PORTUGAL INVESTE MAIS NA IDEOLOGIA DO QUE NA ECONOMIA

No rescaldo da luta cultural entre Conservadores liberais e Socialistas radicais

Por António Justo

Em discussão sobre o ensino, Francisco Seixas da Costa defende que “ o ensino público obrigatório seja laico e naturalmente, gratuito” e faz a confissão de que “Entregar crianças que, por lei, deveriam ter um ensino laico a escolas que observam rituais religiosos (católicos ou outros) configura um grave infringimento de uma importante liberdade constitucional, um dos fundamentos basilares da ética republicana”. O senhor Embaixador certamente já se deu conta de eventos e comemorações do Estado laico, muito inocentes, que correspondem a verdadeiros ritos (actos “religiosos” laicos) que podem ser entendidos como festas de ideologias que até se tornam em ritos de endoutrinação.

Os prosélitos da “ética republicana” declaram a Constituição de crença laica em contraposição com o mundo religioso como se a crença laica não fosse, também ela, uma crença e como se ela não sofresse de particularidades e de uma mundivisão própria e outras éticas não tivessem uma concepção de homem e sociedade de visão universal.

Ensino obrigatório sim, mas que o ensino tenha de ser laico, corresponde a fazer prevalecer a confissão ideológica laica sobre outras, num país em que a república e a laicidade se definem em termos de racionalismo, materialismo e esquerdismo. Muitas pessoas meteriam os seus filhos no Ensino Público se este fosse isento, independentemente da sua matriz constitucional de esquerda.  As escolas do estado em 2016 recebem 105.800€ por turma e as escolas com contratos-associação recebem 80.500€.

O estado laico não é eunuco, não é virgem, nem é isento; o povo que o legitima é formado por cidadãos de crença religiosa, de crença laica, de crença agnóstica, de crença ateia e de crença ideológica de direita e de esquerda. O Estado, em vez de disponibilizar um ensino estatal independente e neutro quer ver nas suas escolas um ensino de matriz de confissão laica. A escola do estado não é isenta como pude observar em muitos anos de professor do ensino público. República significa coisa pública, coisa de todos e, como tal, não é compreensível que a ideologia de Abril determine a influência ideológica do ensino, apelando para a Constituição tal como na política do ensino no regime de Salazar.

 Neste texto darei a impressão de colocar o primado da liberdade individual sobre a comunidade, embora esteja convencido de que a liberdade só acontece na relação interpessoal criadora de comunidade: uma comunidade educativa em que professores e alunos são sujeitos aprendizes.

Com a pressuposta “ética republicana”, o senhor embaixador considerada tal moral como algo absoluto, um puré obrigatório e como tal subsidiado desde que mastigado pela boca do Estado. Quem tiver dentes ou quiser outros a mastigar o seu puré que recorram ao ensino privado secular e ao ensino privado religioso mas pagando tudo do próprio bolso.

A tal ética republicana quer ver reservado para ela o privilégio de ser financiada por todo o cidadão. Isto é discriminação obrigando a ideologia republicana a ser privilegiada, e assim a ver a sua ideologia considerada pública e como tal com o direito (só ela) aos dinheiros públicos. Identificam a sua ética republicana com uma filosofia ética de Estado à imagem das caducas repúblicas comunistas que vendem como universal e pública a sua ideologia de pensar oficial. Um esquema de pensamento e de monopólio para a república equivalente ao que criticam nos antigos estados monárquicos.

A chefe de governo Margaret Thatcher já constatava: “Jamais esqueçam que não existe dinheiro público. Todo o dinheiro arrecadado pelo governo é tirado do orçamento doméstico, da mesa das famílias”.

O senhor embaixador anda mal informado sobre as escolas católicas; há escolas cristãs que até têm espaço para oração para muçulmanos. Conheço indianos que frequentaram escolas católicas até na Índia e continuaram Hindus. As escolas católicas têm fama e por isso são procuradas por hindus, muçulmanos; até socialistas não fanáticos inscrevem seus filhos nelas porque sabem que são respeitados na sua ideologia, outros preferem ensino privado secular  de acordo com a sua coloração ideológica.

Testemunho pessoal

Eu próprio, fui professor de uma escola privada católica em Lisboa e tinha um dos melhores alunos de fé judia; quando ele atingiu os doze anos  fui convidado para a sua festa Bar Mitzvá na sinagoga de Lisboa; no colégio católico ninguém era obrigado a frequentar a missa; também o ano escolar era aberto com uma missa mas ninguém era controlado. Nas escolas católicas que conheço não há endoutrinação, ou, quando muito tanta como nas escolas públicas: o que há é uma visão integral da pessoa que não se deixa reduzir a uma ideologia. A comunidade educativa e o seu regulamento concreto interno são regrados pelo estatuto da escola e pelos representantes de pais, de professores e de alunos.

Conheço escolas com contrato, uma delas que conheço sob responsabilidade da Igreja e ela consegue, dado ser apoiada, promover os filhos dos pobres ao mesmo nível que são promovidos os “filhos de papá e de mamã”!

