OS FACTOS NÃO CONTAM O QUE CONTA É A SUA INTERPRETAÇÃO

Pós-facto – a palavra do ano no discurso do populismo das elites e do povo

António Justo

A palavra do ano
A Sociedade para a Língua Alemã (SLA)escolheu a palavra pós-facto como palavra do ano 2016. Fundamentou a sua escolha no argumento de que nas discussões sociais e políticas valem mais as emoções do que os argumentos e os factos. Na Alemanha surgiram movimentos populares que se queixam da “imprensa mentirosa” por esconder aspectos negativos relativos aos refugiados/estrangeiros e acusando a política de andar atrás dos acontecimentos e só reagir “a posteriori” à crise dos refugiados, etc. Como pano de fundo, a SLA considera o resultado do referendo e das eleições que tiveram como consequência o Brexit e a eleição de Trump como fruto da emoção e não da razão. Assim, a opinião pública já não se orienta pela exigência da verdade mas pelo sentimento da verdade. O jornalismo representante da classe estabelecida classifica o Brexit, a eleição de Trump e a crítica geral à política de refugiados como resultado do populismo.

Populismo tornou-se em palavra de ordem

Daí o uso da palavra populismo de maneira inflacionária por críticos e criticados e em especial pelo jornalismo estabelecido que comenta as novas formações políticas (críticas do regime) como meramente baixas e emocionais à margem de argumentos. A palavra populismo ou populista é conotada depreciativamente por cheirar demasiado a povo e usar palavras demasiado claras e simples numa retórica que se quer complicada.

A emocionalização da sociedade e da política evita deixar espaço para argumentos e factos. Prescinde-se da argumentação porque chegamos ao “quem pode pode e quem pode manda”! No discurso o sentimento passa a ter mais importância que a razão factual. Este fenómeno é de observar tanto na retórica elitista como na popular.

A classe política e jornalística também usa palavras discriminatórias e emocionais para classificar o novo fenómeno que considera refutado pelo facto de o denominar de populismo ou populista; em vez de usar argumentos contra as teses e aspirações deste, o jornalismo, considerado sério, abusa deles e do público que informa ao fazer uso de adjectivação negativa e de palavras emocionais como “populistas”, “intolerantes”, “racistas”, “discriminadores”, “pós-fácticos”, “direitas”, “fundamentalistas”, etc e ao evitar discutir os seus argumentos.

Em vez de entrarem numa discussão séria sobre as questões que aqueles levantam, entram numa verdadeira campanha de difamação do adversário ou de quem se torne incómodo. Alimentam-se das mesmas emoções que condenam nos outros (p.ex. AfD).

Exemplo de manipulação grosseira

Para dar um exemplo do que está em jogo refiro aqui o que observei num canal de notícias da TV pública alemã, relativamente ao governo da Polónia, que não alinhava na política de asilo que a Alemanha queria impor à UE; na notícia o emissor televisivo apresentou pessoas do governo polonês a preto e branco e de forma ralentada. O povo inocente que vê as imagens de tal notícia, numa televisão a cores, nem nota que a apresentação das referidas pessoas a preto e branco cria inconscientemente no espectador a ideia de um governo atrasado e das imagens em câmara lenta sugere um caracter ameaçador! O mesmo se observa em reportagens em que se quer dar a impressão de haver muita gente embora havendo pouca, filmando os poucos de forma continuada mas de várias perspectivas, ou para manipular empatia apresentarem-se imagens de crianças ou mulheres que choram e não outras mais características e relevantes para compreensão da situação. Isto é manipulação banal em programas informativos que se suporiam objectivos e independentes na informação!

