IGREJA EM DERROCADA NA ALEMANHA

A politização do Discurso religioso falsifica os seus Conteúdos e viola a Fé

Na Alemanha, 522.821 fiéis abandonaram a Igreja Católica, em 2022, conforme relatado da Conferência Episcopal Alemã (DBK) e no mesmo ano abandonaram a Igreja Evangélica 380.000 protestantes. De notar que em 1979 49% dos alemães eram evangélicos, hoje são 21%. A declaração de abandono da igreja não ocorre na própria igreja; é declarada à cidade ou município de residência (por causa do imposto) sem precisar de fundamentação.

Actualmente a Igreja Católica conta com 21,6 milhões de membros registados e a Evangélica com 19,73 milhões, numa população alemã de 83,1 milhões em 2022. Do total de 83,1 milhões, 59,278 milhões são sem histórico migratório (1) e 23,825 milhões com histórico de migração (2), o que corresponde a uma parcela de 28,7% da população total.

A Igreja Católica e a Igreja Protestante empregam cerca de 1,8 milhão de pessoas e cerca de 1,3 milhão delas trabalham nas duas instituições de caridade: Diaconia e Caritas!

Entre os factores que contribuem para a diminuição dos cristãos na Alemanha contam-se: a obrigação dos membros da igreja pagarem imposto (entre 8 e 9%) para a igreja (3) , a politização do discurso religioso, o escândalo dado por padres pedófilos; a secularização, o individualismo e a luta cultural contra o cristianismo propagada por ideologias,  agendas, ONGs e por forças globalistas interessadas em criar uma nova ordem mundial que vê no cultivo do humanismo e dos biótopos culturais um obstáculo à centralização do poder que aspira à criação de um humano de caracter meramente funcional para poder ser mais facilmente governável e entretido por valores em torno da subsistência no dia-a-dia.

Segundo a Igreja Católica em Fulda as razões da desvinculação devem-se sobretudo ao ” fenómeno social geral que está diminuindo as forças vinculantes de grupos, forças e iniciativas relevantes”, isso afeta tanto as igrejas, como partidos e associações. “Além disso, há uma crescente secularização da sociedade, bem como conflitos internos da igreja e uma contínua perda de confiança em conexão com o processamento de abuso de poder e violência sexualizada”. Depois de uma propagação anti cultura e anti instituições precisamos de “uma nova cultura de união… rumo a uma igreja inclusiva em diálogo com a diversidade de seus membros e da sociedade secular”. Como consequência concomitante, também é preciso adaptar as estruturas da igreja nacional ao menor número de membros e dinheiros.

A diminuição dos membros das confissões católica e protestante e correspondente diminuição das receitas dos impostos implica consequências muito graves para a sociedade alemã. A rede especial de pontos de contacto e de serviço das igrejas, desde o trabalho comunitário com todas as gerações até ofertas de trabalho social diaconal e hospitais, escolas, ajuda a refugiados e creches, é insubstituível. Com a perda das igrejas, perde-se um importante pilar humano da nossa sociedade. A jornalista Katja Rudolph adverte que a “nossa sociedade continuará a precisar de uma posição ética equilibrada em muitos debates no futuro. Apenas uma igreja que tenha uma base significativa ainda será ouvida aqui”. Merece nota de registo constatar-se que mesmo aqueles que não estão ligados a igrejas frequentemente manifestam grandes exigências com respeito a eles. Segundo os resultados do inquérito da NDR sobre os motivos de saída, cerca de 62% dos entrevistados disseram ter diferenças ideias dos da igreja e 51% referiram os casos de abuso na igreja como razão para deixar a igreja.

Especialmente na Alemanha observa-se uma luta na Igreja Católica entre bispos conservadores e bispos progressistas na discussão sobre a renovação da Igreja e também entre leigos e bispos no Caminho Sinodal, onde a discussão é muito cerebral e política. O fator demográfico também desempenha um papel relevante e o espírito alemão mais inclinado para as teorias cerebrais (crenças) do que para as questões do coração (fé) sente-se estimulado mais a dividir que a unir! Assim uma sociedade totalmente dominada pelo discurso político-secular faz com que as igrejas percam sua importância. Por isso os esforços de reforma pouco ajudarão. Não são apenas as demissões ativas que desempenham um papel, mas também os casos de eutanásia. Por outro lado, há batismos e reentradas pelo lado positivo.