Conheço também ensino privado nas mãos dos salesianos, de alta qualidade para filhos de pobres, ricos e ciganos. Muitos salesianos ensinam ao lado de outros professores nas suas escolas sem reterem para eles o fruto do seu trabalho; são pessoas cristãs humanistas não inquinadas pelo preconceito. Eu mesmo cheguei a dar aulas em duas escolas dos salesianos, nunca me veio sequer à cabeça se o aluno era pobre ou rico cristão ou não cristão; trabalhava 27 horas lectivas por semana, enquanto os  colegas de fora, não salesianos leccionavam o horário oficial de 22 tempos lectivos. Aos fins de semana dedicava-me ao trabalho pastoral. Muitíddima criança pobre conseguia aqui uma educação integral e esmerada tal como outros que podiam pagar. Havia um ensino de excelência para todos! O que os salesianos poupavam vivendo numa comunidade (verdadeiro comunismo) era investido em favor dos alunos. Devido a muitas experiências que tive de crianças abandonadas e até filhas de prostitutas que através dos salesianos conseguiram estudar e depois seguir estudos tecnológicos e universitários e alcançar uma vida integrada na sociedade, sou, por experiência positiva um defensor do ensino privado católico. Além disso sou defensor da liberdade desde que ela reverta em favor do indivíduo e da comunidade no respeito recíproco.

O grande problema hoje é a desorientação humana,  o capitalismo liberal e o relativismo. Pena é que a esquerda radical seja sempre contra a igreja católica e em todo o lugar em que se encontra siga uma luta estratégica contra ela, sob o principal motor da maçonaria; isto obriga à perda de tempo e energia na defesa da parte quando as energias seriam mais bem empregues num esforço de colaboração e complementação ao serviço do aluno, ao serviço do todo.

Tenho três filhos que frequentaram escolas cristãs e escolas do estado e tenho um que frequentou só escolas do estado. O Estado alemão subsidia a Escola privada, embora também ele seja republicano; na Alemanha, em geral, a República orienta-se mais pelo bem comum, pela economia e pela cultura com uma forma de estar plural e não tão dependente de uma ideologia tão vincada e jacobina nem tão proferida publicamente; não está dependente da ideologia republicana de tipo francês, ao contrário do que acontece com Portugal com elites influentes copiadoras e servidoras das ideologias republicanas de matriz francesa.

Embora muito consciente de todas as formas de ensino, estou contente com o ensino público do Estado e com o do Privado. O ensino privado coloca mais importância no desenvolvimento da personalidade individual e no respeito pelas suas potencialidades. Na Alemanha, devido ao cofinanciamento do ensino privado as escolas privadas são mais baratas que em Portugal. E por isso mais acessíveis à camada social desprotegida.

O ensino católico como o de todas as instituições terá também defeitos mas a imagem de catolicismo que a esquerda radical parece ter, parece sofrer da conotação republicana de cunho maçónico dos inícios da república e julga, predominantemente com pressupostos escuros, tudo o que é católico; naturalmente parece tratar-se aqui de um ressentimento recíproco que foi semeado por Marquês de Pombal e estruturado na República. Há que abraçar-nos para que o povo não continue a pagar as favas pela falta de entendimento e de compreensão.

Absolutismo da Matriz ideológica republicana?

Seria interessante se o senhor embaixador definisse o que entende por “ética republicana”… Porque há-de ser a ética republicana superior a outras éticas onde a liberdade e o respeito pela pessoa e a solidariedade social não são apenas teoria? Porque há-de a matriz republicana e dos grupos que se apoderam do Estado, ter o privilégio de impor a sua confissão/matriz como doutrina sub-reptícia de Estado e vê-la reconhecida como monopólio privilegiado e subsidiado pela nação e financiada pelo Estado? O Estado laico terá de ser mais isento, mais qualitativo, menos ideológico para melhor servir todo o cidadão na qualidade de pessoa e de grupos e assim as pessoas não se virem obrigadas a terem de tirar os filhos das suas escolas.

A constituição religiosa católica defende o direito à liberdade religiosa e ao respeito por toda a pessoa, e isto é praticado; excepções sempre haverá, tal como há escolas do Estado em que a ideologia de esquerda é mais vincada que noutras. Não conheço ensino religioso nas escolas por onde passei (não vivemos nas arábias!), conheci sim o ensino científico acompanhado de aulas de moral e religião e nas escolas católicas não há missionação nem proselitismo ao contrário do que acontece nesta nossa discussão.

A lógica de “ética republicana” apresentada conduz a um beco sem saída; porque no seu entender deveriam seguir todos a ética republicana, como se essa fosse o Corão republicano para toda a nação. Ao cidadão basta-lhe a Constituição, passível de muitas interpretações, embora a Constituição portuguesa tenha ainda muitos ressaibos ideológicos.

A Dúvida conduz à Controvérsia e a Controvérsia ao Desenvolvimento

 Os guardiões do republicanismo determinam o pulsar do coração da república (à semelhança do que a religião fazia na governação antiga), pensam não precisarem de se justificar – pensam-se República e querem a República a pensar como eles, querem como monopólio a sua “ética republicana” de que abusam, chegando até a exigir que os outros se justifiquem do que acham injustificável. São tão categóricos que consideram esforço perdido quem defende outras posições. Mas justificar o quê e perante quem? Haverá alguém em posse da verdade? A verdade não se pensa, nem se tem, a verdade acontece, ela é povo!

Será que quem já tem acesso ao cofre já pode descansar dando-se ao luxo de abdicar da dúvida? A dúvida bem fundamentada já se encontra no apóstolo Tomé e é um elemento importante da crença cristã, que possibilitou em grande parte o desenvolvimento da civilização ocidental.