A sabedoria popular costuma dizer que “em casa sem pão todos ralham e ninguém tem razão”; no caso talvez fosse mais apropriado dizer que todos ralham porque todos têm razão e o alarido que se nota nos meios de comunicação social é devido ao facto de haver uns que teriam muito a perder e outros que quereriam ganhar algum! Na nossa praça pública, na luta de interesses contra interesses ganha quem tem o megafone na mão. Temos o populismo dos de baixo contraposto à arrogância do ‘superiorismo’ dos de cima. Um caminho para a solução seria cada grupo deixar de projectar as suas sombras no outro, para poder superar situações unilaterais polares.
© António da Cunha Duarte Justo
Pegadas do Espírito no Tempo

UMA CICATRIZ EM VEZ DO CLÍTORIS E DOS LÁBIOS VAGINAIS

A mutilação genital feminina é a maior expressão machista

António Justo
Passou-se mais um dia internacional da mutilação genital de mulheres e, apesar disso, em 2016 foram cortados os clítoris e em muitos casos também os lábios vaginais a milhões de meninas. A maior expressão machista documenta-se socialmente na mutilação dos órgãos vaginais. 100% das mulheres sofrem toda a vida física e psiquicamente do trauma causado na sua infância.

Dá-se uma quebra de confiança da criança nos pais que entregam as meninas a tal tortura e, além do mais, sem anestesia; a criança passa a sentir o próprio corpo transformado em ceara alheia. As consequências da mutilação genital são: possíveis dores para toda a vida, problemas no urinar e nas relações sexuais. Fica-se com uma cicatriz em vez do clítoris e, muitas vezes, também sem os lábios vaginais.

Este rito cultural revela a barbaridade das energias da masculinidade quando, não temperadas pelas da feminilidade, se tornam repressoras e repugnantes; além do mais causam um impedimento à intimidade e à união afectiva entre homem e mulher. Nestas condições o acto sexual passa a ser uma atitude de caracter meramente funcional em proveito da satisfação imediata do homem e da procriação, afastando a possibilidade do prazer da mulher. A mulher torna-se em “terra agrícola do homem” que como charrua férrea a degrada, sem qualquer sentimento de violação (psíquica e corporal).

Na Guiné-Bissau, na altura em que os soldados portugueses lá se encontravam e se admiravam com o berreiro que surgia de alguns aldeamentos, era-lhes explicado pelos nativos que aquele hábito de mutilação das meninas era um acto ancestral preventivo para protecção dos homens; assim os homens não precisavam de ter preocupações porque as meninas, quando mulheres, não seriam tentadas a ser-lhes infiéis por terem dores nas relações sexuais.

A expressão do machismo cultural mundialmente vigente encontra a sua forma exacerbada nas acções bélicas e em algumas práticas culturais. A guerra foi domesticada e sublimada nas práticas de desporto como o futebol, onde o instinto guerreiro é satisfeito de forma agradável e sem estragos de maior. Noutros aspectos encontramo-nos ainda nos tempos da pedra lascada. (A propósito, o corte vaginal é geralmente feito com instrumentos primitivos e não esterilizados, o que provoca a morte a muitas meninas!)

Tive conhecimento do caso de um homem bom e sensível casado com uma mulher sexualmente mutilada. O homem sofria e não queria ter relações sexuais com ela, ao ver as dores que provocava nela sempre que tinham relações sexuais, devido às cicatrizes da sua mutilação vaginal; aquele homem, também indirectamente vítima da barbaridade cultural, dirigiu-se com a esposa à médica na procura de auxílio; uma vez submetida à operação, a mulher passou a ter menores dores físicas nas relações sexuais e mais tarde o casal teve a consolação de ter dois filhos.

Como informa “Terre des femmes” (https://www.frauenrechte.de/online/index.php/themen-und-aktionen/weibliche-genitalverstuemmelung2/173-weibliche-genitalverstuemmelung), só na Alemanha vivem pelo menos 48.000 mulheres afetadas pela mutilação total ou parcial do órgão sexual exterior e 9.000 raparigas de famílias imigradas encontram-se ameaçadas de o virem a ser. O corte do clítoris é efectuado, geralmente, entre os dois e os oito anos. É um rito cultural, não religioso próprio da África e levado também para a Indonésia. Pelo mundo fora são cortados os clítoris a 6 jovens em cada minuto que passa. Segundo UNICEF, mundialmente há 200 milhões de mulheres genitalmente mutiladas. Na Indonésia são mutiladas 2 milhões de mulheres por ano.

