SOCIALISMO E CAPITALISMO RESULTANTES DE DIFERENTES ÉTICAS – A CATÓLICA E A PROTESTANTE

Atualidade da matriz católica e da matriz protestante

A ideia leva à acção como garantia de desenvolvimento (1).

No atual conflito internacional (ocidente-oriente), penso assistirmos, numa determinada perspectiva europeia, à continuação do debate entre a matriz social/antropológica de cunho católico e a matriz social/antropológica de cunho protestante. Estes são como que os dois polos de uma mesma realidade no processo de desenvolvimento social e individual. Se por um lado no catolicismo se destaca o movimento centrípeto (a comunidade) no protestantismo e na sociedade anglo-saxónica acentua-se o movimento individual centrífugo em relação à comunidade.

A sociedade e a natureza deixam-nos livres, mas também presos; nelas se constata que a autonomia só é possível no relacionamento. Daí a emancipação ter de ser vista num relacionamento processual de maturação recíproca e como processo de complementaridade inclusiva.  Antropológica e sociologicamente tem como sujeito comum o humano em tensão entre comunidade e indivíduo, tradição e inovação, entre terra e céu (Que seria da árvore sem a terra que a sustenta? A negação de uma significaria o fim das duas!). Assim uma sociedade saudável terá de integrar o fenómeno da individuação (autonomia) e da socialização (comunidade) como processo de desenvolvimento recíproco. A sociedade ocidental tem-se desenvolvido mais no sentido da individuação (afirmação do ego) mas tem desprezado o seu aspecto comunitário (afirmação do nós)  e deste modo em crise devido ao processo de autodestruição porque afirma o “movimento de rotação” sem contemplar o “movimento de translação” que incorpora aquele numa constelação ou sistema comunitário e sem isso conduz a uma desconstrucção tornada inerente ao sistema.

Uma emancipação Voluntária (2) acontecerá entre a emancipação familiar/social/individual e a emancipação legal/institucional e não numa conexão de subjugação de uma em relação à outra. Se observamos o sistema solar poderemos identificar os diversos planetas, mas todos eles recebem a consistência do Sol (a Terra sem o Sol seria impensável). A verdadeira emancipação (autonomia individual) não pode esquecer a sua natureza relacional, a necessidade de um habitat cultural (Deus, “Pátria” e Família) doutro modo transforma-se em meteorito, fora de órbitra, que se autodestrói devido à inércia e à resistência do espaço-tempo ou acaba num buraco negro que tudo sorve!

De momento vivemos numa sociedade precocemente envelhecida sem consciência do equilíbrio necessário das várias forças condutoras que lhe dariam vitalidade e sustentabilidade. A emancipação terá de ser entendida como processo individual e colectivo sem que um se oponha ao outro. O relacionamento recíproco entre o indivíduo e o grupo acontece num processo de autolibertação e desenvolvimento quer do indivíduo quer da comunidade numa cumplicidade solidária de dar e receber! O processo de autoafirmação em oposição à comunidade só poderá ser compreendido como fase adolescente numa conjuntura especial de individuação, mas não como atitude sã e equilibrada permanente (a tensão interpolar é o factor de desenvolvimento em intercâmbio).  Como exemplo dos extremos de individuação e de colectivismo temos o capitalismo e o socialismo, a sociedade ocidental e a sociedade islâmica. Enquanto a sociedade islâmica se apropria da singularidade individual subjugando-a à comunidade (aquisição de valor pela funcionalidade), a sociedade ocidental destrói as ligações à comunidade de maneira à pessoa se tornar num indivíduo sem características que o definam (e na consequência caminha-se para a anonimidade da pessoa como um abstrato funcional pragmático sem capacidade de autorresponsabilidade); na deficiência do caracter da comunidade ocidental afirmar-se-á o islamismo de maneira avassaladora na europa para ocupar este défice europeu e por outro lado o islão é aproveitado pelo globalismo mundial por atribuir à pessoa apenas um caracter funcional, o que o que facilita o estabelecimento de uma plutocracia mundial.

Um individualismo despersonalizado e demasiado acentuado afirma-se à custa  leva da comunidade favorecendo a criação de uma pequena elite mundial de déspotas iluminados que ditem normas e condutas de vida para as pessoas já descaracterizadas e regiões também elas sem caracter próprio e anonimizadas.

Passo a referir-me às diferenças éticas (católica e protestante) para melhor se entender os diferentes ideários entre os povos nórdicos e os povos do sul da Europa e a luta a decorrer entre o polo ocidental e o polo oriental. Muitas vezes combatemo-nos esquecendo que somos irmãos gémeos e de quem somos filhos. Diferentes teologias deram origem a diferentes éticas (salvaguardem-se muitas interpretações e expressões diferentes).

Em geral, a ética protestante baseia-se na crença no trabalho árduo, na economia e na necessidade de se submeter à vontade de Deus (aqui está certamente um dos factores que levou os países protestantes a tornarem-se mais ricos). Se a ética protestante acentua a consciência individual baseada na Bíblia (o indivíduo), a Igreja católica baseada nos ensinamentos da Igreja Católica acentua a autoridade transmitida através da igreja (a comunidade) e das tradições. A ética protestante enfatiza a justificação só pela fé (aspecto individual) e a ética católica além da fé acentua também a importância das boas obras e da cooperação com a graça (aspecto comunitário). Se para o protestantismo o importante é o relacionamento pessoal com Deus (distinção individual) a ética católica afirma especialmente a importância da graça e dos sacramentos (timbre comunitário) e não esquece a relação pessoal directa com Deus na mística e a nível moral a consciência individual como juiz soberano. Também no que respeita às virtudes há acentuações diferentes; se a ética protestante acentua a importância de virtudes como diligência, economia e responsabilidade pessoal, a ética católica enfatiza a importância de virtudes como misericórdia, caridade e solidariedade. De resto, a ética protestante tem uma forte incidência no trabalho e acentua a responsabilidade pessoal pelo sucesso na vida, a ética católica acentua o amor e a misericórdia para com os outros e a importância da comunidade e de defender os fracos (justiça social). Neste sentido a ética católica frisa a importância de virtudes como humildade, paciência, modéstia, bravura e justiça e convida os fiéis a viver e expressar essas virtudes nas suas ações diárias; exorta os fiéis a expressar a sua fé por meio das suas acções e a usar a razão no que toca a tomar decisões morais!

