CULTURA DA RECORDAÇÃO – LEMBRANÇA DO HOLOCAUSTO

É injusta a sociedade que só comemora os heróis

António Justo
Ontem, 27.01- Dia Internacional da Lembrança do Holocausto – o parlamento alemão dedicou uma hora comemorativa às vítimas do socialismo nazi. Em Buchenwald também houve um evento comemorativo. Também foram lembradas as vítimas nos campos de concentração de Auschwitz (Polónia) e Theresienstadt (Chéquia).

Sempre admirei na Alemanha a cultura da memória; não recalca nem faz por esquecer as partes sombrias da sua história para assim manter viva a consci^^encia do perigo de violação da dignidade humana. Numa sociedade adulta, a lembrança não só dos heróis mas também das vítimas e dos humildes não prescrevem com o tempo. Quem recorda apenas os heróis prolonga o culto mas não desenvolve a cultura.
Sem uma cultura da recordação torna-se mais fácil justificar actos de desumanidade que se encontram sempre latentes em cada pessoa e em cada sociedade. Num tempo em que um nacionalismo exagerado se espalha é importante lembrar-se que das palavras se passa às obras e palavras da violência e da segregação se transformam facilmente em armas.

Os factos

A 27.01.1945 soldados das brigadas vermelhas libertaram 7.500 prisioneiros sobreviventes de Auschwitz-Birkenau.

Até à libertação, através dos americanos em 11.04.1945, o regime nazi tinha deportado 250.000 pessoas de 36 países para Buchenwald. Cerca de 56.000 morreram de fome, frio, ou na sequência de trabalhos forçados e outros foram assassinados em experimentações médicas ou morreram nas marchas da morte. 21.000 conseguiram a libertação.

De 1946 até 1950, as tropas da ocupação soviética usaram este campo de concentração para 28.000 funcionários nazis e mais tarde também para denunciados e anticomunistas; cerca de 7.100 morreram (HNA 28.01).

De lamentar é o facto de tais celebrações serem, por vezes, usadas para atacar alguém ou alguma organização.

Uma sociedade que só comemora os seus heróis é injusta. Sofreria de cinismo uma sociedade que recordasse apenas as vítimas do nazismo e recalcasse as vítimas do estalinismo. É imoral um regime que mistifica os seus actos e eleva as suas virtudes à custa da afirmação dos defeitos dos outros.
©António da Cunha Duarte Justo
Pegadas do Tempo

TRUMP UM INCÓMODO PARA A ESQUERDA E UMA INSEGURANÇA PARA A DIREITA

Trump mete medo às elites do poder favorecidas pela unidade de opinião

António Justo
São mais as vozes que as nozes! O discurso de Trump abriu-nos uma panorâmica a preto e branco! Assistimos ao irromper de uma era histórica da privatização e emocionalização da política e ao bulevardismo do poder mediático.

O que está em jogo?

Trump manifestou-se contra as elites que vivem encostadas ao Estado, quer iniciar o proteccionismo económico e assim opor-se principalmente à concorrência chinesa, não pretende a guerra fria com a Rússia,quer responsabilizar mais os membros da Nato, quer destruir as bases do “Estado Islâmico „na Síria e no Iraque, põe em questão a causa das alterações climáticas, é contra a imigração ilegal, considera o islão como “potencial de risco” querendo proibir a imigração de muçulmanos, é também contra o aborto e contra o casamento homossexual que hoje são legais nos EUA.

De momento encontram-se dois poderes em luta na opinião pública: a dos que defendem os interesses do estabelecimento político e a dos que alegam a defesa do povo mais precário ou em derrocada: num extremo os que vivem melhor da ideologia e no outro os que vivem pior do trabalho.

Contra uma cultura da abertura que favorece as culturas fechadas

Os EUA são de todos: de republicanos e de democratas; a Europa é de todos: de conservadores e de progressistas, de religiosos e ateus; neste contexto é óbvia a moderação e o equilíbrio e o reconhecimento da intercultura provocada pela imigração que vai mudando o rosto americano.

O trunfo Trump assusta principalmente as elites que vivem em torno do poder estabelecido habituado à unidade de opinião pública de timbre vermelho e numa política do continue-se assim! Uma grande parte da população na América e na Europa não têm nada a perder, pelo que, qualquer experimentação no palco da política não a levará a pior.

Os apoiantes de Trump, tal como parte do povo europeu, contesta a prática política de uma cultura aberta desenfreada que tem beneficiado a afirmação das culturas fechadas (privilegiando mesmo a formação de guetos com mais força de organização e afirmação do que o povo precário nativo) e consequentemente o ressurgir do proteccionismo e do nacionalismo. A Europa tem fomentado a abertura da própria cultura e a formação de guetos cerrados no seu meio: uma contradição!

Esta onda irrita de sobremaneira uma certa elite do poder europeu que tinha apostado na desestabilização económica da classe média e da própria cultura em favor da globalização e do rejuvenescimento social através da imigração e da afirmação do islão, mais adequado à execução da sua ideologia e interesses.

Compromisso: Primeiro América e os americanos

O aparecimento súbito de um homem representante de valores machistas a dizer “Primeiro América e os americanos” desperta esperanças naquela parte da população que se sente há muito como alma penada da nação e como tal a sapata de um regime político que a leva a julgar-se estrangeira no próprio país. Segundo a revista Forbes nos últimos quarenta anos os salários dos gestores cresceu mil por cento e o dos trabalhadores onze por cento.

