NA PASSAGEM DA DEMOCRACIA PARTIDÁRIA PARA A OLIGARQUIA LIBERAL (DEMOCRACIA AUTORITÁRIA)

Poder económico e Poder político em Promiscuidade clara

Estamos no início de uma nova era moldada pelas tecnologias virtuais e pela Inteligência Artificial. Por um lado, essas ferramentas democratizam a informação; por outro, concentram o saber e o poder em poucas mãos. A aliança entre Donald Trump e Elon Musk simboliza essa transição, sinalizando uma mudança radical no sistema político e social. Economia e novas tecnologias – representadas por nomes como Musk, Zuckerberg, Bezos, Altman e Thiel – ousam caminhar agora de forma ostensiva junto ao poder político. Antes faziam-no de maneira escondida porque ainda tinham respeito pelo poder político que, em democracia, ao perder o seu respeito pelo povo colhe agora o desrespeito dos dois.

Talvez isso seja uma reação exacerbada do eixo americano frente à China e aos BRICS, num último esforço dos EUA por manterem o controle da exploração e do destino dos povos. Trata-se de um perigoso jogo com o fogo, especialmente quando se esperava que Trump trouxesse uma abordagem mais conciliadora num mundo em crescente tensão.

As declarações controversas de Trump disparam em todas as direções, deixando uma Europa cativa em estado de alerta. Suas ideias de intervir no Canadá, na Groenlândia e no Canal do Panamá revelam intenções imperialistas claras. Além disso, ele propõe que os países da OTAN invistam 5% de seus PIBs em despesas militares – enquanto os EUA gastam atualmente 3,38%. Para a Alemanha, por exemplo, isso significaria um gasto anual de 200 bilhões de euros em armamentos à custa do budget social e da qualidade de vida do cidadão. A satisfação dessa exigência obrigaria a Europa a concentrar seus esforços políticos e económicos no setor militar, liberando os EUA para se dedicarem ao controle dos oceanos Índico, Pacífico e Atlântico. Nem mesmo os Açores estariam seguros nesse cenário.

A Dinamarca, por exemplo, preocupada com a presença russa, agora enfrenta a sombra do imperialismo americano. Imagine-se um membro da OTAN, como a Noruega, pedindo proteção contra os próprios EUA, que têm utilizado a organização como ferramenta de avanço territorial e político. O imperialismo americano concentra-se agora no domínio dos oceanos não apenas por suas riquezas, mas por sua importância geoestratégica no controle mundial. “Ser inimigo dos EUA é perigoso, mas ser amigo é fatal”, dizia já Kissinger!

Da colonização ideológica à colonização oligárquica

Tudo indica que estamos presenciando uma transição de uma colonização ideológica para uma colonização oligárquica. Enquanto isso, os partidos tradicionais da União Europeia perdem-se em debates superficiais e carecem de credibilidade. Como aponta o sociólogo Emmanuel Todd em seu livro Apres la Démocratie (Depois da Democracia), já não vivemos num regime democrático. O exemplo francês de 2005, quando um referendo rejeitou a Constituição Europeia, mas o Tratado de Lisboa foi adotado mesmo assim, ilustra bem essa crise.

O desgaste e a desilusão com a democracia levaram à eleição de Trump, num cenário em que as narrativas lineares se desautorizaram umas às outras sendo substituídas pela concorrência desenfreada nas redes sociais e nas redes oficiais do sistema político. As antigas convicções religiosas foram substituídas pelas convicções burguesas, que, ao buscarem globalizar-se, acabaram desautorizando-se e contribuindo para o surgimento da tirania da opinião.

O papel de Musk e a crise europeia

Elon Musk revolucionou áreas como a banca, a mobilidade, as viagens espaciais e o meio ambiente. Ele apoiou a Ucrânia com a Starlink em sua defesa contra Putin e agora parece querer transformar a política. Musk, com acesso privilegiado aos grandes decisores globais, reconhece a falta de liderança tanto na política como na sociedade. Contudo, enfrenta resistência dos detentores do poder europeu, especialmente no campo progressista e nos partidos do arco do poder.

Estamos diante de um novo sistema. Musk estende a mão à direita, provocando preocupação entre os progressistas que ainda controlam os governos. Muitos continuam enredados nas aparências do poder e na retórica oficial, sem reconhecer as transformações em curso.

A Europa e a busca pela autonomia

A Europa, um dia, conquistará a sua autonomia. Contudo, isso só ocorrerá após romper o laço umbilical com os EUA. Para traçar um novo caminho, a Europa deve se aproximar de seu parceiro natural, a Rússia, com quem compartilha um berço geográfico e uma base cultural comum. Após a Primeira Guerra Mundial, os EUA determinaram o destino europeu, mas em um mundo que busca maior justiça social, é essencial que a Europa invista em colaboração com a Rússia, em nome de interesses próprios e autênticos, mas que respeitem a paz e a justiça entre os povos.

