No jardim primeiro, Adão caiu no pó,
Eva, de mãos feridas, abriu a ausência.
Mas no jardim derradeiro, enfim,
o novo Adão se ergue, e a nova Eva canta.
Cristo vence a morte, no madeiro da vida,
Maria acolhe o Verbo, restaura a luz.
Se o corpo da primeira foi a ruptura,
o da segunda é templo, eterna cruz.
Assunta aos céus, não sobe só,
leva na alma a carne humilhada,
o luto das mulheres sem história,
a esperança do pobre na sua jornada.
Não reina distante, de coroa intocável.
É mãe-irmã, com pés no chão ferido,
o seu corpo glorioso é profecia em acção:
“Eis o vosso destino, em mim cumprido.”
No ventre da nova Eva germina a promessa,
a fragilidade é força, o pó é ouro escondido.
Quem a louva, louva a própria gente,
nela o humano encontra o seu espelho.
Assunção bendita, subversiva e serena,
carne que aos céus em glória ascende.
Maria, mulher inteira, radiosa,
a porta da manhã, por nós, abre.
António da Cunha Duarte Justo
Pegadas do Tempo