A vitalidade das nações pode medir-se pelo crescimento sustentável do seu pib (produto interno bruto). O crescimento do pib previsto para este ano nos USA é de 1,5% e na China é de 6,6 %. Isto mete medo a Trum que quer manter de maneira sustentável a economia norte-americana à frente do mundo sem pensar que os outros países também trabalham no seu sentido. Em 2016 o pib americano foi de 17,9 biliões de dólares e o pib da China foi de 10,9 biliões.

Nesta perspectiva a América não é Europa e a Nato também não; esta mensagem de Trump, aliada à intenção de proteccionismo económico, mete medo a uma UE habituada a viver encostada aos EUA e que se abriu tanto em nome do capitalismo e do socialismo liberal que se encontra mergulhada em problemas sem fim.

O proteccionismo da economia nacional e a introdução de direitos comerciais aduaneiros significaria o fim da globalização e prejudicaria sobretudo nações exportadoras como a Alemanha que são beneficiadas pela globalização.

Trump quer poupar na Nato para investir nas infraestruturas

Trump quer restringir a política externa e o planeamento militar e para isso reduzir os lugares de inserção e operações militares. Os EUA gastam com a defesa 600 mil milhões de dólares por ano (tanto como a China, a Rússia, o Reino Unido e a França juntos) e têm um exército com 1,5 milhões de empregados. A tesoura entre ricos e pobres é maior que noutros países industriais. O topo da população americana (0,1%) ganha em média seis milhões de euros por ano, enquanto 90% da população ganha em média apenas 33.000 dólares por ano. A expectativa de vida dos norte-americanos desceu há dois anos de 78,9 anos para 78,8. Vinte e nove milhões de norte-americanos não têm seguro de saúde; as infraestruturas do estado, estradas e electricidade, são piores que as europeias.

Enquanto os gastos com a Nato em 2016 corresponeram a 3,61% do pib dos EUA, na Alemanha corresponderam a 1,19%, na França a 1,78% e no Reino Unido a 2,21%. O objectivo da NATO combinado em 2002 para os seus membros tinha sido 2%.

Só a aragem de Trump talvez obrigue a Europa a unir-se e a estender a mão à Rússia, seu natural e vocacionado vizinho, se não quiser perder-se em gastos imensos de armamento.

Uma elite do poder renitente

O medo do terror dependurado no pescoço americano (desde11.11.2001) legitima o governo a tornar-se mais autoritário. Na Turquia que, se encontra perto e dentro da Europa, o fascismo e a ditadura afirmam-se sem manifestações públicas nem medidas da EU que considerem isso perigoso embora 60% dos turcos na Alemanha apoiem Erdogan.

O poder estabelecido treme já só em ouvir o soar da trompeta de Trump. Há muito a perder de um lado e talvez algo a ganhar do outro. Em democracia os interesses revezam-se no poder e, como a sociedade está dividida, reveza-se também na dor. Muitos cidadãos não se se dão bem com a bipolaridade da realidade colocando a verdade num só polo esquecendo que partido é parte e, como tal, representa apenas uma parte da verdade e dos interesses populacionais.

Independentemente dos Erros de Trump, é triste o facto de uma Europa com uma consciência política semelhante à das elites do partido democrático americano não se aproveitar da lição da eleição de Trump para se virar para o povo e analisar o que realmente faz de mal.

Do nosso lado temos a soberana dívida, o Brexit que questiona a EU e a que se soma uma taxa de desmprego nos paíse europeus horrenda de desemprego (de 23,1% a 7,6%: média europeia 9,8%), um capitalismo feroz que tomou conta da política e a crise dos refugiados.

Uma Europa aberta mas de patriotismo envergonhado e pródiga em relação ao esbanjamento de interesses económicos arma-se em tribunal da sociedade americana dividida que agora vê ganhar a parte instável em Trump. Em vez de análise da situação ouve-se por todo o lado uma indignação arrogante de uma opinião pública massificada que se arroga o direito do monopólio da interpretação, como se em democracia só tivesse uma facção razão e a verdade fosse determinada pelo barulho da rua ou dos Média. Trump não gosta dos jornalistas e os jornalistas não gostam dele. O poeta e dramaturgo Bertold Brecht (1898-1956) alertava para a cegueira do quotidiano e da opinião pública publicada dizendo: ”Não aceitem o habitual como coisa natural, pois em tempos de confusao organizada, de arbitrariedade consciente, de humanidade desumanizada, nada deve parecer natural. Nada deve parecer impossível de mudar”.

Talvez o exagero de Trump ajude a Europa a mais realismo e, com o tempo, a menos ideologia política de modo a poder voltar à Europa a política económica social de mercado e o respeito pelos interesses da sua população desprotegida ou mantida à mão da esmola do Estado. Esta, estruturalmente desdignificada e desonrada, cada vez se sente mais como peso morto num Estado sem sol para ela e que lhe não oferece perspectivas.

