PODERES ANÓNIMOS APODERAM-SE DA DEMOCRACIA E DOS GOVERNOS

Novo Carro Eléctrico Português

António Justo

Gerentes de multinacionais, políticos das primeiras filas, jogadores das sociedades de acções e um estado reduzido à dimensão de Judas preocupado com a bolsa dos impostos, actuam como as pragas bíblicas dos gafanhotos que de tempos a tempos invadiam os campos do povo e os desbastavam com a sua voracidade indomável deixando atrás de si o desconsolo e a desorientação. O povo sofre a nível mundial. Em 1960 20% da população mais rica do mundo tinha um rendimento 30 vezes maior que o dos mais pobres. Em 1995 o rendimento dos mais ricos tinha aumentado para 85 vezes mais.

Os energúmenos cartéis internacionais da energia, os cartéis ideológicos e do poder, reduzem o ser humano a presa. O petróleo sobe constantemente nas bombas de gasolina e com ele o preço dos produtos transportados e gerados à custa de energia. O mesmo se dá com o gás, a electricidade e os produtos alimentícios. Os preços tornaram-se astronomicamente simbólicos não correspondendo ao seu valor real. O gasóleo que é um produto de terceira qualidade, em relação à gasolina, chega mesmo a ultrapassar o preço desta.

A indústria automóvel constrói carros com consumo de gasolina mais reduzido mas logo a gasolina é subida de maneira a, multinacionais e Estado, compensarem, com a subida do preço de combustível, o que perderiam com a redução de consumo.

A política desobriga-se, perante um povo também ele anónimo mas ainda sensível às palavras, promovendo actos de fé na ecologia e na defesa do ambiente. O paradoxo da situação está em o negócio florescer melhor com uma natureza doente e um cidadão precário. Os Governos não promovem o razoável para o povo e para a defesa da natureza. Limitam-se a acantonar-se na defesa do status quo pernicioso, desviando as atenções dum povo clientela com responsórios de ocasião. Jogam às escondidas falando de energias alternativas, de CO2 e de modernização criando no povo esperanças e motivação para aguentar maiores cargas e sacrifícios. Não ousam a resistência às sociedades anónimas nem ao ditado do hábito rotineiro. Naturalmente que os políticos se encontram sobrecarregados com um sistema que pressupõe forças sobre-humanas para o dominar. Para isso seria necessária a mudança de mentalidade de todo o povo. O Estado não pode limitar-se à função de impedir a violência dos pequenos, considerando tabu a dos grandes.

Novo Carro Eléctrico Português

Numa reportagem da televisão SIC, sobre a Escola Superior de Tecnologia de Viseu, foi apresentado um carro com capacidade regenerativa. Os finalistas do curso de engenharia transformaram um carro comum num carro do futuro. Este carro, com motor movido a electricidade (15 Quilovolts), significaria uma revolução nos orçamentos familiares. De facto o veículo é bastante potente e movido a energia eléctrica gastando apenas 1,20 Euros de energia em cem quilómetros.

Será que uma iniciativa cívica ou o Estado se interessarão por esta tecnologia ou deixarão que as petrolíferas com a indústria automóvel comprem a patente para ser impedida a produção e comercialização de tal veículo?

O governo engoliu e ficou mudo. Certamente que um cidadão com um carro a carregar as baterias na ficha de electricidade de casa não cabe no seu conceito de Estado para quem a sociedade humana ainda não existe. É melhor viver da administração da “apagada e vil tristeza” do factual ordinário. O Estado perdeu de vista o cidadão.

As Novas Tecnologias não interessam ao Negócio da Energia fóssil

Como se pode ver pelas notícias da imprensa, em 1996 a General Motors produziu os primeiros automóveis eléctricos (EV1) que em 9 segundos aceleravam dos 0 ao 100 Km/h. Eram silenciosos e não precisavam de tubo de escape. Eram recarregáveis com energia eléctrica em casa. Postos em circulação na Califórnia, eram alugados continuando propriedade da empresa. Findo o prazo do contrato, esta não renovou mais os contratos apesar do interesse manifesto dos utilizadores.