Muitos não querem compreender que Portugal é cada um de nós, seja de crença ateia ou de crença religiosa, de esquerda ou de direita; são todos filhos de Deus e todos queridos por Ele, diria um cristão que se encontre  nas pegadas de Cristo. Uma sociedade com futuro integra todos os cidadãos – o cidadão é o rei – e preocupa-se mais em consumir menos do que produz.

O direito e o dever de aprender é um imperativo natural em todos os Estados civilizados e consequentemente a existência de uma rede pública. Em Portugal, quando só havia a quarta classe como ensino obrigatório já na Alemanha havia, duas gerações atrás, a obrigatoriedade de frequência do 7° ano.

Também hoje o Estado alemão apoia medidas especiais em faculdades de elite para assim poder manter-se à altura da concorrência técnica e do saber a nível internacional. Um certo Portugal produziu uma certa elite que vive bem encostada ao Estado e a uma ideologia republicana antiquada; por isso a economia portuguesa se mostra sempre carente num Estado habituado a viver à mama das remessas emigrantes, do estrangulamento dos investidores pequenos e médios e da mão estendida ao estrangeiro. Temos uma consciência ideológica de clube e não uma consciência de sermos um país orgânico baseado na produção e contributo e da solidariedade da diversidade de cada cidadão e de cada grupo social.

 Persistimos em ser um povo moderno e aberto para inglês ver,com muitos a viver do cantar da cigarra e de lógicas interessadas na defesa da própria cerca! Falta-nos a normalidade do viver porque habituados a ser levados pelo cantar doentio de intelectuais e políticos que perderam o sentido da realidade, do país e da natureza em que vivem!

Creio que, infelizmente, a nossa maior doença, como povo e como elites, é a de vivermos virados para o próprio umbigo! O mundo não começa nem acaba em Portugal, não começa nem acaba numa ideologia. Para não atraiçoarmos Portugal e a lusitanidade temos de voltar ao universalismo e humanismo universal que caracterizava a Escola de Sagres” de um Dom Henrique, de um Vasco da Gama e de um Camões que partilhavam ainda de uma visão cultural universal e de um saber de experiência feito. Portugal não terá hipótese de se desenvolver enquanto a elite política confundir a maneira de estar europeia com a francesa.

O mesmo Estado que se diz laico em relação ao catolicismo subsidia a construção da Mesquita muçulmana em Lisboa e pelos vistos com milhões de euros! Também aqui o nosso Estado laico se mostra interesseiro. A esquerda é a favor da subvenção da Mesquita porque indirectamente subsidia a própria ideologia dado a antropologia muçulmana e o método de governar andar muito perto do ideário maçónico e socialista marxista: quem vale é a doutrina e o grupo de interesse, a pessoa é apenas meio para se atingir um fim! Isto constitui, a longo prazo, um tiro no pé da própria laicidade. Quanto à Mesquita a construir na Mouraria quem deveria negociar seria o grupo muçulmano e o proprietário do terreno.

A escola portuguesa tem produzido muita gente de intelectualidade convencida e ideólogos demasiado finos e altos para poderem descer à realidade do dia-a-dia, num sistema estatal paternalista favorecedor de parasitas; continua a viver da ideia dos novos-ricos dos descobrimentos habituados a viver dos trabalhadores manuais alheios, mas que, no fundo, desprezam por o trabalho sujar as mãos. Por isso Portugal alimenta predominantemente uma elite ideológica de partidários quando precisaria de uma elite económica e de uma elite intelectual não encostada a uma só ideologia. Portugal – um país com um povo de grandes potencialidades – é assim obrigado a marcar passo porque as energias do discurso se esgotam em lutas ideológicas longe dos interesses concretos de uma nação que para ser adulta teria de ser reconciliada e viver menos da cantiga e do fazer para inglês ver!

A geração que parece ser promissora de futuro não se orientará tanto pelo espírito de alternativas mas sim pelo espírito de complementaridades e de inclusão.

 

António da Cunha Duarte Justo

www.antonio-justo.eu

Interesses marxistas comunistas contra Interesses liberais conservadores na Arena da Educação

O Aluno é a Vítima da Farsa entre o Ensino privado e o público

Por António Justo

O Facto e a Premissa

O marxismo que se servia da politização da economia para se autoafirmar, ao perder a guerra contra o capitalismo, mudou de estratégia, optando por um neo-marxismo de luta anti-cultural; o estratagema é mudar a cultua, a moral popular e a tradição, acabar com a influência da família e da religião. Por isso o neo-marxismo declara guerra à cultura e às aquisições culturais da colectividade (no sentido da sua ideologia revela-se anticristão e pró islão).

A Luta e suas Contrapartes

Estamos a assistir, na sociedade portuguesa, às consequências de uma luta de forças entre duas visões de sociedade de interesses antagónicos – marxismo e capitalismo – que se debatem de maneira vingativa e irreparável sem consciência de Estado nem de Povo. Isto acontece numa sociedade depauperada que precisaria de uns e de outros e, como tal, em vez de se obstinar em soluções exclusivas, precisaria de se entender num compromisso de deliberações inclusivas. O resto é conversa fiada que faz lembrar os leões e as hienas em torno do cadáver do cordeiro (o aluno) e ao largo um público que assiste e se contenta com o cheiro a sangue e a satisfação de ter uma opinião.