Islão como factor de risco

A eleição de Trump alerta também para o facto do preço da abertura da Europa ter sido proveitoso para as elites que participam do poder e prejudicial para a camada social desprotegida, com mais concorrência e mais negação da própria cultura em favor da árabe: esta dá-nos petróleo e imigrantes em troca da expansão da sua religião. Trump tocou também este ponto sensível ao considerar o islão como “potencial de risco” sem diferenciar entre islão como ordem social e muitos muçulmanos que a nível individual distinguem entre poder religioso e poder secular.

Temos uma classe política europeia cúmplice, crítica em relação ao cristianismo, fraudulenta no que toca ao futuro da juventude e implementadora do islão por razões económicas e estratégicas. Enigmático na política da EU, que se preocupa tanto com a defesa dos valores ocidentais permanece o facto de nunca um governo ocidental ter defendido os perseguidos cristãos nos países islâmicos e por outro lado os políticos virem para a praça pública dizer que o islão pertence à nação e que o sistema dos países islâmicos e o terrorismo islâmico não têm nada a ver com o islão. Em vez de se procurarem medidas para resolver os problemas de maneira equilibrada e bilateral, assiste-se também aqui a uma política semelhante à seguida nas dívidas soberanas que apenas se juntam e aumentam à custa da insegurança das gerações futuras. Nos USA há 5 milhões de muçulmanos, na Alemanha vivem 4,02 milhões.

Na hora dos malcomportados

Trump, tal como Costa em Portugal, conseguiu assumir ao governo embora o partido adversário tenha reunido mais votos (Clinton 61 milhões e Trump 60).

Nestas eleições reúnem-se os malcomportados: Trump que não respeita a classe dominante nem as minorias; Obama que vai contra a tradição fazendo um discurso de despedida contra o da tomada de posse de Trump e dirigido ao eleitorado dos democratas; na rua, vencidos revoltam-se contra vencedores como se não tivesse havido eleições; tudo isto parece dar vida à democracia que não quer ver todos os cidadãos reunidos debaixo das suas saias: ela vive da disputa de valores e interesses. Trump poder-se-ia vingar em parte do “estabelecimento político” que, há cinco anos, através de Obama, o humilhou publicamente. Tal atitude prejudicaria o restabelecimento da unidade nacional. Naturalmente Trump não governa sozinho; ele tem a seu lado instituições democráticas que o não deixam isolar-se.

Penso que o que está aqui em jogo é a volta dos nacionalismos e correspondentes proteccionismos dado também a política europeia das portas abertas ter falhado e ser um perigo para um continente dividido que não tem os mesmos pressupostos históricos nem a independência política que podem ter os EUA. Penso que a situação da esquerda e da direita é tão novelada em torno de um polo e do outro que, de momento, domina demasiadamente o medo e um espírito político carnavalesco.

Trump quer governar o mundo como se este pudesse ser governado tal como se gere uma empresa; neste sentido parece equacionar o mundo em termos de cálculo de custo e de utilidade (lucro). Por outro lado personaliza e privatiza a política conotando-a mais de povo. A um extremo seguido até agora segue-se talvez um outro, num movimento pendular de épocas, ideologias e tempos.

No reino das projecções e das sombras

A indignação exagerada ou uma fixação na crítica contra Trump ou contra outra personalidade pode ser indício de caracter fraco e correr o perigo de procurar e combater inconscientemente fora de si os defeitos que traz dentro de si e consequentemente vê-os (projecta-os) como sombras em Trump ou em alguém que odeia. Muitas das pessoas que odeiam deixam-se reduzir a meras portadoras de sombras. Exigem que os outros sejam exemplos de luz, portadores da luz que corresponde à sombra que não reconhecem em si mesmos. A América sempre serviu de espaço da sombra para a esquerda europeia e para os nacionalistas.

Este é um conceito de C.G. Jung que tudo o que não aceitamos (vícios) em nós, o oprimimos e banimos para as sombras que são o nosso inconsciente. Então inquieta-nos o que não queremos admitir em nós para o combatermos nos outros. Quando nos irritamos muito com algum defeito nos outros isso é um sinal de que esse defeito é algo que faz parte da nossa sombra invisível (combatemos fora os próprios defeitos oprimidos!).

No sentido do pensar positivo americano

Uma vantagem da América e da Rússia sobre a Europa na qualidade de povo e nação vem do facto de darem importância à religião cristã como factor de substrato nacional e de identificação. Trump é um aviso à esquerda materialista dominante na sociedade para que se torne mais humilde e não tão determinante e poder-se-ia tornar também num apelo aos americanos de cima para que se comportem de modo responsável para com os de baixo.

Concedamos-lhe 100 dias para governar e então saberemos mais! De resto, até agora, pelo que pude observar, Trump tem a vantagem de ser um homem igual a si mesmo! Quanto ao resto, os factos o dirão.
© António da Cunha Duarte Justo
Pegadas do Tempo,

FEDERAÇÃO TURCA SOB INVESTIGAÇÃO DE ESPIONAGEM NA ALEMANHA

O Ministério Público alemão investiga a Federação das Associações Turcas na Alemanha (Ditib) por razões de espionagem efectuada por chefes religiosos de várias mesquitas. Como relata a imprensa alemã, Ditib confirmou que Imame enviaram informações para o governo do déspota Erdogan sobre apoiantes do Pregador Gülen, rival de Erdogan a viver nos EUA, que Ankara considera inimigo público. Na Alemanha, 60% dos votantes turcos apoiaram Erdogan que pretende instalar o fascismo na Turquia. Ditib, que apresenta um rosto democrático para o exterior, é, na realidade, uma organização nacionalista. A Federação tem uma palavra a dizer no ensino religioso nas escolas de alguns estados alemães. O Ministério do culto turco de Ancara envia anualmente para a Alemanha 600 imames para as mesquitas. Esta é a melhor estratégia turca (aliada ao Gueto) para o impedimento da integração dos turcos na Alemanha e uma maneira de manter a lealdade política aos partidos da turquia.

