NO DIA DA MULHER

Falta da Face feminina na Matriz cultural

A matriz cultural (talvez mais adequado dizer “patriz” cultural!) em que vivemos é masculina e como tal discrimina de maneira sistemática a mulher ao não evidenciar o rosto da feminilidade nela! Nesta matriz ainda se aceita como natural ver os homens a explicar o mundo, partindo do princípio que eles é que sabem como o mundo funciona. A não integração da feminidade de maneira sistémica na matriz provoca discriminação e lutas correspondentes à forma de estar desse modelo cultural; não se tem tido em devida conta o aspecto da complementaridade do feminino e do masculino numa inter-relação  de diferenças, chamadas a ser inclusivas e não exclusivas.

O que se mantém em silêncio é que esta atitude é a consequência da matriz masculina que nos orienta e por isso estamos a lidar principalmente com um problema sistemático que se expressa em papéis e evita o talento feminino na qualidade de perito. Seria trágico para a sociedade se homens e mulheres entrassem numa luta de uns contra os outros na sequência sistémica orientada para o poder e para a dominação (atitude própria de um modelo cultural mais masculino que se poderia apaziguar através da inclusão nele do princípio da feminilidade). Seria absurdo e desonesto entrar-se numa discussão de experiências puramente pessoais numa espécie de luta corpo a corpo. O importante será ter um espaço em que se questione tudo para que os estereótipos sejam quebrados e se possibilite o surgir de uma nova cultura de relações a um nível básico interior e exterior. Isto não evitará a questão de homens se fixarem mais no mental e de mulheres no experimental (o método dedutivo e indutivo são formas necessárias complementares de explicar o mundo).

As mulheres não são melhores nem piores que os homens; umas e outros são diferentes, mas ambos portadores dos princípios da masculinidade e da feminilidade com diferentes predominâncias (pode até haver homens com predominância das características femininas e mulheres com a predominância de particularidades masculinas). Uns e outros são seres feitos deles mesmos e das suas circunstâncias e como tal sempre em processo de desenvolvimento! A injustiça feita às mulheres assenta no paradigma masculino que dá forma a todas as culturas e sociedades mundiais, obstruindo, basicamente, o surgir de uma igualdade dos dois rostos na sociedade. Para evitarmos muitas guerrilhas entre homens e mulheres será de começar por articular o lugar mais eficiente, a nível de princípios, afinidades e valores, que resolva de maneira inclusiva os problemas conflituais que se expressam em papéis demasiadamente definidos.

Numa fase intermédia, é lógico que muitas mulheres se organizem e lutem pela emancipação fazendo uso de métodos e estruturas que assentam no modelo cultural masculino. Como a estrutura masculina se afirma pela luta, também elas usam como estratégia essa forma de afirmação, ainda condicionada mais ao ter e adquirir do que ao ser!   É demasiado evidente a falta da face feminina na matriz cultural: uma nova matriz em que masculinidade e feminilidade fluem poderia ser simbolizada e expressa numa mesma moeda composta da face feminina e masculina!

O presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelenski pretende concretizar a obrigatoriedade do alistamento de mulheres no serviço militar (1).

Tal intento, há anos legalizado, é, no meu entender, uma medida contra a feminilidade! Embora o movimento feminista (Femen (2), siga uma estratégia masculina de afirmação, neste ponto parece ter tido um vislumbre feminino ao declarar-se contra a inclusão de mulheres em zonas de combate!

Independentemente do respeito que se deve à decisão livre das mulheres, penso que as mulheres, que se manifestam contra o alistamento delas nas guerras, são as verdadeiras femininas que defendem a feminilidade (energia da paz), abstendo-se de entrar, num mundo de masculinidade exacerbada expressa no exército; para já urge o surgir na sociedade o rosto feminino  que questione a nossa matriz cultural mundial que se manifesta ridiculamente no que acontece em torno da Ucrânia/USA/Rússia.

Neste paradigma, a feminilidade não está presente, apenas se instrumentaliza a mulher! Talvez esta situação concorra para que os movimentos de emancipação das mulheres tomem consciência delas para não se deixarem tornar agentes do “patriarcado opressor” que julgam combater! A luta que fazem, usando a metodologia masculina de resolver os problemas, é compreensível se considerada apenas como passo provisório (Os lutadores são soldados em campo de batalha e como tal só podem ser tolerados por pouco tempo!), até que se esteja em situação de se criar uma matriz cultural em termos humanos justos e inclusivos dos princípios da feminilidade e da masculinidade, sem que haja hegemonia de um sobre o outro; isto, muito embora a questão se encontre radicada também em termos de funcionamento e organização do pensamento. A inclusão do princípio da feminilidade na base do paradigma iniciaria uma nova cultura mais humana e pacífica: outros valores e prioridades surgiriam sem que o papel social assumisse carater tão relevante!

