O FIM DO MUNDO É HOJE

A Vingança dos Bons só chega no Fim dos Tempos

António Justo

2012 tem sido um tempo grávido de pessimistas e moralistas. A terra tem sido pródiga em catástrofes sísmicas, atómicas, económicas e políticas. O seu rosto macabro produz sismos de medos com reacções em cadeia em almas hipersensíveis. A crise social, a insegurança existencial, numa palavra, o medo do futuro é o melhor húmus para a fertilização de cenários apocalípticos. O medo revela-se como o odor dos cadáveres; logo que surge rondam em torno dele as gralhas do oportuno.

 

Alegadamente, o calendário Maia prevê para hoje 21 de Dezembro o fim duma era (isto é o seu calendário acaba ali).

 

Na constelação social actual, para admiradores do exótico, nada viria mais a preceito que a história dum povo devastado que prevê o próprio fim. Um clima insuportável fomenta crenças obscuras. Um efeito colateral do medo do apocalipse é branquear os problemas do clima, meio ambiente, matérias-primas, corrupção estatal, etc. Ao adiar-se a solução dos problemas aceita-se, implicitamente, ser vítima deles. A impotência e o desamparo humano tende a diferir as soluções dos problemas do dia-a-dia dando oportunidade às moscas do sofrimento alheio. O negócio com o esoterismo revela-se, hoje, como o milagre económico para as editoras e outras indústrias afins.

 

Geralmente, a vingança dos bons e dos sofredores/oprimidos chega atrasada; dá-se só no fim dos tempos.

 

Muitos livros, em vez de esclarecerem os necessitados, servem-se dos seus problemas para os embrulhar, por momentos, na lã fofa e quentinha do sentimento.

 

Até o estado joga nesta lotaria: o ministro russo da defesa civil chega mesmo a afirmar que tinha “informações inequívocas” (HNA, 21.12.2012) segundo as quais o fim do mundo não se daria no dia 21.

 

As mitologias das religiões falam dum “fim do mundo” que prevê, depois da catástrofe, a felicidade.

 

O cristianismo fala dum “Apocalipse” (revelação divina, tirar o véu), num tempo depois do tempo e do qual surgirá um novo céu e uma nova terra! Um modo simbólico de metanoia humana.

 

A mitologia nórdica prevê, o fim do mundo, no “destino dos deuses” que depois de três anos de luta entre eles e de três anos glaciares daria lugar à luta das forças destrutoras da natureza em que os monstros lutam contra os deuses; por fim o mundo arde e Ódin, o supremo deus germânico, cria, de novo, a terra.

 

Nostradamus publicou em verso as suas profecias que chegariam até ao ano 2242. Segundo ele, dar-se-á uma catástrofe cósmica e uma catástrofe climática depois das quais o mundo surgirá de novo.

 

Em 1910 também cientistas tinham previsto o fim do mundo devido à aproximação da terra pelo cometa Halley.

 

Já outros fins do mundo tinham sido profetizados para 1981, 1999, 2000 e os próximos previstos pelos especialistas do fim estão já agendados no calendário para acontecer em 2060 e 2076.

 

A “vingança” dos bons revelar-se-á produtiva quando não se refugiar nas ideias e se desculpar no que há-de acontecer. Somos o acontecimento onde o princípio e o fim se encontram.

 

António da Cunha Duarte Justo

antoniocunhajusto@gmail.com

www.antonio-justo.eu

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ADVENTO DO NATAL

António Justo

Chegou o advento vem o Natal. Aquele tempo em que optimistas celebram e pessimistas lamentam, produzindo a harmonia das notas do Universo. Uns cantam em bemol, outros em allegretto (sustenido). Para todos é Natal em cada dia: uns na alegria do gerar outros nas dores do parto.

 

Se não fosse a referência de Lucas no seu evangelho de que Jesus nasceu num curral de pastores com os anjos a cantar e os reis magos a visitá-lo, certamente que a ideia do presépio não se teria vulgarizado e o mundo seria mais frio. Independentemente da exactidão histórica do relato, imaginem como seria frio e sombrio o mês de Dezembro, sem a festa de Natal. Lucas quer com a sua narração dizer que do seu presépio surgirá o amigo dos pobres (dos pastores que eram então a classe mais baixa da sociedade). Das baixezas dum curral surge a luz da justiça a preparar a paz. A fé nesta mensagem é o contraponto da fé nas acções da bolsa e da fé dos milhões que levarão a paz apenas aos mercados financeiros.

 

No Natal a vida reúne-se em festa. A natureza unida toca-nos porque lá no íntimo do presépio, de cada um, flagra uma chama, sorri uma criança. Quem ama não está sozinho, encontra-se à lareira do presépio onde se encontram pessoas, animais, pastores e reis sob o mesmo calor. No presépio do mundo, somos todos reis a seguir uma estrela, a luz do horizonte.

 

No Natal, independente do credo, celebra-se a humanidade, por isso Natal é a festa de todos, a festa mais humana de todas as festas. Nela o mundo muda, nós mudamos; é natal, a vida a jorrar em tudo: Deus a tornar-se homem para podermos ser criança.

 

Lá fora na praça a sede dum tempo novo passa. No chão as leis, enlameadas, tornam a praça escorregadia. No ar sombrio dum tempo árido, se ergue, nas nuvens da amargura, o gralhar da dor de doentes, desempregados, desiludidos e não amados. As sombras invertidas. Ruinas de vida, no chão, estendidas. Esboços no chão, à espera do presente da vida.

 

Neste dia em que nada acontecia marquei um encontro comigo. A consoada estava demorada; em casa, sozinho, descanso das compras. No recolhimento, ouço alguém que bate à porta. – Quem é? – É um Jesus fugitivo, que precisa de pausa, para descansar do estresse do dia. – A minha porta está aberta mas a minha casa desarrumada. – Não importa, o que conta é a porta aberta para poder entrar e comigo a paz. Muitos têm a porta fechada, com os meus presentes amontoados à porta… – Como vês só tenho aqui umas rabanadas, uns bolos e o resto por acabar de fazer. Que desejas? – Quero amor, aquela parte de mim, que tu és. -Eu amo e tu és a resposta.

 

António da Cunha Duarte Justo

antoniocunhajusto@gmail.com

www.antonio-justo.eu

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Natal – A Compreensão cósmica de Deus, Homem e Mundo

O Cosmos evolui no Sentido da Natureza de Cristo

 

António Justo

Aproxima-se mais um Natal no tempo. Um escândalo! Deus torna-se mundo e Homem depois duma grande gestação que se seguiu à Palavra de Deus inicial que produziu o “Big Bang” do universo e se foi tornando, cada vez mais, visível, atingindo o apogeu no Filho do Homem. Em Jesus Cristo une-se a divindade e a criação (poder e vulnerabilidade); os opostos tornam-se parte duma realidade maior que ultrapassa a visão dialética e bipolar habitual. O JC torna-se a interpretação de Deus e do mundo: é não só a sua metáfora mas também a sua realidade; ele reúne e resume a corporeidade, a matéria no Jesus homem e a divindade no Cristo. O divino apresenta-se aqui numa dimensão física visível e numa dimensão espiritual invisível: é mundo e transcendência ao mesmo tempo.

 

Com as dores da evolução, o espírito expressa-se no espaço e no tempo (cosmos) à semelhança do desenvolvimento do ser humano no ventre da mãe durante a gravidez. JC é o “início” e  “o primogénito de toda a criação” (cf. Paulo aos Colossenses); com Ele e nEle a divindade incarna já antes de toda a criação. A divindade torna-se pai/mãe no Filho, gera e cria por amor permanecendo na união do criar e dar à luz (revelar) parte de si mesmo (a sua dimensão cósmica). JC já resumia nele a divindade e a criação antes do pecado original. Daqui ser óbvio não se acentuar demasiado a espiritualidade do pecado original como fundamento da incarnação divina (como advertem teólogos). Para João Duns Escoto o pecado assume uma realidade secundária em relação ao amor. A religião do cristão é o amor e o amor expressa-se na bondade.

 

O universo é o alfabeto e a sintaxe da Palavra inicial (No princípio era o Logos, a Palavra, a Informação) donde tudo surgiu e se manifesta. JC é a revelação de Deus nas suas dimensões material e imaterial. “No princípio já existia o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus. Ele estava, no princípio, com Deus; tudo começou a existir por meio d’Ele, e sem Ele nada foi criado” (Jo 1, 1-3).

 

A criação traz, assim, em si o gene divino e o germe da evolução tendo chegado à maturidade física que comporta o seu florescer no espírito, na natureza do Cristo. Em JC temos a ideia e o acontecer duma Realidade ao mesmo tempo visível e invisível. É aquilo que a liturgia realiza na eucaristia, antecipando nela a realidade final, a transubstanciação da matéria no espírito, num processo de Alfa e Omega, como JC já antecipou.

 

Teilhard de Chardin compreende o cosmos inteiro como Cristocêntrico numa espécie de consagração transubstancial da realidade. Bento XVI fala do sinal da ” Eucaristia, comunhão com Cristo e entre nós” e Joao Paulo II acrescenta: “A liturgia cristã deve ter uma orientação cósmica. Tem que, por assim dizer, orquestrar o mistério de Cristo, de facto, com todas as vozes que estão à disposição da criação” (Ecclesia de Eucaristia). Com isto, chama a atenção não só duma espiritualidade transcendente mas também duma espiritualidade imanente (inerente ao cosmos). Esta será a dimensão a aprofundar numa fase mais mística do cristianismo e que virá dar resposta aos novos tempos.

 

Deus torna-se mundo e Homem em Jesus Cristo (processo evolutivo do Alfa para o Omega); JC ao resumir em si o mundo e a divindade espelha nEle a pessoa e o universo no seu processo de divinização. Deus dá hoje continuidade ao processo de incarnação que tinha iniciado e realizado em Jesus Cristo ao iniciar a criação. Os movimentos cíclicos e lineares convergem em cenários de uma mesma realidade que se expressa nas espiritualidades natalícia, pascal e pentecostal. O ciclo da natureza e o ciclo litúrgico tornam-se metáforas duma mesma realidade em via.

 

No processo evolutivo, à hominização segue-se a natureza de Cristo. O Natal (incarnação) provoca uma verdadeira revolução do pensar racionalista e sentimentalista, abrindo horizontes para panoramas e dimensões impensáveis. Não podemos acentuar demasiado o aspecto pedagógico-didático da liturgia natalícia em detrimento da realidade essencial teológica e mística que se resume no mistério da Trindade e no processo de incarnar e ressuscitar.

 

O Natal, embora incorporado no negócio do consumo, na concorrência e no sentimentalismo, é, no tempo, aquela parte do tempo que aponta para a justiça e para paz. O calendário litúrgico, tal como as estações do ano, expressa metaforicamente a realidade da vida, e consequentes diferentes nuances.

 

Urge uma actual compreensão e vivência do mundo, do homem e de Deus. A desmitologização do mundo expressa no cristianismo pressupõe a desmitologização do espiritual, para se poder compreender a realidade integral que é Jesus Cristo. Urge dar-se a desmitologização de Deus, do homem e do mundo para se sentir o fluir do divino no humano numa interligação de Pai no Filho, de Filho no universo na unidade do Paráclito.

 

A incarnação é um mistério que pode ter várias abordagens também no sentido de dar resposta aos problemas actuais apresentados pelas novas impostações teológicas e pelas ciências físico-naturais. Uma das impostações será a de que Deus não encarnou em JC porque Deus estava ofendido com os pecados do mundo mas também porque, por amor, na sua relação trinitária, ao tornar-se mundo e homem se submete à evolução, à cruz do mundo a caminho do Cristo. Deus ao revelar-se em Jesus Cristo revelou o ser do Homem e do mundo também.

Estamos chamados a realizar o JC.

 

Com este Deus que se declara por nós e em nós, há que renascer para realizar o Natal.

 

António da Cunha Duarte Justo

Teólogo e Pedagogo

antoniocunhajusto@gmail.com

www.antonio-justo.eu

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POVO INSOLVENTE

POVO INSOLVENTE

Os pássaros já não voam
E a terra engole os sonhos

Os judas andam à solta
São Galantes da opinião
Sugam e malham as gentes
Os esponjas da evolução

Traficantes da injustiça
A viver da podridão
Eis a sociedade mórbida
Onde reina a servidão
Já só vingam os vilões
Nos jardins da nação
O Povo não vive nem morre
É erva de fado no chão
A paisagem é dos iníquos
Dos impunes a civilização
Por entre a rama opulenta
Homúnculos do dia-a-dia
Espreitam a luz já coada
Nas faixas da fantasia
Os pássaros já não voam
E a terra come os sonhos

António da Cunha Duarte Justo

www.antonio-justo.eu
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