Andamos todos comprometidos na procura das melhores e mais acertadas ideias para resolver os grandes desafios sociopolíticos. Isto pressupõe maior abertura a pluralismo de ideias e métodos e a prontidão para uma atitude de inclusão e abertura à interdisciplinaridade e ter a coragem de dizer não à unilateralidade de equacionar a sociedade só em termos políticos e de sistemas lógicos, mas unilaterais.

Apesar de tudo não há razões para desesperar! A razão acompanha as pessoas de fé. A nossa cultura que agora se encontra em perigo devido às ideologias e guerras dos dois últimos séculos reconhecerá um dia que para subsistir terá que redescobrir o seu tecto metafísico judaico cristão e os seus alicerces greco-romanos da filosofa do direito e da administração sempre numa atitude de sociedade peregrina, tal como a Igreja. Só a virtude envolve o agir integral da pessoa humana; o resto são ideologias acompanhantes ao serviço do tempo e dos que se aproveitam dele.

 

António CD Justo

Pegadas do Tempo

(1) Em 20 de abril de 2023:  https://www.destatis.de/DE/Themen/Gesellschaft-Umwelt/Bevoelkerung/Migration-Integration/Tabellen/migrationshintergrund-geschlecht-insgesamt.html

Com fundo migratório em 2005 eram 14,421 milhões e 23,825 milhões em 2022. A população estrangeira na Alemanha de 2015 a 2022 foi de 13,4 milhões. O número de “estrangeiros” – ou seja, residentes sem cidadania alemã em 2021 situava-se entre 10,6 e 11,8 milhões.

(2) https://www.destatis.de/DE/Themen/Gesellschaft-Umwelt/Bevoelkerung/Migration-Integration/Tabellen/auslaendische-bevoelkerung-staatsangehoerigkeit-jahre.html

(3) Muitos imigrantes não acham muito católico terem de pagar imposto para a Igreja: https://antonio-justo.eu/?p=3105

REVELAÇÃO DOS DIABOS!

O Diabo disse-me há dias que, embora seja ele o mestre da confusão nos reinos inferiores, se sente sobrecarregado com as andanças na sociedade; o emaranhado da confusão em voga nas populações já é tanta que já nem ele lhe dá vazão, encontrando-se também ele em risco de perder a supervisão!

Num momento de bom senso confidenciou-me que governantes e meios de comunicação social sejam mais moderados porque ele trabalha a longo prazo e embora o actual negócio lhe agrade, receia que, no meio de tanta confusão, se pode virar o feitiço contra o feiticeiro!

Pelos vistos o maioral Belzebu (Satanás) trabalha tanto nos andares superiores da sociedade que o pobre Diabo se vê às aranhas para consolar as vítimas da confusão acumulada cá em baixo!

Depois de ouvir tanta lamúria dei-lhe o conselho de fazer um pouco de férias e certamente nesse intervalo os ares telúricos tornar-se-ão menos poluentes e os mortais dar-lhe-ão mais tempo para que logre fazer o seu trabalho sem stresse. Doutro modo passa também ele de dirigente para dirigido e o resultado de tanta confusão será, também para ele, ficar tudo perdido!!!

António CD Justo

Pegadas do Tempo

SOBRE O GÉNIO OCIDENTAL DE CARACTER CAPITALISTA E O GÉNIO ORIENTAL DE CARACTER COMUNISTA

Das formas do Pensamento Linear e do Pensamento Circular para o Pensamento Espiral

Para melhor compreendermos a razão de sermos como somos e de outros serem como são torna-se importante analisar-se as estruturas de pensamento próprias de cada cultura que se expressa em mentalidades distintas. Daí a importância de se distinguir os conteúdos dos embrulhos em que somos formatados. A tradição de “pensamento ocidental” e a de “pensamento oriental” apresentam conotações diferentes, mas encontram-se desde sempre numa relação de osmose e de aprendizagem comum tal como acontece com o indivíduo em relação ao seu meio ambiente. Naturalmente também há características diferentes que se afirmam comuns em filósofos e pensadores das duas vertentes. Há que prestar atenção para se não ser levado pelo preconceito capitalista nem pelo socialista.

A tradição ocidental de caracter mais “secular” enfatiza a lógica, a racionalidade e a análise numa visão dualista concentrada na observação da realidade usando, para isso,  o processo da distinção que conduz à individuação, à definição do particular, do elemento, do indivíduo. A tradição oriental, por seu lado, enfatiza o caracter religioso dando maior destaque à intuição, contemplação e busca do conhecimento interior numa visão mais monista de interação das coisas como meras manifestações de uma única substância ou realidade.

