O RIO E A ALMA PERDIDA

Havia um tempo em que o rio corria livre, serpenteando vales e montanhas com a graça de um dançarino ao som de uma música suave e delicada imbuída da ternura de Bach. Nesse tempo, a sua água clara refletia o azul do céu, as copas das árvores e era lar de libelinhas, peixes e passarinhos que enchiam o meio envolvente com cantos e cores. As pessoas vinham até ele, deixavam as roupas nas margens, mergulhavam nas suas águas, colecionavam pedrinhas e pescavam trutas que se escondiam sob rochas cintilantes. O rio era mais que um caudal de água; era um confidente, um retrato da natureza e, em muitos aspectos, um espelho da alma humana.

Mas o tempo foi passando, e as mãos humanas interferiram no curso do rio. O que antes era uma dança despreocupada transformou-se em algo contido, forçado. Barragens ergueram-se como muralhas, prendendo a correnteza, apagando curvas e lagos que, um dia, haviam sido refúgio de vida. Várzeas inteiras desapareceram sob as águas turvas, junto com os telhados de casas e memórias que antes respiravam esperança. O rio, agora engolido pela represa, não se reconhecia mais a si mesmo. Suas águas estagnadas refletiam tristeza, e o seu murmúrio tornou-se num lamento que se fazia sentir no subir da bruma cinzenta.

Uma noite, sentado à beira do rio transformado, ouvi seu desabafo. Ele falou-me de sua dor, de como sentia saudades de ser livre, de carregar folhas, galhos e sonhos em seu percurso até ao mar. Compartilhei da sua tristeza, pois em sua transformação eu via um reflexo do que acontecia à humanidade. Assim como o rio, as pessoas também haviam perdido a sua essência, a sua alma.

Convidei o rio para dividirmos o mesmo travesseiro de memórias. Fechamos os olhos juntos, tentando reviver um tempo em que sonhos individuais tinham espaço para florescer, livres das imposições de uma sociedade massificada e sob o controlo de forças estranhas. O rio contou-me que seu destino não foi escolha sua, assim como a alma humana não escolhe ser moldada por forças que a afastam de sua natureza autêntica. Ele lamentava como a sua água havia sido canalizada para um propósito impessoal, reduzida a uma fórmula de H2O que sustentava uma civilização sem alma.

“E os humanos?”, perguntou-me o rio, depois de uma pausa de silêncio. “Vocês também estão presos em barragens invisíveis, perdendo a identidade ao serem agrupados em massas. Antes, cada um de vós era como um cristal único e brilhante; agora sois apenas parte de um fluxo amorfo. Ninguém ouve mais o murmúrio de sua própria alma, apenas ouve e segue o eco da corrente dominante.”

Eu nada respondi, pois sabia que o rio estava certo. Olhei para o céu, buscando uma resposta que não veio. As águas calmas da represa refletiam estrelas, mas era uma calmaria que escondia uma verdade inquietante. Como o rio, também me sentia preso, não mais um indivíduo, mas parte de uma massa que se movia ao sabor dos ventos anónimos.

 

Naquela noite, prometi ao rio que guardaria suas memórias e suas lágrimas. Decidi que não deixaria minha alma ser submersa pelo lago da conformidade. Talvez, como o rio, eu pudesse encontrar um caminho de volta à liberdade, mesmo que apenas em sonhos, ou numa de troca de saudade transcendente que salda a dor da humanidade no colo da natureza.

E assim adormecemos, o rio e eu, com a esperança de que, um dia, tanto as águas como as almas reencontrariam o seu curso verdadeiro.

António da Cunha Duarte Justo

Pegadas do Tempo

A NATUREZA E O HOMEM SOFREM DA EROSÃO DO SEU CARACTER NA MASSA

Todos nós, natureza e humanos, caminhamos ao longo do riacho do espaço e do tempo seguindo um chamamento para nos erguermos e definirmos.

O meu amigo rio que antes se espreguiçava por meio de vales e montanhas e onde cada um podia nadar e divertir-se colecionando pedrinhas e pescando trutas escondidas debaixo das pedras e admirar os sedimentos que embelezavam o fundo do rio, ameaça perder o próprio caracter, o vigor e a vida que a natureza lhe proporcionou.  O meu rio no seu percurso espelhava as árvores e era o encanto de libelas e passarinhos e o seu rumorejar é como um duche de alma; um encanto antes de se unir a outros rios até chegar ao mar.

