Queridos Leitores e Amigos!
Neste tempo de quarentena em que se vive sobretudo sob o manto das estrelas noturnas, somos levados a ressaborear o Sol da vida que a luz do dia, até há pouco, nos oferecia. Este anoitecer talvez nos ajude a admirar a outra parte de nós que é a do céu estrelado em que o Sol do nosso dia repousa.
A vida é feita de dia e noite, daquilo a que chamamos bem e mal, e nós também! No declinar das certezas notamos que permanece a luz da esperança, aquele raio de luz que une o eu ao nós.
No Mestre da Galileia, temos o exemplo dessa mistura de noite e treva, de sexta-feira santa e de domingo de ressurreição: temos a mistura de terra e Céu, de que todos nós somos formados e de que Jesus Cristo é também protótipo. Daí sermos vida em processo, vida feita, toda ela, do eu e do nós. (Quando sofremos sofre o mundo em nós, quando sofremos o vigor da maldade alheia também sofre a sombra da nossa em nós).
O tempo de crise viral que passamos é um momento da nossa vida, um momento de “Sexta-feira Santa” a que falta acrescentar o Domingo de Ressurreição. O Domingo da semana permanecerá ainda rodeado pela esperança da realização completa.
Pelo que verifico em mim, o difícil da vida é conseguirmos integrar em cada um de nós o todo, o todo da Semana Santa que é feita Sexta-feira e Domingo de Páscoa. O mesmo se pode ver também na analogia da natureza com as quatro estações do ano (inverno, primavera, verão e outono), na vida trata-se de reconhecer e de integrar pessoalmente em nós mesmos o todo integral. Então o encurralamento em que nos encontramos não será tão limitador porque nele temos já o gene divino, as janelas e as portas de que possuímos as chaves. Então cada um de nós se poderá tornar numa porta ou numa janela aberta em que raia a luz da esperança mesmo nos momentos mais tenebrosos da escuridão. Somos feitos de Céu e Terra, de divino e de humano, e para lá das crenças vamos ajudar-nos uns aos outros a não esquecer o Céu comum a todos nós.
Somos feitos de luz e treva e no reconhecimento da própria treva estaremos mais irmanados e mais preparados para vislumbrar a luz que brilha em nós e nos outros. Somos feitos de noite e dia e a nossa consciência de ser torna-se possível, porque o ser só é ser, só acontece na complementaridade e como tal é de encontrar em todas as partes e não numa só parte (o existir do ser, tal como a moeda, só o é na expressão de duas faces!); creio que esta dicotomia do existir no ser (sombra e luz, terra e céu) só poderá ser sublimada através do amor, da com-paixão e da consciência de se ser parte no todo; e isto num todo a servir-nos e cada um de nós a servir o todo. Neste sentido serão transpostas as incompreensões e inimizades pessoais e sociais e também a luta escura entre os partidos se tornará diferente.
Desejo a todos uma Páscoa saboreada à sombra da Semana Santa. Se não fosse a luz não víamos a cruz e se não fosse a cruz não existiria a vida. Somos feitos de luz e treva, cientes de que o nevoeiro do dia (humildade) nos permite pressentir a beleza das cores que a vida encerra. De facto, o brilho das cores do arco-íris só é possível e reconhecido no fundo pardo da atmosfera!
Se não fosse a luz não víamos a cruz! Se não fosse a noite não víamos o dia, se não fosse o dia não sentiríamos a noite. Importante é reconhecermo-nos e aceitarmo-nos do sermos feitos do que somos e do como somos.
Para todos, família e amigos, uma Páscoa feliz e que o sol da ressurreição nos vá iluminando a sexta-feira santa desta quarentena forçada que estamos a viver.
Jesus resurrexit sicut dixit, Alleluia! Para os que não creem podem saborear a simbologia que a tela da vida nos proporciona. No fundo, o que importa será ficarmo-nos pela luz do amor que em todos brilha.
Um grande abraço para todos
António da Cunha Duarte Justo
Teólogo e Pedagogo
Pegadas do Tempo
Obrigado pelo texto e pelos votos. É dessa forma que somos feitos e estaremos no bom caminho e o mundo seria de paz, se cada um de nós, no nosso dia a dia, aceitasse a diferença dos outros, como gostamos que aceitem a nossa. Boa continuação.