CONFISSÃO

Quando escrevo quero ouvir a terra molhada,
na espera que a palavra amadureça na ferida,
que a dor aprenda a respirar
antes de se fazer tinta e vida.

No intervalo entre o que sinto e o grafar
vão-se ajustando memórias ao coração,
para o passado não pesar
mais que o amor na minha canção.

Minha mão quando escreve o que sente,
não busca enfeite, busca sentido
faz ponte entre a gente ausente
e o humano que está comigo.

O nevoeiro cai na serra,
Novembro triste vai passando,
mas já se acende, na terra,
a luz do Advento chegando.

Quando escrevo com verdade
sinto que algo maior passa no texto:
que é Deus ou o divino rosto
no simples riso do próximo.

Escrever é acreditar:
e o que sinto merece voz,
porque, ao ser dado, vai voar
para tornar-se luz no meio de nós.

António da Cunha Duarte Justo

Pegadas do Tempo

Kassel, 2016, no rescaldo da morte do meu pai.

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António da Cunha Duarte Justo

Actividades jornalísticas em foque: análise social, ética, política e religiosa

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