O VALE DO SILÍCIO E A ESCOLA DE SAGRES – MITOS DA SUSTENTABILIDADE!

A nova Economia da Rede Digital e o correspondente Pensar comercial

Por António Justo
Cada civilização e cada época precisam dos seus mitos que lhe possibilitam a sustentabilidade de futuro. Em Torno do infante D. Henrique congregaram-se os mestres das artes e das ciências ligadas à navegação; a concentração dos sábios da época num determinado lugar possibilitou o mito de Sagres que se tornou na expressão motivadora do começo de uma nova era mundial.

Também agora, no seguimento dos líderes da Universidade de Stanford ligados ao Venture Capital (1), se acentua o mito do Vale do Silício (Silicon Valley Califórnia) que parece inaugurar, como Sagres, uma nova era. Vale do Silício é a capital do mundo da indústria de TI (tecnologia da informação) e da alta tecnologia. Aí se juntam ideias arriscadas com o capital de risco (2).

O génio ocidental sempre soube juntar o saber (a verdade) à dúvida que se revela como a incrementadora de desenvolvimento e futuro (a característica da civilização ocidental). Esta mensagem original encontra-se já na alegoria bíblica de “Adão e Eva” onde se junta o saber divino à dúvida humana na pessoa de Eva que inicia assim o desenvolvimento humano e a cultura civilizacional.

Numa dinâmica de tentativa e erro o ser humano tem encontrado maneira de dar forma ao seu desenvolvimento. Neste sentido tal como na relação do dia-noite se expressam, tal como na Bíblia, duas dinâmicas de pensamento complementares: o pensar optimista e o pensar pessimista.

Em relação ao novo mito da economia virtual, o publicista alemão Christoph Keese, que creio nas pegadas do Adão e Eva dos nossos dias, faz uma análise do Silicon Valley no sentido de se fazer uma ideia do que se pode esperar do vale mais poderoso do mundo. Keese, no seu livro “Silicon Valley”, movimenta-se entre medo e admiração na análise que faz da Economia de Rede Digital cada vez mais orientada para o mercado e cada vez mais fomentadora de uma nova maneira de pensar: o pensar comercial (3).

A Ideologia eclética do Risco

O empreendimento digital possibilita novas conquistas da realidade e do globo, transformando a práxis das antigas empresas em movimentos empresariais. Der Spiegel n°10,2015, refere que a capitalização bolsista das 30 empresas mais valiosas do mercado Silicon-Valley já é mais do dobro da capitalização das 30 empresas de Dax. Grande parte das empresas mundiais actuais nasceu no Vale do Silício (4). Por aqui se nota que o futuro irá, em parte ou em grande parte, no sentido da filosofia das empresas “Vale do Silício” que têm como credo a inovação cientes de que “quem não arrisca não petisca”.

A mesma revista faz referência aos quatro líderes do pensamento da elite tecnológica Vale do Silício: Ray Kurzweil chefe de Google, intitulado de “o profeta”, prevê que os computadores em 2029 conseguirão fazer tudo o que o Homem faz hoje mas ainda melhor.

Para Sebastian Thurn, o “engenheiro alemão”, o optimista é quem muda o mundo, não o pessimista. De facto o optimismo baseia-se na esperança e na realização de um mundo melhor. O optimismo assemelha-se à água que não destrói mas apenas se desvia deixando com o tempo as marcas da sua presença. Trata-se de um optimismo humilde por não ter a certeza de saber para onde vai nem saber onde termina a viagem.

Joe Gebbia (o conquistador), criador de Airbnb, pensou revolucionar o turismo e fazer concorrência a actores financeiros internacionais que manobram a indústria hoteleira. Gebbia possibilita, como monopolista, uma certa democratização da economia. Estão presentes em 190 países ou seja em 34.000 cidades. Por um lado os novos monopolistas cibernéticos fomentam mais transparência concorrendo com os chefes locais a nível de economia e de política, por outro lado despersonalizam o indivíduo tornando-o objecto transparente.

Peter Thiel, “o ideólogo”, defende o princípio liberalista: Prosperidade e felicidade querem-se para todos através de tanta autonomia quanta possível e de tão pouco estado quanto necessário. Para o alemão, Peter Thiel, o mundo dos Bits conquistou o mundo por ser isento de regras retardantes, ao contrário do mundo dos átomos, como medicina e transportes, que devido à regulamentação estatal não se desenvolve tanto. Thiel defende os monopólios e quer a construção de cidades navegantes em águas internacionais (Já serão de prever as contendas que surgirão na luta pela ocupação das águas marítimas internacionais, isto certamente na lógica da Conferência de Berlim de 1815!). Thiel justifica os monopólios: “Monopólios criativos possibilitam novos produtos, dos quais todos têm proveito”.