Por trás da iniciativa contra o ensino privado encontra-se a luta ferrenha da esquerda radical e da maçonaria pela aplicação da soberania do dirigismo ideológico marxista a nível de Estado e povo; a esquerda radical e a maçonaria sentem-se donos da república e os guardiões dos interesses só de alguns. A esquerda radical é contra o princípio civilizacional da cultura cristã segundo o qual o soberano não é a instituição, o Estado ou a ideologia mas sim a pessoa, a pessoa em comunidade; a pessoa é o outorgante!

O professor Vital Moreira afirma no “Público” que “o direito público ao ensino é realizado por meio da escola pública” e conclui que “o Estado só pode recorrer a escolas privadas em caso de falha da rede pública”. O professor confunde “alhos com bugalhos” ao pretender condicionar o direito do aluno ao ensino gratuito a uma só via de concretização. Naturalmente tem todo o direito de defender o projecto político de esquerda radical a que é inerente uma filosofia de vida de caracter socioeconómico marxista. De notar que esta posição marxista não é partilhada pela parte da esquerda portuguesa não radical. O que o senhor professor diz é lógico mas a Razão não se reduz à lógica. A lógica socialista marxista tal como a lógica liberal capitalista são duas pistas no terreno mas não devem ter a pretensão de serem o terreno; este pressupõe a superintendência da razão e não o seguimento de uma só lógica.De facto a natureza consta de terra e céu e não só de terra como pretende o materialismo ateu marxista nem só de céu como pretendem os crentes idealistas.

A posição, referida pelo professor universitário, refugia-se numa ideologia reducionista que confunde o ensino público (do particular e do Estado) com a escola pública. Ao condicionar a acção do Estado à ideologia marxista desrespeita a liberdade e a dignidade da pessoa, além de discriminar o contribuinte que, no caso de optar pelo ensino público particular não subsidiado, teria de subsidiar duplamente o ensino, o que contraria o espírito democrático plural de uma sociedade civil aberta e adulta numa sociedade moderna justa. O ensino é pago pelo contribuinte independentemente de se realizar no “Privado” ou no “Público”. O subsídio é devido e dado com base nos alunos e não nas instituições de ensino. O critério de avaliação e de apoio deveria basear-se no serviço prestado.

A identidade e a vontade da nação não são identificáveis nem reduzíveis a  uma ideologia monocolor de ditadura. A política e o MEC, em vez de tentarem impedir a fuga de alunos do ensino estatal para os colégios, deveriam preocupar-se com a qualidade de ensino e oferta de actividades paraescolares nas escolas estatais para que os pais não se sintam tanto obrigados a colocar os filhos no ensino particular. A qualidade do ensino e a pluralidade de ofertas é que deveriam determinar a escolha e a discussão. O Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo de 2013 poupa gastos ao Estado (contribuinte).

O Artigo 75° CRP, ao determinar a obrigação de criação de uma “rede de estabelecimentos públicos de ensino que cubram as necessidades de toda a população”, vem dar resposta ao direito constitucional de todo o aluno ao ensino gratuito. Público é todo o ensino, seja ele efectuado em escolas particulares ou em escolas estatais. (Há sociedades que concedem o direito ao ensino privado também na família!)

A referida frase constitucional pode ser interpretada no sentido de o Estado ter de cobrir as necessidades de toda a população e que não haja nenhum vácuo nesse assunto. Grupos com uma visão de estado marxista pretendem o monopólio do Estado especialmente no controlo da ideologia educacional e dos órgãos estatais que lhe dão continuidade. Se bem que a ideologia que produziu o Artigo 75° CRP fosse marxista, a sua leitura é passível de outras interpretações como mostram outras leis em vigor, até ao ponto de não serem cobertas pela constituição (por ex. a lei do aborto é um exemplo de inconstitucionalidade!). Já agora porque não se atreve a argumentar também com o direito do cidadão a abrigo (direito a casa) quando o Estado deixa isso a cargo do privado?

À liberdade individual de escolha do ensino não deve implicar a cobrança de um imposto ou contribuição de forma dupla: o contribuinte deverá pagar o imposto ou contribuição para o mesmo serviço uma só vez e não duplamente, efectue-se ele no ensino privado ou no estatal (1).

A liberdade de ensino (educação) e de escolha de escolas não implica o alegado “propósito de liquidar o direito ao ensino público”, as escolas privadas possibilitam apenas mais qualidade, mais liberdade, mais competição e comparação em termos de avaliação escolar entre os estabelecimentos de ensino sejam eles particulares ou estatais.

A história constitucional portuguesa reflecte o projecto político marxista que esteve na base da sua criação ainda orientada para a ditadura do proletariado, que via na democracia apenas uma oportunidade para, depois de uma educação ideológica consequente e de que enferma ainda hoje o MEC, atingir os seus objectivos: impor, através da lavagem ao cérebro, o comunismo materialista e ateu.

O actual Governo dependente do PCP e do Bloco de Esquerda fomenta legislações no sentido de servir os radicais da revolução de Abril. Sabem que através do Ensino oficial também conseguem promover os seus multiplicadores ideológicos de sindicatos num valor de 9 milhões de euros por ano e perpetuar na mentalidade do povo os interesses da extrema-esquerda e da maçonaria (2).