90% das mulheres genitalmente mutiladas vivem no Egipto, Eritreia, Somália e Indonésia. Muitas vezes, famílias emigradas mandam mutilar as meninas ao seu país de origem, sem que a comunidade acolhedora se dê conta do que se passa.

Urgem medidas preventivas contra esta barbaridade. Também nos países onde chegam migrantes é de muita importância, esclarecer as famílias em que isso possa vir a acontecer, bem como educadoras e enfermeiras. As mães deixam mutilar as filhas na sua boa-fé. Transmitem uma educação desumana machista sem sequer serem conscientes disso por se encontrarem submetidas ao hábito cultural.

Vivem sob o jugo de tradições machistas brutais sem se darem conta que a revolução humanitária em culturas patriarcalistas rígidas só poderá tornar-se eficiente e provocar verdadeiro desenvolvimento integral através da insurreição das mulheres. Estas têm de ser consciencializadas para através da educação dos seus filhos fazerem valer a energia do princípio da feminilidade perante o da masculinidade e assim se construir uma sociedade mais equilibrada.

Políticos intervêm militarmente em países quando vêem os seus interesses estratégicos ou comerciais em perigo; também eles dão testemunho de desumanidade ao não actuarem de forma consequente em sociedades onde a desumanidade fica presa nas fronteiras culturais.

Na Alemanha, apenas a partir de 2013 foi considerada a mutilação sexual da mulher delito penal de maltrato e atentado contra a integridade física (§ 226ª) com uma pena de 6 meses até 5 anos de prisão. Antes, talvez em nome da multicultura, olhava-se para o lado certamente porque atentados à dignidade humana concorriam com os direitos culturais. A lei é paciente dado praticamente não se registar acusações. Na Alemanha a maior parte das vítimas provêem da Somália e da Eritreia. Devido à grande afluência de refugiados, desde 2014 o número das mutiladas aumentou 37% e das meninas que possivelmente ainda estão em perigo de ser vulneradas 67%.
© António da Cunha Duarte Justo
Pegadas do Espírito no Tempo

DEUS NÃO É IGUAL A DEUS

Existe um Islão não político?

António Justo

Factores impulsionadores da violência

O Islão considera a política e a religião como uma unidade inseparável (sem separação entre poder secular e poder religioso) e, ao mesmo tempo, subjuga a dignidade da pessoa aos interesses da comunidade e segue o princípio selectivo da evolução dando a razão ao mais forte. Como na ditadura do proletariado também no islão o indivíduo é meio e não fim em si; os interesses do grupo justificam a imolação do indivíduo porque o que está em causa é a justificação da superioridade da cultura (instituição) e não a relação pessoal e comunitária; tais pressupostos fomentam a violência e a guerra porque vinculam totalmente a pessoa (individual, religiosa e politicamente) ao sistema seu que se afirma contra outros sistemas.

Cultura do gueto contra cultura aberta

Uma sociedade para ser pacífica tem de ser plural, tem de partir da liberdade e da dignidade individual e não dos meros interesses da instituição que faz do crente um escravo de Deus e da religião.

Os políticos ocidentais não se importam com a dupla estratégia dos membros de países de cultura árabe: os muçulmanos, no estrangeiro, exigem abertura social-cultural da sociedade acolhedora para se afirmarem nela como gueto e a nível nacional interno perseguem ou discriminam quem não for muçulmano.