Para os cientistas do Google a política, com as suas regulamentações, desacelera o progresso porque “tudo acontece globalmente mas as leis são locais. Isto já não se enquadra no nosso tempo”.

O novo tipo de empresas tenta reunir em si a economia, o pensar esotérico, o socialismo cultural e o capitalismo liberal. Os impérios digitais parecem interessados apenas na prosperidade e na satisfação individual; a manutenção da multiplicidade dos biótopos culturais não lhes interessa. Um dos preços a pagar começa pela perda da esfera privada e pela renúncia à protecção de dados, como todos já sentimos no Google, Facebook, Yahoo, etc. O preço da própria satisfação é desnudarmo-nos.

Da Era dos Coches e dos Cavalos para a Era dos Automóveis e da Internet

O movimento de autonomia individual vê, na Elite tecnológica, a possibilidade da sua maior extensão; por outro lado o movimento tecnológico globalista e a economia virtual em via esvaziam as autonomias regionais, porque tentam ordenar a sociedade numa perspectiva de cima para baixo ao contrário de uma natureza que se desenvolvia de baixo para cima. A realidade global determina contínuos desafios. A política e a pastoral dos temos da era da velocidade do coche puxado a cavalo terão de ser aferidas à era dos aviões e dos computadores. Num mundo da eficiência para quem quer ser eficiente, a estratégia de Gebbia é “pensar como a pessoa que vai utilizar a tua ideia”.

A “ideologia califórnica” pretende a felicidade e a autodeterminação do indivíduo. Vale do Silício prossegue essa ideologia no sentido de “tornar o mundo um melhor lugar”.

As boas intenções do Vale do Silício esbarram com a dúvida, ao serem confrontadas com a verdade dos Goldman Sachs, Stanley, Lehman, etc, instituições sem alma, onde o proveito e a ganância são lei.

Para se não ser prisioneiro do tempo é preciso compreender o tempo. De facto, o que provocou os Descobrimentos foi a dedicação ao saber científico e tecnológico da altura, o saber e a vontade concentrados em Sagres e tudo iluminado pela fé numa missão ambiciosa; esta fé tinha porém uma componente religiosa de humanismo global bem determinado e arreigado no coração de um povo inteiro que afirmava ao mesmo tempo o valor da pessoa e o valor da comunidade.

No tempo dos coches, quando apareceu o automóvel, os pessimistas condenavam os carros por assustarem os cavalos, hoje condenam a internet por prender as pessoas. Não há que parar o tempo nem o desenvolvimento; a função do Homem será acompanhá-los e dar-lhes sentido à imagem do que aconteceu em torno de Sagres.

Se observamos o desenvolvimento da sociedade e da História verificamos uma constante mudança a nível exterior; uma mudança que vem servindo um satus quo sustentável pela ilusão da mudança que, de facto, não muda a essência das relações sociais e humanas porque a mudança adquirida é provocada pelos detentores do poder e seus herdeiros que reduzem a mudança à mera adaptação às circunstâncias e às necessidades do tempo. A política fracassada afirma-se no mesmo erro aceite que lhe dá continuidade. O Homem muda para não se mudar.
A reflexão continua no próximo artigo sob o título: “OS RISCOS DO CRENTE AD HOC COM UMA IDENTIDADE INTERNET”

António da Cunha Duarte Justo
Teólogo e pedagogo
In Pegadas do Tempo www.antonio-justo.eu

1. Venture Capital = capital de risco; em 2014, os investidores aplicaram no Vale do Silício, em cerca de 1.700 negócios, um total de 26 bilhões de dólares, o que corresponde a 30% do capital de risco mundial, http://blog.wiwo.de/look-at-it/2015/01/14/venture-capital-2014-silicon-valley-26-milliarden-dollar-deutschland-3-milliarden-dollar/
2. No “Silicon Valley” trabalham as pessoas mais qualificadas do mundo, entre elas 20.000 alemães (cf. http://www.capital.de/dasmagazin/silicon-valley-nicht-nur-was-fuer-milliardaere-4457.html).
3. Com o tempo nas escolas as aulas de programação farão parte da aprendizagem regular tal como ler, escrever e fazer contas.
4. No Vale do Silicon nasceram, entre outras, as empresas mundiais: Apple Inc., Altera, Google, Facebook, NVIDIA Corporation, Electronic Arts, Symantec, Advanced Micro Devices (AMD), eBay, Maxtor, Yahoo!, Hewlett-Packard (HP), Intel, Foursys, Microsoft etc.