Assim, para se compreender as diferenças de mundivisões e políticas do Ocidente e do Oriente terá de se ter em conta que o ocidente é mais individualista e o oriente mais colectivista; no Ocidente, especialmente a partir do renascimento e da reforma deixa-se de valorizar a comunidade para se acentuar a autonomia do indivíduo, os seus direitos e sucesso pessoal a que corresponde, no âmbito económico à criação do capitalismo, enquanto o pensamento do Oriente de mentalidade mais centrada no coletivo, na comunidade e nas relações interpessoais acentua o socialismo.

No que respeita ao moldar o tempo e a vida social, o Ocidente sente-se impulsionado pela linha linear de progresso, cuja aceleração lhe tem dado a hegemonia sobre o mundo, mas pela lógica a velocidade da aceleração chegará a um aceleramento que gripa o desenvolvimento da sociedade; daí o caminharmos no sentido de um beco sem saída. Por seu lado o pensamento oriental no que toca à moldagem do tempo está mais preocupado em dar forma ao momento presente correndo o perigo de se repetir numa circularidade que faz lembrar as estações do ano e que não dá resposta à evolução. Deste modo estaciona sem se preocupar com o desenvolvimento social (recorde-se os ciclos fechados das castas). Se o Ocidente exagera ao focalizar-se no progresso, o Oriente exagera ao fixar-se no viver o momento presente repetitivo e como tal circular descurando o aspecto linear do desenvolvimento. (É interessante verificar que enquanto no oriente um guru se apresenta como o ideal acabado, no ocidente o sacerdote permanece em peregrinação com o fiel a caminho da Realidade que é  Deus). Estamos numa época da história que se encontra nas dores de parto e talvez estrebuche ainda pelo facto de nos encontrarmos historicamente no final de duas mundivisões que se combatiam para passarmos a uma visão integral,  já não unilateralmente dualista nem monista, e entrarmos numa fase inclusiva que se expressará numa mundivisão mística que une a razão mental à razão do coração de que falava o grande filósofo e matemático Blaise Pascal.

O facto de o cristianismo e com ele o Ocidente adoptarem uma tradição linear ascendente fez com que o Ocidente se tornasse num condutor da história até à actualidade; outras sociedades de caracter monista mantiveram-se num caminhar repetitivo de recorrência de eventos; a deficiência do leste foi a negligência do aspecto da linearidade do tempo e com ele do progresso; a deficiência do ocidente vem do descuido da alma e a consequente decadência cultural, dado toda a civilização precisar de um tecto metafísico consistente que lhe proporcione sustentabilidade; a fixação na materialidade e no mecanicismo tem levado o ocidente a esgotar as suas forças na perspectiva económica e militar como garantes de domínio e de futuro e imperceptivelmente conduzir à implosão de uma cultura cuja sustentabilidade assentava na dignidade da pessoa humana.

Na Europa a ideia progressista já não convence; é unilateral e torna-se inutilizável ao gerar filhos deserdados a sentir-se cada vez mais estranhos na própria terra. Tudo tem um limite e aproxima-se o tempo de se voltar às origens e implementar a perspectiva holística que responda ao desenvolvimento integral da pessoa e da sociedade. Encontramo-nos num momento axial da História humana em que as camadas de consciência social mais desenvolvida aspiram a um novo layout de sociedade de caracter mais integral humano num processo de acentuar mais relações de complementaridade e menos de polaridade (apesar do estúpido conflito geoestratégico – extrema manifestação de polaridades –  entre a OTAN e a Federação russa a desenrolar-se na Ucrânia) ; torna-se adequada uma mudança de paradigma para o Ocidente e para o Oriente numa opção de matriz civilizacional e social comum que una o pensamento linear (de desenvolvimento-evolução  pessoal a caminho da ressurreição) ao pensamento circular (do retorno no carma da reincarnação) num modelo espiral que inclua o retorno e o totalmente novo (em linguagem teológica cristã, a concretização do Cristo Cósmico). Neste sentido encontra-se na fórmula trinitária da tradição cristã o modelo/fórmula da Realidade e como tal conciliador; nele se junta a linearidade temporal (a dualidade) ao caracter circular (monismo) oriental num holismo espiritual! Este poderia ser o caminho a redescobrir pela civilização ocidental para que não desapareça no bulício de tentáculos económico-militares à rebeldia de qualquer desenvolvimento orgânico.