Também a cultura europeia não deveria tornar-se propriedade nem presa fácil de sistemas alheios a ela nem de mundivisões internas de esquerda ou de direita. Os dois polos para continuarem a ser integrais europeus ou globais terão de respeitar-se como partes integrantes do todo: o combate recíproco serve a autodestruição e a absorção por forças alheias mais fortes. O partidarismo aferrado e não tático apressa a derrocada da cultura europeia. Embora a opinião pública se deixe mover por posições extremas seria de pressupor nas elites dirigentes critério suficiente para não se deixarem cair na mesma dinâmica.

A divisão da ética cristã abrangente em dois polos opostos estilhaça a unidade e a perfeição cristã e com ela a alma cultural da Europa. Temos de nos encontrar para voltar a reencontrar a Europa e as suas fontes e nela o mundo. O cristianismo não ideologizado continua a ser a oferta integradora de indivíduos e sociedades numa relação fraterna de povos, religiões e culturas. Comunidade e individualidade são as rodas de um mesmo eixo que proporcionam o desenvolvimento humano e histórico.

A matriz católica e a matriz protestante expressam uma certa atualidade nos motivos da guerra a decorrer na Ucrânia onde se debate o sistema individualista anglo-saxónico com o sistema comunitarista oriental. O modelo anglo-saxónico (egocêntrico) encontra-se em decadência tal como o modelo da Idade Média se encontrava no surgir do Renascimento.

Devemos encontrar um meio-termo que abarque os dois polos para que os dois sistemas (um excessivamente individualista e outro excessivamente comunitário) se combinem de forma complementar num caminhar comum e numa só direção esperançosa (usamos o pé esquerdo e o pé direito, para avançarmos).

Neste sentido, a guerra na Ucrânia entre o Pólo Ocidental e o Pólo Leste é um grande desfasamento da história e apenas manifesta a estupidez, a arrogância e a falta de consciência das elites para com uma cultura que deveria começar por reconciliar-se a si mesma na Europa (de Lisboa aos Urais ) para assim se se possibilitar a reconciliação no mundo!

António CD Justo

Pegadas do Tempo

 

(1) (renascimento cultural dos séculos XIV, XV e XVI valoriza o humanismo, o racionalismo e a antiguidade greco-romana de maneira a preparar a passagem da Idade Média para a Idade Moderna de 1453 Conquista de Constantinopla a 1789 Revolução Francesa). Se na idade Média a terra (feudalismo) era o centro da riqueza e da produção (senhorios feudais) com a idade moderna inicia-se a economia do mercado (mercantilismo e capital) a ser o indivíduo o centro delas (poder centrado nos reis secundados pela nobreza e clero e no Estado). A época em que vivemos é também ela charneira e de consequências imprevisíveis tal como o tempo da mudança iniciado no século XVI (na passagem da Idade Média para a Idade Moderna).

(2) Emancipação como Princípio impulsionador da Idade Moderna   https://www.amazon.de/Ant%25C3%25B3nio-da-Cunha-Duarte-Justo/e/B076KYVPVH%3Fref=dbs_a_mng_rwt_scns_share

 

SERÁ QUE O SUL GLOBAL VIRÁ AJUDAR A REEDIFICAR A EUROPA?

Rivalidade entre sistemas que favorecem a individualidade e sistemas que favorecem a Comunidade

No momento crítico da História em que nos encontramos estamos a repetir, no âmbito geopolítico, a luta que se deu na Europa na passagem da Idade Antiga /Idade Média para a Idade Moderna/Idade Contemporânea. Duas mundivisões encontram-se hoje, como outrora, em luta rival: a mundivisão de caracter individualista e a mundivisão de caracter comunitário.

Em vez de se tentar uma relação equilibrada das forças da individualidade e das forças da comunidade as duas lutam bestialmente uma contra a outra (sociedades com estruturas sociais individualistas contraestruturas sociais medievais comunitárias, fazendo-se passar a ideia no povo de que a luta é entre liberdade e comunismo/autoritarismo quando se trata de dois polos de uma só realidade.

Os governantes europeus têm assumido no contencioso geopolítico uma posição irresponsável de ignorância cultural e da sua autonegação! Há um factor de erro e de crise comum nos dois tipos de sociedade em luta: a sociedade ocidental destruindo em si mesma a necessidade comunitária em favor do individualismo caótico e as sociedades orientais subjugando toda a exigência legítima de emancipação de um sistema comunitário abafador do indivíduo. No meio de tudo isto afirmam-se as arrogâncias e rivalidade dos poderes contra os povos e suas populações.

A partir do renascimento a Europa começou paulatinamente a abandonar o seu caracter comunitário latino (greco-romano) como reacção emancipatória adequada expressa no individualismo; essa tendência humanista aliada aos interesses dos senhores seculares  conduziram à discórdia (espírito nórdico contra o espírito latino); a Europa em vez de se desenvolver de forma inclusiva em relação à ética individualista protestante optou por seguir um só polo (individualismo) vendo-se absorvida e dominada pela cultura  e filosofia anglo-saxónica, atingindo o seu auge no iluminismo.