CULTURA DA MUDANÇA ENTRE SONHO E LIBERDADE

A alta tecnologia promete sonho mas consome liberdade – Tudo e todos têm de mudar

Por António Justo
Encontramo-nos num processo de desenvolvimento em que o pensar linear será substituído pelo global e em que consequentemente as visões da realidade a-perspectiva substituirão paulatinamente as actuais visões e equacionamentos lineares da realidade. Passaremos do tenho razão para o temos razão, atendendo à consciencialização da complementaridade dos diferentes biótopos da natureza, da complementaridade dos diferentes biótopos culturais e da complementaridade dos diferentes sistemas de pensamento e à fragilidade da formação da opinião regulada por monopólios globais. A estratégia que se encontra por trás desta mundivisão aproxima também a linguagem e metáforas de mitos e religiões às expressões e concepções científicas.

Iphone, automóveis com propulsão própria, drones usados no comércio como serviço de entrega, robôs inteligentes, etc. parecem substituir cada vez mais o Homem reduzindo-o ao papel de espectador. A alta tecnologia promete o sonho à custa da liberdade. O exercício do pensamento passa para os computadores e a força revolucionária parece ter passado para a técnica e o trabalho manual é cada vez mais substituído pela produção mecânica. Tudo isto está a provocar uma mudança radical das nossas impostações éticas, da nossa maneira de pensar e agir. É o que se observa e sente hoje que nos encontramos em pleno epicentro da revolução Vale do Cilício: uma revolução que quer tornar possível a felicidade individual realizada através dos padrões de grandes monopólios anónimos à margem de democracias, das culturas e das religiões. Aristóteles diria hoje em termos portugueses: ”nem tanto ao mar nem tanto à terra”.

Aos industriais e aos barões do petróleo sucederam-se os Bancos e os Gestores de fundos Hedge. Actualmente encontra-se em via de realização a era da revolução digital – com os génios dos computadores e das altas tecnologias.

Antes os líderes contentavam-se com o poder da riqueza depois passou-se ao poder do dinheiro. Hoje os líderes do mundo (protótipo Silicon Valley na Califórnia) querem mais; aspiram a determinar não só o que consumimos mas também a maneira como consumismos e como vivemos juntando na mesma mão (ou organização) o ideário, a economia, a ideologia e a produção numa Agenda bem definida. A nova ideologia-praxia é tentadora porque sabe empregar também a linguagem e as metáforas das religiões e das literaturas.

Religiões e outras instituições abertas aos sinais dos tempos terão de estar atentas às suas estratégias! Delas poderão aprender muito em termos de resposta ao globalismo.

No princípio era a fé em Deus, depois veio a fé no dinheiro e agora experimenta-se a fé na mensagem da Alta Tecnologia como doutrina de salvação, que transfere a esperança para a perspectiva das possibilidades infinitas da tecnologia! (Já há pessoas que se deixam congelar para serem descongeladas na altura em que a técnica tenha descoberto soluções para a morte – uma ilusão que desconhece a realidade do ser criado ou da matéria mas que como utopia dá resposta, à sua maneira, a necessidades do ser humano). Para os apóstolos da nova mensagem, os estados, as religiões, as filosofias tornam-se em empecilhos de progresso. Fixados na sua filosofia que de forma eclética se serve da ciência e da religião como expressão da necessidade humana, elaboram um sistema de ortodoxo-praxia orientada pelo desejo criativo que se realiza na inovação. Reduz-se o ser a uma determinada forma de estar na vida. A ideologia substitui cada vez mais as soluções práticas passando muitos projectos a ser efectuados segundo os óculos da ideologia e do momento.

No princípio era a fé em Deus que se encontrava no âmago do Homem. Hoje é a fé na tecnologia que já não se encontra dentro do homem, dependendo só dele e ao não fazer parte do seu centro corre perigo de o alienar totalmente.

A filosofia da alta tecnologia (economia digital) incorpora nela também Marx e Engels definindo o alienante como aquilo que nos tira do tempo, do concreto; assim se reduz a pessoa à materialidade que se esgota na actividade produtiva que se torna, ao mesmo tempo, fonte da consciência; por outro lado considera a religião, Deus e o dinheiro como factores alienantes que nos desviam da realidade material. A nova fé encontra no Yoga e em exercícios semelhantes uma maneira de estar prática e de subjugar instâncias metafísicas.

