CRIE-SE UM MINISTÉRIO DAS COMUNIDADES E DA LUSOFONIA!

Em prol de uma Lusofonia para além do Espaço do Sentimento de Pertença

António Justo

 A Secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas, independentemente de algumas mais-valias pontuais que regista e do seu trabalho administrativo, revela-se, ao longo da sua vigência, ineficiente e desgastante, contribuindo até para adiar, ad eternum, uma possível política séria, com pés e cabeça para a emigração e para as comunidades lusófonas. A experiência da Secretaria de Estado constituiria um contributo importante à hora de ser definida uma reforma da política das Comunidades portuguesas e da lusofonia em termos de estratégia.

Só um ministério próprio estaria à altura de reparar os defeitos da política passada e seria capaz de desenvolver conceitos e estratégias de uma política abrangente e adequada aos novos tempos. Temos a área da cultura, da língua, da economia, da lusofonia à espera de concepção inclusiva, de projectos e aplicação numa política visível e eficiente que sirva e se aproveite dos recursos das potencialidades migrantes e dos países lusófonos (com eventuais parcerias).

Urge aproveitar com eficácia a rede da presença lusa e das suas economias de maneira mais satisfatória e proveitosa para os emigrantes, para Portugal e para os países lusófonos. As comunidades da diáspora lusófona poder-se-iam aproveitar e ser aproveitadas e reunidas em conveniências comuns de fomento (Bancos, Câmaras da Indústria e do comércio, representações diplomáticas, institutos culturais, etc.) numa estratégia de inclusão de interesses e políticas de perspectivas de futuro lusófono.

Só uma política, atenta aos sinais dos tempos e à realidade da perspectiva das economias emergentes lusófonas e do equacionamento de projectos em termos globais, poderá dar resposta adequada às novas possibilidades e ao enquadramento económico e estratégico do constante fenómeno de movimentação social. Só a criação de instituições inclusivas com grande peso a nível de governos e de sociedade darão resposta eficiente aos novos desafios.

A missão não pode estar subjugada nem amarrada à administração (burocracia) se não queremos dar continuidade à típica mentalidade orientada pelo hábito da apagada e vil tristeza de não vermos o que está para além das bordas do próprio prato.

Assim deveria ser criado um ministério das Comunidades muito ligado ao MNE, a repartições ministeriais de gestão, de economia, de finanças, de cultura, universidades, turismo e de investimento! (Isto são ideias que já defendia publicamente em “O Emigrante” dos anos 80 ao dar-me conta do desperdício de recursos e da falta de racionalização e eficiência administrativa na emigração! A mesma carência de visão constatei ultimamente na reacção do MNE e Secretaria das Comunidades à luta que encabecei pela subsistência consular de Frankfurt; a rotina, a perspectiva burocrática e a defesa de interesses de instalados têm determinado muitas das decisões políticas e deste modo atrasado o desenvolvimento de Portugal e dos portugueses.)

Continua a ser irresponsável e arcaica uma política abandonada à boa vontade de secretários de Estado das Comunidades que, além da falta de uma política forte que os apoie, têm de se acomodar aos maus hábitos da casa (burocracia) que dirigem!

Em todos os Secretários de Estado que pude observar constatei o seu estado carente de também eles serem migrantes na transitoriedade de uma vida política que os obriga a cobrir a irresponsabilidade política de um Estado/Governos que nunca se interessou por delinear uma política séria para uma vertente tão importante como a dos emigrantes e das suas economias.

Na minha observação do palco político e do agir das Secretarias de Estado, durante mais de 30 anos, constatei sempre o mesmo estado precário desta instituição que, além de boa vontade e iniciativas passageiras, não deixa nada de duradouro. Um mínimo de seriedade política conceptual e programática exigiria um certo interesse por se encarar o problema de fundo. Verifiquei nos anos oitenta, um pouco de interesse de curta duração que não passou de meras intensões de discussão burocrática! Uma política de carácter meramente indutiva sem um tecto dedutivo que lhe dê perspectiva alargada continuará a ser incómoda para secretários de Estado e prejudicial para a emigração ao desperdiçar levianamente os seus recursos e as potencialidades de Portugal. Temos universidades e pessoas de experiência que em conjunto poderiam elaborar cenários políticos. Os partidos portugueses deveriam abandonar o jogo da cabra cega e do pingue-pongue a que se têm dedicado em questões de política de língua e de emigração para se afirmarem como competentes e ser reconhecidos em serviço do povo.