No que diz respeito à gerência do tempo (tempo histórico), quer o Ocidente quer o Oriente, terão oportunidade de ir integrando de forma inclusiva as concepções de tempo Cronos e de tempo Cairós. A visão do tempo Cronos (tempo cronológico, sequencial, – tempo físico dos humanos) é limitadora amarrando-nos ao calendário: séculos, anos, meses, dias, horas, etc (1). A concepção do tempo Cronos (de caracter secular ocidental) deveria ser complementada/superada pela concepção do tempo Cairós (tempo de Deus, “tempo da graça” Efésios 5:15-16, que é o “momento certo” do acontecer especial que não se mede e é ao mesmo tempo pessoal e universal).

A actual acentuação do Ocidente no “viver o momento presente” tem a sua importância numa sociedade estressada pela ideia de ser forçada a progredir numa noção de tempo linear secularizado e por isso agir como mera reacção autómata de busca, numa forma de viver mais característico oriental (meditação e práticas de joga), mas sem a compreender. Buscadores deslocados de espiritualidade, correm o perigo de negligenciarem o aspecto linear do desenvolvimento no tempo (próprio do arquétipo ocidental) num arquétipo oriental correndo o perigo de vir a cair numa atitude de vida comparada à roda de hamster e deste modo tornarem-se em vítimas das rodas das duas civilizações. Os admiradores orientais da civilização ocidental correm por sua vez também o perigo de se autodestruírem pelo facto de contactarem sobretudo a vertente superficial da cultura ocidental (aquilo que de momento lhe dá brilho, mas não deixa de ser decadente). Assertório seria se o corpo e a alma do ocidente se encontrassem com o corpo e a alma do oriente numa de complementaridades.

Devido às vantagens e desvantagens de cada sistema de pensamento (mundivisões monismo e dualismo) será sempre um assunto actual pois sempre discutido por crenças individuais e por posições filosóficas ao longo da história. “Nada de novo sob o Sol”!

O espírito do nosso tempo (Zeitgeist) desumaniza-se a olhos vistos encontrando-se no beco sem saída do materialismo e do pragmatismo utilitário que conduz à satisfação das necessidades básicas primárias de tipo egoísta ignorando as necessidades espirituais; isto leva pessoas espirituais e sensíveis (culturalmente desorientadas devido à monopolização política do discurso público) a procurar orientação espiritual em representantes de espiritualidades asiáticas (lamas e gurus). A procura é salutar, mas como condicionada pelo ambiente busca orientação em categorias monistas materialistas de caracter oriental que sustentam que a matéria física é a substância fundamental que contem em si o seu princípio e o seu fim. Num primeiro contacto, encontram aí resposta a um idealismo individualista que se projecta no idealismo oriental que, por sua vez, sustenta que a mente ou a consciência é a substância fundamental. Deste modo o idealismo ocidental encontra a sua morte na procura de resolução do problema que ele mesmo criou exteriorizando-se a si mesmo e agora indaga fora dele; de facto, na generalidade, a opinião pública ocidental é dominada pelo polo exterior lineal dele e encontrando-se agora no desconhecimento da sua interioridade procura consolo   no imanentismo monista asiático como que numa atitude de autopunição (pelo exagero da sua afirmação da individualidade contra a comunidade) e dissolução do indivíduo na mera gota do grande oceano de uma mística onde acaba toda e qualquer distinção. Pelo que se observa de currículos destes buscadores ocidentais de espiritualidade no budismo e no induísmo, constata-se que os mais autênticos consigo mesmos redescobrem no seu currículo o cristianismo ou uma forma profunda de humanismo que se encontra no arquétipo cristão europeu.

O ideário ocidental em vez de desembocar no ideal oriental (como parece querer o globalismo político-económico) deveria optar por uma visão espiral que daria solução aos dois ideais (linear e circular) e não incorreria no perigo da renuncia a si mesmo e deixar enterrar-se na vala asiática comum anónima e imanentista como parecem querer os promotores do Zeitgeist (O ego exacerbado em vez de procurar resposta na própria comunidade peregrina, vagueia, caindo na contradição de ao tanto querer afirmar-se vir a dissolver-se no nada através do condicionamento da mente ou num estado fora dos ventos dos desejos). Deste modo assiste-se a uma autopunição do ocidente que abusou de tal modo do processo da individuação (do eu contra o nós, na dicotomia corpo-alma, corpo-mente) que desatinado sente uma inclinação fatal para o autoapagamento total do seu espírito original, uma tendência para a morte (tanatofilia) e não para a vida. A natureza da realidade e da existência só terão realização perfeita se conseguirem manter nelas o sentido da vida e uma vocação que o concretize num caminhar comum de respeito e espírito de complementaridade. Doutro modo continuaremos: uns à procura da alma matando o corpo e outros à procura do corpo matando a alma! Há que salvar corpo e alma juntos!