A tática turca na Alemanha sempre se revelou muito inteligente e profícua no seu sentido. De facto, através das mesquitas controla o cidadão simples e com a conexão de interesses políticos através dos Conselhos de Estrangeiros nas comunas consegue uma boa rampa de lançamento para o seu pessoal politicamente mais consciente; muito dele serve-se do Conselho de Estrangeiros para apoiar financeiramente mesquitas através de associações de utilidade pública e para entrar também nas estruturas dos partidos alemães, especialmente Verdes, SPD e Die Linke e para gratuitamente estabelecer contactos e estratégias. Esta estratégia pude observá-la já nos anos 80 quando era porta-voz de um Conselho de Estrangeiros.

O Estado da Baixa Saxónia sai das negociações para estabelecimento de um contrato com as associações muçulmanas DITIB que regule o ensino da religião muçulmana e a pastoral nas instituições hospitalares, prisionais e serviços funerários. Fazem isto para fugirem à crítica pública em ano importante de eleições. Hamburgo e Bremen tem já contrato com Ditib que é uma federação dependente do governo turco. O problema nos imigrantes de cultura árabe vem principalmente das organizações muçulmanas (mesquitas) que no espírito do Corão fomentam o gueto e uma atitude anti-Ocidente. .
António da Cunha Duarte Justo
Pegadas do Tempo

PARA MELHOR SE COMPREENDER O PERÍODO NEGRO DA VIDA NACIONAL

Uma opinião pública açamada e condicionada aos interesses subterrâneos de certos interesses políticos e económicos acoitados desde as caves do Estado até ao seu tecto, continua a confundir a sociedade portuguesa de tal modo que esta, para se sentir imune prefere continuar a não acreditar na gravidade da situação em que nos encontramos política, económica e socialmente nem na maldade que os governa.
A situação é tal que para branquear a própria posição basta afirmar-se contra a posição do outro (Para se ser e ter razão parece bastar pertencer a uma facção). Esquece-se porém que a situação é tão bicuda que implicaria de cada facção o abandono das próprias certezas – uma nova maneira de pensar- para se mudar de vida e poder eleger uma geração nova de políticos e especialistas não gerados nos alfobres da corrupção estatal. É bom ler o seguinte artigo de Paulo Morais sem colocar os óculos da esquerda nem da direita!:

“Ricardo Salgado e José Sócrates são gémeos no mal. Salgado é filho do capital e usou sempre o poder para ganhar mais dinheiro. Por outro lado, Sócrates é filho da política e usou o dinheiro para ganhar mais poder. No final, ambos ganhavam mais poder; e mais dinheiro. Pelo que a investigação das luvas pagas por Salgado a Sócrates, no Processo Marquês, é o corolário lógico de uma longa ligação de cumplicidade.”
Continua em http://ionline.sapo.pt/544709
Boa Leitura!

TEOLOGIA DA LIBERTAÇÃO NO DIÁLOGO DOUTRINA-PASTORAL

Divorciados recasados admitidos aos sacramentos

Por António Justo
Com a Exortação Apostólica “A Alegria do Amor” Francisco I provoca uma nova liberdade pastoral e uma “descentralização salutar” nas relações entre a igreja mundial e as igrejas locais. Fundamenta uma certa flexibilidade na doutrina em questões de moral sexual, sem definir novas regras. Possibilita também a admissão de divorciados recasados aos sacramentos.

Pastoral versus Dogmática em „A Alegria do Amor”?

A fé e a Igreja não podem ser estranguladas na moral. Uma igreja universal que se quer católica tem que lidar de forma cautelosa (e “estadista”) com as diferenças inevitáveis em política, doutrina e moral. Francisco quer que a presença da Igreja na sociedade seja fraterna.

A Igreja católica mundial tem de manter o seu caracter essencial de comunidade institucional e de vida; como tal tem de incluir a fé como obediência à doutrina da Igreja e por outro lado respeitar a consciência e a experiência individual de cada cristão no aspecto místico que implica a relação pessoal com Deus: esta tensão característica no cristianismo é salutar para a Igreja e para a sociedade, garantindo-lhe desenvolvimento e perenidade.
Neste sentido, os padres têm de estar atentos para não se limitarem a uma ética de atitudes sem contemplar a ética da responsabilidade (1)

De facto, pessoas com a mesma atitude moral podem chegar a diferentes conclusões sem terem necessariamente de caírem numa moral situacionista; por outro lado somos definidos não só na qualidade de indivíduos mas também de comunidade orgânica. O mandamento do amor e a virtude da misericórdia também não podem anular, sem mais nem menos, a inteligência e a justiça humana.