Assim se processa um método sub-reptício de invasão de uma cultura pela outra sem contrapartidas nem acordos bilaterais correspondentes. O argumento muçulmano usado, de que a nossa sociedade ocidental deve abrir-lhe totalmente as portas pelo facto de se definir como sociedade aberta, não é coerente e não legitima, por outro lado, que a sociedade muçulmana do país de origem se afirme como monolítica e fechada, quando, no estrangeiro, se afirme na sociedade aberta como gueto.

Representantes islâmicos escondem, no seu diálogo com os políticos e com os representantes de outras religiões, que na sua religião mais que de religião e ética se trata de poder e influência religiosa e política. Considerando as coisas meramente sob o pressuposto do poder, o grande forte da cultura islâmica perante outras culturas reside ainda no facto de não distinguir entre religião e política, entre poder religioso e poder secular, considerando o islão como factor de identidade nacional, cultural e individual.

Representantes do islão, para defenderem o seu satus quo, procuram, inteligentemente, confundir os parceiros de diálogo dizendo que Maomé tinha ao mesmo tempo uma função religiosa e política (falava ao mesmo tempo como profeta e como guerreiro comandante. Deste modo as mensagens de Maomé são consideradas ao mesmo tempo políticas e religiosas ou conforme dê mais vantagem; esta foi uma estratégia que o islão fez e faz na sua política imperialista. Palavra de honra e vinculativa só há em relação aos da própria religião.

Uma outra estratégia de branqueamento da violência islâmica é afirmar-se que fundamentalistas também os há nos cristãos.

Naturalmente todas as pessoas trazem consigo o bem e o mal mas há uma grande diferença quando se valem da violência e da repressão.

Neste sentido, a religião muçulmana torna-se num instrumento político que através da instrumentalização do súbdito muçulmano opera uma invasão agressiva, ao não permitir liberdade individual ao crente e ao utilizar a religião como único factor de poder e de expansionismo hegemónico (pena de morte, procriação, mulheres e escravas) e definir como muçulmano todo o filho de pai islâmico (por isso, uma muçulmana que se casasse com um não muçulmano constituiria motivo de vergonha e desonra para a família que chega a motivar assassino por motivo de honra, como acontece, por vezes, também na Alemanha). Como se verifica, o poder islâmico é de uma congruência insuperável no sentido de fazer valer a sua posição perante os de fora. O Islão não mudará enquanto não se abrir à teologia e enquanto continuar posse de associações e funcionários com um emaranhado de interesses que ligam a religião ao chauvinismo nacional. Exemplo: Ditib – confederação de associações turcas na Alemanha – tem representado interesses antidemocráticos da Turquia que com o seu ministério da religião e correspondente envio rotativo de imames vê o fascismo turco ser apoiado na Alemanha em contraposição com os princípios democráticos da sociedade alemã. Na Alemanha e noutros países as instituições conservadoras islâmicas são muito fortes e consideram-se os únicos parceiros de diálogo e a política como precisa de parceiros organizados, para o diálogo, fomenta-os; os muçulmanos mais liberais são arredados dos órgãos de co-decisão e deste modo impede-se um Islão mais humanista. Assim se vai formando uma sociedade paralela de religião totalitária. Na Alemanha nas ruas das grandes cidades, torna-se visível uma invasão islâmica no vestir das mulheres. Depois de mais de 40 anos de presença turca cada vez se nota mais o avanço do islão de lenço na cabeça.

A liberdade religiosa no cristianismo e nos países ocidentais favorece o avanço do Islão que não concede liberdade nem contrapartidas e por outro lado enfraquece a laicidade nos países de cunho cristão.