Também a discussão da política dentro da comunidade portuguesa (falo da Alemanha que conheço melhor) tem sofrido do característico defeito português, de se reduzir a visões partidárias de perfilhação e fomento de perfil partidário nada isenta nem equacionada em termos de situação e de povo!

O novo ministério poderia criar condições para a canalização das remessas para o investimento produtivo em Portugal e contribuir para a inovação da mentalidade portuguesa no sentido de se fomentar uma cultura de trabalho frutuoso e responsável. A perspectiva dos países lusófonos, em que a Lusofonia se tornasse não só o espaço do sentimento de pertença mas também a nova força catalisadora das novas gerações, não deveria ser parte acidental da filosofia e práxis de um Ministério das Comunidades e da Lusofonia.

 

 António da Cunha Duarte Justo

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UMA MULHER ÁRABE COM ROSTO PRÓPRIO – MAJAM MAHMUD

Uma Revolução da Mulher seria a Solução

António Justo

Majam Mahmud, que antes preferia ser rapaz porque como mulher não via futuro digno, está agora orgulhosa do seu género. É uma rapper egípcia de 18 anos e de lenço na cabeça que não tem papas na língua quando fala. Não lhe interessa a política mas a discriminação. Na sua música lematiza temas tabu de uma sociedade medieval. Chama as coisas pelo nome sem os rodeios do oportuno. Enfrenta os problemas da nação; fala sem medo da discriminação da mulher e do assédio sexual na sociedade egípcia. O Ocidente mais interessado na guerra económica do que na justiça individual e social fecha os olhos da guerra dos homens contra as mulheres especialmente nas sociedades da Índia e da África.

Revolução da Mulher – Quando?

Segundo uma pesquisa das Nações Unidas 99,3% das mulheres egípcias indicam terem sido sexualmente molestadas.

Para Majam Mahmud o problema da discriminação sexual no Egipto é intocável porque é declarado tabu e como tal não precisa de leis que condenem o assédio sexual. Quem sofre as consequências cometidas pelos agressores não são os infratores mas as mulheres que depois têm de assumir o desprezo social. Os homens querem que as mulheres sejam graciosas e atractivas mas sem chamar a atenção. A solidariedade masculina não quer ser questionada, nem quer sofrer a concorrência entre homens e por isso a mulher terá de ser a eterna vítima, a culpada do desejo masculino. Este é lei e por isso não se pode questionar a si mesmo. Neste contexto, ser mulher livre é uma provocação. As mulheres calam-se e nas sombras do seu silêncio continua a fermentar a arrogância e a violência masculina. O problema é que o sistema não se muda, quem se muda são as pessoas e só quando estas se mudam, só então se muda o sistema. 

Numa altura em que ideias revolucionárias já germinam debaixo de cabeças com lenço, há mais motivos de esperança do que qualquer pretensa primavera árabe na sociedade norte-africana.

Majam Mahmud pergunta numa entrevista com o Speigel: “Que se pode esperar de uma sociedade onde o maior objectivo para uma mulher é casar?” Logo a seguir desabafa “Eu realmente acredito que a próxima revolução será uma revolução da mulher.” O problema da sociedade muçulmana mais que um problema religioso é um problema de homens e de cultura árabe cimentada no Corão e na sharia.

A verdadeira revolução está na transformação do espírito. O mundo árabe cairá um dia num caos se não se mudar, mas a mudança só as mulheres a podem fazer através de uma revolução doce ou também agressiva, à maneira de homem. Majam Mahmud é um exemplo muito necessário, uma luz a brilhar e mais que um grito de emancipação é uma voz modelo que grita por libertação do chauvinismo masculino com a sua consequente violação. A música é um dos melhores instrumentos para se transmitir uma revolução.

Deveria haver direito a asilo mais liberal para as mulheres perseguidas por razões de cultura ou religião. Se observamos as mulheres vítimas do exílio político observa-se, porém, que trazendo os homens consigo não há possibilidade de libertação individual.

É um facto sociológico que, de uma maneira geral, os homens não querem mudar-se preferindo continuar a viver ao abrigo das leis naturais que perpetuam o domínio do mais forte. A cultura árabe, fruto de uma geografia agreste, continua na elaborar as suas leis positivas com base na cópia da lei natural. (De não descurar que a cultura ocidental tem outras formas de discriminação, muito embora mais suave).