Em 1997 a Nissan apresentou o modelo ecléctico Hypermini, tendo a Câmara Municipal de Posade (Califórnia) adoptado este veículo para os seus empregados. Em Agosto de 2006 expirou o contrato de aluguer e a Nissan recusou-se a prolongá-lo ou a que a Câmara comprasse as viaturas. Preferiu destrui-las. Em 2003 a Toyota produz o veículo eléctrico RAV4-EV. Também neste caso, em 2005 expiraram os contratos de aluguer não tendo sido prolongados. Os lobbies das companhias petrolíferas não querem, ganham mais com a guerra e com a poluição.

Preferem os carros híbridos com bateria interna eléctrica porque, no fim de contas, gastam tanto como os carros convencionais.

O problema é que com eles, a América, o Japão e a União Europeia não podiam meter a mão tão funda no bolso do consumidor. A socialização da energia solar foto-voltaica também não lhes interessa, a longo prazo, porque o consumidor se tornaria independente das multinacionais monopolistas da energia e do Estado. Este porém certamente que logo compensaria a perda de entrada de impostos com a alternativa de nacionalizar o sol, submetendo-o a um imposto a pagar pelo cidadão!

O Tipo Cidadão Cliente

Somos geridos por poderes anónimos que transformam os governos em bonecos. Estes bem esperneiam mas até agora em vão.

Os seus detentores vivem melhor das palavras e dum povo proletário na impossibilidade de resistir. O progresso quer um povo desenraizado dos biótopos naturais, um povo citadino acorrentado já não à natureza mas às cadeias do poder.

Substituíram as paisagens naturais pelas paisagens ideológicas e pela propaganda consumista reduzindo o povo a massa e o cidadão a cliente em que os produtos se tornam os únicos factores de identidade. O cidadão cliente vive assim da mais valia simbólica e emocional. Tornou-se acomodado, incapaz de resistir, porque se encontra aquartelado nos bairros dos prédios altos das cidade e das pressões factuais faltando-lhe, por isso, a terra debaixo dos pés para se poder afirmar autonomamente.

O povo vive incomodado mas os Estados e os Partidos ainda vão vivendo bem, uns do encosto às multinacionais os outros do encosto ao Estado. Em segredo os Governos parecem esfregar as mãos de contentamento com cada aumento de preço dos produtos. Então os impostos jorram nas caves ministeriais.

Vive-se num estado de anarquia económica e de servilismo político em que nada é normal.

A corrupção organizada oficial e oficiosa cria uma atmosfera apocalíptica. A virtude, como centro de dois extremos, deu lugar ao vício dos extremismos. Tem-se a impressão que a democracia não consegue já manter as bocas democráticas que criou. A Praga dos Gafanhotos vive da Mentira da Defesa do Ambiente

Instala-se cada vez mais uma cultura parasitária que vive de rituais do pensamento e da liturgia da propaganda que se tornou o ópio do povo no controlo do consciente e inconsciente na estratégia de implementação duma consciência proletária consumista.

Assim o povo, vislumbrado pelo brilho dos medos, distraído e desorientado com a desinformação instalada, acabrunha-se perdendo a capacidade que fez dele homem/mulher: a capacidade de reflectir e resistir.

António da Cunha Duarte Justo

EURO 2008 – PORTUGAL EM FORMA

PORTUGAL VENCE A TURQUIA E LIDERA O GRUPO A

Portugal derrotou a Turquia por 2 a 0, em Genebra.

A grande novidade trazida pela equipa portuguesa foi a sua capacidade de trabalhar em equipa. Antes era um grupo de grandes individualidades e no EURO 2008 está a demonstrar que é também uma equipa de artistas de cúpula não só a nível de trabalho individual como em trabalho de grupo.

Parabéns aos jogadores e ao seu trinador. São um exemplo para Portugal e para os politicos portugueses!

Antóni Justo

Com o Romantismo nas Pegadas de Portugal

(Continuação do texto “Dia de Portugal – Nas Pegadas de Portugal – Romantismo, Diagnóstico e Cura)

António Justo

A crise de hoje é civilizacional, antes de tudo cultural. Ela atinge mais os países da periferia, levados no redemoinho da globalização e propensos a reduzir-se a macacos de imitação. A crise portuguesa é crónica com muitos problemas chocados em casa. A má condução e aplicação da “Revolução de Abril”, com o abandalhamento do espírito português; a traição dos interesses portugueses nas antigas províncias ultramarinas, e um povo continuamente na rua de ouvidos atentos à propaganda dos dançarinos de Abril, tudo isto conduz Portugal à depressão e reata o ritmo da nação ao ideário do jacobinismo socialista do século XIX.