Hoje a cultura anglo-saxónica encontra-se em crise e na iminência de perder a sua hegemonia mundial para dar lugar a uma realidade global multipolar; apesar dos males e crises que as divisões criam talvez a actual crise se manifeste como a grande oportunidade para a Europa se reconsiderar e se reencontrar culturalmente de maneira integral deixando o caminho desintegrador iniciado pelos países protestantes no século XVI e levado ao extremo no iluminismo (modernismo) motivado hegemonicamente pela cultura anglo-saxónica que viu surgir o comunismo como tentativa de dar resposta à necessidade comunitária. O desenvolvimento e a cura deixaram de se dar na comunidade para iniciar a sua profanação e consequente fragmentação. O progressismo individualista oprimiu o desenvolvimento conservador de maneira a ser instalado um progressismo de bandeirantes como se observa hoje no agir de muitos grupos activistas!  

A Europa, vista na sua integralidade operou uma divisão cultural nela mesma ao optar pela cultura e filosofia anglo-saxónica. Hoje seria a oportunidade de se reconverterem as vertentes anglo-saxónica e latina de modo a poder-se criar na Europa o encontro do sul global com o nórdico. O Brexit foi um passo desastrado e quase de rutura com a Europa em favor da hegemonia anglo-americana e a União Europeia viu-se reduzida e à condição de ter de seguir, de cabeça baixa, os Estados Unidos. 

A cultura e a filosofia anglo-saxónica enfatizam a importância da liberdade e autonomia individual descurando o desenvolvimento comunitário (o estado social funciona mais como tapa buracos de um sistema por si polarizador). O direito à afirmação do indivíduo, à liberdade de expressão e o direito à autodefesa tornaram-se de tal maneira tensos que ameaçam tirar os últimos fundamentos à comunidade para os destruir em grupos individualistas sem consciência de comunidade e de bem-comum (constrói-se um humano sem características numa sociedade descaracterizada!). Assistimos na Europa à imposição do ideário protestante de caracter individualista ao ideário católico de caracter comunitário; na guerra da Ucrânia dá-se a luta entre a mundivisão emancipatória anglo-saxónica e a mundivisão comunitária oriental, faltando aqui a Europa com a função de papel moderador entre a afirmação do individualismo e do comunitarismo. Assiste-se hoje à crise inversa à que se deu no surgir da idade moderna com a sua expressão no protestantismo (emancipação da comunidade medieval). Se, na Europa, no renascimento e com o protestantismo a concepção de comunidade entrou em crise por sufocar o indivíduo, hoje a afirmação do indivíduo é tal que ameaça sufocar a comunidade de maneira a conduzi-la ao caos! A filosofia individualista encontra a sua melhor expressão na cultura anglo-americana. Na falta de uma complementaridade e inclusão dos factores individualismo e comunidade fomentam-se as guerras entre mundivisões de caracter mais individualista ou mais comunitárias. Desta falta de inteligência e compreensão humana assistimos a nível geopolítico como exemplarmente se combatem as duas mundivisões (individualista e comunitária) de maneira catastrófica quando a tarefa seria de se aproximarem uma da outra. No meio disto quem se aproveita da situação é o socialismo/comunismo (China) porque assume assim um caracter religioso dando a falsa ilusão de fazer uma síntese entre a necessidade humana de comunidade e de individualidade e a hegemonia americana ainda se oferece como vantajosa para países ou regiões da periferia económico-política.

A filosofia e a ciência anglo-saxônicas puseram em destaque o Empirismo e a metodologia científica e sobrepuseram na Europa o ideário e a ética protestante à católica (no próximo artigo reflectirei sobre as consequências da matriz católica e da matriz protestantes a nível geopolítico). O pragmatismo anglo-saxónico faz uma abordagem pragmática da realidade (político-económica) para encontrar soluções práticas. Esta posição unilateral favorece a decomposição cultural europeia.

António CD Justo

Pegadas do Tempo

 

QUEM SÃO OS RIVAIS SE A EUROPA É CONSIDERADA INEXISTENTE?

O Presidente Mácron solicita mais soberania para a Europa irritando assim a Alemanha

Mácron busca um debate que até agora foi oprimido na Europa. Na entrevista no voo de volta da China, Mácron referindo-se ao conflito com Taiwan disse: “O pior seria pensar que nós, europeus, deveríamos seguir a liderança nessa questão e nos adaptar ao ritmo americano e ao exagero chinês”.

O presidente francês Mácron no seu discurso de visita à Holanda, também pede mais soberania europeia. Mácron não se contenta com uma Europa presente mundialmente só pela sua importância económica; ele quer que a Europa assuma relevância a nível geopolítico para ter influência nos destinos dos povos; doutro modo estes continuarão a ser determinados pelos Estados Unidos e pela Rússia (e num futuro próximo também pela China).

Indiretamente Mácron adverte também para a experiência com o conflito na Ucrânia provocado pelos EUA e pela Rússia e onde os interesses da Europa foram sacrificados a longo prazo.

No próximo conflito, a Europa não deve cair na armadilha dos EUA, como aconteceu com a Ucrânia; doutro modo a Europa permanecerá sempre presa das crises geopolíticas externas.  Vai sendo tempo de as potências deixarem de afirmarem os seus negócios egoístas com a guerra em vez de negociarem a paz!

Se a Europa não acordar, os estados extremamente dependentes da administração americana tornar-se-ão vassalos dos EUA e da China. A Europa mereceria ter uma palavra a dizer em questões geopolíticas se fosse fiel a próprios interesses e às suas populações, mas para isso, não poderia renunciar a ser a terceira posição geopolítica e desse modo poder contribuir para a construção da paz mundial.  Para tal, os governantes europeus teriam de renunciar a serem mercenários das guerras dos Estados Unidos assumindo uma atitude diferente em relação à Rússia, aos Estados Unidos e à China e, ao mesmo tempo, abandonar a velha atitude imperialista, imanente à política do regime americano.

Que o governo alemão se irrite com a mensagem de Mácron é natural porque a Alemanha não tem a possibilidade de privilegiar uma política europeia em relação aos Estados Unidos devido às condições pós-guerra que lhe foram impostas e ao facto da presença militar dos EUA na Alemanha ser avassaladora! Na Europa precisa-se uma influência mais latina e menos anglo-saxónica.