Salvaguardada a liberdade de decisão da mulher, não é justo o argumento de que a mulher, para assumir responsabilidade pelo seu Estado, tenha de absolver o serviço militar e tenha de participar directamente na guerra (mesmo com o argumento da igualdade!), dado ela, também nesse esquema, poder assumir diferentes formas de serviço. Além disso é um facto que grande parte das mulheres já contribuem significativamente para a sociedade ao terem e criarem filhos (facto que numa sociedade de modelo não tão masculino deveria recompensar a mãe, monetariamente, como se fosse, durante um certo período, um soldado militar).  No meu ponto de vista, também não é sexismo defender-se que a mulher não seja convocada a fazer o serviço militar nem ser incluída em combates directos dado encontrarmo-nos numa matriz cultural em que a masculinidade se expressa e impõe sem contemplar a perspectiva da feminidade de de caracter pacífico.

É preciso apostar no poder renovador que a mulher tem (3).

 

António da Cunha Duarte Justo

©Pegadas do Tempo

(1) As mulheres devem ser recrutadas em caso de guerra. O escândalo é grande. Desde a Primavera de 2021, as mulheres de 100 grupos profissionais estão legalmente obrigadas a submeter-se ao serviço militar. Na altura, o regulamento mal foi notado pelo público. Para as mulheres, o serviço nas forças armadas é voluntário. Cerca de 32.000 mulheres estão actualmente a servir como soldados temporários no exército ucraniano, tendo cerca de 16.000 delas participado em operações de combate. O recrutamento de mulheres existe na Bolívia, Costa do Marfim, Eritreia, Israel, Coreia do Norte, Noruega, Suécia, Sudão e Chade. https://www.mdr.de/nachrichten/welt/osteuropa/politik/frauen-musterung-ukraine-militaer-100.html

(2) O grupo radical feminista Femen, nascido na Ucrânia, lançou uma nota pública em que exige que, se revogue o decreto que tornou obrigatório o alistamento de mulheres no serviço militar. Alguns intitulam tal exigência do movimento feminista Femen como hipócrita alegando que pretendem os mesmos direitos mas não as mesmas obrigações e que não foi o “patriarcado opressor”, mas a mentalidade feminista que colocou as mulheres na guerra. 

(3) PODER RENOVADOR DA MULHER: https://triplov.com/letras/Antonio-Justo/2009/mulher.htm, A História repete-se: https://antonio-justo.eu/?paged=99&author=1Aquivos ; Debate sobre o género: https://bomdia.eu/debate-sobre-o-genero-ciencia-ou-ideologia/ ; Matriz política… https://bomdia.fr/matriz-politica-masculina-nao-pode-ser-norma-para-a-instituicao-eclesial/ Sobre o tema mais artigos meus no google.

 

 

SINTONIA

Pus-me a olhar para a vida e, ao entrar dentro de mim, sinto, com tristeza, que como no „microcosmos” de cada pessoa e de cada família, assim é no macrocosmos da política!
Se olhamos para o ano 2021 e para o que corre, notamos os reflexos do “mundo louco” em que vivemos.
Nele, somos levados à reflexão e, por vezes, ao desalento a que nos conduzem os eventos que, mesmo sem querermos, determinam os nossos pensamentos e sentimentos.
Resta-nos contribuir junto com os outros para que a “paz de Deus” (liberdade, justiça, reconciliação e paz ) molde as nossas vidas num mundo sem conquistadores nem vencidos! Fica-nos a confiança de que da morte nasce a nova vida! Não estamos sós, somos muitos!
Apesar da tristeza que se encontra a caminho, desejo a todos uma semana feliz e com muito momentos de gozo para que o briho da alegria não se ausente.
Abraço
António da Cunha Duarte Justo
Pegadas do Tempo

DA GUERRA CIVIL UCRANIANA PARA A GUERRA RÚSSIA-UCRÂNIA À GUERRA EM TODA A EUROPA?

A Guerra da Informação faz da População Soldados mentais

Esta guerra meteu-nos a todos num túnel escuro em que nem sequer se avista luz no fundo dele! A situação encontra-se tão enredada que só promete desastres em cadeia! Isto, atendendo aos interesses da Rússia, ao temperamento indomável de Putin e à guerra geral através do bloqueio económico que o está a encurralar! O mais provável é que, se ele não atingir os objectivos mínimos que tem na Ucrânia, teremos um inferno nos países vizinhos da Rússia! No purgatório já nos encontramos nós com os custos de vida a subir incontidamente.