Iniciativas de mudanças da constituição não são “tentativa de subversão constitucional” como pretende o professor e alguns dos seus pretensos donos e radicais abrilistas que, entre outros, fizeram da revolução dos cravos a revolução dos cravas, que nos levou ao ponto de abdicação em que nos encontramos! As iniciativas de revisão revelam a expressão de interesses e de vontades livres e a subjacente intenção de não encostar a Constituição à vontade de uma só ideologia ou de um só grupo de interesses, seja ele de esquerda ou de direita. A Constituição portuguesa tem, em vários sectores, uma conotação marcadamente marxista que carece de modernização e adaptação ao desenvolvimento do povo e dos novos tempos.

Das Ovelhas ranhosas do Ensino estatal e particular

Tanto no particular como no estatal há escolas melhores e piores. Diria ainda que também há colégios com contratos de associação que terão como objectivo principal o lucro e não o bem dos alunos e da comunidade escolar. Dizia-me um director de uma escola: “Nesse grupo estará, por exemplo, o grupo GPS. Parece que conseguem sempre trabalhar com professores no início de carreira. Não sei como conseguem controlar as leis do trabalho e ter sempre professores “baratos”. Foi coisa que nunca investiguei. Haverá colégios subsidiados, que não terão qualidade educativa. Mas, para eliminar a não-qualidade, o Ministério tem à sua disposição a IGE (Inspecção geral do Ensino). Esse deveria ser o seu trabalho: enviar a IGE às escolas estatais e às escolas privadas e inspeccionar; uma medida importante seria também submeter os professores à avaliação de desempenho para poderem obter resultados semelhantes ao do privado. Quem persistisse em prevaricar sofreria as consequências até de fechar portas, desde que esta medida fosse válida para o ensino estatal e privado. Agora, fechar, sem mais, os privados simplesmente porque são privados para encherem as escolas estatais que estão vazias, independentemente de serem boas ou más escolas, isso é que é ser ladrão da liberdade que é constitutiva do ser humano e, no caso português também consagrada na Constituição”. O Estado deveria ser ideologicamente neutro no seu agir, para respeitar a diversidade de interesses dos diferentes grupos e corresponder à democracia e poder orientar-se pelo bem comum. Um estado democrático deve dar resposta à diversidade e à multiplicidade.

Ataque marxista também ao Ensino das Escolas da Igreja

Há ensino privado e ensino privado; o ensino administrado nas instituições da Igreja é geralmente de alta qualidade. Parte do princípio superior da dignidade humana e da soberania da pessoa em relação a ideologias e instituições. As escolas privadas da Igreja são altamente apreciadas, em todo o mundo civilizado, entre outras escolas  temos o exemplo, dos alunos formados nas escolas dos jesuítas e das doroteias. O ensino privado nas instituições da Igreja é social e solidário e de alta competência e integra nele também muitos alunos das camadas desfavorecidas que, de outro modo, não teriam a possibilidade de subir às elites (https://antonio-justo.eu/?p=1305).

O ensino nas escolas da Igreja envolve uma formação integral orientada para os talentos pessoais com valores comportamentais positivos morais e intelectuais, pressupostos para o crescimento pessoal de maturação humana para melhor servir o outro (mais em https://antonio-justo.eu/?p=3336).

Um Estado com instituições produtoras de boa formação e de boas elites é como um carro puxado a motores de alta cilindrada; naturalmente muitos peões inocentes consideram a bicicleta como suficiente para andar, só que depois passam o tempo a queixar-se do vento dos carros que os ultrapassam (destes inocentes e dos descontentes se aproveitam as ideologias)! Também esta seria uma razão muito oportuna para o Estado subsidiar o ensino e a qualidade no ensino privado também porque grande parte deste é cooperativo e solidário e, de uma maneira geral, produz melhores motores para puxar o carro. A maior parte da conversa com que se ocupa a nação é gasolina para encher os depósitos de oportunistas e do partido (3). Muito boa gente socialista tem as suas boas razões para colocar os seus meninos em colégios privados. A esquerda radical do actual governo geringonça faz tudo por tudo por defraudar o ensino da Igreja.

Solução: não ideologizar integrar e descentralizar

A democracia precisa das posições da direita e da esquerda a actuar em compromisso com um ideário base de consciência integral e de subsidiariedade recíproca numa sociedade plural.

Uma e outra, para estarem à altura de um Estado democrático humano e plural, deveriam tornar-se complementares e não contraditórias nem exclusivas. Os pais deveriam ter a possibilidade de escolha entre o ensino estatal e o ensino particular (ambos gratuitos, em princípio). A escolha da escola deveria basear-se no que ela oferece, comunidade escolar, conceito pedagógico, qualidade, empenho, formação complementar, música, teatro, arte, actividades paraescolares, cursos inovadores, etc.

As escolas estatais deveriam deixar o dirigismo centralista de Lisboa e fomentar mais a criatividade e a qualidade de ensino, a autonomia, a inserção e promoção regional; o sistema centralista de colocação dos professores deveria ser abolido para ser descentralizado e humano; contradiz o espírito democrático tratar os professores como soldados, obrigados a viver longe da terra, devido a uma política do MEC anti-familiar e desrespeitadora das necessidades elementares dos seus funcionários. Deputados e servidores do Estado, que baseiam o seu poder para desestabilizar o cidadão e as instituições orgânicas de base, não são factualmente sérios, porque usam e abusam demagogicamente do pouco saber que têm de avanço em relação a um povo que propositadamente tornaram espectador e especialista do aplauso.

O que está em jogo e em perigo?

