Na Passagem da Era do Petróleo e do Carvão para a Era das Energias renováveis
Por António Justo
Com 2020 iniciamos um ano redondo de fim de década, o que convida a fazer uma tentativa de balanço sobre o passado e o que nos espera no futuro.
Como pontos relevantes de referência básica temos a primeira guerra mundial que iniciou o fim das nações na qualidade de potências individuais. Temos o comunismo a tornar-se no elo de ligação e coerência que deu expressão mundial à União Soviética como grande potência que hoje se prolonga na influência ideológica; por outro lado os USA com o capitalismo que deixaram de ser apenas um país para se tornarem na superpotência mundial, a partir da sua intervenção na I e II Guerra mundial. Ficaram assim a atuar no subconsciente dos povos e nos bastidores do palco mundial, de um lado, o capitalismo americano e do outro, o socialismo facetado.
A uma Europa enfraquecida pelas guerras e reduzida ao mero âmbito de nações, para poder sobreviver em relação aos USA, à Rússia, às potências surgentes da Ásia só lhe resta a alternativa de se organizar através de convenções e contratos na União Europeia.
À II Guerra Mundial seguiu-se o grande crescimento económico europeu, tendo dado origem ao maior período de paz na História da Europa e consequentemente houve um grande desenvolvimento no que se refere aos direitos humanos, responsabilidade social, espírito democrático, liberdade de imprensa e de mercado e à revolução tecnológica em via.
Temos pela frente o grande dilema climático e a necessidade de produção de energia sem base no carvão e no petróleo (grande problema tecnológico a solucionar será o do armazenamento de energia em baterias) para apostar certamente no desenvolvimento e construção de reatores de fusão à base de hidrogênio, como os ingleses já procuram fazer.
Como a vida social e política costuma andar atrelada à económica, tudo dá a entender que, no futuro, as zonas geradoras de riqueza e de conflitos passarão do Ocidente para o Oriente, como se observa na afirmação mundial da China em relação aos USA. As tempestades económicas são sempre acompanhadas por devastações sociopolíticas.
A destruição do Globo não tem que acontecer, talvez as nossas esperanças se encontram mais flutuantes nesta era muito caracterizada pela mudança e pelo receio do domínio de “dinossauros „económico-políticos.
Já não serão as políticas nacionais a determinar o desenvolvimento das regiões, mas sim grandes empresas anónimas (Google, Apple, Facebook, Amazon, Tencent, Alibaba, Visa, AT&T e outros que surgirão, chamarão a si as atenções e os interesses); estas concorrerão entre elas na tentativa de concentração de capitais e de poder ao lado do poder ideológico político na disputa comum pelo domínio das grandes massas.
A inovação tecnológica necessária, se acompanhada por uma cultura do senso comum e da honestidade, prometerá um futuro melhor e ainda mais agradável do que o de hoje. Para isso seria necessário que os valores surgidos da civilização judaico-cristã e greco-romana (baseados em relações pessoais humanas) não sejam substituídos por relações individuais baseadas no útil comercial (influência asiática).
A vida é contínua mudança e a plataforma que lhe dará consistência e sustentabilidade é a fé/esperança que nos acompanha no caminho, não nos deixando ficar sozinhos! Um povo, que não cultive a fé e a esperança, patina em si mesmo e não avança.
A esperança assemelha-se ao nadador que, para se afirmar em frente, se apoia na resistência que lhe oferece a fragilidade da própria água que o sustem.
A atitude da classe política europeia ao transpor para o povo o peso das dívidas e ao reservar para as elites o luxo descomunal, fomenta assim a chamada reação do “populismo” e dos ‘coletes amarelos’; estes são muito sensíveis à mudança axial que paira no ar e de que muitos ainda se não deram conta e por isso se limitam, por vezes, a discursos do medo do medo!