A esperança da Nato que o povo russo deponha Putin revela-se vã, ao não contar com a realidade do confronto de blocos nem com os interesses do povo russo como nação (e como velho bloco); por isso só uma reconciliação entre a Rússia e a Ucrânia e entre os USA e a Rússia poderá aplainar o caminho para a paz! Uma outra opção corresponde a manter-se a guerrilha na Europa por tempo indeterminado, independentemente de resultados militares! A EU tem de estar atenta a não seguir apenas os interesses americanos (longe da Europa) e para isso também não cair na tentação de instigar a Polónia a imiscuir-se na guerra! Os EUA querem que a Polónia forneça à Ucrânia aviões de combate Mig 29 em troca de F 16!… Neste sentido o artigo de 2014: “Ucrânia entre imperialismo russo e ocidental”: https://www.triplov.com/…/Antonio-Justo/2014/ucrania.htm e outros (1).

Considero muito importante o visionário texto de Henry A. Kissinger, secretário de Estado dos USA, que agora recebi (2): “Para que a Ucrânia sobreviva e prospere, não deve ser o posto avançado de nenhum dos lados contra o outro – deve funcionar como uma ponte entre eles…. O Ocidente deve entender que, para a Rússia, a Ucrânia nunca pode ser apenas um país estrangeiro…”… A Frota do Mar Negro – o meio da Rússia de projetar poder no Mediterrâneo – é baseada em arrendamento de longo prazo em Sebastopol, na Crimeia.” Alegra-me este texto, porque sem saber dele corresponde, em parte, ao que tenho vindo a procurar fazer compreender com os meus textos, se não formos advogados da guerra.

Putin não precisa de activar uma bomba nuclear, ele tem as centrais nucleares na Ucrânia como ameaça maciça. Verdade é que, para já, se tem de renunciar ao sonho de “uma Europa de Lisboa a Vladivostok”! Uma solução de compromisso satisfatório para todos os lados seria a formação de uma República Federal da Ucrânia Independente. Assim se mitigaria a longo prazo o princípio que Putin usa de ir defender uma minoria (problema de minorias usadas como pretexto a desejos de poder!).

Um possível contributo pessoal e social para a paz exterior e interior passaria pela abstenção de se ver regularmente TV, dado nos encontrarmos já envolvidos numa guerra de informação! A Guerra da Informação está a fazer da população soldados mentais!

Trazemos a maldade nos nossos genes (“pecado original), uma realidade que reprimimos em nós (deslocamento psicológico!) mas que faz parte do nosso habitat natural e cultural. O mal que vemos nos outros encontra-se em nós! Produtivo será o trabalho feito no sentido da reconciliação e dedicar mais tempo às coisas que nos dão prazer e assim não estarmos tão sujeitos à invasão das coisas que entram pela porta da televisão.

Com a queda das torres de Nova Iorque iniciou-se na Europa um processo de cortar, ao cidadão, direitos cívicos e humanos até então assentes nas legislações dos Estados; com as medidas anticovid-19 os governos centralizaram em si mais poder, a ponto de privarem o cidadão de direitos democráticos e de liberdades essenciais. Com a guerra Rússia-Ucrânia legitimaram a proibição da informação (3) estrangeira de modo a irem criando a possibilidade de só serem possíveis pensamentos em bloco, de modo a só se poder estar de acordo com os donos da informação de um lado ou do outro! As democracias estão a ser esvaziadas no sentido de governos cada vez mais autocratas, fenómeno que já se conhece da Rússia, China, etc. poderem controlar toda a população.  Eles sabem que as pessoas pensam o que veem e ouvem!

O tempo em que vivemos daria mais para chorar, mas tudo corre tão depressa que nem tempo para lágrimas há, mesmo que sejamos pessoas compassivas! Continuamos todos agarrados à lama do barro de que fomos tirados, mas na ilusão de que só os outros estão sujeitos ao “pecado original”!