Aqui temos a ver com uma cultura misógina bárbara onde, sob a capa do islão, se dá continuidade à discriminação das antigas sociedades de clãs primitivos. (Temos porém que estar atentos na avaliação porque muito do que acontece sob a capa das religiões são costumes ancestrais nómadas da cultura árabe.)

Se se pretende um desenvolvimento são e sadio a discussão terá de ser feita em termos de sociologia e de antropologia. De facto a velha cultura egípcia tem elementos muito mais desenvolvidos do que lhes foi posteriormente imposto com a hegemonia da cultura bérbere árabe. Uma discussão fora destes moldes corre perigo de, sem notar, levar a água ao próprio moinho! O que está aqui em causa é a relação e a integração da feminilidade e da masculinidade na pessoa independentemente do ser homem ou mulher!

Há quem critique Majam Mahmud por trazer lenço na cabeça, um símbolo da repressão; estes esquecem porém que ela pode assim alcançar melhor um público conservador de mulheres que de outro modo não atingiria. Também há que estar-se atento na luta da emancipação para se não cair em movimentos emancipatórios baseados em princípios masculinos, como por vezes acontece no ocidente.

Uma sociedade patriarcalista que segue unilateralmente os vestígios de Abraão só poderá ser mudada com a mutação progressiva da mulher e só esta poderá constituir a base de uma verdadeira revolução.

António da Cunha Duarte Justo

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EUSÉBIO GRANDE EXEMPLO DE LUSITANIDADE

 

Eusébio é Voz de Povo a esperar

António Justo

No dia de Reis é sepultado um rei do futebol e dos corações. Eusébio nascido em Lourenço Marques/Maputo, Moçambique veio cedo para Lisboa, deixando-nos agora com 71 anos.

Salazar declarou-o invendável. Em 1960 passou do Sporting de Lourenco Marques para o Benfica de Lisboa que pagou, na altura ao clube rival um resgate de 350 contos (cerca de 25.000 euros) conseguindo assim um grande negócio. Eusébio recebeu na altura o correspondente a 1.200€ de compensação e passou a ganhar 30€ mensais. Não dava para enriquecer.

Aquele homem bom e simples conseguiu unir a simplicidade à heroicidade. Corria por amor à camisola e ao povo. Era um ícone do desporto entre as vedetas de futebol do mundo mas sempre sem peneiras.

Pertence ainda a um tempo em que o futebol não era dinheiro mas paixão. O seu profissionalismo e exemplo de trabalho fizeram dele uma referência da ciência popular. Como homem íntegro manteve-se homem do mundo e não da ideologia; talvez por isso não fosse sempre reconhecido por uma certa elite política a que o cheiro a povo incomoda.

Porque não arrotava a poder mereceu de Mário Soares a seguinte declaração: ” De Eusébio não sei muito, sei que era um homem simples, que só sabia falar de futebol, que não era culto…”  

O “Pantera Negra” foi um Homem Bom, um símbolo do Portugal povo e da África que mete num saco a cultura de muitos pretensiosos senhores da cultura e que fez mais por Portugal que muitos embaixadores e senhores que determinam o que é cultura e poder.

Paz à sua alma!

António da Cunha Duarte Justo

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A IGREJA CATÓLICA INTERROGA AS FAMÍLIAS

A Família entre Direito Natural e Direito Positivo

António Justo

O Papa Francisco, consciente das posições teóricas da Igreja sobre a Família, está a fazer um levantamento de pareceres relativos à família a partir da experiência, a nível mundial nas comunidades católicas. Pretende unir os métodos de aquisição de conhecimento dedutivo (saber mais idealista adequado à capacidade especulativa) ao conhecimento indutivo (saber de experiência feito adequado à vivência local).

 A unidade e indissolubilidade do casamento são valores que a cristandade aceita de uma maneira geral. Já o mesmo não se diz em relação aos métodos anticonceptivos. Um saber a partir da experiência levará a instituição Igreja a reconhecer maior individualidade na escolha e decisão em questões de moral sexual. Com isto mantem-se fiel a si mesma na consciência de que, na terra em questões de moral, o último juiz, para o cristão é a consciência individual.