Há dias o meu rio queixou-se aos meus pés que se sente mal porque já  não é o mesmo porque o que  fizeram dele soa como uma insónia onde ecoam lamentações de recordações de uma realidade que não volta mais:  das suas curvas, e pequenos lagos do seu leito que foram profanados com barragens que o engoliram dissolvendo-o no grande ventre represa onde as águas se juntam para ficarem paradas encobrindo vales vivos e até telhados de casas, onde outrora a vida também fervilhava envolvida nas ondas de esperanças abertas. Como é triste e sem vida ver a vivacidade individual do rio transformada na quietude de uma barragem de águas turvas e impedidas.

Eu nesta noite chorei com o rio porque nele via em sintonia o destino da alma humana na alma do confidente rio. Então eu consolava o rio convidando-o a dormirmos com a cabeça juntos no mesmo travesseiro e assim não apagarmos os sonhos de outrora que eram próprios individuais, e ao mesmo tempo comuns e abertos quer na natureza quer no humano. Forças alheias não aceitaram a vida natural como ela é e ao domesticá-la secaram-lhe a alma. A minha alma, na alma do rio ficou estagnada murchando a sua esperança porque a essência da água foi canalizada em levadas de betão. Esta água desanimada passou a ser a artificialidade de uma fórmula H2O desencarnada ao serviço de pessoas berberescas com alma de massa sem individualidade. As pessoas, tal como a água da barragem, vegetam na generalidade da corrente principal, já não são elas passaram reduzir-se à voz do fluxo da corrente humana, sendo só eco vazio mais nada. Agora que as águas cristalinas do rio foram obrigadas a viver nas águas turvas da represa, verifico também eu que já não me entendem porque me vejo a viver já não na qualidade de indivíduo, mas como mera voz de grupo. Agora tal como o rio que não se sente como rio, mas como mera massa de águas, prevê-se o destino de um humano que deixa de ser ele próprio.

As ventanias da anonimidade funcionam como ciclones de um viver no entremeio numa tensão de alta e baixa pressão sem espaço próprio. Nos finais do século passado apressou-se o processo de despersonalização e a desculturalização. Já não temos personalidade, nem nome, nem identidade para passarmos a ser a desaparecer na anonimidade do grupo ou agrupamento ordenado em fascista, comunista, religioso, ateu. A massificação domina elites da política e até da arte e da literatura que passaram a ordenar as pessoas em grupos simbólicos. Assim passamos a ter uma sociedade massa, um rebanho anónimo com pastores anónimos que vivem da massa.

Hoje pensa-se não no indivíduo como pessoa, mas como figura dentro de um grupo. O que move o discurso e as ondas da sociedade não é a pessoa nem o seu fundamento, mas apenas o comércio a acontecer e incorporado no socialismo e no capitalismo. A resolução dos problemas humanos e sociais não se situa já no espaço do indivíduo nem da dignidade humana passando a acontecer no vácuo da anonimidade conflitual entre ideias e opiniões.

O rio da humanidade encontra-se num falso percurso dado a confiança e a esperança só se situarem nos corações humanos individuais, na alma individual. Encontramo-nos todos como o rio extinto nas águas do lago a tornar-nos a voz das correntes (mainstream) com um coração de massa. Quando chegará o tempo de acordarmos? O rio confidenciou-me dizendo, “talvez numa noite astral, em que nós lhe prometamos caminhar com ele juntando as suas memórias e as suas lágrimas às nossas”. Decidi que não deixaria minha alma ser submersa pelo lago da conformidade. Talvez, como o rio, eu pudesse encontrar um caminho de volta à liberdade, mesmo que apenas em sonhos, ou numa de troca de saudade transcendente que salda a dor da humanidade no colo da natureza.

António da Cunha Duarte Justo

 

IGUALITARISMO OU IGUALDADE RASTEIRA: UMA ILUSÃO QUE PARECE JUSTA, MAS NÃO É

Imagine-se que o mundo (a sociedade) é como um campo com muitas plantas diferentes: umas altas, outras rasteiras, algumas com frutos, outras com flores e outras até com espinhos. Cada planta tem sua maneira de ser própria, mas o igualitarismo (igualdade!) é como um jardineiro que quer podar todas as plantas para ficarem todas do mesmo tamanho. Parece justo à primeira vista, mas será que é mesmo? Não será no sentido de que a palavra de ordem igualdade é, por vezes, usada indiferenciadamente para tornar os desiguais iguais na amálgama de massas sociais!