António da Cunha Duarte Justo

Pegadas do Tempo

(1)  “UCRÂNIA É O CAVALO TROIANO DOS USA E DA RÚSSIA” : https://antonio-justo.eu/?p=7116 ; “ Chegou a hora de Putin – A Solução será tornar-se República Federal Neutra” https://antonio-justo.eu/?p=7129 ; Dados sobre a Ucrânia: https://antonio-justo.eu/?p=7127 ; “VIRAGEM NA ORDEM EUROPEIA INICIADA PELA ALEMANHA – NOVA GUERRA FRIA”: https://antonio-justo.eu/?p=7138 ; “Acirrar o Urso russo significa preparar uma Guerra nuclear na Europa”: https://antonio-justo.eu/?p=7149 ; “A GUERRA FRIA NOS MEDIA RUSSOS E ALEMÃES”: https://antonio-justo.eu/?p=7067 ; etc.

(2) https://www.washingtonpost.com/opinions/henry-kissinger-to-settle-the-ukraine-crisis-start-at-the-end/2014/03/05/46dad868-a496-11e3-8466-d34c451760b9_story.html

(3) GUERRA FRIA NOS MEDIA RUSSOS E ALEMÃES: https://antonio-justo.eu/?p=7067

 

PERMANEÇAMOS HUMANOS

A orientadora de um culto infantil em Kiev escreveu aos pais: “Que Deus proteja cada um de vós! Não caiamos em pânico, mantenham a calma e permaneçam humanos, aconteça o que acontecer! Se algum de vós precisar de ajuda, por favor contacte-me pessoalmente”.

É trágico e embaraçoso para todos nós assistir impotentes à morte das pessoas!

Muitas ilusões começam a afastar-se de nós!

Numa situação destas ajudam-nos as palavras da dirigente do serviço litúrgico em Kiew.

Acirrar o Urso russo significa preparar uma Guerra nuclear na Europa

A GUERRA NUNCA É POR UMA BOA CAUSA

A ilusão de se vencer Putin conduzirá à tragédia de pôr todos em perigo. Depois do 24 de Fevereiro, acordámos num mundo diferente: horrorizados com a guerra, o receio e a ansiedade acompanham-nos! Mais de um milhão de ucranianos encontram-se em fuga. Segundo a ONU, dos 874.000 ucranianos que estavam há dias em fuga, 454.000 já se encontravam na Polónia e os restantes em nações (1) vizinhas. A ONU presume que outros quatro milhões deixarão o país.

Nunca há guerra por uma boa causa. Esta guerra embora fabricada na Ucrânia não deixa de ter direitos de autoria!  Por isso há que ser pelos Ucranianos e preocupar-se por encontrar soluções para depois da guerra. A Ucrânia tem o direito à autodeterminação, embora o povo se encontre dividido, o que complicará a questão também depois da guerra. Isto e o facto de o presidente ucraniano pretender forçar que a Ucrânia entre na EU, mais complica a questão (a guerra não se dá directamente entre a Rússia e a EU e os parceiros da Nato!). Há perguntas por responder: porque é que a Ucrânia, pelo menos numa fase intermédia, não quer ser não-alinhada, independente da Rússia e da Nato?  Deste modo causaria menos dores de cabeça à EU e aos blocos rivais. Não será que o presidente ucraniano com o seus acto heroico não estará a sacrificar a Ucrânia ao pôr demasiada confiança nos parceiros da Nato? Não será que quanto mais armas se entregarem à Ucrânia mais fogo haverá lá porque elas apenas prolongarão a guerra? Será do interesse dos USA/Nato prolongar a guerra o mais tempo possível, na esperança de Putin ter de ceder devido às consequências internas das sanções impostas; mas os ucranianos é que pagarão esta estratégia com as próprias vidas e com a debandada do país. A que conduzirá o demasiado cerco internacional a Putin? Que acontecerá quando o urso russo se encontrar em situação de já não ter mais nada a perder? A sua única força é a bomba atómica! Será que queremos uma aliança entre a Rússia e a China? Há um ditado chinês que diz: “Um homem aponta para o céu. O tolo olha o para dedo, e o sábio vê a lua”

Além de assistirmos à guerra militar entre a Rússia e a Ucrânia estamos envolvidos numa guerra mediática onde se pretende criar fronteiras mentais; neste sentido procura-se, evitar falar do contexto, falando-se só dos aspectos emotivos para facilmente armar a mente das pessoas e assim fazer das suas opiniões soldados ao serviço de uma parte ou da outra: o que interessa é formar soldados!…(O ambiente mediático cria a sensação de que já estamos em guerra e até faz surgir entre jovens a vontade de se alistarem como soldados mercenários para a Ucrânia). É preciso evitar analisar a situação em termos maniqueístas e também não culpar as vítimas nem desculpar o crime. Em política não há santos, o que resta e conta são os factos e acções, que ficam, por vezes, à margem da razão e de actos corajosos!