Outrora, o romantismo, cultura também ela de importação tardia, esforçou-se muito por tapar o buraco do racionalismo francês e por salvar o liberalismo dando-lhe uma feição portuguesa. Para tapar os buracos da ideologia dialécticaactual, ainda se não vislumbra nenhum oásis em que os portugueses se reconciliem, na base duma identidade própria. (Naturalmente que Portugal precisa de inovação e de progresso mas não com os extremismos ideológicos e estrangeirados expressos nos barões de outrora e nos boys de hoje!)

Criar uma cultura nacional portuguesa

O fomento duma cultura nacional portuguesa implica mundializar Portugal dado o ideário português possuir um espírito integral global, forjado no cadinho do cristianismo e das diferentes culturas.

Os românticos são escritores em que a dimensão nacional se torna palco e sentido da sua produção literária. Entendem-se como plataforma da cultura e ao mesmo tempo como crítica dela.

Em consequência das invasões francesas, do refúgio da corte no Brasil, do desenvolvimento das lojas maçónicas, ideais liberais, de revoluções e contra-revoluções, muitas personalidades vêem-se constrangidas a emigrar.

O exílio político dos nossos românticos contribuiu para a evolução cultural portuguesa. Emigrantes como Garrett e Herculano, transmitem com autenticidade temas românticos como saudade, isolamento, revolta amargurada e anseio da liberdade. Garrett desabafa perante o estado da nação e os exageros liberais: “Eu do meu pátrio Tejo desejoso / Deixei nas praias desmontada a lira: / Suas águas, já tão puras; hoje envoltas / Em lágrimas de sangue… / …quando a pátria é morta, / Morrem com ela as Musas.”

Também Alexandre Herculano em ‘A Vitória e a Piedade’ (1833) dá expressão à alma portuguesa romântica: ”…E lá chorei, na idade da esperança, / Da pátria a dura sorte: /

Esta alma encaneceu; e antes do tempo / Ergueu hinos à morte…”

No romantismo, o ideal, o sonho, a emoção o sentimento, fazem parte duma mesma paisagem humana e duma natureza comuns. Ele segue uma espécie de panteísmo místico que constitui como que o cenário base para a relação indivíduo – geografia, indivíduo – paisagem, indivíduo – povo numa identidade participada. Quer construir o futuro mas numa unidade de nação e indivíduo num destino comum enraizado no passado mas aberto ao futuro. Ele questiona uma forma de racionalismo vigente para possibilitar a descoberta do indivíduo sensível e livre. Pretende, na procura duma espiritualidade e duma mística que lhe dê um panorama libertador, libertar das amarras político-sociais autoritárias e dum certo moralismo convencional. O status quo ata o povo à melancolia levando-o a refugiar-se em figuras de heróis que contestam a mediocridade do factual e as máscaras duma sociedade artificial que se opõe a uma subjectividade nascente e inconformada com os limites do dia a dia.

Introduzido em Portugal por Almeida Garret com “Camões e Dona Branca” em 1825, o romantismo afirma a emoção e o sentimento, ao contrário do Neoclassicismo que afirmava a razão. O sentimento e a imaginação são guiados pela liberdade com uma referência sempre ligada à terra e ao povo num estilo coloquial e muito natural. Almeida Garrett, empenhado na propagação do liberalismo, proclamava: ”Este é um século democrático, tudo o que se fizer há-se ser pelo povo e com o povo”. Por isso a literatura assume um carácter pedagógico com intenção formativa. Os poetas querem-se com espírito cívico e democrático com uma reflexão fundada sobre a nacionalidade. Sentem-se os continuadores da obra dos padres numa plataforma cívica. Almeida Garrett preanuncia em “Dona Branca” a nova orientação estética. Renuncia à mitologia pagã para afirmar o maravilhoso nacional. O novo altar é o das tradições nacionais. “Professei outra fé, sigo outro rito, E para novo altar meus hinos canto”. Nas suas obras estão presentes as tradições populares, as figuras históricas, o sebastianismo, a rivalidade com Espanha e o ideal cristão evangélico. Garrett também contribui para a restauração do teatro nacional com a sua obra-prima “Frei Luís de Sousa”. Aqui confessa a prevalência da Literatura sobre a História. “Eu sacrifico às musas de Homero, não às de Heredoto; e quem sabe, por fim, em qual dos dois altares arde o fogo de melhor verdade”. Em “Frei Luís de Sousa” assiste-se ao sebastianismo projectado na fidelidade de Maria e de Telmo que se vê representado no regresso de D. João de Portugal, o primeiro marido. À ocupação filipina procura afirmar-se a dignidade nacional preservada num certo sebastianismo.