Na teologia sempre haverá uma discrepância entre aqueles que consideram a fé como expressão de experiência directa com Deus e pensam encontrá-la em tudo e aqueles que crêem mais na obediência à doutrina da igreja, pensando que a questionação desta corresponde a uma ofensiva contra a Igreja. Cada pessoa tem um rescript de salvação e como tal, nestes assuntos, importa ter muita discrição e muita sintonia.

Integração da Teologia da Libertação

Desde 2013 a Igreja inteira (leigos, sacerdotes, bispos e cardeais) discutiu os vários assuntos de família e sexualidade no intuito de chegar a uma reforma da moral sexual católica. O Sumo Pontífice descontrai a sexualidade, clarificando em “Alegria do Amor” que para cada discussão não é necessário um esclarecimento doutrinal de Roma.

Temos um grande papa que consegue resolver o impasse entre teoria e praxis conjugando a ortodoxia na orto-praxia sem cair no relativismo nem no subjectivismo de um Deus elaborado “à la carte” como querem muitos movimentos exotéricos. Francisco põe em relevo a unidade de doutrina e prática, mas deixa espaço para a interpretação da doutrina. Esta prática exige grande maturidade da parte dos cristãos, conscientes de uma certa lei da ambivalência da realidade social e pessoal, não reduzíveis a uma mera ressonância de alma nem tão-pouco a uma doutrina racional.

Pelo que me é dado deduzir, com o papa latino-americano, dá-se um pequeno ajustamento de teologias: a teologia de âmbito doutrinal europeia (centrada na ortodoxia) abre uma janela no sentido da teologia latino-americana da orto-praxia dando espaço não só para o processo científico dedutivo como também para o indutivo pastoral. A unidade anterior pastoral-doutrina abre-se à teologia da libertação no sentido de uma legitimação teológica mais localizada (também maior autonomia das igrejas locais). As conferências episcopais passam em parte a ter poder decisivo quando se trata de interpretação prática de normas morais em questões de sexualidade e deste modo desabonar um pouco as congregações do vaticano (2).

Do balanço entre indivíduo e comunidade entre consciência e norma

O dilema, entre o ideal católico do matrimónio indissolúvel (entre homem e mulher) e a possibilidade das pessoas contornarem esse ideal através da sua consciência individual responsável, permanece, mas deixa uma porta aberta. De facto temos a doutrina da Igreja configurada nos dogmas (verdades científicas teóricas da fé) que dão coerência e sustentabilidade à Igreja e por outro lado a pastoral (litúrgica, profética e de serviço) que é a sua teologia aplicada e vivida sem perder a ligação ao exercício da autoridade da igreja petrina.

Para melhor se compreender a complexidade da questão, poder-se-ia estabelecer um paralelo simplificador entre o âmbito religioso e o âmbito civil: A dogmática (e o Papa) está para a Constituição dos países como a pastoral para o direito civil (A Constituição regalaria o ideal e a lei faz a adaptação à situação concreta das necessidades do cidadão). De facto, para a Igreja, a pessoa é centro e fonte de todo o direito: ela é portadora do germe divino; a dignidade humana vem-lhe do facto de todo o ser humano (crente ou não crente) ser filho de Deus e como tal portador de um valor moral e espiritual inerente que o torna soberano em relação aos seus actos e decisões baseadas na sua consciência responsável, não sendo subordinado a sacrificar novilhos aos ídolos sociais e institucionais. O homo cristianos é soberano, segue a sua consciência mas forma-a a partir do nós.

Um outro dilema será: ou seguem a autoridade magistral do papa como ele a não quer, ou não seguem o Papa para seguirem a própria servidão de cariz caseiro. Sim porque o cristão consciente, embora pense por ele, pensa a partir do nós, compreende-se como indivíduo e como comunidade e sabe que a ética é transmitida pela igreja; o Deus de Jesus Cristo não é só dos cristãos, Ele é de todos; é comunidade e também pessoa encarnada. Daí a difícil missão de uma igreja que se tem de manter católica. Constitui sempre um desafio para a Igreja conseguir manter o balanço entre indivíduo e comunidade entre consciência e norma, entre as subculturas e a cultura que lhes dá sustento.

Na sociedade actual domina imperceptivelmente uma ideia do politicamente correcto e um certo sentimentalismo do bonzinho que podem ser tão nefastos para o progresso do indivíduo e da sociedade como a violência que “bons” e “maus” criticam. Não chega ter um coração bom, é preciso activar também uma inteligência iluminada, doutro modo chega-se ao ponto de se confundir justiça com injustiça (vejam-se diferentes problemas políticos actuais). Uma atitude cristã de identificação com os humildes, de defesa dos pobres, da paz e dos direitos humanos implica grande capacidade de saber e de discernimento, porque nem todas as desigualdades sociais nem cada controlo nas fronteiras se pode declarar como não éticos ou não cristãos. Quem exclui a negatividade da vida torna-se unilateral e terá de pagar a factura com a saúde ou fazê-la pagar a alguém. A vida existencial é polar e um polo não pode excluir o outro; não há o eu sem o outro nem o outro sem o eu, não há sombra sem sol. Importa fomentar uma sociedade de pessoas boas conscientes que são portadoras das forças do bem e do mal mas com uma vontade forte de praticar o bem; a inconsciência cria a espécie do mauzinho ou do bonzinho que cospem descontentamento.

