O PODER DIGITAL E A PERDA DO AQUI NO AGORA

Reduzidos ao Presente – a mero Entremeio – sem Passado nem Futuro

O mundo digital, na sua vertiginosa dança de luzes e algoritmos, quer-nos reduzidos a funções, engrenagens silenciosas de um mecanismo que celebra o agora sem raízes, sem o aqui. Vivemos na superfície do tempo, como sombras que crepitam na tela, efémeras, sem deixar marcas na terra firme da existência. O ego, inflamado de estímulos, esquece-se do “eu mesmo” e do nós, e assim caminhamos, isolados em multidões digitais, consumindo presentes contínuos sem jamais habitar um lugar.

Ou será que nos deixamos reduzir a ruídos pensantes, partículas minúsculas no universo das mentes, sujeitas à mesma força de atração que mantém os astros em equilíbrio. Mas há uma escada a ser escalada: o pensamento analítico e crítico. Ele é o único meio de elevar-se acima do turbilhão, de vislumbrar, ainda que por um instante, o jogo das coisas sob a luz do sol — não como meros espectadores, mas como participantes conscientes. Num mundo onde a história nos assombra e as massas nos arrastam, é preciso transcender a rotina das instruções de utilização, essa prisão invisível que nos ensina a funcionar como expressões do tempo, mas não a ser.

Crescemos numa cultura de guerra, de utilitarismo rasteiro, onde o sonho é visto como luxo e a fantasia, como fuga. Mas é justamente no reino da fantasia, na filosofia que bebe do cristianismo e do mito, que encontramos o poder criativo — a coragem de aspirar a algo maior que o prático, algo que nos liberte da tirania do imediato. As coisas da vida aguardam o nosso toque pessoal, como notas dispersas que só se tornam música quando ordenadas pela mão do compositor que devemos ser. Criar é responder ao que a vida nos apresenta, é emprestar-lhe a nossa essência, tal como o gesto divino insuflou vida no barro. Sem isso, sem nós mesmos (conscientes), as coisas morrem, e nós com elas.

Urge estarmos alerta (alerta física, espiritual, mental e emocional): as novas tecnologias não são neutras. Elas moldam a nossa percepção, o nosso modo de ver, de sentir, de amar. E se não vigiarmos, tornamo-nos cartões de crédito cerebrais, consumidores de impulsos, servos de poderes anónimos que nada sabem de nós, excepto nossos dados. Desmaterializamo-nos, trocamos a carne pelo algoritmo, o aqui pelo agora vazio. Abandonamos o processo de in-formação — de nos tornarmos forma, de assumirmos uma identidade — para ficarmos presos no em (no processo in), num limbo onde nunca chegamos a ser. Queremos tudo à disposição, e assim nos reduzimos ao que está disponível. Ambicionamos a omnipresença, e, no processo, perdemos o eu que habita o aqui e agora. Contentamo-nos com o agora num mero estar sem ser reduzido a momento.

E assim, construímos um universo de meteoritos errantes — sendo fragmentos sem estrelas, sem órbitas, sem calor. Konrad Paul Liessmann alerta: “se no século XX combatíamos a reificação (a transformação do humano em coisa), no século XXI teremos de combater a desreificação, essa abstração que nos dissolve em pura informação, esvaziando-nos de matéria e alma”. O mercado das opiniões não tem ruas, só becos. E a felicidade, exige esforço. É no atrito que a criança — o novo, o possível — nasce.

Mas preferimos a “ditadura do relativismo”, como bem nomeou Bento XVI, onde tudo vale precisamente porque nada importa. E assim, sem raízes, sem chão, sem aqui, flutuamos no vazio digital (e até social), reduzindo-nos a funções sem rosto, agora sem memória, ego sem eu nem nós.

Por que continuar a deixar-nos reduzir ao fugaz intervalo do agora e, deste modo, sermos condenados ao presente líquido, onde passado e futuro se evaporam, como se fossemos o relâmpago cósmico do acaso: só visível porque a vida, frágil e obstinada, ergueu lentes contra o vazio.