Para se criar uma cultura de paz seria lógico criar-se laços de irmandade entre as religiões monoteístas e o panteísmo do taoismo e do hinduísmo afirmando-se um panenteísmo de Deus ontologicamente separado do mundo, mas em que o mundo se encontra em Deus à imagem de Jesus em Cristo.

Na elaboração de uma matriz humana da paz seja de notar que a tradição ocidental tem muito de comum com a tradição oriental sobretudo na sua expressão religiosa. A nível religioso e místico,  a sociedade  ocidental supera o dualismo grego da existência de  duas substâncias separadas ou categorias fundamentais e independentes (dualismo mente-corpo, alma-corpo, modelo ainda próprio da política)  através da fórmula trinitária (3) como equação da Realidade e da realidade aplicada (aquilo a que os alemães dão o nome de Wirklichkeit) e se expressaria em termos de linguagem e de discurso numa passagem da matriz do diálogo para a do trílogo. Deste modo se superaria um certo dualismo entre Realität e Wirklichkeit como se pode ver já plasmado nos inícios bíblicos quando se afirma “no princípio era a Palavra, a informação… e a Palavra se tornou carne…”. Isto é, em Jesus Cristo unem-se as dicotomias carne-espírito de forma a ele tornar-se num modelo de Realidade e realidade aplicada numa mesma pessoa e de modo a dar perspectiva ascendente à própria matéria no Cristo cósmico. Em vez de ficarmos presos a um dualismo alternativo integramos a forma existência dualística num dualismo de interação e integrado na divindade (prototipicamente o Jesus e o Cristo não são duas entidades distintas embora o Jesus e o Cristo se expressem dentro da Realidade numa só pessoa de maneiras diferentes. A divindade estaria como a Realidade sustentadora das três pessoas divinas e nelas também todo o existente/criado.

No desenvolvimento histórico individual e cultural, o pensamento ocidental secular tende a ver a ipseidade, a ideia da pessoa, como identidade individual e separada, enquanto o pensamento oriental tende a focar a ideia de pessoa como parte de um todo maior ou entidade para lá da pessoa. Estas distinções não são absolutas e existem muitas nuances e variações. Portanto, é de aconselhável considerar cada filosofia ou tradição individual no contexto de suas doutrinas e desenvolvimentos específicos, em vez de reduzi-las a uma única categorização. O Cristo cósmico como arquétipo (e a fórmula trinitária) seria para o humano ocidental e não só, independentemente de ser religiosamente crente ou não, a resposta a todo o seu ideal e desenvolvimento material e espiritual incardinado na civilização, humanidade e universo.

O cristianismo ao deixar-se levar pelas estruturas patriarcais tem descurado  o velho saber da natureza de Cristo “do Cristo Cósmico, o ‘padrão de conexão’ de todos os átomos e galáxias do universo, o tecido do amor divino e da justiça inerente a todas as criaturas e seres humanos”(2) e por isso a instituição eclesial se encontra hoje em crise, tal como a depressiva civilização ocidental, sua expressão física. Jesus Cristo, Deus-homem, espírito-matéria é a realidade modelo que unirá o género humano com crenças, idealismos e misticismos que serão avaliados pelas suas obras:”Pelos seus frutos os conhecereis”, aconselhou Jesus. Depois de séculos de secularização do Cristianismo, seria chegada a hora de o redescobrir e assim se redescobrir o sagrado na natureza e na humanidade. A criação é obra sagrada de Deus. Uma das perspectivas do caminho para o cristianismo seria redescobrir a visão espiritual da praxis mística e da consciência cósmica das origens. A visão de um Cristo cósmico presente em todas as criaturas e culturas insufladas pelo Paráclito é um luzeiro que poderá mover o humano a descobrir-se no seu protótipo. A decadência da espiritualidade das religiões vai à frente da decadência humana e das civilizações: Primeiro despede-se a alma, depois enterra-se o corpo. Isto acontece de maneira imperceptível porque a concentração no ego e no imediato leva o humano a ignorar o mal e quem nega o mal fortalece-o.  A sociedade de estruturas patriarcais impôs-se contra uma visão holista substituindo a espiritualidade e a mística pela moralização (moral de caracter pedagógico). Deste modo desmiolaram a essência da própria civilização exteriorizando-se num processo de alienação contínua de modo a gerar uma sociedade dirigida por poderosos que assentam as suas estruturas de poder apenas na economia, no moralismo e nas leis. O cristianismo esconde a sua mensagem para a pessoa e para o mundo sempre que descura a mística original liquidificada em ritos, por vezes, reduzidos a meras palavras ou sentimentos ocasionais. O fundador da psicologia analítica, Carl Gustav Jung diz que “somente o místico é religiosamente criativo”!