A nova alienação prende a consciência humana à sua mera actividade. O produto é a luz da vela que resulta da energia do trabalho e o indivíduo esvai-se nela. A ideologia moderna, que a todos parece iluminar, aliena-nos com produtos conseguidos à custa da desumanização das pessoas reduzidas a mercadoria numa “metafísica” bruta construída, como no caso da vela, a partir da relação produto-consumidor. Aqui dá-se a identificação do indivíduo com o seu destino; tudo é reduzido a indivíduo saído da materialidade para se consumir na materialidade. A promessa do desenvolvimento infinito alimenta a nova alienação do indivíduo que ao ser reduzido a produto passa a ser consumido na ilusão do que consome. A relação entre produtor-produto e consumidor passa a ser a utilização, o imediato. A teoria da alienação em Marx, na sua consequência lógica reduz o Homem a mera biologia animal irracional. De facto, o pensamento, na sua qualidade de abstracto, seria na sua essência uma alienação. Para ser consequente o pensamento marxista e da aliança capitalismo-marxismo teriam então de declarar o fim do pensamento.
Continua no próximo artigo sob o título “O VALE DO SILÍCIO (Silicon Valley) E A ESCOLA DE SAGRES – MITOS DA SUSTENTABILIDADE”
António da Cunha Duarte Justo
In Pegadas do Tempo www.antónio-justo.eu

TURQUIA USA A NATO PARA IMPEDIR A FORMAÇÃO DO ESTADO CURDISTÃO

Território sírio e iraquiano à Disposição da Cobiça ideológica e internacional

Por António Justo
Mais uma vez a Europa ajoelha perante os interesses dos USA. A NATO na reunião de 28.07 conseguiu, mais uma vez, iludir as massas europeias dando indirectamente carta-branca às aspirações de Erdogan que se quer aproveitar da situação para se vingar na etnia curda que aspira à formação de um Estado próprio.

Por interesse próprio os USA apoiam a política turca, embora o governo turco tenha sido conivente com as milícias rebeldes jihadistas sunitas do EI (“Estado Islâmico”). De facto a Turquia tem servido de país de trânsito do terrorismo jhiadista internacional para a Síria e Iraque. A Turquia não permitiu que as bases da NATO no seu país fossem utilizadas para ataques ao terrorismo do EI. O presidente Erdogan anunciou pôr termo ao processo de paz com os curdos precisamente no dia da reunião com os países da NATO. A Turquia não quer negociações de paz com os curdos, prefere o uso da força e a conivência da NATO sob a salvaguarda dos USA. A estratégia da Turquia é enfraquecer os curdos que se têm distinguido na luta contra o Terror do EI e com isto ganhado trunfos políticos internacionais para a causa da formação de um Estado curdo.

Os países da NATO ao dizerem-se em “estrita solidariedade com a Turquia” apoiam indirectamente a política de opressão turca contra os curdos e seguem a política hipócrita no Iraque e Síria ao serviço das grandes potências e dos potentados locais que aspiram ao domínio sobre a zona; uma forma para legitimar uma nova divisão do território.

A criação de uma “zona de segurança” (90 km de comprimento por quarenta de largura) no terreno sírio fronteiriço com a Turquia favorece sobretudo as intenções nacionais turcas de retalhar a zona onde vivem os curdos e assim criar já obstáculos à união curda do lado da Síria; também a transferência de refugiados acampados na Turquia para a “zona de segurança” enfraquece o papel dos Curdos e cria, com a ajuda internacional, situações factuais que impedem a posterior formação de um estado curdo com território ininterrupto. (As potências internacionais comportam-se, fechando os olhos, à semelhança do que fizeram em 1915 para que a Turquia pudesse perpetrar, à vontade, o genocídio aos arménios). A Turquia não tem interesse que as milícias curdas (YPG), aliadas da coligação internacional na luta contra as milícias terroristas EI, conquistem mais território às milícias do EI. A pretexto de se defender contra o EI, as tropas turcas bombardeiam posições do PKK até em terreno turco enfraquecendo também os curdos do Iraque e da Síria. Segundo relatórios de observadores internacionais, as forças aéreas turcas atacam mais os activistas curdos do PKK do que os terroristas do EI.

Nos últimos dias a Turquia aprisionou 1.3000 suspeitos de terrorismo de grupos de esquerda, de curdos e das milícias “Estado Islâmico”. Os USA designaram os ataques contra o partido dos trabalhadores curdos (PKK) como ofensivas de autodefesa. A Turquia tem 15 milhões de curdos, o que corresponde a 19% do total da população. Os curdos, na Turquia não têm direito ao ensino oficial da própria língua. O território correspondente à etnia curda espalha-se por vários estados sob ocupação de potências que não respeitam a sua autonomia.