António da Cunha Duarte Justo

Teólogo

Pegadas do Tempo

 

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EXTREMISMO E POLARIZAÇÃO SOCIAL NA ALEMANHA

Em 2024, as autoridades alemãs registaram um total de 57.701 crimes com motivação extremista, refletindo um cenário preocupante de radicalização no país. O Gabinete de Protecção da Constituição (BfV) identificou dados alarmantes sobre o extremismo em 2024:

Extremismo de direita: 50.250 indivíduos, dos quais 15.300 são considerados propensos à violência.

Extremismo islâmico: 28.280 pessoas, com 9.540 em risco de adopção de métodos violentos.

Extremismo de esquerda: 38.000 activistas, com 11.200 de tendências violentas.

Tudo isto tem a ver com a polarização social e cultura do confronto.

O relatório não se limita aos números, alertando também para uma degeneração do clima social. A sociedade alemã está cada vez mais dividida, com discursos políticos e mediáticos que privilegiam o conflito em vez do diálogo.

 Assiste-se a um reducionismo perigoso: Debates públicos são dominados por uma visão maniqueísta (“bem vs. mal”), ignorando nuances e aprofundando divisões.

 Guerra e propaganda: Temas complexos, como conflitos internacionais, são simplificados em “a favor ou contra”, eliminando espaço para análise crítica e objectiva.

A falta de coerência política, a hipocrisia, o dogmatismo e o cinismo são factores que alimentam a desconfiança e o radicalismo.

O relatório da Protecção Constitucional Alemã serve como um alerta urgente: a radicalização e a polarização estão a corroer a coesão social. Para combater o extremismo, é essencial promover diálogo, transparência política e rejeição de narrativas simplistas que alimentam o ódio e fomentam o desequilíbrio.

 Segundo um provérbio alemão, “o peixe começa a feder pela cabeça”.

António da Cunha Duarte Justo

Pegadas do Tempo

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Dia de Portugal – Um Canto Renascido

10 de Junho de 1580 – Luís de Camões parte, levando consigo o último suspiro de um Portugal dourado.

De celebração em celebração, embrulhamos a alma da pátria em folhas de jornal, como sardinhas de feira popular. Queimamos incenso sobre o corpo ainda quente da nação, enquanto ela, entre golfadas de fumo e discursos vazios, agoniza em festa.

Camões, o trovador do destino lusitano, cantou-nos quando éramos aurora. Nas páginas d’Os Lusíadas, o sangue dos heróis ainda corre, mas secou nas veias dos que nos têm governado. O sol da ideologia queimou as cores da nossa bandeira, e as revoluções, como vagas traiçoeiras, arrastaram para o abismo o que nos restava de identidade.

Dizem que, ao morrer o poeta, morreu Portugal. Talvez. Mas a terra não sepultou a semente. A classe política, sim, é cadáver – um fantasma que vagueia pelos corredores do poder, surdo ao ritmo do povo, cego à chama que ainda bruxuleia nas cinzas. “Fraco torna fraca a forte gente…” E nós, filhos de uma escrava e de revoluções alheias, deixámos que nos vendassem com os trapos da Libertas, da Agar, de todas as quimeras que nos roubaram o rosto.

Mas Portugal não morre apesar de muitas loucuras ideológicas e nos últimos tempos dos interesses do deus Mamon de Bruxelas que suborna os humanos para obter suas almas. Não morre enquanto respirar fé e coragem, enquanto lembrar que foi à sombra da cruz e da espada que conquistámos o mundo. Pátria e fé eram uma só carne, um só destino. Hoje, porém, perdemos o povo no labirinto das ideologias, e sem ele, a pátria é apenas um nome esvaziado, um barco à deriva sob o voo circular dos abutres.

Agora, a missão é outra: não basta restaurar – é preciso redescobrir. Os Homens-Bons de hoje não partirão em caravelas, mas em busca da própria alma. Terão de navegar “mares nunca dantes navegados”, não de água salgada, mas de consciência. A Taprobana a vencer já não é a distância, mas o materialismo que nos engoliu, o Estado que nos devora, a religião que se esqueceu de rezar.

