DESTRUIÇÃO IRREVERSÍVEL DE POVOAÇÕES

A 32 – Ruína da Branca – Um Exemplo entre Outros
António Justo
Numa altura em que estados desenvolvidos procuram desviar o trânsito das populações o Estado português teima em construir auto-estradas através de vilas, aldeias e pequenas cidades sem consideração por população, ecologia, paisagem, património histórico, etc.

A Irracionalidade dum Projecto
O litoral, já bastante bem servido de auto-estradas, vê estas aumentar sem qualquer compensação para o interior do país, deitado ao abandono. De facto, no Litoral, paralelamente à projectada A 32 já passam, num espaço de cerca de 10 km, a A 1 e a A 17. O que faltam são auto-estradas no mesmo sentido (N-S) nas regiões do interior e traçados de ligação às já existentes no sentido Este-Oeste. A A 32 seria um investimento no futuro se fosse desviada, para leste, pelo menos dez ou 20 quilómetros.

A poente da EN1 havia um projecto previsto já há 20 anos e que agora é alterado pela alternativa bárbara de passagem pela Branca, vila pacata de 6.000 habitantes. Esta alternativa vem destruir o que a Branca tem de melhor a nível paisagístico e histórico com um impacto ambiental irrespnsável, destruindo zonas ecológicas e recursos hídricos (35 nascentes de água e poluição das minas de água), o Monte de São Julião e sua Estacão Arqueológica; o trajecto projectado iria ter um viaduto com um quilómetro empoleirado por cima de casas, atravessando a população e indo impedir o desenvolvimento da Zona Industrial de Albergaria-a-Velha, tal como refere AURANCA (Associação do Ambiente e Património da Branca). Esta alternastiva ainda se torna mais onerosa para o erário público. Auranca, vê neste traçado a “destruição irreversível da Vila da Branca”. Dado esta alternativa ser duma irracionalidade que brada aos céus Auranca ainda confia na inteligência dos políticos e da EP.
É revoltante ver-se a irresponsabilidade e autismo de projectistas, políticos e grupos económicos, que sem princípios nem responsabilidade, fazem passar um monstro de poluição sonora e ambiental, por cima duma encosta, a sala de visitas da Branca, destruindo a sua identidade física, geográfica e social. Esta alternativa destrói o futuro de populações e vilas que cresceram naturalmente num abraço entre povo e natureza. Esta alternativa da A 32 seria um aborto da inteligência política centralista e distante, a impedir-se por todos os meios.

Possíveis medidas a tomar
Para impedir a aberração do trajecto projectado serão necessárias iniciativas múltiplas. Se o Governo continuar de ouvidos moucos serão necessárias: acções prévias, tal como aconteceu em São João da Madeira, com bloqueios e acções de protesto público mais eficientes; acções políticas a nível nacional e de Bruxelas; acções jurídicas impedidoras da efectivação do projecto; e acções jurídicas posteriores, a nível Europeu, para efeitos de indemnização dos lesados.

Para haver sucesso na iniciativa contra o troço de auto-estrada projectada seria necessário actuar paralelamente com intervenções públicas e com uma acção em tribunal.

Nesse sentido seria preciso verificar se e quando foi feita uma “Providência Cautelar” para efeitos suspensivos.

Mais eficiente seria uma acção comum (processo) dos lesados e / ou prejudicados, ou uma acção de alguma associação, grupo ecológico, etc.

É sempre possível intentar acção em tribunal enquanto a auto-estrada não estiver construída. Depois também é possível para o caso de indemnizações.

É possível intentar-se um processo de responsabilidade Civil e / ou administrativa. Para isso seria importante a recolha de factos (proximidade, barulho, zonas protegidas, casas próximas, argumentos ecológicos, históricos, etc.); fazer-se o levantamento de pessoas lesadas e expropriadas para se reunir o maior grupo possível por causa das custas de tribunal. Uma acção em tribunal ficaria por cerca de 6.000 euros. Uma acção posterior no Tribunal europeu dos direitos humanos ficaria mais cara atendendo a que, para o facto, serem necessários dois advogados que teriam de se deslocar ao tribunal europeu, isto para o caso de indemnizações.