Essa ideia do “todos iguais” muitas vezes é usada por quem quer juntar as culturas, as religiões, as populações e os indivíduos no mesmo saco, para os reduzir a uma argamassa e assim melhor os poder controlar e dominar. É como se dissolvêssemos cada gota d’água num grande oceano, onde ninguém mais consegue destacar-se nem manter a sua própria forma. A gota deixa de ser gota, torna-se apenas parte do mar (no mar da sociedade!). E aí, quem tem força para nadar contra a corrente é que comanda. (As doutrinas asiáticas estão hoje, entre nós, muito em voga por expressarem o “espírito do tempo” ao serviço do caudal do politicamente correcto!).

Quando olhamos para o céu, vemos as nuvens e sentimos que há algo de maior lá em cima, algo que nos inspira e nos faz querer ser mais do que simples animais. Mas hoje, parece que querem tirar-nos essa vista, essa perspectiva de consciência, dizendo que pensar diferente ou ter sonhos altos já não tem mais lugar numa sociedade de terráqueos. Querem que sejamos como bichos sem coluna vertebral; querem que os humanos não se consigam erguer e não ousem sair fora da sebe para assim melhor os poderem montar.

O povo humano quer viver em paz, mas há sempre aqueles que vivem da guerra, dos conflitos e das divisões. Claro, todos nós devemos ter o mesmo valor como pessoas – nossos direitos e nossa dignidade são iguais, não fôssemos nós todos irmãos não por adopção mas por filiação divina. Apesar do muito patuá actual, não dá para fingir que todos tenham as mesmas condições de vida ou as mesmas oportunidades. Cada um carrega com a sua história, com seus desafios, suas capacidades porque é feito dele mesmo e das suas circunstâncias.

A verdade é que as condições em que vivemos são muito diferentes. Tratar toda a gente como se fosse igual acaba ajudando só alguns grupos, deixando outros para trás. Não é justo pedir que a árvore frutífera e o cacto deem a mesma sombra – cada um tem seu papel e suas limitações. E o melhor será procurar viver não só do sol que brilha para todos, mas também ver que as sombras dos outros se tornem até em momentos de fortalecimento para o nosso desenvolvimento.

O igualitarismo, que promete bem-estar para todos engana as pessoas. Ele desvia a nossa atenção do que realmente importa: melhorar as condições de vida e respeitar as diferenças de cada um. Não somos todos iguais, mas podemos ser todos valorizados pelo que somos. Somos todos pessoas com raízes em diferente terra, mas o que nos faz erguer a todos é o olhar no sentido do Sol.

(O igualitarismo do bem-estar é uma ideologia enganadora que desvia os incautos da realidade que os oprime). A natureza tal como a sociedade é diversa pelo que a questão socialmente a resolver no sentido da igualdade jurídica será evitar que as desigualdades sejam devidas a meras circunstâncias.

António da Cunha Duarte Justo

Pegadas do Tempo

PS: O texto surgiu-me ao reflectir sobre a magia de que se vestem certas palavras usadas na política para atraírem pessoas que olham para o azul do firmamento, mas sem terem os pés assentes em terra confundindo a diferença das pessoas com a igualdade perante a lei. O filósofo Aristóteles defendia, “devemos tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais na medida de sua desigualdade”.

 

 

GRATIDÃO ELIXIR DA VIDA

GRATIDÃO 

 

Gratidão é brilho na alma a vibrar,

Um remédio que o coração vem curar.

Memórias ancestrais, de sombras a persistir,

Que a gratidão nos ensina a redescobrir.

 

 

Gratidão, além do que se vê,

É Natal a vibrar no coração e na fé.

É a luz da Lua na noite a brilhar,

Um caminho de amor para nos guiar.

 

O Deus Menino nos deixou a direção,

A felicidade nasce da entrega na gratidão.

Mesmo na dor, podemos escolher,

A luz de um “Obrigado” para nos renascer.

António CD Justo

Pegadas do Tempo

in Poesia de António Justo

„EXTREMA-DIREITA” A ÂNCORA DE RESGATE DA ECONOMIA E DA IDENTIDADE CULTURAL EUROPEIA?

Elon Musk interfere na Política europeia sugerindo a sua Mudança da Faixa da Esquerda para a Faixa da Direita

Elon Musk, elogiado como o grande génio empresarial do nosso tempo e designado por Trump para dirigir a nova repartição governamental para a eficiência, apresentou uma análise enérgica da Alemanha no “Welt am Sontag” de 29 de dezembro de 2024.