A revolução liberal de 1820 empenha a intelectualidade portuguesa. Os românticos da primeira geração revelam-se personalidades do equilíbrio não perdendo, no seu entusiasmo iluminista, a perspectiva da paisagem natural mantendo-se com os pés no chão pátrio. Garrett e Herculano fazem parte do movimento revolucionário liberal, contribuindo também eles para a derrota miguelista.

A implantação do romantismo com “Camões” e “Dona Branca” dá-se sob o signo dum liberalismo humano baseado nos valores de liberdade, igualdade e soberania da nação.

Com Herculano surge uma consciência nova duma história crítica mas integral. Alexandre Herculano em “Eurico o Presbítero” torna-se porta-voz dum romantismo liberal conservador e respeitador da tradição religiosa portuguesa, contra o jacobinismo militante e contra o populismo ideológico vigentes. Herculano defende o municipalismo (democracia biotópica e não ideológica) contra o centralismo; ele critica o clericalismo e o socialismo e defende um liberalismo e um cristianismo evangélico como se pode ver no “Pároco de Aldeia”. Herculano luta pela implantação dum liberalismo português e não francês. Ele lamenta que o país viva sem conteúdos culturais profundos e que a preocupação intelectual portuguesa se esgote pois “todos os cuidados estavam aplicados às misérias públicas e aos meios de os remover”.

Oliveira Martins constata também: ”Uma das mais conspícuas aventuras do Romantismo foi decerto a tentativa de criar uma tradição nacional portuguesa…” O romantismo vem tapar o buraco cultural criado por ideologias socialistas não aferidas. Fomenta uma literatura de empenhamento cultural tendente a provocar uma reforma das mentalidades no povo. O problema será o da ideologia e do jacobinismo mais interessados nos dividendos da revolução liberal do que no empenhamento cultural e na transformação do povo.

Assim à geração Garrett/Herculano (1825-1850) segue-se a geração convencionalista dos instalados à sombra dos ministérios e da administração, liderada por Castilho em que, sob o seu mandarinato, se impõe uma literatura oficial. Alberto Ferreira descreve a situação deste modo:”Convulsivamente, o artista aceita o predomínio social e político do barão, cede às prepotências mundanas ou às imposições do público… cada um, mais ou menos, acaba por sucumbir às solicitações e apelos dos instalados, à coacção da mediocridade… O escritor ora cede às imposições familiares ora se deixa absorver pela burocracia estatal”.

Não admira, assim, que, na feitura literária passem a dominar os aspectos formais, e o espírito criativo se esgote na vernaculidade da palavra, na ortodoxia da sintaxe e na correcção métrica. Dá-se o emburguesamento mental e o escritor perde a capacidade crítica, como convinha ao rotativismo partidário da governação.

Depois, a geração de Antero de Quental, com a “Questão Coimbrã”, consegue maior autenticidade e perspectivas de visão. Ele luta contra o mandarinato de Castilho e certas fraquezas ultra-românticas, contra convencionalismos e oportunismos mas desilude-se. O socialismo leviano português não compreendeu, ontem nem hoje, a profundidade do pensamento português de Quental. Quental mata-se desiludido do socialismo e talvez dum Portugal que não aprendeu a entender-se a si mesmo. Um Portugal que, tradicionalmente vai adiando a vida, atraído por ideias de ocasião que as modas políticas vão exibindo.