Conclusão

A Turquia está interessada na destruição do governo Sírio e na separação das organizações curdas YPG e PKK para inviabilizar a concretização da velha exigência da formação de um Estado curdo. A NATO é usada como cortina de fumo para que a Turquia vá criando situações de facto que a favoreçam nas conversações do período pós-guerra. Os USA não abdicam da série de erros iniciados no Afeganistão, Iraque e continuados no norte de África. Destrói-se uma das nações mais desenvolvidas, a Síria, em favor de interesses e intrigas religiosas entre a força sunita (turca) e xiita (iraniana) e a favor dos interesses americanos e aliados contra os interesses russos na região.
António da Cunha Duarte Justo
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IDEOLOGIA DO GÉNERO OU GENDER – CREDO ESTRATÉGIA E PROGRAMA

Marxismo cultural em Acção – Destruir Pessoas para criar  Indivíduos

Por António Justo
No princípio dominava a natureza; as suas leis eram comuns ao ser humano nos seus primeiros passos do processo de humanização e de socialização; em seguida surgiram os grupos organizados (tribos, povos e nações) que elaboraram uma cultura feita de costumes leis e normas em diálogo aberto com a natureza; a cultura num acto de sublimação da natureza cria a lei/orientação moral à imagem das leis que governam a natureza (tentativa de superar o mero instinto para possibilitar a criação de paisagens culturais: diferentes tribos, nações, etc.). Natureza e cultura reconhecem-se mutuamente numa orientação analógica crescente do simples para o complexo, do elemento para o órgão e deste para o corpo natural e social. No momento histórico de que somos também protagonistas assistimos à inversão das leis do crescimento natural e espiritual; observa-se a tentativa de se estabelecer uma nova matriz social que comporta um retrocesso no sentido do órgão para o elemento (e tudo sob o pretexto da igualdade e de se criarem supraestruturas de caracter global: quer-se um corpo sem órgãos, uma cabeça sem membros, quer-se uma mudança paradigmática na cultura. Nesta já não se observa a organização, definição e crescimento do simples para o complexo mas a destruição da ordem orgânica natural e cultural no sentido da desintegração caótica em nome de uma moral matemática desenraizada ao serviço das leis do mercado em que o lucro é moral e o dinheiro felicidade. Nega-se a tradição como elemento da identidade para se viver do negócio do momento presente.

Há leis biológicas, leis naturais e leis culturais; há duas formas de se chegar ao saber: o saber indutivo adquirido pela experiência (leis biológicas da natureza) e o dedutivo adquirido a partir da ideia; os dois saberes encontram-se numa relação de feminilidade e masculinidade; um sem o outro é irreal e infecundo; a grande mentira da ideologia do género, parte do princípio de que o que se pensa é a realidade, dando-se ao luxo de afirmar o saber teórico (ideologia) contra o saber experimental (biologia). Em nome de uma revolução cultural colocam a intenção de educar o povo acima de qualquer princípio ou dado real.

UE tornou-se no Sistema de Controlo de Valores e Normas dos Países europeus

O que se pretende para a economia já se encontra implementado no controlo da cultura! No dia 9 de junho de 2015, longe da população, o Parlamento Europeu aprovou a sua resolução controversa “Estratégia da UE para a igualdade entre homens e mulheres a partir de 2015”. Esta contém orientações a aplicar pelos parlamentos nacionais. Em nome de uma justiça necessária no trato entre homem e mulher, procura-se desintegrar a feminilidade e a masculinidade comuns à mulher e ao homem para as colocar em luta reivindicativa como se partes complementares fossem opostos. Tudo isto ao serviço não do homem nem da mulher mas do igualitarismo comunista. O Parlamento “solicita à Comissão para assegurar que os Estados-Membros permitam o pleno reconhecimento do género preferido de uma pessoa perante a lei”. Em texto claro: o que vale não é o sexo que se tem biológico (homem ou mulher) mas o que se pensa dele. Partem do pressuposto que o gênero não é definido com base na genética e nos cromossomos, mas que é apenas uma construção social devida à educação e, como tal a ser repelida, no sentido de um indivíduo que deve ser desenroupado do que constitui a sua “persona” (personalidade) e daquilo que os pais lhe transmitiram.

Há papéis da mulher e do homem que são aquisições ou expressões culturais mas o papel de pai e mãe é de ordem natural da criação tal como o ser homem ou mulher. O ser humano não pode ser visto apenas como um produto cultural; da sua essência faz também parte a natureza, o seu caracter sexuado.