O povo deve ser induzido em erro! Na legítima discussão estão em jogo duas filosofias de vida: a visão do mundo socialista marxista contra a visão liberal conservadora. A esquerda radical procura impor-se à nação em nome de uma revolução apresentada à sua imagem e semelhança e não criticamente discutida como seria natural numa sociedade com uma direita e uma esquerda responsáveis e sérias!

A concepção socialista marxista aposta no valor do Estado e na manipulação cultural do indivíduo, concebe o Estado como patrão monopolista com direito a cimentar a sua máquina do poder e decidir sobre os conteúdos, os métodos, o pensar, a moral e os costumes, e até a religião; considera o Estado como um absoluto e a pessoa como meio para atingir os seus fins, vendo a pessoa e a educação como tarefa do estado; esta mundividência é a razão pela qual a esquerda procura, como estratégia inteligente, ocupar os lugares do Estado e da administração pública e de maneira especial o sector do ensino e da cultura; deste modo influencia com sustentabilidade as gerações novas e estudantis: Pretende, a longo prazo, uma escola de pensar único à maneira do dirigismo da troica soviética; consequentemente é contra a liberdade de ensinar e contra a liberdade de escolha dos pais; considera-se dona do orçamento do Estado (contribuintes) penalizando os pais que optem pelo ensino particular. Encontramos esta filosofia já plenamente aplicada e concretizada na antiga União Soviética, na China e na Coreia do Norte.

A concepção liberal conservadora aposta no valor da pessoa, na liberdade de escolha, na personalidade e nas capacidades do indivíduo, defendendo a multiplicidade de visões, a concorrência das instituições no sentido de optimação do nível do ensino (considera o Estado em função da pessoa); esta visão é liberal e vê na iniciativa privada o factor impulsionador da sociedade e na família o direito de determinar a instrução e educação e não o Estado; este apenas deve manter uma função de regulador e controlador do cumprimento da Constituição e dos programas de ensino. Encontramos esta filosofia aplicada nos USA, na Alemanha e muitos outros países democráticos.

Cada qual tem o direito de puxar a brasa à sua sardinha na grelha do estado democrático que é subsidiado pelos impostos e pelas vontades de todos os cidadãos (4). A irresponsabilidade governativa torna-se culturalmente prejudicial para a sociedade, significando a um empobrecimento educacional e cultural nacional, além de esbanjar os recursos do Estado. A AEEP (Associação de Estabelecimentos do Ensino Particular) refere que os cortes previstos pelo governo originam o “desemprego de mais de mil professores” e, de imediato, 9811 alunos que serão arrancados à comunidade educativa a que pertenciam. A medida governativa provocará “31 milhões de euros em indemnizações” e professores com “20, 25 anos de casa, que, se nada for feito, vão para o desemprego”.

A ideia original cristã da soberania da pessoa humana, sobre as instituições e as ideologias, poderia ser o princípio de uma discussão equilibrada baseada nas relações livres e complementares, como a política nórdica tentou com a economia social de mercado (ao tentar tornar compatíveis as leis da economia com a doutrina social da igreja), uma economia mista que responda de maneira inclusiva aos direitos e interesses do indivíduo e do grupo. 

De resto a nação é mais rica com o ensino público privado e com o ensino público estatal numa aposta de cada um tentar servir melhor os alunos, as famílias e a nação. Vamos todos colocar o poder dos factos sobre o poder das ideologias! O cinismo do poder não teme conduzir e fortificar a ideologia até à destruição do país. Ousemos colocar o futuro ao serviço de Portugal e dos portugueses numa inter-relação de grupos e interesses orientados pela inclusão e pelo bem da pessoa, a única soberana!

António da Cunha Duarte Justo

Pegadas do Tempo

  • 1 A propósito: a ADSE é segurança social privada ou pública? Não chegaria também um SNS comum? Porque não assume o estado português também a incumbência de construir casernas para toda a população em vez de delegar isso no privado?
  • 2 https://antonio-justo.eu/?p=3569) e https://antonio-justo.eu/?p=3444
  • 3 Como produto que sou do ensino particular dos salesianos e com os exames feitos no estatal, ensinei 7 anos no ensino particular e mais de 30 no ensino estatal; como andei sempre empenhado em representações de professores e sindicais, sei bem do que falo. Muitas vezes tive a impressão de que aqueles que mais se expõem em nome do proletariado são os que mais abusam dele, servindo ele apenas de escada para eles, do alto das suas posições, se servirem e deitarem as suas sentenças em nome de quem se distanciam.
  • 4 Em termos muito simplificados temos a lóbi marxista comunista beneficiada pelas infraestruturas criadas pela ideologia de Abril que pretende tornar-se na razão do Estado e temos a lóbi liberal capitalista que aposta no privado (no indivíduo e nas empresas, no mercado livre e nos contratos livres com o Estado a regulá-los) e nas relações livres. O capitalismo liberal explora a pessoa como força de trabalho reduzindo a pessoa a um instrumento ou mercadoria; o socialismo marxista explora a pessoa como mera força proletária reduzindo a pessoa a um instrumento em função do Estado.

 

 

ENSINO PÚBLICO ESTATAL VERSUS ENSINO PÚBLICO PRIVADO

Quem financia quem? Ensino Público ao Serviço da Esquerda?