Como outrora também hoje se precisa de janelas abertas e rasgadas que permitam maiores panoramas à alma portuguesa. Necessitamos, além de fazedores, também de videntes e admoestadores ao serviço de todo o povo português. No deserto de Portugal não chegam as miragens precisa-se também de oásis. O romantismo queria levantar a nação e ao mesmo tempo dar-lhe profundidade com a fantasia e a inspiração, ao contrário do que faziam e fazem os nossos figurinos de casa vivendo da cópia ou do ditado alheio.

Percurso de Portugal previsto já em “Viagens na minha Terra”

António Justo

“Viagens na minha Terra” a obra de Garrett que deveria constituir leitura obrigatória para todo o bom português é uma viagem ao “espaço” português, um espaço polivalente que possibilita os mais variegados trajectos ideológicos. Garrett apresenta nesta obra os diferentes componentes políticos, culturais, históricos e ideológicos em curso. Para ele o povo é puro, autêntico e tem bom gosto enquanto que a sociedade urbana e burguesa é “espuma descorada”, superficial e artificial.

No herói da novela, Carlos, dá-se uma transformação do Homem Natural para o Homem Social. Nas Viagens prevalece a ideia rousseauriana da bondade natural do indivíduo, numa mística cristã e num ambiente idílico longe da perversão social modernista.

As viagens comprovam a crise de valores e a situação político social com os seus conflitos de idealismo e materialismo. Dum lado os ideais do amor pátrio e da arte e do outro o mundo mesquinho utilitário e artificial. Nele se vê o aguilhão da cultura portuguesa no conflito frade – barão. O barão aproveita-se da confiscação dos bens fundiários das ordens religiosas e duma igreja acomodada, originando-se assim uma oligarquia de barões ricos.

As Viagens resumem: “O frade era, até certo ponto, o Dom Quixote da sociedade velha. O barão é, em quase todos os pontos, o Sancho Panca da sociedade nova. Menos na graça… O barão é pois usurariamente revolucionário, e revolucionariamente usurário. Por isso é zebrado de riscas monárquico – democráticas por todo o pelo”.

Os barões de hoje reportam-se aos cravos do seu Abril, vendo Portugal com os olhos colorados de Abril mas não com os olhos de Portugal. Encostados também eles à administração pública e partidária deixam Portugal sangrar. A sua má consciência é branqueada com ideias ou invertida em combates contra redutos cristãos ou contra uma Igreja já não existe, ou à maneira quixotesca com palavras vazias como progresso, inovação, mudança, reformismo. A questão porém não está no ter mas no ser…

Uma coisa é comum ao liberalismo, ao republicanismo e ao 25 de Abril: a desilusão. Nestas três “revoluções” mancharam-se os ideais da igualdade e da justiça. Em “Viagens na minha Terra” constata-se com resignação que a oposição natural ao progresso é constante pois “o mundo sempre assim foi e há-de ser” e verifica-se que os que se apoderam das revoluções se apoderam sempre das instituições estatais. O “status in statu forma-se: ou com frades ou com barões ou com pedreiros – livres se vai pouco a pouco organizando a influência distinta, quando não contrária, às influências manifestas e aparentes do grande corpo social. Esta é a oposição natural do progresso…” Os arautos das revoluções tornam-se barões. As revoluções tropeçam nos seus próprios mentores. Certamente por estas razões uma das primeiras acções governamentais de Mário Soares foi reabilitar a Maçonaria.

Na novela, Carlos simboliza o Portugal progressista e Joaninha o Portugal tradicionalista. Carlos representa o conflito ideológico e psicológico com Frei Dinis, seu tio (antigo regime). Ele busca nas novas ideologias, nas lutas liberais o afastamento das suas origens naturais. No seu trajecto, Carlos transforma-se, degrada-se e faz-se barão. Joaninha permanece fiel aos ideais de amor e de autenticidade, de que não abdica e morre doida. Carlos segue a razão e o progresso; Joaninha segue o coração e a tradição.

Já tarde, Carlos escreve a Joaninha, a única com quem ele realmente pode falar abertamente e confessa (e com ele a Revolução): “estou perdido para todos, e para ti também… Estou perdido. E sem remédio, Joana, porque a minha natureza é incorrigível. Tenho energia de mais, tenho poderes de mais no coração. Estes excessos dele me mataram…e me matam”.