Além das pessoas expropriadas há também pessoas indirectamente envolvidas no caso devido à desvalorização dos terrenos e das casas. Casas e terrenos diminuem certamente o seu valor até um mínimo de 50%, afastando possíveis interessados. A classe média e alta não se sujeita a viver junto a auto-estradas e a carenciada precisa de quem a defenda!

Segundo o parecer dum advogado e professor de direito da universidade, poder-se-á conseguir vencer as acções com custos reduzidos desde que tenham um número mínimo de lesados, no mínimo 10, para a despesa ser bastante inferior a mil euros per capita. Para além disso, pode requerer-se uma indemnização compensatória das despesas ocorridas, e por danos morais e patrimoniais. Um advogado constituído das partes, submeteria imediatamente uma providência cautelar isto é uma acção judicial rápida, seguida de um processo civil na devida forma, e, provavelmente também um processo de direito administrativo; posteriormente, uma acção contra o Estado Português, com informação concomitante à Comissão da União Europeia no Serviço Jurídico da Direcção-geral do Ambiente em Bruxelas.

Também seria feita uma acção política junta aos parlamentares e outros órgãos políticos nacionais, incluindo o Provedor de Justiça português e o comunitário.

Atendendo a que o Direito do Ambiente faz parte dos direitos fundamentais previstos no primeiro capítulo da Constituição Portuguesa, será importante intentar acção no Tribunal Constitucional Português por haver violação do Direito Português do Ambiente, artigo 9 e seguintes da Constituição Portuguesa.

Finalmente, a nível da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, cujo tribunal permanente está sedeado em Estrasburgo, esta seria a ultima ratio e com êxito, porque existe jurisprudência nos casos idênticos, particularmente contra o Reino Unido.

A alternativa do traçado em causa foi feita sem ter em apreciação as condições prévias sérias, sendo contra a razão económica e sem ter em conta a realidade da situação e as necessidades reais da nação e das populações.

O “establishment democrático” do quero, posso e mando precisa de correcção e de ser domesticado, urgindo para isso o surgir duma vontade cívica consciente e decidida a actuar no sentido do povo, da terra e da nação.

António da Cunha Duarte Justo
a.c.justo@unitybox.de

LUTA EM VEZ DE LUTO

A32 degrada Oliveira, Branca, Albergaria e Águeda

António Justo
A Vila da Branca encontra-se de luto. A sua riqueza de paisagem impar seria destruída, para sempre, pelo traçado da auto-estrada A32. A destruição paisagística, ecológica e patrimonial estende-se como uma nuvem negra ao longo dum trajecto completamente irracional.

Das janelas dos prédios ao longo do IC2, que atravessa a Branca, meneiam, ao vento, longas faixas de tecido preto, numa atitude de resignação amarga perante poderes e interesses que sopram de longe.

A Associação do Ambiente e Património da Branca (“Auranca”) esgota-se num activismo de conversações com políticos e autarcas locais também eles impotentes perante a prepotência do poder político de Lisboa e os seus parceiros económicos.

De facto, perante os ouvidos moucos e a cegueira dum poder político centralista, encerrado em Lisboa, que, longe das populações, decide contra a razão, contra a natureza, contra o ambiente e contra o povo, a população da Vila da Branca, tal como outras populações vizinhas, parece resignada, sofrendo em silêncio, perante aberrações económicas, sociais, paisagísticas que o novo troço de auto-estrada vem irremediavelmente causar, ao passar pelo monte de S. Julião sem respeito nem consciência pela natureza e pelo humano.

