A SENHORA DA ASSUNÇÃO É SIMBOLO RELIGIOSO E EXISTENCIAL DA DIGNIDADE DA MULHER

A devoção a Nossa Senhora da Assunção, revela, na sua simplicidade, uma profunda teologia encarnada na liturgia e na devoção popular. Ligado ao louvor da elevação de Maria ao Céu, encontra-se o símbolo abrangente da mulher como portadora da glória divina, elevada em corpo e alma, não como excepção, mas como promessa para toda a humanidade.

Maria, assunta aos céus, não é apenas uma figura passiva da graça, mas a realização plena do destino humano. A sua assunção é a antítese da queda original: se Eva, símbolo da humanidade decaída, trouxe a ruptura, Maria, a “nova Eva”, traz a reconciliação e a vitória da graça. O corpo que carregou o Verbo não poderia conhecer a corrupção, pois nele habitou a santidade em sua forma mais pura.  O paralelismo é nítido: do mesmo modo que Cristo, novo Adão, repara a desobediência de Adão, Maria, a nova Eva, reverte a desobediência da primeira mulher com o seu “sim” total a Deus. Aqui, a piedade popular intui algo que a teologia aprofunda: o corpo humano e em particular o corpo feminino, tantas vezes reduzido a objeto ou humilhado pela história é templo do Espírito e sinal de transfiguração. A Assunção proclama que a matéria, longe de ser desprezada, está chamada à glória.

Na liturgia, a festa da Assunção associa-se intimamente à Imaculada Conceição e à Maternidade Divina. Maria não é glorificada por acaso: toda a sua vida foi oferenda silenciosa, um “fiat” que se estende de Nazaré ao Calvário. Também na Assunção, ela se torna a Mãe que precede os filhos na glória, mostrando que a santidade não é abstrata, mas carne entregue ao mistério de Deus.

Ao rezar “intercede por nós, para que sejamos dignos da mesma glória”, a comunidade não contempla uma rainha distante, mas reconhece em Maria a irmã e mãe que percorreu o caminho da dor e agora resplandece como esperança. Seguir as suas pegadas significa viver a vida com empenho e esperança, sabendo que o destino do homem e da mulher não é a corrupção, mas a glória.

Numa cultura que ainda discute o lugar da mulher, a Assunção ergue-se como contra-símbolo: a feminilidade não é fragilidade, mas lugar teológico da revelação de Deus. Em Maria, o divino e o humano unem-se de modo definitivo, e a sua glorificação é resposta divina a toda humilhação sofrida pelas mulheres ao longo da história. O seu corpo glorioso proclama: “Aqui está a vossa dignidade. Aqui está o que fostes criadas para ser”.

Esta mensagem, quer a nível simbólico quer místico, deveria ser integrada e respeitada por toda a humanidade, porque na sua singeleza carrega uma força subversiva. Na Assunção, o povo de Deus reconhece o próprio destino. Ao glorificar Maria, glorifica a humanidade chamada à plenitude. Nossa Senhora não se encontra em trono distante: ela é espelho da Igreja, “esposa sem mancha”, sinal de que a carne humana, especialmente a dos marginalizados, está destinada a brilhar.

Nossa Senhora da Assunção, mulher forte e gloriosa, é ao mesmo tempo ensinamento e apelo: em cada rosto feminino resplandece algo da mulher simples e divina que, como nova Eva, nos abriu o caminho da vida verdadeira no novo Adão, Cristo.

António da Cunha Duarte Justo

Teólogo e Pedagogo

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António da Cunha Duarte Justo

Actividades jornalísticas em foque: análise social, ética, política e religiosa

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