Com esta confissão se declara o falhanço do liberalismo português, que foi o falhanço do republicanismo (a primeira democracia portuguesa) e que está a ter continuidade nos indícios de fraqueza crónica da nossa democracia de Abril.

Carlos protagoniza o percurso histórico de Portugal e em especial o do liberalismo e do 25 de Abril.

Uma vez desmistificada a revolução francesa (e ultimamente a Russa) trata-se agora de desmistificar a revolução dos cravos para se poder passar a desmistificar o sentimentalismo português e, na reconciliação de razão e coração, se dar perspectiva à vida nacional e individual abrindo a janela da poesia e da acção no sentido da reconquista de Portugal. Então a literatura, a poesia tornar-se-ão, não em instrumentos ideológicos mas em factores correctivos da política e factor formador do povo, tal como queria o romantismo. Para isso, os conservadores terão de acordar do seu sono deambulatório e os progressistas têm de deixar o seu espírito mercenário, para juntamente descobrirem que o globalismo, a modernidade e a democracia se encontram já nas origens da nação e da terra lusitana e não nas ideologias e modas estranhas.

Há entretanto uma chance que passará pela transformação e integração contínua do nosso ser de Carlos e de Joaninhas sem a perca da própria identidade. Integrar o progresso na tradição e a tradição no progresso, esta deverá ser a missão de governos e de cidadãos. Para isto pressupõe-se uma capacidade de auto-reflexão e de integração e a vontade de se ser povo, de se ser português não abdicando das diferenças e de se ser homem/mulher livre em processo.

António da Cunha Duarte Justo

“Pegadas do Tempo”


DIA DE PORTUGAL – NAS PEGADAS DE PORTUGAL

A Festa repete-se e Portugal também

António Justo

Romantismo – Diagnóstico e Cura

Também, este ano, alguns portugueses celebrarão o seu dia de Portugal. A maioria terá dificuldade em festejar por viver fora de Portugal ou porque as preocupações pela sobrevivência não deixam espaço para festejos. A comemoração oferece, porém, uma oportunidade para se frazer o ponto da situação. Que dia de Portugal se continuará a celebrar: o macho ou o fémia, o dos seus representantes ou o do povo?

Ao compararmos o Portugal de hoje com o de ontem, verificamos que repete os mesmos vícios e virtudes do regime liberal e republicano. A nível de processo íntimo, as revoluções em Portugal parecem decalcáveis: os mesmos mitos, as mesmas lutas, os mesmos mostrengos, as mesmas ideias, a mesma estratégia, os mesmos políticos (desdobráveis) e os mesmos erros, a mesma mentalidade. Cada nação tem a sua doença colectiva específica. Diagnosticá-la será já meio caminho andado para a sua cura.

Em “Viagens na minha Terra”, Garrett faz uma descrição modelo da situação e dos problemas do Portugal de sempre. Nos protagonistas da narrativa, Carlos, símbolo dos progressistas e Joaninha, símbolo dos tradicionalistas, temos uma boa diagnose aplicável à actualidade sobre a situação dos partidos e da cultura portuguesa num Portugal que teima ser irreconciliável.

O romantismo liberal inicial de Garrett e Herculano, tal como, depois, o de Antero de Quental procuram aportuguesar o liberalismo (masculino) e o socialismo político importado (inicialmente bravio depois oportunamente acomodado) e dar-lhe uma perspectiva lusitana (feminina). Constatam o falhanço do projecto de liberalizar e democratizar Portugal. Portugal falha pelas mesmas razões que Carlos e Joaninha falharam. O comodismo instalado e o espírito Sancho Pança predomina em todos os sectores nacionais dominal a camada responsável.

O desenrolar da democracia do 25 de Abril parece seguir os mesmos passos encontrando-se já na fase da “desistência cívica”. Por isso desejo lembrar dois autores românticos, Almeida Garrett e Alexandre Herculano, cujo ideário se encontra na continuação genuína da originalidade nacional e de Camões e, bem analisado, poderia dar impulsos novos e correctivos, atendendo que apresentam as mais variadas perspectivas do espaço português.