O Brexit pode ser interpretado como uma reação de medo no mesmo contexto e também um sinal da falta de coesão de uma Europa envelhecida incapaz de dar respostas de caracter orientador e de sentido para o tipo de nova sociedade que vai surgindo (O Papa Francisco poderia servir de modelo para o novo homo politicus que urge criar – as peias ideológicas impedem, porém, os políticos de reagir aos sinais do tempo. A mentalidade extremista e exclusivista de uma esquerda ativista e de extremistas da direita mais não são que a continuação do fanatismo das antigas guerras de religião só que encoberto com indumentárias de democracia e de luta em nome de algum bem desgarrado.
Pelo seu lado, o mundo do operariado do sector produtivo sente-se inseguro perante a inteligência artificial que o vai arrumando pouco a pouco. O capital que o trabalhador possuía era a energia do seu trabalho manual sublimado no Dinheiro. Atendendo à dicotomia entre economia produtiva e a economia financeira e correspondente anulação dos juros, desvaloriza-se também a energia laboral do trabalhador em benefício da energia das máquinas e do anónimo. As inovações tecnológicas já se fazem sentir também no clima dos trabalhadores e seus receios em relação ao futuro; cada vez se torna mais seu anseio serem funcionários do aparelho estatal.
Por seu lado, as elites já incluem no seu agir a instabilidade social e o incómodo social; elas vão dando um passo de cada vez, tendo assim já abdicado da História.
Embora a pobreza mundial diminua, nunca houve uma época com tão grandes desigualdades sociais como a de hoje: regentes e oligarcas permitem-se a nível de salários e de gestão da vida (energia desviada) o que não se permitiam reis em relação aos seus súbditos: hoje estamos a ser cada vez mais burilados, através também do pensamento politicamente correto, como massa súbdita e anónima na grande máquina da anonimidade económica e política, que vê o seu trabalho simplificado através do controlo total de tecnologias e cabecilhas.
Estamos a passar do século do petróleo para a era das energias renováveis… O expansionismo económico chinês em rivalidade com o americano obrigar-nos-á, pouco a pouco, a desquitarmo-nos do domínio americano e também de muitos dos valores da sociedade ocidental. A não ser que o poder asiático se torne tão forte que provoque a união dos povos do ocidente com a Rússia.
Por enquanto a sociedade ocidental encontra-se numa fase de desconstrução não só por fraqueza própria, mas pela concorrência de novos protagonistas mundiais e por interesses estratégicos da ONU, interessada em desvalorizar a influência cristã no mundo no sentido de adquirir o controlo total sobre as sociedades para ir substituindo a concepção cristã da pessoa pela de indivíduo da China (relação mais de serviço). Se olharmos para os dados estatísticos do desenvolvimento económico dos países neste século, será de esperar que depois dos anos 70 já não será relevante a problemática política e económica entre a China e os USA, mas sim entre a China e outros países asiáticos.
© António da Cunha Duarte Justo
Pegadas do Tempo
Olá, Caro António Justo.
É verdade, gosto dos teus textos, já o sabes.
Depois do que acabo de ler, pus-me a pensar, alertado por ti, evidentemente, que a Europa, nós, europeus, ainda continuamos a considerar-nos (demasiado) importantes, porque ainda temos e respeitamos alguns valores “humanos, ou queremos acreditar que assim é.
Ao longo de séculos, comandámos a nau da História nos seus diversos aspectos: políticos, culturais, sociais, religiosos, económicos, científicos, tecnológicos…. O problema (minha opinião) é que nem já nós, muitas vezes, respeitamos os valores que herdámos ou conquistámos, nem os outros os respeitam como tal, e outros valores se levantam, aos quais teimamos em não dar a importância que talvez mereçam, ou para os confrontar ou, quiçá, para os respeitar e incluir na nossa idiossincrasia de europeus.
O actual posicionamento dos vários actores políticos, a nível mundial, faz-me lembrar o comportamento das placas tectónicas do planeta que, de vez em quando, têm necessidade de se adaptar entre si, muitas vezes através de embates incomensuráveis e com efeitos terríveis para o minúsculo ser humano.
