TRATADO DAS ONDAS

(Da Lei da Vida e Seus Complementos)

 

Se cada um soubesse, se cada um notasse,

Que a vida é um mar de forças entrelaçadas,

Ondas que se erguem, ondas que se abraçam,

Leis que se completam, nunca separadas.

No atrito, a essência da união é gerada,

Na resistência, a pele do ser é lavrada.

 

Se cada um soubesse, se cada um notasse,

Quantas tempestades, no lar, seriam sossego,

Se o olhar, em vez de acusar, fosse espelho cego

Para enxergar no outro a própria face manchada.

O problema que em mim começa, em mim se desfaça,

E não no outro, espelho da minha desgraça.

 

Se cada um soubesse, se cada um notasse,

Que os donos do poder, cegos em sua doutrina,

Trocam o diálogo por uma guerra fina,

Ondas humanas que sua dança despedaça.

Ignoram que a força que usam para domar

É a mesma que um dia os virá a devorar.

 

Se cada um soubesse, se cada um notasse,

Que a onda que vem não é inimiga da ida,

Mas irmã que sustenta a maré da vida,

E na aparente guerra, o equilíbrio se enlaça.

Cada rugir de espuma, cada aresta lapidada,

É o preço da existência, a marca da jornada.

 

Se cada um soubesse, se cada um notasse,

Que a força que nos define, que nos individualiza,

É a mesma que nos une, que nos harmoniza,

E o conflito é só a superfície que se escava.

No embate de vontades, na correnteza alterosa,

Nasce a consciência clara, serena e luminosa.

 

Se cada um soubesse, se cada um notasse,

Que as leis do mar e as leis da alma são iguais:

Não há onda sem mar, nem ser sem os seus laços,

E o que parece oposição são elos universais.

No alto mar da vida, no barco da razão,

São as ondas contrárias que dão à vela direção.

 

Se cada um soubesse, se cada um notasse,

Que a vida se move em ritmos de complemento,

No ondular do tempo, no sopro do momento,

Toda a guerra é passageira, todo o atrito é um vento.

E quem se vê como parte do todo entrelaçado,

Encontra na resistência o sentido do abraço.

 

Se cada um soubesse, se cada um notasse,

A grande lei do mar, que a tudo rege e passa:

Ser é ser com o outro, na mesma dança e casa,

E a onda que hoje luta é a que amanhã abraça.

Pois a vida não é combate, é composição,

E a mais sábia vitória é a da compreensão.

 

António da Cunha Duarte Justo

Pegadas do Tempo

Social:
Pin Share

Social:

Publicado por

António da Cunha Duarte Justo

Actividades jornalísticas em foque: análise social, ética, política e religiosa

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *