BRICS PLUS significa mais “Cooperação Sul-Sul” e “Desdolarização” do Comércio mundial
A guerra substituta a decorrer na Ucrânia e a guerra económica apressam o alinhamento do mundo em torno do grupo G7 e dos países emergentes no grupo BRICS PLUS. O conflito sistémico entre estados socialistas e estados capitalistas que se expressa na Ucrânia não impressionou as ações do G BRICS que viu o BRICS (5) aumentado para o BRIKS PLUS (11). Com o erguer-se do grupo BRIKS PLUS, o sonho globalista de um mundo monopolar sob a égide da NATO esvai-se no sentido de um mundo multipolar, de caracter mais pragmático e menos ideológico, facto este que obrigará as nações a novas estratégias de comércio internacional; a hegemonia ocidental será, porém, um osso duro de roer; o grupo surgente pode contribuir para se ir criando um mundo mais humano em termos de relações internacionais.
O “Brics plus”, em termos geopolíticos, é um sinal positivo que irá proporcionar uma reorganização da ordem mundial já fora do tradicional conflito sistémico socialismo-capitalismo. Nele se nota a marca mais própria do Sul (África negra + Ásia) que é organizar-se em termos utilitários pragmáticos e não tanto em termos de doutrina ou ideologia (valores) como é mais próprio da nossa região nórdica e da arábica.
Para nós, ocidentais, a nova situação político-económica revelar-se-á como desagradável porque teremos de abandonar a posição de determinar as nossas condições e padrões ao resto do globo. Com a afirmação do G Brics plus os parceiros internacionais serão levados mais a sério e ver-se-ão de cara a cara num mundo em que o que mais conta é o poder económico e militar. Espera-se que as relações internacionais sejam mais determinadas pelos interesses e encontros de povos do que pelos interesses ainda vigentes e trocados entre as elites dos diversos povos.
A15.ª Cimeira dos BRICS (Brasil, Rússia; Índia, China e África do Sul) realizada em Joanesburgo de 22 a 24 de agosto expressou a aspiração dos países emergentes a tornarem-se num contrapeso do domínio unipolar americano e manifesta a vontade de emancipação num momento histórico, em que no jogo geopolítico em curso, passarão a valer como trunfos não só os azes mas também as biscas, reis, valetes e damas, e em certo sentido também passa a contar um pouco a arraia miúda.
O BRICS Business Forum tenta ser a contrapartida do G7 que domina a economia mundial expressa no Dólar americano como moeda de transações. Manifesta-se a nível económico e político a vontade de uma geopolítica bipartida (bipolar) num primeiro estádio para um dia se chegara uma política multipolar que evite o globalismo unipolar. Neste sentido o G Brics por iniciativa da Rússia pretende a possibilidade de transações comerciais internacionais na moeda nacional de cada país, o que se revelará muito difícil atendendo à instabilidade das diferentes moedas! O presidente brasileiro Lula perguntava-se:” Por que é que o Brasil precisa de Dólares americanos para fazer comércio com a China… com a Argentina?”
O Ocidente que esperava manter alguns trunfos divisionistas no grupo, devido à concorrência de interesses da Índia-África do Sul dentro dos países do G BRIKS, viu-se desiludido ao constatar que de uma só vez o grupo se viu duplicado ao anunciar a adição de 6 novos membros ao grupo em 1º de janeiro de 2024. Os novos membros serão Arábia Saudita, Irão, Emirados Árabes Unidos, Argentina, Egito e Etiópia. Os Emirados Árabes Unidos já faziam parte do banco dos BRICS. Como resultado, o grupo dos 11 ganha peso geopolítico e representa um forte contrapeso do grupo G7. Porém o Banco de Desenvolvimento do G Brics com sede em Xangai terá muita dificuldade em afirmar-se devido às moedas locais que não oferecem estabilidade; a hegemonia ocidental ver-se-á obrigada a fazer aferimentos contratuais mas perdurará atendendo às suas redes estáveis nos seu sistema bancário, produção e redes de distribuição económica e de presença militar estratégica.
Segundo informações do Governo sul-africano, o G BRICS representa mais de 42% da população mundial, 30% do território do planeta e 18% do comércio global. Segundo o presidente brasileiro Lula da Silva, o grupo dos 11 produzirá até 37 % do produto interno bruto global (PIB) em paridade de poder de compra e representará 46 % da população mundial.
Dos 40 estados pretendentes a entrar no G Brics, 23 tinham manifestado firme interesse na adesão reconhecendo no G Brics o centro de poder do sul global. Na lista encontram-se países como Indonésia, Turquia, Kuwait, Nigéria, Uruguai e Bangladesh.
A Rússia, a China e o Brasil empenhados na ampliação do grupo Brics conseguiram assim ver a sua iniciativa premiada no seu alargamento para o “Brics plus”. Quanto mais estados tiverem, mais poder terão para se afastarem do dólar, que consideram instrumento de lutas políticas pelo poder. Putin também apoia a entrada da Bielorrússia como membro do grupo.
A China afirmou que defendia a expansão do grupo Brics, no sentido de se estabelecer uma “ordem económica mundial mais justa”. A China quer passar para o centro da ordem mundial.
De destacar no fórum foi o facto da Índia aceitar o “Brics plus” porque o seu alargamento corresponde ao aumento da influência da China na região o que poderá tornar-se desfavorável para a Índia num espaço asiático onde China e Índia são concorrentes. A Índia estaria mais interessada na cooperação entre países em desenvolvimento e emergentes e em manter boas relações com os EUA e a Europa que recebem 30% das suas exportações.
A África do Sul queria ver no grupo Brics um jogo de caracter mais diplomático não considerando o G Brics como pró-rússia nem como antiocidental. Interessante foi o facto de a África do Sul ter apoiado o BRICS PLUS que considerava mais como “cooperação Sul-Sul”.
O Irão considera a sua inclusão no grupo Brics como uma “vitória estratégica para a política externa iraniana” e a Argentina vê nele uma “nova oportunidade”.
O Brasil defendeu sempre o “Brics plus” como contrapeso ao grupo G7. Lula criticou o Fundo Monetário Internacional (FMI) por muitas vezes ajudar a “afundar países”. A Argentina deve US$ 44 bilhões ao FMI. Criar uma moeda comum independente de dólares, como o Brasil deseja, será difícil devido às diferentes economias dos membros do G Brics..
O Ocidente considera que os estados do Brics plus não têm orientações políticas, o que dificulta o seu agir futuro; como o conflito oeste-leste se está a transformar em conflito norte-sul, tudo justifica a necessidade da autoafirmação do G Brics plus. Com o G Brics plus, a comunidade ocidental passa a ter um sério concorrente. Por isso o Ocidente tenta não perder parceiros comerciais como o Brasil, a Índia e a África do Sul.
A fusão dos estados Brics, apesar das diferentes situações, ao centrar-se na defesa de interesses pragmáticos aumenta a esperança de que a via ideológica possa ser ultrapassada de modo a que o que é bom ou mau no capitalismo já não tenha de ser ditado pelo marxismo e por outro lado surja a possibilidade de o capitalismo receber um rosto mais humano.
O grupo das economias emergentes BRICS PLUS reunir-se-á em outubro de 2024, na cidade de Kazan, Rússia. Neste contexto será interessante observar o desenrolar da reunião do G 20 (um grupo de importantes países industriais e emergentes) na Índia, nos dias 9 e 10 de setembro. Sem sonho não há vida!
António CD Justo
Pegadas do tempo