O protagonista Carlos, de “Viagens na minha Terra”, símbolo de Portugal do progresso abandona a província (Santarém) e assim enjeita Joaninha (cultura tipicamente portuguesa) incompatibilizado, ao mesmo tempo, com Frei Dinis (antigo regime) e vai à procura de novos ideais para a cidade (liberalismo) envolvendo-se nas lutas liberais (conflitos entre socialistas e conservadores). Neste novo espaço transforma-se e conhece, entre outros bens, a cor da luz dos olhos da Georgina e da Soledade (os belos corpos duma modernidade que permanece alheia). Depois de desenganos e frustrações volta a Santarém (cultura tradicional nacional) mas aí sente-se já estranho; tinha-se mudado e a mudança tinha sido tão radical que já não comportava a integração da memória no seu ser. Entretanto foi-lhe revelado que era filho do padre Dinis (um sinal talvez de que deveria reconciliar a tradição com o progresso ideológico, o pólo masculino com o pólo feminino da nação). Pelo contrário, desiludido da ideologia e da terra, que já na pode amar porque a ideologia e os bens o tinham desnaturado, volta à cidade e faz-se barão. Declara-se perdido. Joaninha enlouquece e falece.

Esta tem sido a perspectiva dum Portugal insatisfeito fatalmente irreconciliável consigo mesmo. Em Carlos podemos ver a masculinidade portuguesa infiel e homossexual que vive dos bordéis estrangeiros e em Joaninha a feminidade portuguesa fiel mas fechada em si mesma quase lésbica. Este é o problema de Portugal. A sua masculinidade e feminidade não se integram num todo. A luta do saber cínico (Carlos) contra a crença ingénua (Joaninha) conduz, segundo a experiência histórica, a uma portugalidade amorfa e indiferente. Isto conduz àquela “apagada e vil tristeza” dum Portugal não vivido mas com a ilusão de viver que lhe vem da sua divisão num Portugal de alguns tantos eremitas e poetas refugiados, de alguns barões da ceita e dum resto lamuriento.

O carácter másculo da revolução desmistifica a vida nacional fazendo dela um deserto desconsolado e mono-perspectivo. Não percebe que uma nação vive de muitas fidelidades. Não chega a mudança pela mudança como pretende o touro revolucionário, é precisa a fidelidade duma relação que possibilite a evolução.

Portugal ajoelhado e preso ao cadeado do racionalismo francês

O destino de Carlos e de Joaninha são, até agora, o destino de Portugal, o destino dum Povo fracturado. Foi este o destino da época do Marquês de Pombal, da época liberal, da época republicana e parece ser o futuro da revolução de Abril com a sua democracia. Nas diferentes épocas referidas repete-se o mesmo esquema: estrangeirados e sequazes importam a ideologia renovadora e, com ela, o seu espírito jacobino e dialéctico. Falta-lhe a própria reflexão, a reflexão portuguesa. Não chega o esperma da ideia, é preciso o corpo da nação em que ele fecunde. Portugal tem desonrado a nação (cultura nacional) dando mais carinho à amante do que à mulher!… O racionalismo francês, incorporado no socialismo português tem andado inebriado de si mesmo deixando-se levar pelo som das próprias patas em direcção duma direcção sem orientação. Vai sendo tempo de Portugal deixar de ser o bordel de alguns rufiões. Estes têm que integrar a feminidade em vez de a violarem.

Portugal serve o estrangeiro descurando o seu ser e os seus interesses. As revoluções, não aferidas ao espírito português, tornadas apanágio de alguns e desconhecedoras do seu ser cristão, monista e panteísta, tornam-se ciclos viciosos. Assim os que se apoderam de Portugal comportam-se, no país, como senhorios ao curso dos ventos estrangeiros, determinando, de suas “lojas”, o sentir e o ser dos seus inquilinos. Dançarinos do poder e da cultura importam as ideologias da França (ou Rússia) com o prejudicial jacobinismo como se tratasse da importação de máquinas.

Em Portugal quem consegue viver de fora não vive mal. Metade dos portugueses vive fora de Portugal e a outra metade vive dos de fora. Também o pensamento e a reflexão têm sido artigos estranhos de importação. Não chega pernoitar com eles.