Jesus, no caso da mulher adúltera, prescindiu de explicar uma ideia de casamento, família e sexualidade, deixando a análise do problema à pessoa, à Igreja e aos teólogos. Jesus não julga ninguém definitivamente; a Igreja também não, ela sabe que a vida é relação resumida na fórmula trinitária Pai-Filho-Paráclito e na de Deus com a sua criação no mistério do Deus-Homem. O Paráclito acompanha cada pessoa e expressa-se de maneira relevante na relação (cura animarum) entre o padre e o cristão. Francisco I, como pastor, segue o princípio de João: “Nem eu te condeno”. Em vez de cavalgar no cavalo alto da moral, o Papa procura descer a todo o lugar onde há pessoas.

Com “A Alegria do Amor” o papa não muda as leis da Igreja; apenas alarga o âmbito pastoral de reflexão e de interpretação. Pressupõe maior capacidade de reflexão e de autonomia responsável no cristão em geral e na pastoral. O pastor, o cura, não deixa de apregoar a fé da Igreja, no diálogo íntimo com o fiel deixa-se orientar por uma pedagogia da graça e deixa a este a decisão.

Segundo a doutrina católica Deus tem um relacionamento directo com todas as pessoas, independentemente do facto de serem acompanhadas pastoralmente ou não. Na Cura de almas cada cristão é chamado e capacitado a exercer o cuidado pastoral de acompanhamento numa relação de empatia com o irmão e na consciência de que faz parte de uma comunidade de vida espiritual.

O Papa defende-se dos críticos

A Exortação Apostólica “A Alegria do Amor”, dirigida sobretudo ao clero, provocou críticas nalguns cardeais que apresentaram dúvidas sobre o documento que trata do amor, da família e do celibato. Os defensores da doutrina pura (dogmática) desejam saber se divorciados que casam de novo ou que vivem com uma outra pessoa podem participar no sacramento da comunhão depois da absolvição do sacramento da penitência.

Dentro da igreja e especialmente na cúria vaticana formou-se resistência contra ele e contra a sua exortação porque têm medo de ele ir longe demais no seu desejo de mudança. O papa responde “ que não são as engelhas que devemos temer na igreja mas sim a sujeira” porque os seus planos de reforma não são apenas operações de beleza para eliminar as rugas. O papa quer ver nas reformas um sinal da veracidade e do processo do crescimento de uma Igreja viva que não cheire a naftalina. Aceita a opinião dos críticos e da discussão teológica mas adverte que não se refugiem por trás das aparências de tradições ou do habitual, alegando que a “resistência muitas vezes vem vestida em peles de cordeiro”.

O papa não respondeu directamente a quatro cardeais que voltaram à questão argumentando terem escrito “movidos por um cuidado pastoral profundo”.
Naturalmente nem o papa deve dispor da mensagem cristã, como obstam alguns, devendo apenas administrá-la. Facto é que Francisco anuncia a mensagem cristã e pratica-a. Francisco I procura Jesus Cristo também nas margens da sociedade e não apenas no endurecimento institucional. Ele exorta os padres a olharem para a sociedade com um olhar de mãe e não apenas com um olhar de pai rigoroso porque sabe que Deus é pai e mãe.
Como dito, a questionação do sacramento do matrimónio não pode ir longe demais mesmo a pretexto da misericórdia.

Divorciados novamente casados podem frequentar os sacramentos

Francisco é um papa que não se limita nem refugia na autoridade clerical. Quer renovar a igreja no que ela tem de exterior investindo numa pedagogia da misericórdia. Também na família quer mais misericórdia pastoral no tratamento dos divorciados. A partir de agora, os padres – em sintonia com as conferências episcopais – podem permitir o acesso ao sacramento da Comunhão a divorciados recasados e invocar como fundamento a “Amoris Laetitia”.A exortação apostólica abre as portas aos divorciados recasados, e tem em conta a vida humana como processo e não como algo acabado num determinado momento da História ou da vida, mas ao mesmo tempo não descura o aspecto orgânico da vida social. Acentua o aspecto pastoral sobre a dogmática (doutrina) nas convicções extramaritais. O papa reconhece de facto, a admissão dos divorciados recasados à comunhão em cada caso individual. O padre tem um papel de responsabilidade acrescentada de cuidar dos fiéis interessados na caridade pastoral. Nova é a ideia introduzida pelo Papa ao possibilitar o voltar a casar e o receber os sacramentos da Penitência e da Eucaristia, sem anulação do casamento anterior. Naturalmente, também esta via permanece aberta. Há situações que exigem uma assistência pastoral mais pessoal e que pressupõem uma grande capacidade de discernimento em relação à pessoa e à comunidade. Numa nota de rodapé de “A Alegria do Amor”, o papa diz que divorciados novamente casados poderiam “em certos casos” tirar proveito da “ajuda dos sacramentos”. O papa restitui ao cristão a responsabilidade de divorciados novamente casados, serem responsáveis e discretos ao aproximar-se do sacramento da comunhão. Havia bispos que antes desta exortação apostólica recomendavam a comunhão espiritual a divorciados novamente casados. Alguns bispos sugerem um processo de aprofundamento da própria consciência (uma via paenitentialis – caminho da penitência) com o apoio de um bom acompanhante para depois de um exame de consciência profundo, o cristão seguir a própria consciência e esta decisão ser respeitada. Francisco I apela para a responsabilidade da consciência individual (como última instância moral do cristão). Um papa que no sentido cristão deixa muita folga para a liberdade e responsabilidade individual pode ser incómodo também numa sociedade civil, cada vez mais massificada e alienada pela ditadura do pensamento politicamente correcto (uma sociedade, por vezes pedante e ingénua, que se julga apta a poder julgar outras sociedades não se dando conta que é prisioneira do próprio espírito do tempo tal como outras o foram). Naturalmente, não será fácil fazer despertar uma consciência e uma atitude cristã adulta numa polis em que as pessoas são demasiadamente condicionadas pelo ego infantil e pelo superego.