Ditaduras e despotismo só são possíveis através do medo. Quem, antecipadamente, põe luto dá o sinal de desistência! O medo perante poderes anónimos veiculados pelo centralismo megalomaníaco lisboeta, alheio ao resto de Portugal e penalizador dum Norte trabalhador só poderá ser superado por uma acção conjunta de todos perante o poder central e a AE. De facto, povo, junta de freguesia, câmara municipal são contra o projecto. Não há ninguém contra ninguém. Apenas o próprio respeito, o respeito duns para com os outros e a responsabilidade pelas gerações futura obriga todos a agir. Não nos encontramos em tempos de falsos medos nem da lisonja a que Sócrates nos quer obrigar! O inimigo está em Lisboa e nos seus acólitos!

O prémio da lisonja tem o preço da própria honra e do futuro. Se todos seguirem o caminho de Diógenes, com certeza que a A23 não será construída como planeado e reverterá ao serviço do interior, em especial de Vale de Cambra, Arouca e outras populações.

Certo dia, Diógenes encontrava-se sentado na soleira duma porta a comer um pobre prato de lentilhas. Um ministro do imperador, vendo a pobreza daquele sábio, dirigiu-se a ele e disse-lhe: “Diógenes, a tua situação é lamentável! Se aprendesses a ser um pouco submisso ao imperador e a lisonjeá-lo não terias de comer só lentilhas!” Então, Diógenes deixou de comer, levantou a cara, fixou o nobre interlocutor e respondeu: “ Lamentável é para ti, irmão. Se aprendesses a comer um pouco de lentilhas não terias de ser tão submisso e de lisonjear continuamente o imperador.”

A via do respeito próprio e da dignidade transcende as próprias necessidades e uma auto-estima vaidosa.

O preço da negação própria e o futuro da Branca e vilas circunvizinhas é demasiado alto para nos fecharmos no lamento e no luto. Mãos à obra! Todos unidos conseguiremos o melhor para todos. Para não continuarmos submersos no nevoeiro da lamentação e do luto, a palavra de ordem será: Luta em vez de luto!…
António da Cunha Duarte Justo
Habitante da Branca
a.c.justo@unitybox.de

AMAR É DIVINIZAR

AMAR É DIVINIZAR
António Justo
A. e A. escolheram para lema da sua união a frase de Dostojewski: “Amar uma pessoa significa vê-la como Deus a quis ver”.

Neste sentido quero meditar um pouco convosco sobre tão belo lema!

A união matrimonial consciente é uma bênção, um passo grande na realização do amor e na sua aprendizagem. Cada um se reconhece como processo, consciente de ser incompleto, projecto inacabado em contínua realização. Parabéns! No exercício do amor consciente exercitareis a própria transcendência.

O amor acenou-vos e vós aqui estais para lhe dar resposta. Ele faz-se sentir como a brisa fresca a passar em tarde de Verão. Na vossa presença e no brilho de vossos rostos sente-se o enlevo do seu ciciar. No amor renasceis juntos para em cada um de vós descobrirdes o Eu e o Outro na realização do nós.

A união matrimonial não é absorvente, ela pressupõe o espaço do próprio horizonte entre vós. (Die eheliche Verbindung ist nicht vereinnahmend, sie setzt einen Raum des Horizontes zwischen beiden voraus). A saudade da vida acenou-vos, para no amor vos tornardes vós, vos tornardes a vida. A vida do amor compreensivo abre perspectivas mesmo para aquilo que poderia tornar-se desilusão. O conhecimento adquirido no amor torna-se salvador tendo como consequência a entrega à medida de Cristo. Na união, o homem ajuda a mulher na realização da encarnação – ressurreição e a mulher ajuda o homem através da comunidade a realizar a encarnação – ressurreição. Então, a relação realiza-se não só na necessidade biológica mas também na realização existencial. O ser humano pressupõe o outro (ein Gegenüber) para se realizar. A dualidade, através do amor, desagua na trindade, na transcendência. Naturalmente, o espírito desenvolve-se da consciência dos contrastes entrando então num processo dinâmico frutífero. No outro vislumbramos também o que em nós se encontra subtérreo.