Negam os elementos constitutivos de identidade cultural (do género) adquiridos, para poderem legitimar a manipulação em via na confecção de um novo ser humano sob novos parâmetros, e reduzir o elemento cultural à praxis dos animais (animalogia) no sentido de uma revolução da sociologia. Para isso negam o conceito da pessoa humana (identidade relacional realizada no e dentro do relacionamento) para a reduzir a mero indivíduo, a um abstracto totalmente independente de qualquer vínculo ou relação (um ser tabula rasa), como quer e legisla a esquerda (maioria) no Parlamento Europeu. Tudo isto se dá no sentido de gerar um ser sem identidade e como tal facilmente manobrável por quem detém o poder (que se quer também oculto e anónimo). Aqui junta-se a ideologia capitalista que quer um ser apenas indivíduo – cliente do seu mercado – ao marxismo cultural socialista que pretende uma sociedade de pessoas reduzidas a indivíduos iguais – proletários servidores da nomenclatura.

A Ideologia do género nega diferenças características do homem e da mulher negando assim a sociedade, a natureza e a ordem divina da Criação. Antes da queda começa a decadência!

A porta-voz (Beatrix von Storch) do Grupo Europeu ECR considera que “a UE é um enorme sistema de controlo de valores e normas”. Para isso seve-se de orientações para toda a UE em matéria de educação sexual nas escolas, de direitos de adoção para transsexuais, abolição de eleições livres por quotas nos parlamentos, de medidas em favor do aborto e em desfavor da maternidade; esta é, por vezes, tida como impedimento de emancipação e de igualdade para a mulher. O olimpo da Europa e do mundo quer transformar os países em casas onde eles mandam. O referido documento de estratégia serve-se da igualdade para impor ideologia. Nessa igualdade tornam-se anacrónicas toiletes separadas, clubes de futebol só de homens ou de mulheres.

A advogada eliminação das injustiças laborais ou sociais que ainda existem entre homem e mulher dá-se de maneira selectiva e masculina sem comtemplar a masculinidade e feminilidade ou papéis característicos de um género.

Servem-se da ideia da igualdade entre homens e mulheres, da libertação do sexo, da luta contra os indicadores de gênero (masculino / feminino) para concretizar uma ideologia de base marxista e ateia e tudo isto legitimado pela premissa dos direitos da pessoa.

A estratégia de afirmação ideológica é implementada através de agendas políticas, a nível legislativo, universitário e político com objectivo de indoutrinação ao serviço da revolução cultural em via. Dissociar a pessoa humana da natureza e da herança cultural fora de qualquer complementaridade torna-se dogma do momento.

Quer-se um relativismo subjectivista de tal ordem que sujeite a lei natural à lei cultural. A ideologia do Género, ao prescindir dos dados biológicos para fomentação da nova ordem teria como consequência lógica matematizar até os nomes das pessoas e terras. De facto, também neles se expressam vestígios culturais mais ou menos sexuados: assim uma consequência da ideologia do género seria substituir o meu nome demasiado testemunha de socialização e aculturação (António da Cunha Duarte Justo – com vestígios de domínio e de sujeição) num nome livre e emancipado que se expressaria no nome “Um de Dois Três e Quatro”.

Meteram mãos à construção de uma nova sociedade e de uma nova identidade individual sem especificidades e sem referência como se o género não tivesse nada a ver com a diferenciação sexual nem com a biologia reduzível a uma opção individual que torna arbitrária a definição de homem ou mulher tal como a união homossexual ou heterossexual. Chega-lhes a ideia cópia de que a necessidade cria o órgão. O que não recai sob o metro da igualdade é considerado discriminação. Para a ideologia do género tudo se reduz a uma questão de escolha: sobrevaloriza a opinião e a intenção à margem do factor natural. A ideologia do género dá grande relevo à opção homossexual por testemunhar a afirmação dos iguais contra a afirmação do diferente que a natureza pretende mas deve ser contrariada pela estratégia radical do género. As forças da masculinidade e da feminilidade inerentes a toda a natureza, à sociedade e à pessoa humana mereceriam uma outra impostação.

Mudança da matriz linguística sobretudo ao serviço da Mentira

A ideologia do género, a ponta avançada do marxismo cultural, pretende uma mudança de matriz antropológica e criar uma nova consciência social através da manipulação da matriz linguística à imagem da manipulação genética. Através da manipulação da linguagem consegue-se manipular a consciência individual e social. Tudo isto acontece sob o pretexto de libertação da mulher (mais uma vez instrumentalizada) como se fosse possível desintegrar da biologia e da sociedade a masculinidade e feminilidade na qualidade de elementos distintivos e de energias complementares.