Se estivermos atentos ao que se passa na opinião pública, notaremos que se está a actuar em termos da ordem marxista que divide o mundo entre os que estão do lado certo e os que estão do lado errado: dividir para instrumentalizar, dividir a sociedade e o mundo em opressores e oprimidos para deste modo, o grupo dos espertalhões se alimentarem à custa do que falta ao povo (segundo essa lógica nos seus domínios os do lado certo está a troica dominante e nos domínios dos outros estão do lado certo os oprimidos!  errado os dominantes (capitalistas-fascistas).  Deste modo, impede-se, na sociedade, a construcção de pontes possibilitadoras de convivência e colaboração pacífica entre as camadas sociais e as partes. Continua-se a afirmar e a justificar a ordem da sociedade e do mundo numa estratégia de luta antagónica.  Ao colocar-nos, inflexivelmente, de um lado ou do outro confirmamos a estratégia marxista que procura legitimar a violência pelo facto de ela se encontrar ancorada, em termos de poder, na natureza (evolucionismo selectivo afirmativo do mais forte). Na actual invasão russa na Ucrânia, observa-se o princípio natural de afirmação dos mais fortes (Rússia rival da Nato) contra o pequeno! Por outro lado, constata-se, como reacção, o surgir da solidariedade (princípio de colaboração e apoio entre os mais pequenos), único meio de juntar forças para resistir aos grandes. Aqui ajudaria o espírito do discernimento e a coragem de integrar como forma de vida os princípios inclusivos da ordem cristã. O facto de termos o sentimento de podermos escolher, não nos deve desviar da realidade de só termos liberdade para escolher um senhor!

Não podemos querer tudo ao mesmo tempo, mas também não podemos ignorar, por um lado, as necessidades individuais nem, por outro, desconhecer a necessidade da existência de constelações, de instituições e hierarquias. Essa ordem é tão natural que até se pressupõe na esfera celeste (anjos, arcanjos, etc.), o que não justifica a sobreposição de uns sobre os outros.

Na impossibilidade de se refrear o conflicto actual (2),  o mais racional seria tentar uma maneira de lidar com o antagonismo de modo inteligente não desperdiçando as nossas energias com reacções emocionais que mais lembram tubos de escape ou, pior ainda, servem para afirmar a sustentabilidade da guerra, pelo facto de cada parte se sentir do lado certo! (Tenho naturalmente o direito individual de estar do lado certo desde que numa atitude humilde de serviço, de empatia com o todo e de complementaridade!) Não há que forçar a natureza, importa andar com ela e tentar melhorar nela o que se pode. Martin Luther King lembra:” Ou vivemos todos juntos como irmãos ou morremos todos juntos como idiotas!” Tudo leva a crer que continuaremos, por muito tempo, no estado de idiotia, porque nos preocupamos mais com o ter do que com o ser!

Um efeito colateral da guerra mediática será criar-se socialmente uma atmosfera propícia a que se acolha de braços abertos os refugiados ucranianos (o que será um grande gesto humano e um grande enriquecimento para o país de acolhimento); por outro lado, justificará as medidas que governos e a economia tomarão provocando um encarecimento quase insuportável da vida, o que não seria justificável sem a guerra! A sociedade europeia não será mais o que era!…

A guerra põe ao leu o que se passa nas guerrilhas! Enquanto a guerra gera pessoas sinistras, as guerrilhas possibilitam aos dominadores andarem de cara levantada, porque o fomento de guerrilhas é considerado permitido (veja-se o estado anterior na Ucrânia, a Primavera Árabe, a invasão no Iraque, Síria, Afeganistão, etc…

Porque não iniciar uma política no sentido de evitar a guerra e as guerrilhas? A questão é que as guerrilhas não violam direito internacional por serem consideradas lutas intestinas e o sangue correr sem que o mundo note. Encontramo-nos numa época em que as emoções determinam as decisões e não a razão; essa é uma das razões que nos leva também a não estarmos atentos ao que se passa em África!

Pelo que vemos, não existe um caminho seguro entre a paz e a guerra!…

António da Cunha Duarte Justo

Pegadas do Tempo

(1) Outros preveem até 7 milhões. A Alemanha conta albergar, para já um milhão de ucranianos! Kassel, uma cidade alemã de 200.000 habitantes, está a preparar-se para acolher 3.500 pessoas; os refugiados são distribuídos segundo o número de habitantes das cidades. Em 2015/16 Kassel recebeu 4.000. Os refugiados da Ucrânia, não são abrigados pelo estatuto de outros refugiados, pelo que se a UE não alterar a regra, permanecerão por 90 dias.