Deus é comunhão, por isso criou a pessoa como homem e mulher; os dois juntos formam a sua imagem plural e una. Na descoberta da mulher o homem descobre-se outro, na descoberta do homem a mulher descobre-se outra. Esse outro é tudo o que parece estar fora de nós mas que nos forma e gera para uma nova realidade. O eu é sempre incompleto, atendendo à sua conexão processual no “eu sou tu, tu és eu”. Do reconhecimento do Tu no Eu surge a dimensão trialógica (trinitária) do nós. Cada um torna-se ele mesmo na entrega ao outro. Nesta vivência não surgirá a tentação estática de mudar o outro. O amor vos mudará. Doutro modo, as cadeias do desejo prolongarão o sofrimento, dado o desejo provir da dor.
Como é belo receber da mão do outro o pão que se precisa. Homem e mulher encontram no outro, a outra parte respectiva de si mesmo. (Mann und Frau finden im anderen die jeweils andere Seite von sich selbst: das eigene Selbst) O homem encontra na mulher o outro (das andere, das Gegenüber) de si mesmo, e a mulher encontra no homem o outro de si mesma. Assim se recriam, começando assim a antecipar o futuro. No tu está a perspectiva do acto criador, que implica a exuberância de si mesmo que transborda e se comunica. Na entrega mútua se reconhece a vida como parceria, como ser com, numa relação dinâmica de pergunta – resposta. Aqui se prova a relação trinitária onde não há ordem superior nem inferior, independentemente dos próprios papéis.

Ao reconhecer o outro, eu reconheço também que sou mais do que eu mesmo e dou-me conta da profundidade do mistério da vida. Sem o outro estamos sós neste mundo. E não há maior solidão do que a de viver só na companhia de alguém. Sem uma relação autêntica com o outro estamos sós neste mundo. A vida só é possível em parceria, em relação. A relação é que é a vida! Cada um de nós encontra-se no outro. A tenção do feminino com o masculino, e vice-versa, são o pressuposto para o caminho da unidade interior. Assim descobrimos o estranho como parte essencial do eu.

A relação perfeita não se limita ao eu e ao tu: Ela precisa dum terceiro na companhia, que é o nós, o espírito, o amor, tal como na relação do Pai com o Filho surge o Espírito. Tal como na Trindade: o amor do Pai revela-se no filho gerando-o e o filho reconhece o pai amando-o, sendo o Espírito o fruto daquelas relações amorosas, o nós. A realização do Eu está no Tu e do Tu no nós. Nesta dimensão o Eu e o Tu encontram-se numa relação de salvação mútua e universal. No Tu está a componente salvadora do Eu e a vocação universal de salvação, tal como a vivemos no nosso protótipo Jesus Cristo.

A chama acordada no primeiro momento do amor, aponta para a perspectiva duma realidade aberta manifestando nele a realidade divina no que tem de mistério e possibilidade. Já Paulo dizia: “Aos olhos de Deus, nem a mulher se compreende sem o homem, nem o homem sem a mulher!” (1 Cor 11,11).

O matrimónio é uma forma ideal de antecipação do processo da união do natural com o espiritual, tal como é vivida na relação trinitária. Na entrega mútua de um ao outro dá-se a concepção e realização de cada um, já não apenas como um eu ou como um tu mas também como um nós. A relação e a contínua descoberta do tu conduz à dimensão do nós.
Também na união sexual se torna mais visível a realidade do sacramento da nossa união com Deus. Aí se antecipa já o carinho e a ternura divina. Na união se inicia a realidade do sacramento eucarístico. Aí começa já o futuro.

A aprendizagem e o exercício paciente do amor implicarão finalmente uma relação já não só de diálogo mas de triálogo. Então se compreenderá melhor a expressão de Agostinho quando diz: “Ama e faz o que quiseres” (Augustinus sagte: Liebe und mache was du willst).

António da Cunha Duarte Justo
Stadtkirche Bad Wildungen
22.08.2008