Se analisarmos o desenvolver histórico dos povos do Ocidente e do Oriente podemos concluir que, atendendo às obras e práticas sociais que causam nem uns nem outros são satisfatórios. Tanto o pensamento de caracter linear de uns como o pensamento circular dos outros se revelam como forma desajustada para a orientação da vida e dos povos. Resta-nos uma terceira via alternativa comum (Pensamento Espiral) que uniria uns e outros e seria a via mística, a via do coração que integra também a razão como advogava Pascal. “Uma civilização sem uma cosmologia não apenas se torna cosmicamente violenta, mas também cosmicamente solitária e deprimida”(2).

António da Cunha Duarte Justo

Teólogo e Pedagogo

Pegadas do Tempo: https://antonio-justo.eu/?p=8615

(1) “Tudo tem o seu tempo determinado, e há tempo para todo propósito debaixo do céu.” Eclesiastes 3:1.

(2) Matthew Fox em “Visão do Cristo Cósmico”, pag. 12 e 19.

(3)  https://antonio-justo.eu/?p=8580 

OS SALESIANOS APOIAM AS VÍTIMAS DA GUERRA E DO TERRAMOTO EM ALEPPO SÍRIA

 

Os salesianos de Don Bosco permaneceram em Aleppo durante a guerra e durante o terremoto (1) fazendo de Aleppo um oásis para 800 crianças.

O Centro Juvenil Don Bosco de Aleppo também foi um pouco danificado pelo terremoto e agora é o ponto de contato para quem busca ajuda. Mais de 750 pessoas recebem alimentos, assistência médica, cobertores e um lugar para dormir, como informa a revista alemã Dom Bosco (2/2023).

A situação é catastrófica. No início da guerra, em 2011, trocavam-se 50 liras sírias por um dólar americano e hoje   um dólar americano custa 7.000 liras sírias, a precaridade é tanta  que nem mesmo os alimentos básicos são acessíveis. O relatório do Programa Mundial de Alimentos (PAM) refere que 12,4 milhões de pessoas na Síria, ou seja, 60% da população, passam fome. A situação é extremamente dolorosa principalmente para as crianças; muitas escolas foram destruídas e muitos professores foram levados para o exterior. Do centro salesiano fazia também parte uma escola que foi nacionalizada na década de 1960. Os salesianos esperam do governo a recuperação da sua escola. O Centro Salesiano é um importante foco para a vida cristã em Aleppo.

O padre Gaurie, diretor do centro, diz “nós, Salesianos, estamos empenhados em manter os jovens na Síria”.

De facto, as potências ricas comportam-se como se comportavam os povos colonizadores de outrora, só que de maneira eufemística. Antes traziam os escravos e as mercadorias, hoje trazem os jovens e as riquezas naturais de África. Hoje fala-se muito dos colonizadores de outrora para se fazer esquecer que os mesmos continuam a explorar desumanamente os nativos. Como a política não fala disto o problema é considerado não existir.

Com a sua política de asilo, a União Europeia diz pretender reparar uma política em que se encontra irresponsavelmente envolvida. As potências geoestratégicas em vez de promoverem a paz e investirem na economia de África preferem explorar as matérias-primas de África para importar esta riqueza e ao mesmo tempo importar as pessoas que são vítimas da política mundial e que, como imigrantes,  contribuem para compensar a baixa taxa de natalidade europeia e para aumentar a competição no mercado de trabalho.

António CD Justo

Pegadas do Tempo

(1) A Dor não tem Fronteiras: https://antonio-justo.eu/?p=8293