(2)  Ditadores como na Bielorrússia, Turquia, Rússia, etc. não se deixam intimidar. O facto de a EU ter falado da possibilidade da Ucrânia entrar na EU torna-se numa verdadeira provocação a Putin. O surgir de novos candidatos para entrar na EU mais acirrará Putin! Quanto mais se olha e vê mais se sofre e, por isso, muitos retiram-se na zona privada de conforto. Ditadores como na Bielorrússia, Turquia, Rússia não se deixam intimidar. Na guerra, a verdade morre primeiro e depois a vontade de difamar aumenta. Os políticos de direito próprio não morrem; eles enviam os soldados para a frente. Já havia uma guerra civil e uma brutal “operação antiterrorista” dirigida contra o próprio povo em Donetsk e Lugansk. AS mais de 14.000 vítimas foram negligenciadas pelo público mundial e agora as forças do destino vingam-se.

 

VIRAGEM NA ORDEM EUROPEIA INICIADA PELA ALEMANHA – NOVA GUERRA FRIA

A Ucrânia só precisa da autorização da Nato e da Rússia para se tornar numa República Federal independente neutra

Para evitar a traição da Ucrânia, cuja situação interna foi criada por actuação do Ocidente e da Rússia, decide-se agora a Alemanha pela filosofia militar da guerra fria de outrora. Numa guerra que não pode ser ganha e só será perdida, a situação é grave atendendo à possibilidade do desaparecimento de um país, sua divisão ou criação de um país independente! A história repete-se, com esta tomada de posição da Alemanha reinicia-se na Europa a época da guerra fria!

A invasão da Ucrânia pela Rússia dará início ao surgir de uma nova consciência europeia que facilitará adquirir um lugar mais patriarcal no mundo dos grandes! Até ao presente a Alemanha funcionava, entre os seus parceiros, como travão da vontade militar! Agora, o governo alemão determinou uma mudança histórica de rumo; no passado era consenso alemão o não fornecimento directo de armas para zonas de conflitos bélicos. O governo alemão passa agora a fornecer armas à Ucrânia: 1000 armas antitanque e 500 mísseis terra-ar provindos dos seus stocks da Bundeswehr. Também quer entregar 14 veículos blindados e até 10.000 toneladas de combustível. Para reforçar a nova filosofia, o governo alemão quer disponibilizar 100 mil milhões de euros para a modernização das Forças Armadas alemãs. Há aspirações de reforçar as Forças Armadas de 183.000 para 203.000 soldados nos próximos dez anos (1). O Chanceler Olaf Scholz justifica a mudança de posição da Alemanha, dizendo:  “A invasão russa da Ucrânia marca um ponto de viragem. Ameaça toda a nossa ordem do pós-guerra” e reforça: “nesta situação, é nosso dever apoiar a Ucrânia o melhor possível na sua defesa contra o exército invasor de Vladimir Putin. A Alemanha está ao lado da Ucrânia (2)”…. A pressão sobre Berlim para entregar armas defensivas à Ucrânia tinha vindo a aumentar, feita por países parceiros que já há semanas forneciam armas à Ucrânia (USA, Reino Unido, etc..). Com a viragem de estratégia alemã iniciar-se-á na Europa a corrida ao armamento. Ao contrário do governo de Ângela Merkel, a nova coligação abandona a política pós-guerra de contenção para seguir mais nas pegadas dos USA.

O mundo está roto, chove nele dentro e fora! Na Europa encontramo-nos de luto, com vergonha, desiludidos ou sem palavras. A atitude de Putin traz à luz uma sociedade europeia desprecavida, uma força militar impreparada e uma avaliação desqualificante dos actores políticos por identificar os seus interesses com os da USA. Faz lembrar a situação e atitude em relação ao vírus ao que se seguirá uma nova fixação política no encapotamento militar! Iniciamos agora um processo de retrocesso (na visão alemã), ao termos de passar a aprender a distinguir entre inimigo e amigo e, na consequência, passar a duvidar precipitadamente do rosto humano de cada um.

Até aqui, estávamos preocupados com a Guerra sanitária do SARS-CoV-2 e agora somos ocupados com a guerra militar da Rússia na Ucrânia! Deste modo continuam os povos em estado de emergência: da dependência do ministério da saúde para a dependência do ministério da defesa. . Das pessoas encerradas em casa surgirá a tendência para as guardar nas casernas!