O confessionário não é uma “câmara de tortura” mas sim um lugar de misericórdia; dele surgiu o aconselhamento psicológico laico. Porque nunca Por fim o que prevalecerá será a decisão do penitente se deverá ou não ir à comunhão.

“Na Igreja, a autoridade e a jerarquia são um serviço”, titula o “Observatore Romano”. “Alegria do Amor”, nas suas 300 páginas, deixa lugar para interpretação e para experimentação sem que os bispos se insurjam uns contra os outros nas diferentes posições. Também não é contrária à carta de João Paulo II “Familiaris Consortio” (1981). Ouvi do cardeal de Viena, Christoph Schönborn a afirmação de que o papa, com “laetitia Amoris”, permite em cada caso individual, a admissão à comunhão.

O Papa reformador que mexe com o mundo

Eleito papa a 13.03.2013, vive de maneira simples e sobressai nele o braço estendido para acolher, saudar e abençoar. Na sua simplicidade e atitude atingiu os corações do povo comum e mesmo daqueles que não crêem. O papa procura estabelecer pontes em todo o lugar onde é possível, na Suécia esteve presente no início do 500° aniversário do reformador protestante Lutero. Também o encontro do papa Francisco com o patriarca russo ortodoxo Kyrill I em Havana foi um grande passo: foi a primeira vez que um papa se encontrou com um patriarca de Moscovo. Em relação aos refugiados solicita que se combata contra a “globalização da indiferença”. Na sua visita à Polónia foi um pouco incómodo para com o governo ao defender a aceitação de refugiados. É excelente na defesa do meio ambiente com a sua encíclica “Laudato si’ (24 de maio de 2015) ao estabelecer uma relação directa da exploração da terra (esgotamento dos recursos naturais) e da injustiça social. Tornou possível o diálogo entre os Estados Unidos e Cuba e entre Israel e Palestina. Com a reforma da Cúria romana conseguiu juntar competências estabelecendo um ministério para assuntos de família, leigos e protecção da vida e um outro para migração, combate à pobreza, direitos humanos e defesa do ambiente.

Sem memória não há pensamento! A Igreja institucional é o depósito da memória que se vai sempre alargando e concretizando num diálogo íntimo entre indivíduo e comunidade.

Para concluir: A solução argentina apoiada pelo Papa

A exortação apostólica pós-sinodal “Amoris Laetitia” (AL). “http://www.agencia.ecclesia.pt/netimages/file/papa-francesco_esortazione-ap_20160319_amoris-laetitia_po.pdf, é um documento com assunto controverso e passível de interpretações.

Quanto à possibilidade de acesso à comunhão os bispos argentinos deduzem da AL a possibilitação da frequência da Comunhão, depois de muita reflexão e ponderação, para as pessoas em situações canonicamente problemáticas; nesse sentido determinaram orientações práticas.

O Papa Francisco confirmou e aprovou a orientação dos bispos da região de Buenos Aires (http://www.kathpedia.com/index.php?title=Amoris_laetitia ) dizendo claramente que “não há outras interpretações”; que, em casos individuais, os sacramentos são possíveis para os católicos “a viver em situação objectiva de pecado”. Pessoas a viver em situação objectiva de pecado seriam sobretudo os recasados. De facto AL refere já no artigo 305 com a nota 351 que “a Eucaristia não é uma recompensa para a perfeição, mas um generoso remédio e alimento para os fracos”. Isto não significa porém um acesso indiscriminado aos sacramentos pois pressupõe-se um processo de discernimento no diálogo com o confessor acompanhado da reflexão e da oração.

As premissas estão dadas na Amori Laetitia”; as consequências serão tiradas pelos bispos com o Papa no campo pastoral e na discussão teológica futura. AL não pode ser uma panaceia de receitas pelo que exige responsabilidade pessoal e eclesial. O Cardeal Christoph Schönborn já adiantou que todas as declarações doutrinárias sobre o matrimónio e a família devem ser lidas e observadas à luz de “Amoris Laetitia”.

Concretamente, os bispos argentinos alegam que é de sugerir a divorciados recasados, se possível, a abstinência sexual. Mas esta nem sempre é uma solução viável. No caso da culpa da pessoa em causa ser limitada ou trazer danos às crianças da nova relação a “Amoris laetitia” abre a “possibilidade de acesso aos sacramentos da Reconciliação e da Eucaristia”.