A proibição de interpretar o Corão de maneira histórico-crítica (ao contrário do que acontece no cristianismo) reduz a espiritualidade individual ou grupal a uma incrustação de palavras cultuais e culturais que permanecem estáticas nas mensagens éticas do século VII. Assim, a religião muçulmana é uma religião política sendo uma farsa falar-se do islão político, quando, na realidade, o que a jurisprudência muçulmana só permite o islão político porque só considera a liberdade e a dignidade individual da pessoa numa relação de subjugação e de súbditos da sua cultura árabe e esta como a única verdadeira; uma certa tolerância só é taticamente usada num período de transição até que o grupo islâmico se torne maioria. O islão é intolerante, servindo-se da ambiguidade, como meio de afirmação, e do fascismo religioso não só como factor identitário mas também como estratégia hegemónica. Na Europa há cientistas do islão que, pelo facto de defenderem uma análise histórico-crítica do Corão e de Maomé, vivem sob vigilância policial para não se tornarem vítimas de algum atentado islâmico. O Corão tem muitas revelações jurídicas que requerem localização histórica para não prolongarmos ad infinitum muitos dos seus costumes primitivos.

O islão também tem, muitas vezes, má fama por não reconhecer que o terrorismo islâmico tem a ver com o islão: por toda a parte se assiste à prática da violência islâmica no mundo mas publicamente afirma a sua vontade de paz e não se observe em nenhuma parte manifestações islâmicas contra o terrorismo.

A interpretação oficial de que o Corão é literalmente palavra de Deus dá razão e motiva os terroristas muçulmanos a fazerem o que fazem porque isso está escrito no Corão e Maomé foi o primeiro a dar o exemplo de violência e não cumprimento de acordos. Os líderes islâmicos continuam a manter longe deles a autocrítica e não se preocupam por uma auto-compreensão mais adequada aos tempos modernos.

O Deus de uma cultura espelha a realidade do Homem dessa cultura

Para se poder compreender textos antigos, a sua leitura terá de ser feita no seu contexto histórico e também serem submetidos à análise histórico-crítica. Querer interpretá-los apenas literalmente como fazem os muçulmanos e os Testemunhas de Jeová leva a confundir o seu espírito com o corpo (escrita) que lhes dá forma.

O mesmo se diga sobre a história do desenvolvimento da consciência ética e moral! Por outro lado a revelação de Deus também não se deixa reduzir a uma rima, nem ao casulo de uma cultura nem tão-pouco à imagem que esta faz dele para se poder definir e subsistir; o lugar da revelação de Deus é a pessoa que vive em comunidade e como tal só serve o Homem a cultura que o liberta e não a cultura ou religião que o subjuga com armaduras pesadas e impostas para fazer dele apenas soldado e se afirmar à custa dele. Soldado implica guerra, a não ser que se entenda como irmão da caridade e do amor que que disponibiliza a sua vida em serviço do próximo vendo em cada pessoa um filho de Deus independentemente da sua fé ou crença.

Deus revela-se à medida que o Homem é capaz de entendê-lo e a sua imagem de Deus é a melhor definição do que ele é e pretende ser. Por isso embora só haja um Deus, há contudo diferentes e quase contraditórias imagens dele (religiões). Por isso Deus não é igual a Deus e consequentemente religião não é igual a religião.

Em relação ao islão necessitam-se diferentes abordagens dos textos sagrados, como se faz na teologia ocidental; isto ajuda a evitar fundamentalismos sem a necessidade de se desfazer dos textos nem, por outro lado, de amarrar o sentido à casca das palavras ou aos interesses de uma instituição em que a dignidade humana não seja o princípio de soberania social.

A nossa percepção depende do contexto porque somos feitos também de comunidade

Em geral, o erro dos dirigentes muçulmanos vem do facto de não permitirem a análise contextual histórico-crítica, considerando o Corão como um monólogo de auto-revelação divina: um monólogo sem parceiro que o entenda.