Putin não queria aceitar que também os grandes impérios podem desabar e os USA enganaram-se ao quererem apostar no seu mundo de cariz unipolar!  Se seguíssemos essa lógica de manter e ampliar os grandes, a consequência seria, como dizia um colega, Portugal e Espanha teriam direito à América do Sul, a Inglaterra à Índia, América do Norte e Austrália e assim por diante… E isto para não começarmos pelos Romanos, etc.!  Facto é que os grandes impérios caem e que a ordem se cria num jogo entre pequenos e grandes.

E nós povo, pensamos e agimos privadamente sem nos darmos conta do que está por trás do que fazemos ou deixamos de fazer. Querer meter no mesmo saco os interesses por que se rege  a política e a moral que move o povo, é fraco gesto que usa da confusão ao serviço de interesses políticos. Somos ingénuos quando se trata de avaliar o poder pensando que o que não deve acontecer não acontece. A credulidade numa sociedade romantizada leva à negação da realidade. Não chega pensar que para além do nosso próprio horizonte (mentalidade) não existem outras ideias, outros horizontes com formas anárquicas e cruéis de pensar e agir…. O cúmulo da ingenuidade seria, porém, querer ignorar o próprio mal para culpar só os outros.

O cerco da NATO não justifica a guerra nem a guerra justifica as acções anteriores da NATO. Com a guerra e a ameaça nuclear e pessoas sem escrúpulos, tudo se torna possível, mesmo o que se pensava ser impossível. Em 2007, na conferência de segurança em Munique, Putin manifestou-se contra um mundo unipolar e avisou a NATO: “mãos fora dos nossos vizinhos”. Pelos vistos Putin, na altura, dizia o que pensava perante o agir de uma NATO que queria ver Putin humilhado e uma Rússia reduzida a segundo ou terceiro plano na ordem mundial (O extremo da propaganda ocidental estilizava-o como psicopata). Na fase da divisão do povo ucraniano Putin verificou que a sua acção agressiva no terreno se revelava inferior à estratégia de inserção dos USA e da Nato através de métodos considerados democráticos, mas aí viu que, a longo prazo, iria perder. Putin, nesse tempo de rivalidade pela posse do povo ucraniano, pôde ver que a Nato não tinha dentes nem garras, mas se afirmava de maneira mansa, os USA forneciam dinheiro e a Europa estava interessada em implantar lá empresas enquanto militarmente treinava as suas forças militares em” missões de paz”, e ele Putin só tinha a força militar… a situação mostra agora a face do poder que é imprevisível!

 A Cimeira da NATO em Varsóvia. 8. 7. 2016 tinha na agenda a forma de lidar com a Rússia, cuja guerra de agressão não declarada contra a vizinha Ucrânia já tinha custado a vida a cerca de 10.000 pessoas e tinha obrigado cerca de 2 milhões de pessoas a fugir (3). Na Rússia como no Ocidentes encontram-se valores genuínos que querem foros de cidadania. O The Moskow Times informou que trinta meios de comunicação social russos (incluindo, RT, Kommersant, Novaya Gazeta e TASS)– emitiram uma declaração conjunta em que acentuaram: “Hoje o presidente da Rússia Vladimir Putin iniciou uma guerra com a Ucrânia. Dor, raiva e vergonha – estas três palavras refletem os nossos sentimentos sobre os eventos…” “Nós, jornalistas dos media independentes russos, declaramos que somos contra a condução da guerra pela liderança da Rússia. Prometemos narrar honestamente esses eventos, enquanto pudermos. Desejamos força e determinação ao povo da Ucrânia que resiste à agressão, e a todos os russos que tentam resistir a esta loucura militarista“(4).

 Na opinião pública o sentimento de impotência expressa-se justamente revoltado contra a invasão ordenada por Putin. Erich Kästner adverte:  “Lembra-te da pergunta daquela criança: o que é que o vento faz quando não sopra?… Quem se atreve a opor-se aos comboios trovejantes?… Aquele que não pergunta continua burro…. É a partir das perguntas que emerge o que resta”. Destas ideias se poderia concluir que quando se está contente com a resposta e se deixa de perguntar, então passa-se ao estado de burro.