No Ocidente a família, a partir dos anos 60 tem sido objectivo de grandes adversidades, sendo apelidada de último baluarte burguês. De facto, a família constitui um grande poder em termos políticos e sociológicos; quem tiver a educação da família nas mãos tem o poder sobre o cidadão. O segredo da sobrevivência do judaísmo no mundo, apesar de ter vivido em meios, por vezes adversos, deve-se à coesão que vem do seu cultivo da família e da religião. (1)

No futuro, a pastoral familiar passará, certamente, a descentralizar-se e tenderá a assumir diferentes atitudes conforme os condicionalismos culturais locais; com o mudar das pessoas mudam-se os sistemas; isto terá consequências também a nível de liturgia e para-liturgias. A solidariedade vinculativa no casamento é um valor incontestável mas que não deve pôr de lado a tolerância e reconhecimento de opções tomadas à luz de circunstâncias adversas. Há que conciliar a consciência comunitária com a consciência individual sem a necessidade de recorrer a automatismos de condenações canónicas.

Hoje o relacionamento entre homem e mulher não é tanto analisado em termos de direito natural mas sim no compromisso moral entre os dois. Em sociedade, a autodeterminação e liberdade são mais consideradas.

A pílula não considera a lei natural, ultrapassa-a e é como tal aceite, também no que respeita à regulação dos nascimentos. É uma questão que os cônjuges regulam no foro da sua consciência. O acto sexual tem vindo a perder importância a nível da relação entre homem e mulher.

No caso de pessoas distantes da Igreja pretenderem o casamento, o padre deveria decidir caso por caso sem ter a necessidade de recorrer a actos burocráticos.

Numa altura em que a ciência intervém nas leis da natureza através da modificação genética entra-se em âmbitos novos que exigem novas posturas especulativas e uma responsabilidade especial. Fim do homem é gozar na sua existência a presença de vários mundos nas suas diversas dimensões.

A coexistência, como experiência antes do casamento, é vista por muitos teólogos como forma de preparação para o casamento.

No caso de pessoas divorciadas que se casam, uma pastoral inserida deveria admiti-las aos sacramentos. O recurso ao anulamento do casamento poderia ser uma oportunidade para se rever o passado e motivar a uma nova esperança e oportunidade. A misericórdia divina é infinita.

De uma maneira geral, na sociedade ocidental, a homossexualidade já não causa repulsa. A Igreja é contra a discriminação de homossexuais mas não aceita que sejam favorecidos pela lei como acontece com os heterossexuais com filhos. A igreja espera dos homossexuais fidelidade, solidariedade e confiança. Não deve ser negado o baptismo a uma criança de homossexuais. A pastoral da graça prevalece perante um ideal dogmático e a questão dos preservativos fazem mais parte do foro da consciência privada.

Uma moral sexual demasiadamente fixada no acto sexual, corre o risco de descurar o aspecto inter-relacional em que o nós tenha lugar próprio para o eu e para o tu.

Da relação interpessoal dá-se o crescimento e a experiência da comunidade. A experiência da comunhão conduz ao desenvolvimento individual noutras dimensões quer de auto-realização e afirmação quer de inclusão e de respeito mútuo. Nela se treina a confiança e a entrega.

A promoção da dignidade do matrimónio e da família passaria por uma pastoral familiar que se reveja numa “ igreja do lar” com uma missão no mundo. Nesse sentido deveriam ser implementadas para-liturgias familiares consistentes à semelhança das práticas das famílias judaicas.

 

Ética cristã – Uma Ética livre e do Discernimento

Em todas as sociedades ocidentais se assiste ao conflito entre a lei natural racional e as leis positivas parlamentares, numa verdadeira luta entre a vontade maioritária e a minoritária (a lei positiva inclui muitos princípios da lei natural).

A lei natural mostra o que é melhor e conduz à felicidade numa dinâmica de ultrapassar o momento presente no sentido do bem que se expressa na realização do ser. A razão humana funciona como critério de verdade e de objectividade enquanto a lei positiva se determina mais por interesses de maiorias.

A lei natural é para Paulo aquela voz que se traz inscrita no interior do coração humano e que é razoável e por isso não subjugada ao espaço nem ao tempo. Para Agostinho a lei natural consistia na visão antes da queda original.

A Igreja sempre teve como referência a lei natural; por isso atribui ao indivíduo a soberania de decisão sobre princípios morais universais, inerentes à natureza humana, reconhecendo-lhe a capacidade e o direito de se opor a normas elaboradas pelo Estado ou qualquer outra instituição (vale a soberania da consciência individual). A Igreja milenária, que acompanhou os mais diferentes regimes políticos até hoje, é perita em questões de durabilidade de valores e no reconhecer a imutabilidade e a caducidade de hábitos e costumes. Ao defender princípios do direito natural é necessariamente conservadora em relação ao direito positivo dos estados, porque permanece crítica a fenómenos e normas morais quando enfocados apenas sob os aspectos ad hoc do sentir e da vontade de uma política própria duma época. (De facto, embora a pena de morte seja decretada por uma maioria parlamentar em alguns estados, isso não a iliba de ir contra a lei natural do género).