O ser humano só se reconhece no diálogo ou no encarar um oposto (o rosto do outro leva-me a reconhecer e a perceber o meu rosto, sem necessidade de, para ser, negar o outro!). Por isso o ser humano é o resultado do diálogo em diálogo. No diálogo pessoal e cultural de Deus com o Homem revelam-se simultaneamente Deus e o Homem na continuação do diálogo criador-criatura. O entender do homem é, também ele, uma revelação de si mesmo e de Deus. Deus dá-lhe a mão para que o humano deixe de rastejar e se levante na afirmação-procura do que é mais que uma imagem projectada num ecrã material.

No princípio era a Palavra, a Informação e esta tornou-se carne, revela-nos já o evangelho de S. João. Do diálogo surge comunidade, a comunidade dialogante que não se reduz ao diálogo do eu com um tu mas que se realiza no nós (comunidade). Por isso Deus é trinitário, não se reduz ao deserto de um monólogo de um ausente consigo mesmo, nem à crusta da terra porque esta encobre vida. É comunicação do ser, expressa no estar, no sempre a tornar-se (acontecer).

Deus é a relação por excelência que faz da vida relação, não podendo ser limitador da relação como quer o Islão, com muitas frases do Corão, que procura, através delas, aprisionar Deus na cultura árabe e legitimar a opressão e a perseguição dos vizinhos (dos fora do gueto: os denominados ímpios ou incrédulos). Também muitos muçulmanos terroristas justificam o seu agir violento com o Corão, interpretando-o à letra mas não notando que muitos textos do Corão se encontram em contradição e que neles Alá muda de opinião conforme os interesses da situação, por vezes muito mundanos.

Naturalmente, o conteúdo do Corão ou de uma revelação não pode ser reduzido ao contexto histórico ou a uma história edificante para o tempo. Trata-se de ver o que a casca do texto encobria para hoje melhor compreendermos a verdade profunda que ele esconde e que também hoje usamos para melhor nos definirmos, percebermos e expressarmos. Não se trata apenas de descobrir o conteúdo ético ou histórico mas a espiritualidade que dele brota como eco de Deus, na expressão que encobre o exprimido.

Em contexto apologético, representantes muçulmanos falam muito de justiça e misericórdia que são naturalmente valores que se referem ao tratamento, ao manejo exterior e que se podem encontrar também no Corão. Mais importante que a justiça e a misericórdia é o amor, o amago do que é vida, relação, o único suporte de tudo o resto.

O Islão tornar-se-á cada vez mais anacrónico se não se orientar mais no sentido da espiritualidade e não permitir a análise histórico-crítica das suas fontes.

© António da Cunha Duarte Justo
Teólogo e Pedagogo
Pegadas do Espírito no Tempo,

ANIVERSÁRIO DO ASSASSÍNIO DO REI DE PORTUGAL – UM CRIME REPUBLICANO E MAÇÃO SEM PROCESSAMENTO JURÍDICO NEM HISTÓRICO

O regicídio de 1 de Fevereiro de 1908 com o assassínio do rei D. Carlos e do seu filho e herdeiro, D. Luís Filipe de Bragança, foi praticado por jacobinos republicanos de influência francesa e auxiliados por elementos da Carbonária (maçonaria).

Os assassinos directos Alfredo Costa e Manuel Buíça foram imediatamente apanhados pela polícia e logo depois mortos para impedir uma investigação séria e não descobrir os cúmplices. As armas usadas no regicídio foram levantadas do armeiro Gonçalo Heitor Freire (republicano e maçon).

Em 1910, o governo republicano liderado pelo primeiro-ministro Afonso Costa impediu a investigação judicial do regicídio terminando o caso sem condenação nem conclusão.

“En 2008, el gobierno socialista de la Tercera República Portuguesa rechazó conmemorar el centenario del regicidio de Lisboa, prohibiendo cualquier participación oficial por personal militar o funcionarios del gobierno.”

A memória teria de ser apagada para que não houvesse a ideia de que a República foi filha do crime e de uma classe jacobina que desde as invasões Francesas influenciou e influencia determinantemente os destinos de Portugal.