A União Europeia que temos estará mais interessada em seguir a onda de promiscuidade política do que questões relacionadas com a promoção da liberdade de expressão, inovação ou desmantelamento da burocracia e deste modo poder seguir nas velhas pegadas dos Estados Unidos da América. As castas que temos embora já velhas ainda permitem ao povo ir vivendo do rebusco da vindima.

António da Cunha Duarte Justo

Pegadas do Tempo

(1) Na cimeira da NATO na Lituânia, em 2023, os membros concordaram em gastar anualmente pelo menos 2% do seu produto interno bruto com as forças armadas.

(2) Musk apontou o Presidente Steinmeier como tirano antidemocrático, talvez por ele ter nomeado de “ratazanas„ eleitores de quem talvez não se considerasse presidente.

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O REGRESSO DO NETO AO LAR DO AVÔ

Na quietude da tarde, entre o perfume da lenha queimada e o sonido dos pássaros distantes, o neto Daniel entrou no quintal da casa do avô Joaquim. Fazia já anos desde a sua última visita. O velho Joaquim, de mãos calejadas e olhos de horizonte vasto, aguardava-o sentado no alpendre, esculpindo um pequeno pedaço de madeira.

— Avô, voltei. — disse o neto, hesitante, como se o peso das palavras fosse maior do que a própria presença.

O avô ergueu os olhos com um sorriso que misturava surpresa e uma sabedoria ancestral como o mundo.

— Voltas sempre ao que nunca te deixou, Daniel. Senta-te. Conta-me o que te trouxe de volta.

O neto hesitou, mas sentou-se num tronco que esperava por ser cinzelado. Começou a contar da vida na cidade, das corridas intermináveis atrás de sonhos que se desmanchavam como a fumaraça que saía do tronco fumegante. Falou da confusão que sentia entre o que acreditava e o que via.

— Avô, vi mundo e às vezes sinto que estamos todos num barco que mete água, mas ninguém sabe como o reparar. Pessoas debatendo-se por ser melhores que outras, ateus brigando com religiosos, políticos em luta pelo poder, todos perdendo-se em certezas que são só pedras no sapato da caminhada. E eu sinto-me amachucado e perdido no meio disso tudo.

O avô Joaquim pousou o bocado de madeira e encarou o neto com o olhar de quem vê mais do que ouve.

— Sabes, rapaz, a vida é como este quintal. Tem terra, flores, ervas daninhas, árvores que crescem para o alto e raízes que se entrelaçam no subsolo escuro. Cada um pensa que só o que está à vista importa, mas é lá em baixo, no que não se vê, que está a força.

— E o que fazemos quando nem sabemos onde estamos? — perguntou o neto, com a aflição de quem busca uma bússola.

O avô suspirou, cruzando os dedos envelhecidos.

— Quando Deus perguntou a Adão “Onde estás?”, não foi porque Ele não sabia. Foi para que Adão e nele a humanidade se situasse. Meu neto Daniel, a pergunta continua ecoando na humanidade e em cada um, sem importar se és crente, ateu ou agnóstico. O importante é que respondas honestamente a ti mesmo. Sabes, a vida, com as suas pernas e caminhos, não pede certezas, mas abertura.

O neto abaixou a cabeça, como quem tenta absorver as palavras. E o avô continuou, com a serenidade de quem já viu muitas estações.

— O erro de muitos, meu caro Daniel, é pensar que a razão é o barco e não o remo. A razão ajuda a navegar, mas é o amor — e o mistério que o sustenta — que mantém o barco à tona. Fé, esperança, caridade e dúvidas são os ventos que nos movem. E todos estamos nesse mesmo oceano, procurando um porto que aponte para o eterno.

Daniel sorriu pela primeira vez. Sentia que, apesar de não ter respostas, encontrava um ponto de partida.

— Então, avô Joaquim, o que é o sentido da vida?

O velho levantou-se com esforço e apontou para o céu, onde o sol se punha em tons de ouro e púrpura.

— Vês aquilo no horizonte? A beleza não está só na luz, mas no encontro dela com a noite. O sentido da vida é relação. Estar em relação com, em relação nos outros, com o mundo, com o inefável, contigo mesmo. A vida é dar e receber, um modo de estar em relação pura como mostrou Cristo. Não precisamos de respostas para viver bem. Só precisamos de aceitar o convite de Deus, mesmo sem entendê-lo completamente. Afinal, somos todos peregrinos, não donos do caminho.