As tácticas guerreiras e suas consequências do “big brother” universal (Google, Amazon, Apple, Facebook … que tu referes) ainda não serão totalmente conhecidas e muito menos estão analisadas em profundidade, nem houve espaço histórico para tal por serem demasiado recentes; por outro lado, o homem talvez continue mais preocupado com o (seu) selfismo – passe a redundância – o que o levará a ficar cada vez mais enfraquecido, porque sòzinho.
Concordo plenamente contigo, e aqui está a arma/remédio contra o derrotismo negativista: não podemos caminhar sozinhos, e o que nos irá manter/salvar é a fé/esperança – T.
E, em consequência, apetece-me voltar ao que continuo a defender e a que tu, em tempos, deste aval: são as ideias que levam aos factos – preocupemo-nos, muito, com as ideias, que elas darão fruto.
Mas, e se, com o andar dos tempos, este binómio se inverter? Será tal possível?
Forte abraço do Evaristo Miguel
Olá, caro Evaristo Miguel!
Obrigado pelo teu Feedback e pelas ideias que expões.
O que escrevo é fruto de reflexão própria sobre o andar das coisas e como tal como flaches numa realidade complexa que nos rodeia e determina . Realmente o que importa é pensar e fazer pensar sem contudo dar que pensar! Quer queiramos quer não a civilização Ocidental é a mais desenvolvida que temos embora não completa nem acabada e não nos legitime a sentirmo-nos superiores a ninguém; somos todos irmãos agarrados ao mesmo barco. O que faz sofrer é que muitos a queiram deitar ao lixo em nome de novas agendas materialistas e hegemónicas a que falta a luz do sentido. O que está em jogo são realmente os valores humanos (que importa salvar) que se consideram impedimentos para a hegemonia económica e ideológica.
É verdade, que já “não respeitamos, nós mesmos os valores que herdamos”; a nossa própria cultura, aberta e indefinida no tentar definir criou correntes anti cultura e anti civilização através do existencialismo niilista e do materialismo dialético. Ao matarmos Deus destruímos a alma da nossa civilização, porque sem ele destruímos o sentido e Homem também. É verdade que os valores são como que o rosto da sociedade e esta se encontra em contínua mudança. O cristianismo tem uma espiritualidade de baixo que acompanhada da humildade e do saber-se irmão na riqueza e na pobreza, no vício e na virtude contem em si mesmo o antídoto anti-imperialista que respeita o outro.
A comparação com as placas tectónicas é muito elucidativa; coisa semelhante acontece dentro da Igreja; só que muita gente não nota e pelo facto de não notar não está consciente do que se passa. Por outro lado temos um povo educado para não se incomodar com nada e até pensar que qualquer espírito crítico é um ataque à monotonia de um viver à pateta-alegre que se quer defender no ambiente das camadas dependentes do pensar dos outros.
Também penso que a acompanhar as táticas dos “big brother” estão as agendas universais que reduzem a pessoa humana ao individualista fechado no seu selfismo, como, de modo muito apropriado, exprimes.
Sim, o cristianismo oferece-nos aquela fé capaz de criar o kairós, a nova realidade, sem tropecemos nos momentos surgentes.
Sim, estou convencido que as ideias levam aos factos e esta seria a maneira de ordenarmos melhor a realidade; o problema é que vivemos numa época anti pensante, numa época em que a emoção e certos factos artificialmente criados é que se querem para determinarem a realidade. Atraiçoamos a filosofia clássica para nos orientarmos por dados sociológicos e psicológicos que partem de uma realidade situacionista e como regra geral seguidora e dependente dos altifalantes da ideologia tão subcutaneamente transmitida através do pensar politicamente correto.
Tudo é possível e para mais num momento da História em que o próprio Homem e a física se procuram redefinir!
Grande abraço