A República não quer ter memória porque mostraria o feitio da têmpera de parte da sua classe que determina hoje os destinos de Portugal. A república esconde bem as suas vítimas nas caves da nação. Esquece porém que, deste modo, manipula o pensar da colectividade portuguesa, ao baralhar e e omitir a verdade sobre este período decisivo para Portugal. Este procedimento ajuda amelhor entender o pensar coado de grande parte da população portuguesa. A infraestrutura ideológica da nação não permite o processamento nem a digestão das partes negativas praticadas em nome do Estado e por isso vomita-as logo, de princípio.
António da Cunha Duarte Justo
Pegadas do Tempo

O ESTADO ALEMÃO NÃO HONROU AS VÍTIMAS DO ATENTADO DE BERLIM

O factor medo na política de informação pública e na atitude política

António Justo
Só um mês depois do ataque terrorista islâmico perpetrado em 2016/12/19 junto à Igreja da Memória num Mercado de Natal de Berlim, o Parlamento Federal conseguiu comemorar os mortos e outras vítimas do atentado e isto devido ao incentivo das muitas críticas na imprensa e nas redes sociais. O Estado alemão não honrou oficialmente as vítimas do atentado islâmico: um atentado cheio de simbologia contra o Estado e contra o cristianismo.

O medo encontra-se enraizado na coluna vertebral

A classe política alemã tem medo de dar demasiado espaço público a assuntos como a criminalidade porque desbeneficiariam a imagem pública dos estrangeiros e em especial a dos muçulmanos que se salientam pelas suas exigências à sociedade acolhedora e também pela organização de extremistas em torno de mesquitas e de clãs árabes em Berlim e noutras cidades. Uma censura camuflada da informação revela-se de resultados positivos a nível social; assim a Alemanha não se tem visto confrontada com o nacionalismo como acontece em França que segue uma política de informação mais liberal, neste sector.

A Ministra do Trabalho prometeu compensação às vítimas que seriam pagas pelo fundo para vítimas de acidentes rodoviários. Deste modo relega a questão para “acidente de trânsito”.

O presidente do Bundestag, Lamert, no discurso proferido no parlamento, referiu que um Estado, que garante a liberdade religiosa como um direito humano, “pode e deve exigir dos muçulmanos uma discussão com a sua religião e a conexão fatal entre fé e violência fanática, de forma vigorosa“, disse ele.

Com o atentado terrorista de Berlim a classe política revelou uma atitude cobarde para com as vítimas. A Alemanha é o único país que depois de um atentado terrorista evitou celebrações públicas.
A gravidade desta omissão assenta no facto de um atentado terrorista com fundamentação política ser politicamente ignorado pela classe política. Estamos em ano de eleições na Alemanha e a classe política quer evitar tudo o que faça lembrar os seus erros. O medo do medo chegou à política legitimando o ataque de certos grupos que dizem que ela apenas reage e não age. Há razões objectivas para se ter medo de se viver em cidades que habitamos que levam muitos cidadãos a sentirem-se estrangeiros no próprio país. Não se trata de tomar opções drásticas como faz talvez levianamente Trump mas de convencer os muçulmanos a serem mais moderados e contidos na sociedade que lhes permite elaborar um futuro mais digno do que teriam na própria sociedade.

Hoje a opinião do mainstream autocensura-se evitando ou banindo perguntas críticas com o argumento de poderem fomentar a xenofobia e o populismo. Falta a coragem de argumentar em público com sinceridade e parte-se da consideração de uma sociedade imatura em que não se pode confiar a verdade em vez de a preparar para a multiplicidade e para o dever da interculturalidade.

O medo tem as suas origens sobretudo numa desigualdade social que cresce. A sociedade média encontra-se cada vez mais instável; poucos sobem na sociedade isolando-se em elites e outros vêem que seus filhos, embora nas mesmas condições de formação, estão condenados à depravação.