Teremos de ousar, como os “egrégios avós”, mas sem infantes que nos guiem. A bússola será a dor, o desespero de uma terra que já não nos reconhece. E quando acordarmos, talvez descubramos que a verdadeira liberdade não tem fronteiras – é como o mar, que não sabe onde começa nem onde termina.

Então, Portugal não será apenas um lugar no mapa, mas um verbo: criar. Já não conquistaremos terras, mas relações; já não levantaremos impérios, mas consciências. E quando o céu se rasgar por fim, não serão canhões que ecoarão, mas as cores do arco-íris, derramando-se sobre nós como uma nova aliança.

Até lá, seguimos. Entre a névoa e o sonho, entre os Velhos do Restelo e os loucos que ainda acreditam. Porque um povo que já foi mar não pode viver eternamente de joelhos.

Viva um Portugal que se redescubra à luz do bem e da verdade e se empenhe na construção de uma cultura da paz e abandone a cultura da guerra!

António da Cunha Duarte Justo

Pegadas do tempo

Notas explicativas:

Os Lusíadas: epopeia nacional portuguesa, escrita por Luís de Camões no século XVI. Glorifica os descobrimentos e as viagens heróicas portuguesas, sobretudo a viagem de Vasco da Gama à Índia.

Os fracos enfraquecem a forte gente…”: De “Os Lusíadas”, expressão para a decadência moral que mina a antiga grandeza.

Libertas, Agar: Figuras simbólicas. “Libertas” representa um falso ideal de liberdade; Agar, a serva bíblica, é aqui uma metáfora da alienação cultural e da heteronomia.

Mamon de Bruxelas (símbolo da ganância ou dos valores materialistas): Crítica à influência económica da União Europeia na soberania nacional, particularmente através de subsídios, burocracia e lobby. A UE é aqui apresentada tanto como parceira como objecto de escrutínio crítico – particularmente devido à sua política de interesses económicos e à progressiva alienação de identidades culturais.

Homens Bons (Conselheiros do rei): Termo histórico para cidadãos respeitados que participavam nos conselhos portugueses na Idade Média – hoje um símbolo de actores íntegros e responsáveis ​​​​– com integridade moral – na sociedade. (Representavam os interesses populares das regiões no Conselho Real.)

Taprobana: Nome antigo para o Sri Lanka, em Camões um símbolo do desconhecido – aqui como alegoria aos desafios interiores e espirituais da modernidade (metafórica “fronteira final”).

Velhos do Restelo: Figura dos Lusíadas, um velho que profere palavras de advertência na partida da frota portuguesa. Símbolo de pessimismo e hostilidade ao progresso.

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Portugal em Campo: Um Exemplo que a Política Insiste em Ignorar

Selecção nacional campeã da Liga das Nações da UEFA

Portugal brilha em campo, derrotando gigantes como Espanha (1) e Alemanha, com alma, inteligência e união. Fora das quatro linhas do relvado, porém, reina o conformismo e a mediocridade: uma política sem norte, sem paixão e sem povo. No futebol vemos uma nação inspirada, competente e com talento; na política, um país parado e resignado sempre à espera de comando próprio.

Nas últimas partidas da Liga das Nações, Portugal conquistou duas vitórias memoráveis: primeiro frente à Alemanha, depois frente à Espanha — duas potências históricas do futebol europeu. Em campo, a seleção nacional mostrou ao mundo aquilo que muitos portugueses já sentem: inteligência táctica, espírito de equipa, resiliência, e uma ambição que não se esgota com a vitória. Mas mais do que resultados, Portugal demonstrou algo raro nos dias de hoje — uma união autêntica entre os jogadores, os adeptos e a identidade nacional.