Pelo que tem de relevante e de importante para a política europeia transcrevo aqui algumas passagens do texto de Musk. Estávamos habituados a falar das interferências de regimes estrangeiros nas eleições, mas, aqui a interferência de Must em defesa dos partidos europeus designados de extrema direita pelos partidos do arco do poder, pode ser também considerada uma retaliação de advertência aos estados europeus que nas eleições americanas tomaram partido pelo partido Democrático (socialistas)!

Entre outras coisas Musk escreveu: “A Alemanha encontra-se num momento crítico – o seu futuro está à beira do colapso económico e cultural… A Alternativa para a Alemanha (partido AfD) é a última centelha de esperança para este país… A economia alemã, outrora o motor da Europa, está agora afogada em burocracia e regulamentos opressivos. A AfD compreendeu que a liberdade económica não é apenas desejável, mas necessária… a AfD é a favor de uma política de imigração controlada que dê prioridade à integração e à preservação da cultura e segurança alemãs… Uma nação deve preservar os seus valores fundamentais e o seu património cultural para se manter forte e unida… A AfD adopta uma abordagem pragmática da questão energética e é a favor de uma abordagem equilibrada… Os partidos tradicionais falharam na Alemanha. As suas políticas conduziram à estagnação económica, à agitação social e à erosão da identidade nacional… A AfD aborda os problemas actuais – sem o politicamente correto que muitas vezes estraga a verdade. Retratar a AfD como sendo de extrema-direita é flagrantemente falso… AfD é a favor de reformas educativas que promovam o pensamento crítico em vez da doutrinação e apoia as indústrias tecnológicas… A AfD pode salvar a Alemanha de se tornar uma sombra do seu antigo eu… é tempo de grandes mudanças e a AfD é o único partido que pode abrir esse caminho” (traduzido com a versão gratuita do tradutor – DeepL.com).

Seria interessante discutir-se até que ponto os interesses dos EUA são compatíveis com um partido como a AfD que, por outro lado, considera necessária a retirada da Alemanha da NATO e da UE e defende o restabelecimento dos laços económicos com a Rússia, no sentido de uma Europa que vai de Lisboa a Moscovo.

Para Musk, a política de imigração de Merkel e a política energética da coligação semáforo foram uma ameaça à prosperidade.

Está-se perante um resfriamento da política liberal globalista seguida até agora. Está em questão também o excesso de regulamentação, institucionalização e burocratização da UE e a intervenção excessiva da UE nos assuntos internos dos Estados-Membros em matéria cultural por parte de burocratas de Bruxelas distantes dos povos; isto acrescentado a uma má governação provoca a mudança de direção que está agora em curso, especialmente por parte das apelidadas forças de extrema-direita. Por vezes nota-se uma grande diferença entre a retórica partidária inadequada e o que se encontra nos programas dos partidos.

Tem-se a impressão que a economia está a querer dar lições à política.

António da Cunha Duarte Justo

Pegadas do Tempo

FORÇAS ARMADAS PORTUGUESAS A ABUSAR DO NATAL E DA INTELIGÊNCIA DE PORTUGUESES!!!

Arrogância e Desrespeito militar sem Limites

Um mundo agressivo, complexo e artificial, sente-se incomodado com a mensagem natalícia e escolhe precisamente esta época para se afirmar como algo contra a vida numa de querer fazer vingar o seu espírito nos céus de Portugal.

Caças F-16 da Força Aérea vão sobrevoar o país a desejar um feliz Natal e a treinar a capacidade militar entre as 12h00 e as 14h15 do dia 24.12.2024.

Segundo a Lusa e o Correio da Manhã a iniciativa visa “desejar a todos um Feliz Natal” e “treinar a manutenção de capacidades dos militares para atuarem a qualquer momento e em qualquer circunstância, reforçando o compromisso de salvaguarda da integridade do território nacional, através do cumprimento das missões de vigilância, policiamento e defesa aérea”.

A iniciativa mais parece vir de algum reduto do Gonçalvismo (Vasco Gonçalves) ainda presente nas Forças armadas.

A atmosfera de paz e as músicas natalícias incomodam muita gente que se aproveita da época natalícia para mostrar os seus músculos na presença militar que se quer altaneira e soberana! Em que mundo vivem? Ou será que querem fazer dos portugueses uns parolos que nada entendem de gestos simbólicos?

António da Cunha Duarte Justo

Pegadas do Tempo