O governo alemão critica Mácron, acusando-o de se isolar da Europa, mas ignora que Mácron personifica melhor a voz, a situação e os interesses da Europa do que a Alemanha; esta encontra-se altamente comprometida pela presença militar americana. Devido aos fardos da guerra e às condições impostas pelos aliados vencedores, a Alemanha só pode ocupar na política mundial uma posição intermediária vendo-se limitada ao poder económico e controlada no que respeita às relações económicas com a Rússia (recorde-se a espionagem de Ângela Merkel, o boicote económico do gasoduto Stream 2, pelos “amigos” americanos e a sabotagem explosiva de Stream 1 e 2! Também por isso o debate político na Alemanha obedece a certas coordenadas em relação aos EUA e também a Israel.

Na questão de Taiwan, trata-se primeiramente da luta de interesses entre os EUA e a China, tal como na Ucrânia, dos interesses da Rússia e dos Estados Unidos, onde a ingenuidade e o oportunismo europeu se envolvem na qualidade de ajudantes, mas que durante e depois da guerra são responsabilizados por ela.  Já não basta repetir o mantra de que somos parceiros, é hora de usar-se o bom senso e velar pelos interesses europeus.

Quem são os rivais se a Europa é considerada inexistente? Não basta argumentar que os chineses são rivais sistêmicos por causa do socialismo. Os países internacionais que não fazem negócios com a guerra devem estar preparados para o diálogo, pois tanto o capitalismo liberal como o socialismo precisam de um tratamento fundamental para se tornarem mais compatíveis com a dignidade humana e com os interesses humanos e estatais. É uma impertinência e uma exigência excessiva continuar a alimentar conflitos baseados em cosmovisões diferentes em vez de aferir e colocar as cosmovisões de forma convergente ao serviço de uma mudança radical a favor da paz e das pessoas. A discussão tinha que ser abrangente e não apenas ao serviço do ponto de vista de interesses egoístas. A Europa, goste ou não, a longo prazo, será mais dependente da Rússia e da China do que dos EUA apesar do poder estratégico mais alto destes. O interesse e o poder mais elevado deve ser o da paz (1).

Na opinião pública europeia joga-se com cartas pró-americanas e antieuropeias ao impedir-se uma discussão pública diferenciada e crítica que permita formular interesses culturais europeus.

Macron visitou com Von der Leyen a China, mas Mácron recebeu altas honras enquanto Von der Leyen, teve uma recepção de segunda classe; e isto certamente porque ela não queria a China como mediadora, mas apenas como afiliada da OTAN.

É triste observar-se que os media fora da europa apresentem uma discussão mais crítica e objectiva em relação ao cenário geopolítico. Mácron incomodou muita gente da real política por ter levado a acompanhá-lo uma grande delegação empresarial! Naturalmente em política nunca há um lado limpo.

A política mundial oscila entre o leste e o oeste e os jornalistas, em vez de oscilarem entre a previsão e a comparação, adoram seguir o erro amenizado através de um misto de decepção e esperança.

 

António CD Justo

Pegadas do Tempo:  https://antonio-justo.eu/?p=8441

(1) MINISTÉRIO DA PAZ COM IGUAL ORÇAMENTO AO DO MINISTÉRIO DA DEFESA: https://antonio-justo.eu/?p=8429

 

 

ENCONTROS DE JESUS COM PILATOS E COM AS MULHERES

Significado ainda não reconhecido da Presença das Mulheres junto à Cruz

Neste processo pode-se verificar não só a tragédia do encontro do divino com o humano, tragédia esta que se expressa na relação entre a instituição e o humano, mas também a relação desequilibrada entre o princípio da feminilidade e o princípio da masculinidade no nosso modelo social! Pilatos e as instituições alheiam-se da caminhada humana de Jesus, das mulheres e do povo para em grande parte fazerem uma caminhada paralela, fora da comunidade.  

Segundo relata o evangelista João, Jesus foi envolvido no jogo do pingue pongue do poder religioso e do poder político (1). Pilatos, representante do poder político, queria que o sinédrio o julgasse porque a causa de Jesus era um assunto religioso/espiritual e este não tinha nada a ver com o poder de Roma nem com razões de Estado. Porque Pilatos não encontrou culpa nenhuma em Jesus mandou colocar no madeiro a tabuleta “JC rei dos Judeus”.  Pilatos no julgamento revelou-se primeiramente como pessoa séria ao deixar-se, na sua função de representante do estado, envolver pessoal e directamente com e por Jesus (2), mas logo assumiu o seu papel de governador desviando o apelo pessoal que Jesus lhe tinha dirigido para a pergunta abstrata “O que é a verdade?

Na tentativa de criar espaço para a sua consternação Pilatos pensou em fazer uso do seu direito de nos dias festivos recorrer a um acto de misericórdia libertando-o. O povo preferiu um outro, Barrabás que era um chefe de uma quadrilha de ladrões. Pilatos, não convencido mandou acoitar Jesus para o mostrar ao povo na esperança de que este ao vê-lo tivesse compaixão dele. Os soldados fizeram dele um rei ridículo e acoitaram-no. Jesus não se defendeu. Pilatos apresenta-o ao povo dizendo Ecce homo (Eis o Homem). Mas os sumos sacerdotes e seus servos gritaram, “crucifica, crucifica-o”. Pilatos queria ver-se livre de Jesus e disse então, levai-o e crucificai-o; eu não encontro nele culpa alguma. Então, as autoridades do templo que sabem como as leis se fazem e como os funcionários da lei representam interesses e não a verdade nem o povo advertiram-no que se o não o condenasse, Pilatos (governador do imperador romano na Província da Síria) não seria fiel ao Imperador a quem deveria obedecer porque Jesus se tinha proclamado filho de Deus. Poem-lhe o problema da lealdade.