António Justo

Na intervenção do governo com o fim de rescindir os contratos do Estado com o ensino associativo particular, o que está em causa não são os gastos com o ensino, o que está em causa é a estruturação da ideologia radical esquerda! O dinheiro do orçamento sai do contribuinte e as escolas privadas ficam mais baratas ao orçamento do estado que as públicas. Da análise e classificação das 621 escolas do ensino secundário em Portugal resulta que o ensino privado é mais económico e com melhor rendimento (1). O governo de Costa deixa-se orientar por ideologia e sensibilidades oportunas e não por dados matemáticos ou de direito comercial. Não há honestidade intelectual?

As nossas deolindas da política, agressivas e invejosas, querem ver tudo alinhado em uniforme ideológico sob a batuta avermelhada do MEC! Agora, que o BE e o PCP têm mão no governo geringonça, aproveitam a ocasião para avermelharem ainda mais o MEC, deitando ao charco os contratos de associação que os governos de esquerda e de direita criaram e cumpriam desde 1995. A discussão pública sobre as escolas privadas faz lembrar uma sequência do episódio da ideologia do sindicato único nacional, que o vermelho PCP pretendia impor à verde democracia de Abril.

O PS ao explicar que os contratos de associação são apenas uma „forma de suprir as carências da rede pública“, demonstra bem o seu entendimento de democracia e cultura plural. Querem o domínio da vontade do Estado sobre a vontade dos pais (2).

A rescisão dos contratos vem criar mais discriminação porque então os privados passarão ter de aceitar só filhos de pais com posses. Estes terão de suportar o ensino privado com as propinas e ao mesmo tempo o ensino estatal com os impostos (sofrem dupla tributação!). Ou será que a esquerda radical não quer ver gente pobre a frequentar colégios particulares? O MEC já interfere e controla as escolas privadas e avalia os respectivos alunos nos exames nacionais…

A esquerda radical qualifica os colégios particulares com contrato como parasitas quando, o que querem é servir o próprio parasitismo na estrutura do MEC e vê-lo como garante da sua clientela. De facto o MEC concede benesses à Esquerda através do subsídio indirecto a sindicatos da Fenprof, etc. gastando muitos milhões de euros com delegados sindicais, seus multiplicadores, dispensados de horas lectivas ou de dar aulas, coisa que num Estado rico como a Alemanha não seria possível (3). É escandaloso ver-se como um Estado pobre como o português se dá ao luxo de subvencionar ideologias no seio dos seus funcionários.

Concretamente, segundo o Relatório do Tribunal de Contas relativo a 2009/10 o ensino com contratos de associação com o ensino particular e cooperativo fica mais barato 400 € por aluno do que o ensino estatal (custo médio por aluno estatal 4.921,44 euros anuais, aluno privado 4.522 €) Estatísticas relativas a esse ano, referem que o Estado poupou 21 milhões de € ao deixar os alunos frequentar o privado.

Os resultados das investigações da OCDE e do PISA falam a favor do privado. O dever do Estado deveria ser fomentar a iniciativa privada e a diversidade de iniciativas e oportunidades, em vez de fomentar o regime monopolista totalitário, de formação em massa.

O MEC continuará a não dar conta do recado enquanto continuar a privilegiar ideologias políticas e a não servir um Portugal plural onde a qualidade de ensino deveria ser prioritária (4).

Com as medidas que a esquerda pretende muitos milhares de professores passariam ao desemprego e milhares de alunos perderiam um ambiente e uma comunidade escolar em que vivem.

O Estado já perdeu em segunda instância quatro processos devidos a cortes de verbas a colégios com contrato em 2010, o mesmo acontecerá, certamente, com os actuais cortes.

Os partidos do governo comportam-se como donos da nação usando o Estado como palco para fazer política ideológica em vez de fazerem política consensual para o povo; em vez de servirem o povo e o país servem-se do povo e das infraestruturas do estado para  se instalarem e imporem os seus credos. A natural consequência será o surgir de uma política conservadora consequente.

António da Cunha Duarte Justo

www.antonio-justo.eu

 

VIVER BEM

VIVER BEM

Na vingança da resposta a vida aquece, evola-se e desaparece.

A vida não pergunta, nós somos a resposta;

se lhe queremos responder

o seu bem esvai-se na pergunta que a disseca.

Viver bem é sofrer e amar sem saber porquê.

Para mim, viver bem, mais que existir é a arte de fugir ao engano,

é querer dar lugar ao leito do sonho e do tempo

que flui em mim, em ti

e prossegue no rio e na estrada.

É também um borbulhar de sonho no tempo

a iluminar o futuro, o caminho, no leito do mundo

a querer parecer (encenar) mundo sem o ser.

Nesse leito sou o brilho, um modo de ser sem estar no acontecer.

Viver bem é deslizar como a água que alimenta sem saber,

é sentir um olhar sem olhar nem pensar,

um estado de graça a agradecer.

Viver bem é a coragem de mergulhar na vida e fluir

e como a água fazer os outros crescer.

Viver bem é saber que se passa sem andar,

que se bebe a água sem ter sede.

Existir é a sede do caminhar no bom viver

e viver bem é ser, ser sem cobiçar nem pensar.

Viver bem és tu sou eu, no rio do nós,

a fluir para o bem.

Para mim, viver bem é viver sem querer,

viver na alegria do fazer e do ser como se é.

Viver bem é estar todo no ser

no ser em devoção da comunhão que se é.