A consistência da orientação cristã revela-se no facto de a dignidade humana ser perene e não depender de valores nem normas ocasionais que vão surgindo no suceder-se das sociedades. No indivíduo permanece algo imutável ao longo da história da humanidade. O ser humano, apesar de ambíguo e incoerente é único.

Consequentemente haverá sempre um contencioso entre a moral da Igreja e as intenções de poder dos estados. A Igreja permanece ao mesmo tempo como advogada do indivíduo e como momento de orientação, encontrando-se também ela, muitas vezes aprisionada por hábitos e costumes do direito positivo (celibato dos padres).

Assistimos ao conflito entre a lei natural racional que se revela como correctivo permanente aos costumes culturalmente adquiridos e a lei positiva (lei estatal – resultante da fidelidade/sujeição aos costumes culturais, ao tempo e ao regime político). Na lei natural prevalece o espírito da natureza aliado à consciência individual e como espírito crítico dos fenómenos sociais do tempo. No texto da natureza as leis naturais são como que a sua gramática também ela com excepções na ordenação e na evolução do mundo. Como a natureza tem leis naturais assim a cultura tem leis coerentes (morais) que a mantêm. A mudança realiza-se na interacção de uns com os outros. De facto também o pensamento não é sempre linear, também ele tem as suas curvas e muitas vezes só se pode orientar por probabilidades.

À Igreja compete o papel de apontar para a responsabilidade individual e social no equilíbrio (balance) entre direito natural e direito positivo e no espírito da “Igreja sempre renovando”. À Igreja institucional cabe o papel semelhante à da Constituição de um estado, sendo ela depois adaptada à pastoral local. A atitude da Igreja, que, à primeira vista, parece conservadora, é extremamente revolucionária e inovadora, ao direccionar a vista para o permanente e essencial.

António da Cunha Duarte Justo

Teólogo e Pedagogo

www.antonio-justo.eu

(1)     O marxismo, o leninismo e em grande parte o estado secular, estão interessados em subornar a instituição família para poderem “nacionalizar” e reeducar a pessoa no sentido da gradual construção do estado proletário. Consciente de que quem tem o poder sobre a família tem o poder assegurado, a esquerda em geral, procura através de iniciativas legislativas demolir certos valores da família tradicional para melhor conseguir os seus propósitos, a longo prazo. Assim, a vivência familiar encontra-se hoje muito exposta e sujeita às correntes do tempo. Com a inclusão da praxis sexual como direito individual já em anos muito verdes (educação sexual escolar demasiado virada para o acto sexual), o Estado sobrevaloriza o acto sexual utilizando-o para fins emancipatórios também eles sem qualquer momento de valorização da família. Neste contexto a pastoral católica não poderá, também ela, continuar a sobrevalorizar o acto sexual (cf. fixação nos anticonceptivos) para passar a acentuar mais a importância da relação entre parceiros. De facto, a opção por constituir família pressupõe hoje uma decisão corajosa e altruísta em relação ao futuro e como tal difícil para pessoas mais individualistas ou pessimistas.

Neste sentido tornou-se uma prática importante da esquerda, impedir programas de apoio à família tradicional e às mães, para fomentar a construção de jardins infantis estatais na intenção de transferir a missão de educar para o Estado. Para uma melhor consecução dos seus objectivos escolhem como lugar privilegiado de influência os ministérios de educação através de funcionários, peritagem e sindicatos. (Deve-se porém aqui reconhecer um valor importante da esquerda: ela alerta cedo para a resolução de problemas relacionados com o acompanhamento do tempo). O socialismo é entendido como um estádio de preparação para o estabelecimento da sociedade comunista; por isso opõe-se à iniciativa privada que fomenta a pluralidade; esta contraria a concepção de Estado de pensar unitário. O capitalismo liberal, que também reduz a pessoa, na prática, a instrumento, veio justificar a política impeditiva duma vida familiar adaptada às necessidades do desenvolvimento natural das crianças. Pelo que se observa, tudo parece desenvolver-se no sentido de uma sociedade capitalista e comunista à maneira chinesa. Sem apoiar ideologias retrógrados nem progressistas há que aplicar esforços no sentido de se analisar o que se encontra nas entrelinhas da política e do senso comum que nos orienta.