Cristiano Ronaldo, mais do que capitão, simboliza uma geração de futebolistas que não joga apenas por títulos, mas por um país. E essa ligação emocional — entre os melhores e o povo — é um dos segredos do sucesso. Há um laço visível entre a elite desportiva e a base popular, algo que se constrói com mérito, trabalho e verdade. Em tempos de descrença generalizada, é no futebol que muitos portugueses voltam a sentir o devido orgulho coletivo tão menosprezado por ideologias estranhas ao povo e por uma governação reduzida a administração de agendas e directrizes por vezes estranhas à cultura e contra interesses genuínos do país.

Onde o futebol dá lições de profissionalismo, superação e sentido de missão, a política nacional mostra-se rotineiramente mais conformada, oportunista, estagnada e sem visão. Governantes evitam assumir erros, não se corrigem, não escutam. Em vez de enfrentarem os desafios com coragem e espírito de equipa, preferem desculpas hipócritas, retórica vazia e o velho hábito de culpar os outros, na incapacidade de canalizar a energia coletiva do povo para algo produtivo. (Na política, reina a arte da desculpa e da fuga à responsabilidade deixando o país entregue a si próprio. O objetivo parece ser contornar o povo, manter o poder e atribuir culpas aos outros, evitando a todo o custo uma análise séria das causas dos problemas.)

A política portuguesa transformou-se num campeonato sem concorrência séria, onde os partidos, enfraquecidos, produzem líderes frágeis. Falta formação, falta exigência, falta ambição. Enquanto no futebol a concorrência entre grandes clubes eleva o nível e cria elites preparadas, na política escolhem-se gestores do status quo, figuras adaptadas que preferem sobreviver ao sistema do que transformá-lo. Bruxelas, que deveria ser parceira estratégica, tornou-se impeditivo e ao mesmo tempo desculpa permanente para a falta de iniciativa nacional. A submissão acrítica a Bruxelas destrói qualquer impulso de iniciativa nacional e transforma uma potencial elite política em meros gestores conformados.

E assim, enquanto em campo Portugal se bate de igual para igual com os melhores, nos gabinetes o país continua a funcionar como um estaleiro sem plano nem engenheiro. A nação é tratada como um projeto provisório, sem missão, sem rumo, sem liderança clara. Pior ainda: a pátria parece já não dizer muito a quem a deveria servir com mais empenho.

O exemplo da seleção nacional, com a sua entrega, competência e ligação ao povo, devia ser inspiração. Mas para isso, seria preciso coragem política, visão de longo prazo e, acima de tudo, sentido de missão. Até lá, continuaremos a ver em campo aquilo que gostaríamos de ver no governo — e a torcer para que um dia, também fora das quatro linhas, Portugal esteja à altura de si próprio. Para a política fica o aviso do seleccionador de Portugal, Roberto Martínez: “É preciso ter capacidade para sofrer como equipa, ter resiliência “. Doutro modo, Portugal continuará a erguer-se com alma no relvado e a render-se à mediocridade sem rumo nos governos.

António da Cunha Duarte Justo

Pegadas do Tempo

(1) A seleção de Portugal venceu a Espanha, no domingo (8 de junho) em Munique, por 5 a 3 nos penaltis após empate em 2 a 2 no tempo normal e sagrou-se bicampeã da Liga das Nações da UEFA (União das Associações Europeias de Futebol).

A Portugal coube ficar em 1° lugar, à Espanha em 2°, à França em 3° e à  Alemanha em 4°.

https://www.gentedeopiniao.com.br/opiniao/portugal-na-final-da-liga-das-nacoes

https://redactormz.com/no-qatar/

https://www.aveirotv.tv/categoria/opiniao/antonio-justo/

 

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PENTECOSTES: A UNIDADE NA DIVERSIDADE SOB O SOPRO DO ESPÍRITO

A festa do Pentecostes (1) ergue-se como um alto espiritual da Igreja; não como mero acontecimento histórico, mas como perene convocação ao divino no humano. É o esplendor do Espírito Santo que, qual vento impetuoso, desfaz as barreiras confusas de Babel e reconstrói, no fogo da caridade, a unidade na diversidade. Aqui, a linguagem já não é maldição, mas bênção; já não separa, mas congrega.

O Impulso do Espírito envolve-nos na engrenagem da vida através do Pensar-Sentir-Agir!