Hoje o pensar correcto assume de forma acrítica a ideologia gender na linguagem corrente (exemplo: a senhora “presidenta” em vez de a senhora presidente, como se a palavra presidente não fosse comum aos dois – S.m. e f. – (tal como a doente, o doente, etc). Na sequência da ideologia seria consequente introduzir o neologismo “presidento” também para o masculino)…

Parentalidade contra Paternidade e Maternidade

Em vez da complementaridade/subsidiariedade de sociedade e natureza de mulher e homem querem deles seres abstractos mais desencarnados e como tal mais facilmente reduzíveis à ditadura de ideologias. Manifestam-se contra as funções reais de paternidade e maternidade querendo-as ver reduzidas ao conceito tribal de parentalidade, numa tentativa de voltar ao caos original em que a individualidade se perdia numa massa anónima desorganizada.

A insistência da luta ideológica contra o sistema ético actual, contra a família, contra uma sexualidade integrada (com lugar para a regra e para a excepção), contra o fundamento bíblico do humanismo cristão, mais que uma tentativa de valorização da pessoa tenciona disponibilizar o ser humano para uma nova matriz civilizacional que terá como cúpula metafísica a economização da sociedade (mercado) e a mercantilização do ser humano (proletário ou cliente).

Projectam uma antropologia alternativa servidora de ideologias internacionalistas, globalistas e economicistas. Como consideram a mulher e o homem como produtos ou meros papéis culturais à margem da biologia, pretendem afirmar um género para lá do sexo e da natureza. Consideram como adversas às suas intenções ideológicas as matrizes culturais passadas que se conexavam à maneira de biótopos culturais numa relação entre cultura e natura. Querem o divórcio destas.

Uma ligação da ética e dos comportamentos sociais a uma metafísica do deus dinheiro e lucro com a consequente redução da pessoa (com toda a carga cultural de contextos sociais e geográficos que traz) a um mero indivíduo desprovido de enraizamento simplifica a administração e “comercialização” de produtos e indivíduos. Esta estratégia pensa melhor servir a organização de um governo mundial. Querem espíritos sem corpo e corpos sem espírito numa estratégia do divide et impera. Querem ignorar a masculinidade e a feminilidade da pessoa, os dois princípios que possibilitam a abertura e o desenvolvimento. Afirmam a igualdade contra “uma abertura recíproca à alternidade e à diferença” de caracter bíblico e natural. Arbitrariamente, toda a experiência milenária é lançada a bordo para a sociedade ser submetida a uma ideologia do género que quer subordinar a natureza a uma nova cultura aleatória.

O facto de a mulher ter sido enquadrada num patriarcalismo cultural que a tornou vítima de uma masculinidade social que a relegava à categoria de criança (exemplo, a criança como a mulher eram tratadas pelo nome e os homens pelo nome de família) deveria ocasionar uma consciencialização de reacção inclusiva e não reactiva; doutro modo reagem aplicando o parâmetro masculino de que se dizem vítimas.

A afirmação ideológica aninha-se a nível universitário legislativo e político na sequência das estratégias das instituições da EU e dos EUA e praticamente fomentadas pelas famílias políticas de esquerda.

Directrizes europeias obrigam os países membros à implementação de leis escolares reguladoras do ensino sobre a actividade sexual, a regulamentação da família, o aborto, etc.

Aquilo que a natureza, a cultura humana e a tradição cristã conseguiram tornar compatível e complementar através dos séculos é agora separado à força e em nome de uma ideologia abstracta que pretende formatizar o homem e a sociedade por princípios matemáticos, como se a pessoa fosse só intelecto e prescindisse do corpo e do espírito.

Se partíssemos da realidade natural e cultural do ser sexuado homem e mulher, em que ele e ela reúnem na mesma pessoa e de forma diferente os princípios masculinidade e feminilidade, a discussão e estratégia de se criar mais justiça individual e social entre homens e mulheres seguiria um outro caminho menos masculino e agressivo e tornar-se-ia mais pacífico (feminino) porque inclusivo. (A não ser que se parta do princípio que a luta é a única maneira de se desenvolver!). A consequência desta luta cultural fomentará os vícios dos dois polos.

Não reconhece os princípios complementares da evolução (a selecção e a colaboração) como forças complementares. Não reconhece que toda a natureza e toda a sociedade são construídas a partir da diferença numa tensão de afastamento e aproximação à imagem das ondas do mar; o movimento cria a tensão criadora que mantem “as águas” da vida vivas e possibilita o desenvolvimento de cultura/sociedade e natureza. Toda a natureza aspira pela comunhão do sol do universo e do sol do amor que se incarna em cada pessoa. A sociedade com a correspondente cultura é como a floresta na resposta à geografia e ao clima possibilitadores de biótopos diferenciados. Nem a geografia pode abdicar do clima tal como a natureza humana não pode abdicar da cultura que lhe confere identidade própria, o mesmo se diga em relação ao indivíduo e à cultura envolvente.