António da Cunha Duarte Justo

A ELITE DE ABRIL ATRAIÇOOU O IDEÁRIO UNIVERSAL PORTUGUÊS EM NOME DA LIBERDADE E DO PROGRESSO

O Jacinto de “A Cidade e as Serras” é o Protótipo do Português moderno autêntico

Por António Justo

 

Eça de Queirós, no romance “A Cidade e as Serras”, revive o espírito luso, ao incarnar-se no seu protagonista Jacinto e defender a reconstrução de uma sociedade tipicamente portuguesa que acompanhe a civilização mas sem se corromper.

Jacinto que levava uma vida afrancesada, progressista e artificial transforma-se no símbolo do verdadeiro português, de autoconsciência madura, que integra na natura e na cultura, de maneira criativa, as novidades da civilização sem destruir a própria cultura.

A obra “Cidade e as Serras” consegue idealmente integrar e reconciliar Portugal e nele, reconcilia o exterior com o interior, irmana a tradição com o progresso.

As nossas elites de Abril, “afrancesadas” e “sovietizadas”, ainda se encontram na fase de Paris, vendendo a alma portuguesa aos demónios socialista e capitalista, mercantilizando o povo e o espírito da sua vida; vivem ainda unilateralmente nos andares da razão do artifício (polar dialético) sem se preocuparem pela integração de razão e coração (corpo e alma); aquele modo de estar tem-nos levado à promoção da desconciliação e à alienação do cultural e natural num movimento de entropia contrariador do espírito luso de inclusão.

A elite pós-25 de Abril, ao contrário do personagem do romance, Jacinto, iniciou uma viagem já não de Paris para Portugal mas de Portugal (natureza) para as cidades da ideologia sem regressar nem capacidade para renovar Portugal porque apenas lhe oferece os enlatados estranhos que, a nível cultural, não produzem humos alimentícios que alimentem a terra mas apenas entulheiras de enlatados amontoados.

“Paris” é a ideologia, é moda que passa em gestos de dançarinos públicos, é espírito que corrompe, se não regressa à frescura e inocência da natureza campestre (o nosso Portugal, que integrou nele o mundo todo não se deixando cativar pelos cantos de sereias nem perder nos extravios de uma Europa decadente porque envelhecida). Enquanto Jacinto moderniza as serras e se junta ao povo, a nossa elite de Abril destrói as serras e desertifica as aldeias; em vez de se casar com a província (Joaninha) prostituem-na com a falsidade e a corrupção de citadinos degenerados e malabaristas sem consciência; em vez de se tornarem no pai dos pobres, tal como fez Jacinto, desprezam e negligenciam o povo e os seus costumes.

O Ideal de Jacinto de Tormes deveria consistir em reconciliar a cidade com o campo (a tradição com o progresso) promovendo uma condição digna também para o povo de baixo. As nossas elites atraiçoaram os ideais de Portugal; Jacinto de Tormes é o protótipo do português autêntico, o contrário da nossa elite que figura no palco da nação, uma elite desenraizada sempre atarefada a correr atrás da moda e de olhos fixos no que faz e diz o estrangeiro como se as modernices não fossem apenas fulgores passageiras condenadas a tornar-se velhices. A situação actual, analisada sob a perspectiva característica da identidade portuguesa descrita no romance “A Cidade e as Serras”, tornou-se mais numa tragédia que num romance…

Resta-nos agir e esperar que a nossa elite progrida e se desenvolva tal como aconteceu com Eça de Queirós, primeiramente iludido e seguidor incondicional do progresso e depois, mitigado pela naturalidade humana do povo e da natureza, se tornou num grande português como se retrata e descreve no Jacinto, e no grande romance “A Cidade e as Serras”. (Este romance, que revela ainda o génio de Portugal e não as suas ideologias, deveria ser leitura obrigatória para todo o aluno).

Não se trata de vendermos a nossa alma ao passado nem ao futuro mas de sermos sempre nós, sempre em processo a tornar-nos nós mesmos, na concretização do presente: um agora feito de passado e futuro. Assim realizaremos a intercomunicação da alma tipicamente portuguesa expressa na saudade, onde ressoa o divino e o humano, a natureza, o tempo e a eternidade.

Também Eça, tal como Jacinto, se deu ao luxo de uma vida desregrada em Paris mas amadureceu deixando de ser um eterno adolescente para voltar, tal como o filho pródigo, à casa paterna, à natureza bem portuguesa das terras do Douro.

Chegou a hora de a nossa elite pôr de lado o cinismo e a vida irónica e dupla e seguir o exemplo de Eça no seu Jacinto para se reconciliar com o povo, com a natura e com a cultura genuinamente portuguesa: uma natureza aberta ao mar que é parte do seu corpo a abraçar o mundo, uma cultura inclusiva e universal que vê e sente o mundo e a humanidade a partir de dentro porque o génio sinceramente português é feito de terra mar e céu.

De facto, seria catastrófico, continuarmos a agir apenas em nome da ganância e do progresso atraiçoando assim o ideal português de ideais éticos e de inclusão numa consciência humilde de complementaridade.

Chegou o tempo de parar para reflectir e sentir o mundo nas pegadas de um Afonso Henriques, de um D. Dinis, de um Santo António de Lisboa, de um infante D. Henrique, de um Vasco da Gama, de um Camões, de um António Vieira, de um Feranando Pessoa e de tantas e variadas personalidades portuguesas que se sentiam na missão e tradição de se realizarem, cumprindo Portugal sem que este abandonasse o seu papel de pioneiro na realização da civilização…

António da Cunha Duarte Justo

www.antonio-justo.eu