Jesus compreende a situação desesperada em que se encontrava Pilatos e que em termos do mundo não teria outra alternativa senão ceder aos que o atraiçoavam também entre os seus: um dos seus discípulos.

Apesar de estar ciente da monstruosidade que se estava a cometer Pôncio Pilatos pergunta novamente: “Devo crucificar o vosso rei?” e paradoxalmente os sumos sacerdotes, afirmam aquela monstruosidade dizendo: „Não temos rei, para além do imperador!”

Deste modo o Sinédrio através do seu testemunho está disposto a renunciar ao seu específico de “povo de Deus” (porque abdica da sua autoridade religiosa que tinha de decidir – excepto a pena de morte – em questões do foro religioso e ao renunciar a ele submete-o ao foro político imperial) para se submeter totalmente ao imperador e deste modo Jesus passa a ser condenado à morte porque abandonado por todos (povo, discípulos e instituições).  No julgamento de Jesus, os seus seguidores que sabiam que o seu reino não era deste mundo, não abriram a boca ou tinham até já fugido. (Todo o reino deste mundo é obra do homem enquanto o Seu reino é um reino interior e espiritual. O reino de Jesus dirige-se à pessoa integral independentemente das suas funções.) O problema não está nos inimigos, mas nos que o abandonam.  Pilatos cumpriu o dever como funcionário do Estado, mas honra-o o facto de tentar ouvir pessoalmente Jesus que era apresentado como reu, como se vê no evangelho de S. João.

Jesus com a sua atitude chama a atenção para a nossa consciência e nosso comportamento. Jesus continua a sofrer com o povo das nossas fraquezas no jogo entre os interesses exteriores e os valores da consciência que trazemos no nosso interior. Pilatos que não queria saber da fé do povo teve a hombridade de se tentar aproximar de Jesus como pessoa e não apenas como funcionário; naturalmente Pilatos estava a usar Jesus como instrumento para os seus próprios fins não se deixando interpelar pessoalmente por Jesus e por isso finalmente condenou-O à morte. Pilatos que menosprezava os judeus como um povo de servos, ao seguir os interesses do Sinédrio e não a própria consciência tornou-se conivente dos interesses da instituição Sinédrio. Jesus tinha apelado para a soberania da consciência individual de Pilatos e não para o seu papel de funcionário porque o poder que ele possui não é inerente a si mesmo, mas vem da soberania estatal de que era servo na qualidade de governador! Esta questão apresenta uma dicotomia que nos acompanhará até ao fim da História!

Esta é uma imagem do que acontece com muitos funcionários e pessoas em funções políticas e institucionais (3): não se deixam abordar de maneira humana nos problemas das pessoas e atraiçoam-nas subjugando-as a regulamentos não aferidos à situação da pessoa e por isso concretamente injustos; como Pilatos deixam de ser pessoas para assumirem o papel de oficiais de serviço.

A Presença das Mulheres junto à Cruz

As mulheres (Maria mãe de Jesus, Maria mulher de Clopas e Maria Madalena) que acompanharam Jesus até à cruz foram as primeiras a testemunhar a sua ressurreição e a assumirem um papel decisivo na história da salvação e na proclamação do Evangelho. Como primeiras discípulas de Jesus apoiaram a sua missão durante toda a sua vida pública. Enquanto os discípulos homens fugiram ao verem a violência e a humilhação, as mulheres mostraram coragem e fidelidade. A matriz sociológica masculina em que continuamos a viver não aprecia suficientemente o papel das mulheres na sociedade nem dignifica razoavelmente a importância do papel das mulheres na história da salvação, se atendermos à questão da valorização meramente funcional e à discriminação e subjugação dos valores da feminidade no nosso modelo social. A feminilidade reflectida no amor e na preocupação das mulheres pelos outros torna-se especialmente presente na sua compaixão que chora e lamenta a morte de Jesus simbolizando assim a presença da dor e da tristeza da humanidade na sua via sacra. Sem medo da violência e da humilhação, as mulheres evidenciam a devoção, a fidelidade, a coragem, a solidariedade, a compaixão e o testemunho! Atendendo ao facto que nos encontramos num modelo de sociedade que acentua cada vez mais as qualidades másculas (e não uma osmose qualitativa dos princípios da feminilidade e da masculinidade) não resta às mulheres senão a estratégia de assumirem qualidades de caracter mais masculino para se poderem afirmar em tal modelo!). Neste processo acontece com a feminilidade (mulheres) o que aconteceu com Jesus que foi condenado pelo facto de Pilatos e as instituições não assumirem responsabilidade pessoal para a alhearem em papéis exteriores mais próprios de interesses institucionais do que humanos (a feminilidade, a religião dá lugar à masculinidade, à política).

Maria Madalena foi a primeira a ir ao sepulcro de Jesus e chorava ao ver a pedra tirada do sepulcro. “Jesus disse-lhe: Mulher, por que choras? Quem buscas? Ela, cuidando que era o hortelão, disse-lhe: Senhor, se tu o levaste, dize-me onde o puseste, e eu o levarei. Disse-lhe Jesus: Maria! Ela, voltando-se, disse-lhe: Raboni, que quer dizer: Mestre. Disse-lhe Jesus: Não me detenhas, porque ainda não subi para meu Pai, mas vai para meus irmãos, e dize-lhes que eu subo para meu Pai e vosso Pai, meu Deus e vosso Deus.” Maria Madalena foi e anunciou aos discípulos que vira o Senhor e transmitiu-lhes a sua mensagem. Madalena tornou-se assim a apóstola de Jesus em relação aos apóstolos!

Francisco (12.05.2016) tinha aberto a discussão à possibilidade de admissão de mulheres ao diaconato (https://antonio-justo.eu/?p=3574 ). Das mulheres na sociedade e na igreja e dos usos e costumes que as oprimem: https://www.gentedeopiniao.com.br/opiniao/artigo/das-mulheres-na-sociedade-e-na-igreja-e-dos-usos-e-costumes-que-as-oprimem

Em nota (4) ver outros encontros a acrescentar à tradição popular da Via Sacra.