As crises sociais e políticas portuguesas repetem-se ciclicamente como os ventos. O vício comum tem sido o desinteresse e irreflexão cultural, acompanhados pelo jacobinismo dos renovadores liberais, republicanos e socialistas (abrilistas). Estes são individualistas e internacionalistas a quem falta a consciência pátria; são os continuadores dos oportunos que na batalha nacional de Aljubarrota se puseram, à margem do povo e ao lado de Castela, que prometias mais comendas. Se, à custa do povo e da cultura nacional uns se puseram ao serviço dos interesses de Castela, os posteriores puseram-se ao serviço da França (maçonaria saúda os invasores franceses) e finalmente (entrega das províncias portuguesas à hegemonia comunista com o 25 de Abril) do socialismo russo e cubano. Um povo vazio, sem ideia nem ideias, facilmente se deixa levar pelos vendedores da banha da cobra que ciclicamente aparecem na arena pública. Portugal se quiser sarar terá de descobrir a sua feminidade e criatividade. Para isso terá, porém, de voltar aos berços da nacionalidade.

Não chega que alguns estranhos à cultura e ao povo, se aproveitem do 25 de Abril e de Portugal, tal como os barões se aproveitaram da revolução liberal. Estes sim, têm razão para festejar e se congratular com os proveitos da revolução; para a nação deixam a ideologia requentada. O problema deles é, não terem nascido do húmus, nem da reflexão portuguesa, faltando-lhes assim um conceito de cultura nacional processual, tornando-se eles mesmos no impedimento duma evolução portuguesa normal e equilibrada de espírito livre e desenvolvido à margem de complexos másculos nem fêmeos. O viver do encosto provoca no povo uma atitude de encostados das instituições.

Um socialismo militante, irreflectido e desintegrado e um conservadorismo emocional e burguês, sem tradição teórica nacional básica, têm sido os ingredientes que fazem do destino de Portugal o destino de Carlos e Joaninha.

Para festejarmos temos primeiro que restaurar Portugal, teremos de nos tornar Carlos e Joaninha mas reconciliados. Doutro modo não passaremos duns machistas da nação sempre à procura dum outro pão.

António da Cunha Duarte Justo

antoniocunhajusto@googlemail.com

(Continua em: “Com o Romantismo nas Pegadas de Portugal”)

Estacionamento ilegal de Soldados no Kosovo ?

O partido alemão „A esquerda “ apresentou queixa constitucional contra o Estado pelo envio de soldados alemães para o Kosovo.

Com a independência do Kosovo a Resolução 1244 das nações Unidas, que legitimava o envio de tropas, deixa de ter efeito. A nova situação não justifica a presença de soldados estrangeiros no país. Por isso o partido “Die Linke” apresentou queixa junto do Tribunal Constitucional em Karlsruhe contra o prolongamento do mandato de envio de soldados para aquela região.

Argumentam também com o Direito das Nações que proíbe a separação unilateral de minorias e no caso de separação exige o acordo das partes.

O governo fundamenta o envio com base no pedido do governo do Kosovo legitimado pela resolução 1999 do Conselho para a Segurança Mundial.

Ontem, o parlamento alemão legitimou o prolongamento do mandato de envio de soldados com 499 votos a favor, 57 contra e três abstenções.

A situação insegura no Kosovo manter-se-á até que a maioria muçulmana, no prosseguimento da sua intenção, assimile os sérvios. Até lá os governos prolongarão a sua presença na região começada há dez anos.

Enquanto que aqui se apoia uma colonização assistida em África deixam-se os povos abandonados ao processo de colonização interna.

Quando o interesse das potências está em jogo a lei ocupa um lugar secundário. Todas as intervenções na antiga Jugoslávia se deram por interesses da Alemanha e de interesses estratégicos europeus, sem que a lei os cobrisse. Na África, onde há irregularidades retumbantes e grupos dizimam outros grupos, aí não há lei nem interesses que motivem intervenções? Ou será que a vida dos africanos não é tão apreçada nos mercados do poder?

Neste caso o Direito é muito maleável e prevê mesmo as curvas mais apertadas.

António da Cunha Duarte Justo

antoniocunhajusto@googlemail.com