Os pastores argentinos têm bem presente o espírito do papa Francisco e os parágrafos de “Alegria do Amor”. De facto, „as culturas são muito diferentes entre si e cada princípio geral (…), se quiser ser observado e aplicado, precisa de ser insculturado”» (AL 3). «A Igreja não deixa de valorizar os elementos construtivos nas situações que ainda não correspondem ou já não correspondem à sua doutrina sobre o matrimônio» (AL 292). «Trata-se de integrar a todos, deve-se ajudar cada um a encontrar a sua própria maneira de participar na comunidade eclesial, para que se sinta objeto duma misericórdia “imerecida, incondicional e gratuita”»(AL 297). E ainda: «Os divorciados que vivem numa nova união, por exemplo, podem encontrar-se em situações muito diferentes, que não devem ser catalogadas ou encerradas em afirmações demasiado rígidas, sem deixar espaço para um adequado discernimento pessoal e pastoral» (AL 298). Não devem sentir-se excomungados, mas podem viver e maturar como membros vivos da Igreja (…). Esta integração é necessária também para o cuidado e a educação cristã dos seus filhos» (AL 299). O grau de responsabilidade não é igual em todos os casos”, as consequências ou efeitos de uma norma não devem necessariamente ser sempre os mesmos» (AL 300). «É verdade que as normas gerais apresentam um bem que nunca se deve ignorar nem transcurar, mas, na sua formulação, não podem abarcar absolutamente todas as situações particulares. Ao mesmo tempo é preciso afirmar que, precisamente por esta razão, aquilo que faz parte de um discernimento prático duma situação particular não pode ser elevado à categoria de norma» (AL304). http://arquisp.org.br/noticias/leia-a-sintese-da-exortacao-a-alegria-do-amor .

A situação crítica de divorciados pode perturbar a mente e deste modo a liberdade… o que objectivamente poderia, à primeira vista, ser considerado como situação objectivamente defeituosa pode, subjectivamente, ser considerada boa. Até o direito civil penal conhece a situação psiquiátrica…

Na Igreja peregrina a vida é processo. Também o Concílio Vaticano II já não via o casamento como contrato mas como aliança, abandonado assim a visão de casamento que via a procriação como objectivo principal do casamento. Com o divórcio acaba a ligação pessoal entre os cônjuges divorciados.

O caracter da indissolubilidade (3) assenta no facto da união assumir o caracter divino (Rom 11, 29); este faz do divórcio também uma violação dos mandamentos, o que complica a realização de um novo casamento pela igreja e a liberdade dos divorciados se sentirem desvinculados embora a ralação com um outro parceiro já não ser considerada de relação sexual adúltera; o novo casamento também pode ser nulo mas não pecaminoso.

Os mais fortes na fé e mais perto do ideal de Cristo não precisam de se sentir enganados com a sua ascética e fidelidade a Deus perante os que frequentam a comunhão sem serem tão consequentes.
O documento deixa lugar para interpretação e para a controvérsia num processo de vida e de discurso que consta de resolução de problemas. A Exortação constitui a base para a admissão dos divorciados recasados à comunhão, como comenta a maioria dos cardeais e bispos.
Não coloca limites à integração dos recasados, pressupõe porém o cultivo da consciência.

A abertura não deve criar confusão na doutrina da indissolubilidade do matrimónio. É preciso formar consciências e não substituí-las.

©António da Cunha Duarte Justo
Teólogo e pedagogo
Pegadas do Tempo,
(1) ÉTICA ENTRE CONVICÇÃO E RESPONSABILIDADE: https://antonio-justo.eu/?p=3884; Ética Republicana https://antonio-justo.eu/?p=3895 ; Um Exemplo De Ética Republicana Socialista Aplicada: http://www.solnet.com/09set16/pena&lap/penalap3.htm ; POLÍTICA DO POSTFACTO – ÉTICA ENTRE CONVICÇÃO E RESPONSABILIDADE – DO COMPROMISSO ÉTICO ENTRE IDEALISMO E REALISMO: http://antonio-justo.blogspot.de/2016/10/politica-do-postfacto-etica-entre.html; Ética da Responsabilidade pressupõe a Educação para a Liberdade: http://palopnews.com/index.php/cronistas/antoniojusto/1721;. O divórcio da política e da ética: http://www.debatesculturais.com.br/o-divorcio-da-politica-e-da-etica/ ; Num outro texto escreverei sobre a ética de timbre cristão! Estaria disposto a publicar livro se fosse manifestado interesse.
(2) No que toca ao aborto, à teoria do género e ao casamento gay permanece como orientação o catecismo da Igreja católica. Deixa à consciência individual a decisão interior sobre o emprego de meios de anticonceptivos e sobre a decisão de recasados irem à comunhão.
(3) O Evangelho diz “Aquele que se casa novamente após o divórcio comete adultério (Lc 16:18; Mc 10:11; Mt 5,32; 19,9) e acrescenta “O que Deus uniu, não o deve separar o homem” (Mc 10,2-9; Mt 19,3-8); “quem se divorciar de sua esposa, (…) destrói o seu casamento! “( Mat. 5, 32). Assim se reconhece diferentes níveis de culpa. O arrependimento e a história individual (consciência) são essenciais na avaliação, o que leva o assunto a ser um caso individual e a ser resolvido como tal.