Concluindo

A masculinidade e a feminilidade não podem ser reduzidas a um masculino e a um feminino limitado a circunstâncias de papéis e funções de um só polo nem consequentemente a uma sociedade de matriz masculina. O domínio do homem sobre a mulher são deficiências a ultrapassar na base da sua imagem divina. Naturalmente que não há sol sem sombra nem sombra sem sol; somos limitados, resta-nos compreender e embarcar com corpo e alma para admirar e louvar o sol e a sombra no sentido de criar mais justiça e relação equilibrada.

Masculinidade e feminilidade realizam-se e desenvolvem-se nas relações interpessoais numa visão a-perspectiva que reconhecendo a realidade vital da tensão interpolar aspira a sempre novas sínteses (ao encontro dos polos que mantem em si a força do regresso a si para de si retomar nova força para se reencontrar de novo). A ideologia do género encontra-se em contradição com a natureza e com todas as culturas e religiões. Pode porém, na força da reacção contribuir para o desenvolvimento no momento em que foge do outro polo. Mas na luta em via, instigada pelo marxismo cultural, o que está em jogo não é tanto a beneficiação da mulher mas sim a instrumentalização dela para sub-repticiamente se conseguir um ser humano e uma sociedade segundo o paradigma marxista comunista.

As premissas da ideologia do género partem da neutralidade do sexo e não da complementaridade: distingue entre o sexo biológico do indivíduo (homem ou mulher) e o género ou sexo psicológico da pessoa (culturalmente adquirido), uma espécie de carapaça psicológica obtida (uma segunda criação) determinada pelo ambiente. Pretende negar a natureza humana tal como Deus a criou na sua complementaridade de homem e mulher (Gn 1,27), menosprezando a uma realidade onde a feminilidade e a masculinidade são partes constituintes da pessoa humana/natureza. Quer fazer de pessoas distintas mas complementares (homem e mulher) apenas indivíduos iguais de modo a perverter a natureza. Partem da realidade homem e mulher como constructos sociais.

Em geral, nascemos com um sexo biológico definido (homem ou mulher), não é sexualmente neutro; a sociedade acrescenta-lhe características próprias segundo o meio em que se insere. Isto porém não pode anular o sexo biológico em favor do sexo psicológico ou género. Apesar das influências sociais não haverá alternativa ao desenvolvimento da mulher e do homem como seres naturais.
António da Cunha Duarte Justo
Teólogo e pedagogo
In “Pegadas do Tempo” www.antonio-justo.eu

A RELIGIÃO SURGE COM O HOMEM PORTADOR DO GENE DIVINO!

O Homem ao procurar Deus descobre-se a si mesmo. Quando o Homem Adão se escondia de Deus, Deus perguntava-lhe “Adão onde estás?” Este jogo do mito de Adão e Eva repetimo-lo ontem e hoje e repeti-lo-emos amanhã e depois. Trazemos connosco o gene divino e para nos definirmos procurámo-lo também fora.

O estudo da fenomenologia das religiões torna-se muito útil. O estudo comparativo das religiões, sob o método da exegese que se aplica no estudo da Bíblia, ajuda a descobrir as diferentes filosofias, antropologias e sociologias a que a correspondente divindade dá forma.

A História das religiões é evolutiva e corresponde à História do Homem e da correspondente cultura num processo recíproco de identificação individual e cultural; o mesmo se diga na tentativa de se definir o ser humano e Deus. A teologia está consciente de que o falar sobre Deus é uma tentativa de definir e encontrar a própria ipseidade e que revela mais o ser humano que Deus! Daí a constatação bíblica do “homem criado à imagem e semelhança de Deus” num processo relacional com a consequente proibição de se elaborarem imagens de Deus. A crença ou não crença em Deus e o falar dela mais que a essência de Deus revela a necessidade do crente ou do ateu de se definir em relação ao outro, ou ao totalmente outro. Cada antropologia, cada sociologia precisa de factores de identificação específicos que a formem e expressem.

Hoje, em determinadas sociedades que se encontram em período de decadência assiste-se a uma tendência niilista de desidentificação que leva ao perigo da arbitrariedade e ao equívoco de se confundir o estar com o ser. Não podemos ter linguagem sem gramática embora seja importantíssimo não identificar uma com a outra. Tanto a pessoa como a cultura implicam narrativas, um conteúdo em diferentes textos. O ser humano sem o mistério permaneceria no estado de bicho. O discurso controverso é a sua chance!
António da Cunha Duarte Justo
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