Permanece a chamada de atenção de Jesus: “Todos os que amam a verdade escutam a minha voz.” Esta voz não precisa necessariamente de ser entendida em termos de confissão religiosa. Jesus Cristo pode também ser entendido como protótipo privilegiado de todo o humano e de toda a humanidade!

António CD Justo

Teólogo e Pedagogo

Pegadas do Tempo

 

(1) Jesus passou por dois julgamentos: um religioso (o Sinédrio) pelo facto de se ter declarado o messias  e outro político (Pilatos que possuía o poder de deliberar sobre a vida e a morte) e Jesus tinha sido acusado de se negar a recolher os tributos e de incitar o povo à rebelião; por isso o responsável pela sentença foi Pôncio Pilatos. Jesus era acusado de se ter declarado ser o messias! Jesus Cristo foi então levado ao Sinédrio, chefiado por Caifás, que era uma assembleia de 75 pessoas, que, além de funções administrativas, tinha o poder de julgar, mas não de condenar à morte.

 

(2) Por outras palavras: Pilatos tem de fazer uma escolha entre a sua individualidade de pessoa e o seu papel de governador. Para não se comprometer tenta passar a decisão sobre Jesus ao sinédrio (representantes da religião). Ao ver que o sinédrio o chamou ao seu dever de lealdade com o imperador, a pessoa Pilatos acobardou-se, não assumindo responsabilidade pessoal nem de governador, ao atirar a bola da decisão para a anonimidade do povo que deverá decidir entre a liberdade de Jesus ou a de Barrabás.  Deste modo, salva o seu rosto como pessoa e como governador e por outro lado não se incompatibiliza com os senhores do Templo. Também o Sinédrio que tinha instigado o povo contra Jesus se sente de rosto limpo porque também se sai bem ao deixar a monstruosidade na responsabilidade do povo. Este é um modo de agir que se encontra também no nosso modelo democrático: governantes cometem os erros e desculpam-se com o povo.

(3) O julgamento de Jesus é um exemplo do que aconteceu e do que acontece hoje: a inocência do indefeso é sacrificada aos interesses dos poderes que para não assumirem responsabilidade entram num jogo de pingue-pongue do lançamento da bola da responsabilidade entre eles na certeza que com o jogo quem sai castigado é a pessoa inocente mas não condenada por eles mas pela anonimidade que eles mesmos manipulam. Ao não assumirem responsabilidade e ao entrarem numa tática de protelar a decisão todos colaboram para uma falsa sentença. Torna-se uma decisão falsa e catastrófica por ninguém querer assumir o próprio âmbito de responsabilidade pessoal; a maioria esconde-se no âmbito funcional a nível de interesses mascarados em funções e os súbditos desculpam-se a pretexto da obediência.

Jesus não se identificada com as instituições religiosas nem com as políticas (porque correspondiam apenas a funções sociológicas e não serviam como deveriam o humano). Não se confrontou com a instituição que sabe ser apenas um constructo em benefício do humano, mas que não pode ser identificado com ele porque assume o caracter de sociedade e não de comunidade. Há uma ciência humano-intelectual e uma ciência divina

(4) A acrescentar à Via Sacra (https://antonio-justo.eu/?p=8394 ):

Encontramo-nos aqui com Jesus, que desafia Pedro, Tiago e João a deixar o povoado, a abandonar o barulho da polis para subirmos com ele ao monte Tabor e depois estarmos preparados para abranger os passos da paixão a caminho da ressurreição. No encontro dá-se a revelação que nos pode tornar seus testemunhos. Assim, neste cenário os encontros de Jesus dirigem-se ao íntimo mais profundo de cada um! Jesus penetra sempre com a sua palavra nas nossas reservas mais secretas.

JUDAS: Na história da Paixão de Cristo, Judas Iscariotes, discípulo de Jesus, ao notar que a mensagem de Jesus não tinha aplicação política imediata, atraiçoou-o, entregando-o aos líderes religiosos em troca de trinta moedas de prata. O papel simbólico de Judas estatui um exemplo da natureza humana falha e da importância do perdão divino. Em Judas dá-se a luta entre o bem e o mal de modo a o próprio mal contribuir para que Jesus cumpra a sua missão de salvar a humanidade do pecado e da morte.

Judas Iscariotes, confundiu a verdade de Jesus com a solução política esperada na ordem terrena e ao tornar-se fanático ignora a mensagem da vida real que pressupõe aguentar a tensão do “Dai a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus!”

Herodes: Por causa da jurisdição pouco clara, Pilatos, governador romano da Judeia, envia Jesus à autoridade judaica da Galileia e a Pereia (Luc 23:7) na pessoa do tetrarca Herodes Antipas (“rei” familiar de Herodes o Grande que tinha ordenado o massacre infantil em Belém: Mat 2,1 e 16), na altura presente em Jerusalém, para que examinasse o caso. (O déspota Herodes Antipas já antes tinha mandado decapitar João Baptista: Mateus 14; Marcos 6; ele reinou de 4 a.C. até 39).

Herodes, que havia ouvido falar de Jesus e estava curioso em conhecê-lo pediu a Jesus que fizesse algum milagre para sua diversão.  O encontro de Jesus com Herodes (Luc 23:8-12) não correu como Herodes esperava porque Jesus permaneceu em silêncio e nem uma palavra perdeu perante ele; então Herodes, embora não reconhecendo nele nenhum crime, vingou-se ridicularizando Jesus, mandando-O vestir com um manto real. Embora em silêncio, Jesus não esconde a sua face daqueles que o invocam e não oferece resistência perante os que o provocam, ele deixa tudo acontecer numa atitude de amor que aceita e deste modo transforma e liberta. Herodes mandou devolver Jesus a Pilatos.