O neto ficou em silêncio, contemplando o céu, de coração mais leve. Naquele momento, percebeu que não precisava de resolver todos os mistérios da vida. Bastava viver a pergunta, na vivência de um passo de cada vez.

E o velho, com um sorriso sábio, voltou à sua madeira, esculpindo uma figura que só ele sabia o que viria a ser — tal como a vida.

António da Cunha Duarte Justo

Pegadas do Tempo

e em  Poesia de António Justo http://poesiajusto.blogspot.com/

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A JORNADA DA ESTRELA

Em tempos antigos, quando as pessoas ainda buscavam preferencialmente o sentido profundo da existência, viviam reis que não se contentavam com o brilho dourado de seus palácios nem com os segredos das constelações. Esses reis, conhecidos como os Magos, ansiavam por algo maior – uma verdade que transcendesse reinos e explicasse os mistérios do coração humano.

Uma noite, enquanto observavam o céu, uma estrela incomum despontou no horizonte. Seu brilho não era apenas luminoso; levava consigo um chamamento que ressoava no íntimo das almas. Belchior, Baltazar e Gaspar entenderam que aquela estrela não era apenas um sinal celeste, mas um convite para uma jornada espiritual. Assim, partiram, guiados pelo seu fulgor.

Enquanto percorriam desertos e montanhas, florestas e vales, algo extraordinário aconteceu: pessoas de todas as partes do mundo começaram a juntar-se à caminhada. Era como se a luz daquela estrela falasse a todos, independentemente de sua cultura, credo ou história. Unidos pelo desejo de encontrar a fonte daquele brilho, tornaram-se uma única humanidade em busca de algo maior.

Os Magos chegaram a Jerusalém, onde procuraram o rei Herodes. Perguntaram onde poderiam encontrar o recém-nascido “rei dos judeus”. Herodes, temeroso de perder seu poder, consultou os seus sábios e indicou-lhes Belém, mas pediu que voltassem para informá-lo sobre a criança. Contudo, os Magos perceberam que o coração de Herodes estava repleto de medo e ganância – qualidades que não poderiam coexistir com a verdade que buscavam.

Ao seguirem novamente a estrela, ela os levou até uma humilde gruta em Belém. Lá, encontraram não um palácio, mas um presépio. Entre o feno, um menino recém-nascido brilhava com uma luz que não era deste mundo. Nos olhos daquela criança, os reis viram refletida a essência da dignidade humana, um aviso de que cada pessoa, em sua simplicidade, carrega uma centelha divina que a torna soberana.

Os Magos ofereceram seus presentes: ouro, simbolizando realeza e fé; incenso, representando a ligação entre o humano e o divino; e mirra, um símbolo da transitoriedade da vida e da eternidade que habita além dela. Mas seus presentes eram mais do que tributos – eram um gesto de entrega à humanidade. Ao lançar seus tesouros no regaço do Deus Menino, proclamaram que a verdadeira riqueza está no amor e na busca da verdade.

Não voltaram pelo caminho de Herodes. Em vez disso, seguiram novos caminhos, conduzidos pela luz que agora brilhava em seus próprios corações. A estrela, que antes parecia distante no céu, agora habitava dentro deles, como um chamamento eterno de que o divino e o humano se podem encontrar em qualquer pessoa disposta a acolhê-lo.

O presépio é mais do que uma cena de um momento histórico. Transformou-se num símbolo universal do encontro entre o céu e a terra, entre o Oriente e o Ocidente, entre o sagrado e o humano. Na gruta de Belém, a estrela não apenas guiou os Magos, mas iluminou o caminho para todos os povos, chamando cada um a olhar para dentro de si e redescobrir a luz que sempre esteve ali.

E assim, a caminhada dos Magos continua em cada um de nós. A estrela brilha ainda, convidando-nos a seguir o chamamento – não para longe, mas para o mais íntimo de nossos próprios corações, onde repousa a essência da nossa dignidade e da nossa humanidade. Aí, na distância do barulho da estrada, poderemos descobrir a nossa caminhada para o próprio Belém, o coração  da humanidade onde o menino Jesus se abriga.

António da Cunha Duarte Justo

Pegadas do Tempo

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ORAÇÃO DE ANO NOVO DE 1883 QUE SE AJUSTA 100% NA ACTUALIDADE

 

 

Tradução do original alemão que se encontra em baixo

 

“Senhor, estabelece limites à abundância e deixa que os limites se tornem supérfluos.

Não deixes que as pessoas ganhem o dinheiro errado, mas não deixes que o dinheiro faça as pessoas erradas.

Tirai a última palavra às mulheres e lembrai aos maridos a primeira.

Dar aos nossos amigos mais verdade e à verdade mais amigos.