De uma maneira geral em vez de nos empenharmos pela causa da paz continua-se nos Media a dificultar formar-se uma ideia justa sobre o que tem acontecido e está a acontecer na vítima Ucrânia. A intervenção militar da Rússia e o processo em via na Ucrânia dificultam a formação de uma opinião justa e equilibrada, aquela que seria propícia para a paz. A guerra quebra com a razão, tirando a razão a Putin e ofuscando a opinião dos que não têm interesse em perceber o envolvimento no terreno (tornado Cavalo Troiano) das actividade da Rússia e da NATO, a partir dos anos 90; só a partir daí se pode chegar a conclusões que levem a soluções imparciais e duradouras. Uma argumentação que certifica a opinião dos que se encontram do lado certo traz já no seu germe também a guerra! Senão olhe-se para a situação na Ucrânia e para os meios de comunicação social. A opinião pública passou dezenas de anos virando o olhar do que acontecia na Ucrânia para agora lavarem as mãos declarando Putin de louco sem contarem o que contribuímos para ele chegar a este estado de loucura. Guerras só se evitam à mesa das conversações mediante compromissos. Não há possível compromisso que satisfaça plenamente as partes e quem não nota isto deveria voltar para a escola, para a escola da vida!

No sentido de uma paz duradoura na Europa, seria um erro crasso termos uma Rússia encurralada; a solução seria a Ucrânia tornar-se uma República Federal da Ucrânia neutra, à imagem da Suiça (ou da Suécia). De desejar seria uma Ucrânia com uma sociedade equilibrada adversa ao capitalismo bárbaro e oligárquico e ao centralismo escravizante estalinista. Para evitar o sacrifício da Ucrânia, ou fazer dela uma zona de disputas entre o Oriente e o Ocidente há que considerar, o conflito dos interesses geoestratégicos da Rússia-NATO-China evitando que a Ucrânia na Europa seja colocada na posição de uma nova Cuba: de um lado os países capitalistas e do outro os países do comunismo oligárquico. Agora seria o momento de pôr em acção a razão na mesa das conversações e haja um esforço por parte da Europa para que se reconheça uma República Federal Ucraniana, doutro modo a Europa, com a sua política, estará a implementar a união dos blocos comunistas e a preparar a próxima tragédia que será Taiwan que até hoje na Europa só foi reconhecida pelo Vaticano e pela Macedónia!  Na hora dos grandes é preciso salvar os pequenos para que não se tornem vítimas dos tentáculos dos grandes polvos! No meio de tudo isto assiste-se a campanhas de desinformação e quem sofre é o mexilhão que sofre com a irresponsabilidade de uma Europa que em vez de olhar pelos próprios interesses e por garantir a paz, está a comprometer a própria população civil e a da Ucrânia.

Uma política de perspectiva europeia   poderia, com o tempo, levar parte da Rússia a integrar-se numa Europa com objectivos comuns. A humildade e a modéstia seriam a virtude a solicitar-se a Putin e a todos os que contribuíram para a guerra (Ver Ucrânia Cavalo de Troia: https://antonio-justo.eu/?p=7116 .

A Nato e a Rússia têm jogado na Ucrânia não em defesa de uma Ucrânia unida, mas na defesa dos próprios interesses. A Ucrânia só precisa da autorização (auto-empoderamento) da NATO e da Rússia para iniciar uma política de união nacional federal; que faz a Europa nesse sentido? Esperar que a Rússia se una definitivamente à China?  (Chegou a hora do ajuste de contas: https://antonio-justo.eu/?p=7129 ).  A liberdade de opção é um bom argumento, o problema é não vivermos sozinhos no mundo!

Urge parar toda a violência para evitar novas ondas de sofrimento. Seria autoengano pensar que escapando à dor se evitaria o sofrimento!… A questão a pôr será se o que se faz é para o bem de todos!

© António da cunha Duarte Justo

Pegadas do Tempo

(1)  Reforço das forças armadas: https://www.welt.de/politik/bundestagswahl/article234668682/Ampel-will-bereits-geplante-Aufstockung-der-Bundeswehr-stoppen.html

(2) Der Tagesspiegel https://www.tagesspiegel.de/politik/ist-unsere-pflicht-die-ukraine-zu-unterstuetzen-deutschland-liefert-jetzt-doch-direkt-waffen-an-die-ukraine/28110020.htm

(3) https://taz.de/Nato-Gipfel-in-Warschau/!5317179/

(4) In The Moskow Times” https://www.themoscowtimes.com/2022/02/24/russian-celebrities-academics-journalists-speak-out-against-ukraine-war-a76565

PS: O facto aqui apelar ao diálogo e ao compromisso, não quer isto dizer que se desqualifique quem tem a sua opinião formada num sentido ou noutro. Sem soldados não se faz a guerra e quando há guerra justifica-se a existência de soldados; o maior problema é que quem morre é a juventude feita soldado e quem mais sofre é o povo. Por todo o lado se levanta o povo em manifestações contra Putin, outros rezam, outros põem a voz dos sinos a rebate duas vezes ao dia. Juntemo-nos todos solidários com o povo ucraniano na defesa de quem é vítima