Muita da camada social decadente sente-se injustiçada e desfavorecida em relação aos refugiados que, por vezes, recebem maior apoio do Estado do que os necessitados nacionais.
Os terroristas combatem o modelo de sociedade ocidental e esta limita-se a construir fossos de combate entre si ou a meter a cabeça na areia. Estabilidade interna e liberalidade encontram-se em tensão alta.

O luto recusado

As vítimas de Berlim encontram carinho e empatia cordial por parte dos cidadãos mas não na sociedade política donde seria de esperar um gesto público de respeito do Estado pelas suas vítimas.

Familiares das vítimas queixaram-se do “luto excluído” e da falta de cultura do luto. De facto não houve imagens das vítimas.
Tal é o medo dos partidos e de um Estado perante um povo que, em parte, os responsabiliza pelo acontecido e por um Estado que perdeu o controlo sobre os refugiados que albergou em 2015 (cerca de um milhão). O culto da culpa praticado na Alemanha não parece conveniente nem oportuno para vítimas alemãs. “Vítimas alemãs não se enquadram no conceito do culto da culpa – em que só pode haver delinquentes alemães e não há vítimas alemãs”, relata um desiludido. Uma certa benevolência de tratar pública e politicamente os muçulmanos na Alemanha fomenta em muitos a inveja de serem desfavorecidos.

A república mudou a partir dos acontecimentos de Colónia

Os cidadãos das potências europeias e, por empatia, também os dos países pequenos encontram-se movidos por uma onda dos sentimentos que em certos meios toma a expressão de uma guerra civil de moral contra moral.

O poder da emoção pública aumenta e mete medo também aos políticos que, em tempos de eleições, se deixam determinar mais pelo medo. Em vez dos factos surge o poder das emoções e das ideologias que determinam um espírito irritado e irritadiço na sociedade.
Nas conversas domina a preocupação e a falta de orientação. O eu individual e o eu social não se encontram em harmonia.

Na passagem do ano de 2015 Colónia e outras cidades alemãs congregaram grupos de refugiados principalmente do norte de áfrica com a finalidade de apalpar, roubar e abusar de centenas de mulheres alemãs reunidas em torno da Catedral para saudar 2016. Este fenómeno repetiu-se na mesma noite noutras cidades. A informação sobre o assunto foi, em parte, manipulada e adiada para não causar aversão contra os muçulmanos. A partir daí a sociedade deixou de ser a mesma; a desconfiança tem vindo ocupando os espaços da confiança. Diminuiu imenso a confiança na imprensa e nos políticos. A ideia que a sociedade tinha em surdina, já desde há muitos anos, de que as informações relativas a abusos e criminalidade de pessoas de cultura árabe eram branqueadas, viu-se confirmada na manipuladora política de informação dessa noite e nas hesitações dos dias seguintes. Depois de Colónia essa preocupação encontra-se mais velada na prática de se procurar justificar a maior criminalidade árabe com problemas de meio social e de precaridade económica como se nas mesmas cidades não vivessem outros tantos ou mais alemães nas mesmas condições sociais. Às vezes a explicação de um fenómeno ainda o agrava mais por substituir a tomada de apoios para os grupos sociais concorrentes.

O medo na Alemanha tem uma certa legitimação, dado o povo estar atento e reagir aos acontecimentos. Era tabu ter medo de expressar o medo ou crítica a uma sociedade hóspede que se comporta, por vezes como se fosse senhora da casa. A sociedade aberta não é consequente ao evitar uma cultura de conversação aberta.

A sociedade ocidental, de uma maneira geral, tem uma atitude complacente para com o delinquente (mesmo a nível de tribunal) e uma atitude indiferente para com a vítima, independentemente de ela ser nacional ou estrangeira. Talvez esta atitude corresponda a uma projecção da própria sombra recalcada no sentimento inconsciente de que o próprio bom viver se deve à exploração.
© António da Cunha Duarte Justo

Pegadas do Tempo,