Melhorar aqueles que são activos na vida pública, mas não caridosos.

Ensinai-nos a compreender que aqueles que são ricos de carteira nem sempre são ricos de coração.

Dai aos governantes um alemão melhor e aos alemães um governo melhor.

Digamos o que pensamos e façamos o que dizemos.

Por isso, sejamos também aquilo que dizemos e fazemos.

Senhor, faz com que todos nós vamos para o céu, mas – por favor – não imediatamente. Amém”.

 

Esta oração foi proferida pelo padre Hermann Kappen, de Münster, na receção de Ano Novo na igreja de São Martinho e Nicolau, em Steinkirchen, em 1883.

 

Traduzido com a versão gratuita do tradutor – DeepL.com

Texto original em alemão:

NEUJAHRES GEBET VON 1883 DIE 100% PASST IN DIESER ZEIT

 

“Herr, setze dem Überfluss Grenzen und lass die Grenzen überflüssig werden.

Lasse die Leute kein falsches Geld machen, aber auch das Geld keine falschen Leute.

Nimm den Ehefrauen das letzte Wort und erinnere die Männer an ihr erstes.

Schenke unseren Freunden mehr Wahrheit und der Wahrheit mehr Freunde.

Bessere solche, die im öffentlichen Leben wohl tätig, aber nicht wohltätig sind.

Lehre uns die Einsicht, wer reich im Portemonnaie ist, ist nicht immer reich auch im Herzen.

Gib den Regierenden ein besseres Deutsch und den Deutschen eine bessere Regierung.

Lass uns sagen, was wir denken und lass uns tun, was wir sagen.

Also lass uns das auch sein, was wir sagen und tun.

Herr sorge dafür, dass wir alle in den Himmel kommen, aber – bitte – nicht sofort. Amen.”

 

Dieses Gebet sprach der Pfarrer Hermann Kappen aus Münster beim Neujahrsempfang des Jahres 1883 in der Kirche St. Martini et Nicolai zu Steinkirchen.

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SITUAÇÃO DA EUROPA EM 2025

Iniciamos o ano 2025 com as esperanças murchas porque na qualidade de cidadãos e de povos nos encontramos envolvidos num dilema político-económico que se pode ver equacionado na constatação da realidade que Henry Kissinger “inocentemente” outrora revelava: “Ser inimigo dos EUA é perigoso, mas ser amigo é fatal”!

Bruxelas encontra-se alheia a uma estratégia de pensamento próprio que pudesse iniciar uma saída deste dilema que os ajudasse a libertar de uma história europeia impura no que toca às suas tendências de cunho imperialista; agora Bruxelas encontra-se recrudescida na estratégia político-militar fatal da NATO de caracter determinante para o agir dos estados membros. Em questões de aprendizagem de interesses europeus, von der Leyen e a EU precisariam de frequentar um pouco da escola turca de Erdogan que usa e abusa da NATO e da Federação russa na defesa dos interesses turcos! 

Talvez no decorrer deste ano os EUA optem mais por uma estratégia económica e isso crie espaço para a Europa poder pensar em realizar-se, libertando-se, pouco a pouco, das peias do ponderante pensamento anglo-saxónico. As guerras económicas deveriam acabar para dar lugar a uma concorrência justa e as guerras militares deveriam ser penalizadas por quem não investe o seu futuro na indústria militar.  A nossa fatalidade vem do facto de nada disto estar na mente dos nossos chefes guerreiros na EU, chamem-se eles Pistorius, Rutte ou von der Leyen.

O chefe da NATO (Rutte) quer ver propagada na União Europeia uma “mentalidade de guerra” (discurso em Bruxelas 12.12.2024) e que a força económica seja canalizada para a indústria da guerra, apelando também à redução dos direitos sociais dos cidadãos, exigindo para isso cortes nas pensões, etc. Pistorius já tinha lançado na Alemanha o lema criar “forças armadas belicosas” e logo surgiram vozes relevantes da política exigindo “aulas de defesa civil” nas escolas para preparar o país para a guerra. O que acontece na Alemanha é seguido na EU encenando-se, para isso, campanhas de possíveis ataques à EU para motivar e sintonizar as pessoas nesta marcha.

Humano seria acabar-se mundialmente com as sanções económicas pois quem mais sofre com elas são as populações; um outro impulso seria fomentar-se o incremento das indústrias nos países sem o nível económico da Europa. Este poderia ser o início de uma economia mundialmente mais justa e de uma política mais séria que não precisaria de ser sustentada por guerras.

Num mundo conduzido pelos interesses das elites há que elaborar um discurso que não se limite à defesa dos interesses destas.

António da Cunha Duarte Justo

Pegadas do Tempo

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