No encontro de Jesus com Herodes, Jesus não se curvou perante o poder terreno. Nessa atitude é simbolizado o contraste entre o poder humano e o poder de Deus. Jesus testemunha a importância da humildade e da submissão à vontade divina ao não demonstrar os seus poderes perante Herodes. No encontro dos dois torna-se patente a divisão entre o mal (reino das trevas) e o bem (reino da luz)!  Herodes era conhecido por suas práticas cruéis e corruptas e Jesus pela sua bondade e justiça.  A tradição dos Herodes dá expressão ao mal na História enquanto Jesus expressa e simboliza a continuidade do plano salvador divino através da história de Israel/humanidade. O encontro com Herodes foi um episódio significativo na história de Jesus, mas a sua importância é mais simbólica do que prática.

O acto do “lava mãos” de Pilatos simboliza a prática de representantes políticos que não assumem responsabilidade pela exclusão social nem pela opressão.

Pelo que se observa dos poderes estabelecidos é que na generalidade pretendem “manter o poder” e não “manter a paz”. Atualmente, o madeiro onde se crucifica a humanidade e com ela Jesus encontra-se no cruzamento de um capitalismo sem alma e de um socialismo materialista, adoptados por um poder divorciado da espiritualidade. Grande parte do sofrimento do povo resulta da luta dos poderosos pelo poder. Não vedes a turba olhante de olhos regalados, mas que não nota o que se passa?

No dia-a-dia a maioria das pessoas não entende Jesus porque Jesus, que é a vida, é encontro e, longe da ressonância divina, a existência torna-se ilusão porque apenas dependente do mundo exterior; a porta de entrada para Jesus é o coração (a fé que é graça divina).

Marta e Maria também choraram a morte de Lázaro

Jesus abriu-lhes os olhos do coração para o horizonte da vida: “Eu sou a ressurreição e a vida. Quem acredita em Mim …viverá…nunca morrerá”.

A fé move as pedras que se encontram sobre os túmulos da nossa vida. Na experiência do encontro na fé, o espírito de Jesus ressuscitado passa a habitar em nós, tal como tinha experimentado Paulo. “Veremos a Deus face a face”. No encontro com Jesus nada mais nos sustem nem domina; o barulho das nossas ideias e pensamentos passa a dar espaço à experiência libertadora do inefável e consequentemente um grande distanciamento de tudo aquilo que nos poderia escravizar no dia-a-dia incluindo até certas restrições morais.

Para idealistas, a morte representa uma transição para a vida após a morte, seja pela transmigração das almas (como em Pitágoras e Platão) seja pela ressurreição do corpo e da alma (no caso de pensadores judeus, cristãos e muçulmanos). Para pessimistas tudo vem da matéria, tudo se resolve e acaba na cova da morte.

Nicodemos é aquele tipo de professor seguidor da lei sem abertura para o espírito nem para os alunos, só tem em vista o cumprimento das diretrizes da estrutura ministerial e os Planos de estrutura (planejamento das aulas mais detalhado).

O nome Barrabás em hebraico significa ‘filho do pai, filho do professor’ e Pôncio Pilatos liberta-o no lugar de Jesus a pedido do sumo sacerdote; Barrabás era um notório prisioneiro que, além do mais, cometera assassinato durante um motim (Marcos 15:7-15). Barrabás encontra depois a fé ao lado de Jesus e mais tarde é crucificado em Roma durante a perseguição dos cristãos pelo imperador Nero.

 

Ao lado do caminho da cruz, sem saber uns dos outros alguns seguem-nO na senda da escuridão. Jesus caminhava carregando com todos eles notando até os solitários que passeavam o cachorro na sombra de uma liberdade não encontrada e também as mulheres à janela de olhar fixo no longe à procura de maior horizonte.

No ar sentia-se um ciciar que fazia lembrar o sotaque da humanidade com ele a caminho e dele surgia uma aragem húmida da noite que falava da saudade de Deus. A voz de Deus é o silêncio e a linguagem dele silenciosa.

Depois da morte de Jesus na sexta-feira espalha-se um silêncio paralisante, Deus ausenta-se e a humanidade e a natureza internalizam o sofrimento do seu primogénito.   

A Sexta-feira Santa e a Páscoa deixam a mensagem que Jesus superou a nossa distância de Deus indo voluntariamente para onde estamos: a morte longe do criador da vida. Jesus venceu a morte e vive em uma nova realidade.

Não olhes só para mim olha para dentro de ti e lá me poderás encontrar a Mim e a ti e então agir comprometida e responsavelmente.

O Papel dos Media na Cultura do Erro

A Mundivisão relativista possibilita um Progresso Tipo Roda de Hamster

Erros acontecem porque é próprio do humano errar seja na esfera privada, pública ou política. O problemático da questão situa-se, porém, no facto de os erros públicos (políticos) serem negociáveis mais que resolvidos e assim a vida passar a assumir um caracter meramente funcional porque reduzida à resolução de problemas!  Isto favorece uma situação social estratificada dos que estão em baixo a olhar para os de cima, diminuindo assim os pré-requisitos para uma melhor forma de lidar com os erros. Se partíssemos do princípio que somos todos falíveis a política seria menos arrogante, falsa e inflexível! Para isso não poderíamos prescindir da atraccão dos valores do bom, do belo e do verdadeiro, que foi o modelo cultural da nossa civilização ocidental e que representavam valores absolutos que a sociedade procurava. Atualmente o mundo ocidental encontra-se numa época de crise ao procurar afirmar no próprio modelo o relativismo moral e cultural em função do útil! Neste entremeio de mundivisões contraditórias torna-se difícil também para as elites governantes e acólitos tentar fazer valer para o povo o relativismo absoluto e reservar para elas uma espécie de verdade absoluta (direito a orientar com validade para as cúpulas e a correspondente exigência aos subordinados (circunscrita ao povo) de aceitarem viver no erro embora legitimado pelo relativismo (1).

Esta incoerência relativista desenvolve o poder explosivo político e promove a legítima desconfiança popular! O equívoco encontra-se no novo modelo conceitual, mas do qual as camadas dominantes vivem parasitariamente porque o relativismo apresentado e espalhado como mundivisão para o povo desqualifica o próprio povo que reduzido a utente ou consumidor de serviços perde qualquer legitimação para se opor às classes governantes a não ser através de uma revolução constante vinda das bases mas que na consequência para evitar tal  leva as elites a unirem-se entre elas, processo já atualmente em via, de maneira a tornarem-se cada vez mais despóticas como é o caso do modelo chinês ou cada vez mais oligárquicas, como já vai sendo o modelo anglo-saxónico (a ser apressado na Europa a pretexto da guerra na Ucrânia).

Atendendo à atual situação do Ocidente, até que se gere uma nova matriz político-económico-social, haverá que partir do erro como estado original normal e tentar protelar a cura especializando-nos não na cura do erro, mas na forma como o tratar! O relativismo não permite uma outra abordagem e a situação desesperada em que nos encontramos pode ser verificada na forma aflitiva como a mundivisão do poder relativista se afirma contra a Igreja Católica que continua a defender o modelo anterior na procura da verdade considerando o bem, o belo e a verdade na qualidade de bens absolutos já realizados no protótipo Jesus Cristo. Também a desconstrução do monoteísmo faz parte do âmago do relativismo que procura impor o politeísmo olímpico com os deuses das sensualidades humanas legitimadoras das lutas do direito dos mais fortes numa espécie de Olimpo das elites que se servem e riem dos humanos que vivem debaixo das nuvens na esperança de uma aberta que permita algum raio do sol cínico de algum deus!

Nesta situação deficitária, para se entrar num processo social de melhoria contínua será de pressupor a capacidade de lidar com o erro de maneira construtiva e positiva. Ao lidarmos com o erro de maneira positiva prestamos um serviço importante ao mecanismo social. Pressuposto será que tanto as esferas superiores como as inferiores reconheçam a realidade do erro.  Ao reconhecer-se que erramos estamos honestamente a assumir responsabilidade analisando as causas do erro e a dar os próximos passos para corrigi-lo (Não é fácil sair da roda de hamster!).

Muitos de nós e relevantemente os media não querem aprender com o erro porque não há interesse em analisá-lo ou em propor formas diferentes de o tratar;  chegam mesmo a usá-lo como algo fatal e também ele fazendo parte do negócio que dá oportunidade ao bom viver das elites e seus acomodados (Também nos Media do sistema é válido o princípio muçulmano: a mentira é boa desde que sirva o sistema; o sistema é sempre generoso para com os seus delegados e para com a administração)! Mais que interessados na mudança e no desenvolvimento do sistema vai-se vivendo, comodamente, dele, com os erros que possibilitam progresso aparente (o progresso da Roda de Hamster) que não o desenvolvimento! Neste sistema e para o qual, a nível geopolítico de momento, não há alternativa mais se necessitaria de um jornalismo crítico e responsável que analise e avalie os serviços prestados num processo de contínua aprendizagem se bem que limitada.   Também a indiferença e a apatia que se observa a nível popular é de basear na ordem relativista utilitária fomentadora de impotência e não numa estupidez natural advogada pelos beneficiados do sistema.

Lidar com o erro pode ser desafiador, mas ao adoptar uma abordagem construtiva, podemos usar o erro como uma oportunidade para aprender e melhorar nossos serviços, tornando-os mais eficazes e benéficos a uma sociedade do bom, do belo e do verdadeiro e, numa fase intermédia, talvez se consiga construir em termos mais humanos e criativos um novo modelo cultural para a nossa civilização ocidental e assim conseguir-se sair do actual modelo relativista resumido na roda de Hamster! A mundivisão relativista possibilita um progresso tipo Roda de Hamster, um andar, de forma convencionada, no tapete do erro.

O facto de o humano se encontrar em diferentes biótopos geográficos, culturais e naturais não quer isto dizer que a sua diversidade exterior seja suficiente para se negar que as diferenças externas têm a sua consistência num só Sol.

A alternativa à afirmação egoísta da nova ordem relativista que favorece o oportunismo dos mais fortes seria a elaboração lenta, mas determinada de uma nova matriz social na base da inclusão dos polos.  A matriz do futuro, o modelo de uma nova ordem social, terá que ter como fundamento antropológico e cultural uma relação equilibrada entre os dois princípios vitais que penetram toda a natureza e toda a humanidade: a masculinidade e a feminilidade. Os dois princípios universais a actuar na natureza, no homem, na mulher e na sociedade terão de entrar numa relação de osmose complementar e abdicar da luta mútua pela superioridade de modo a substituí-la por uma relação de troca,  passando a ser uma troca entre iguais, muito embora com a possibilidade de sublimar energias negativas numa espécie de jogo, sem que este tenha de ser olímpico, como quereriam os seus deuses!

Entretanto, quem não dança fica sentado no banco a chupar o dedo!

António CD Justo

© Pegadas do Tempo

(1) A tese central do relativismo afirma que as crenças e descrenças não são verdadeiras ou falsas num sentido absoluto, mas apenas em relação a certas instâncias, como visões de mundo, culturas, religiões, formas de conhecimento, etc. O relativismo ético assume que diferentes culturas também têm diferentes valores morais (deveres). A posição oposta do universalismo representa a convicção de que os mesmos valores morais devem aplicar-se a todas as culturas. Segundo o relativismo ético, não há juízos morais objetivamente verdadeiros ou objetivamente justificáveis. Em vez disso, a verdade ou a justificação dos juízos morais é sempre relativa a padrões, que são bastante diferentes e podem variar de cultura para cultura. É uma escola filosófica de pensamento que vê a verdade das declarações, exigências e princípios como sempre dependentes de outra coisa e nega verdades absolutas

Ao contrário, para Platão o verdadeiro, o belo e o bom, representam valores absolutos!