Na quietude do Cenáculo de Jerusalém, os discípulos, temerosos e recolhidos, são arrebatados pelo Ruah divino. Não se trata de um mero sopro, mas de um ímpeto que os lança para além de si mesmos. Pensar, na economia da fé, nunca é estagnação; é inquietação, é quesito que clama por resposta. Como os discípulos, também nós somos chamados a recolher-nos, a interrogar-nos, para que, no silêncio, o Espírito nos conceda a resposta que não reside em nós, mas para além de nós.

Sentir, por sua vez, é reconhecer que a existência não se esgota no eu. É no encontro com o outro—seja na fragilidade do próximo, seja na grandeza dos génios da história e da literatura—que o Espírito revela novas possibilidades. O amor, afinal, é sempre diálogo, sempre relação recíproca.

No agir está incluído o risco da liberdade. Os Apóstolos, outrora encolhidos no medo, saem a proclamar. A ação, porém, não é isenta de culpa—e aqui reside o paradoxo da condição humana: mesmo quando movidos pelo Espírito, carregamos o peso da falibilidade. Mas Pentecostes ensina-nos que é melhor errar na ousadia do que definhar na inércia. Importante é primeiramente que o que se faz seja feito com boa intenção no sentido do bem.

O Espírito é a graça (amor) de Deus que age e conduz à renovação e à comunhão!

Pentecostes não é recordação, mas presença, que na vivência interior que move o exterior. É o Espírito que, como seiva invisível, faz desabrochar a Igreja em plenitude. O Espírito não se domestica, não acurrala nem se deixa enclausurar em fórmulas. Ele sopra onde quer—nos simples, nos sábios, nos que choram, nos que esperam e transforma o rumo das coisas. É Ele que, qual artista divino, pinta a unidade com as cores da diversidade, fazendo de muitas línguas uma só voz: a do Evangelho.

A Bíblia diz: “Como é que cada um de nós os ouve falar na nossa própria língua?” (At 2,8). Eis o milagre: a Palavra não se uniformiza, mas traduz-se. O Espírito não anula as culturas; santifica-as. Não apaga as diferenças; transfigura-as em comunhão; não se deixa formular em agendas nem em directrizes políticas movidas por interesses tornados força nem tão-pouco em opiniões pacotes a que falte a diferenciação. Por outro lado, não se deixa reduzir à arbitrariedade do relativismo cultural e moral que reduz tudo ao igualitarismo. Sem a procura da natural individualidade, não haveria desenvolvimento na natureza nem na sociedade. O Espírito Santo é o Sopro de Deus, que atravessa as fronteiras políticas e humanas e permanece na natureza e na humanidade como Paráclito, luz divina e Consolador.

O Pentecostes é legado a ser-se sal da terra!

A abertura ao Espírito da Verdade não é mística passiva; é compromisso. No sentir da Igreja Ele concede-nos os sete dons — Sabedoria (espírito do discernimento), Inteligência (entender o mundo na presença de Deus, uma espécie de intuição das verdades naturais e espirituais), Conselho (na entreajuda e no discernimento de atitudes e circunstâncias), Fortaleza (para encarar a vida de frente se se desviar das dificuldades), Ciência (ao nível intelectual, da vivência e da acção para ir interpretando e atuando num mundo em transformação), Piedade (o amor divino presente em nós através da misericórdia) e o Temor de Deus (o dom que nos leva a reconhecer no Outro o centro da nossa ipseidade, ele ensina-nos o respeito às pessoas e à natureza)—não só para nosso deleite espiritual, mas para que sejamos sal da terra, não nos deixando ficar a marcar passo no horizonte do ego. Ou seja: estamos chamados a dar sabor a um mundo insosso e por vezes perverso, para preservarmos a humanidade da mentira, da hipocrisia, da corrupção e do egoísmo.

Deus é Emanuel—o Deus-connosco. E se Ele está connosco, então nenhum medo justifica a covardia, nenhuma rotina justifica a estagnação. Pentecostes é, pois, um eterno recomeço que se expressa na igreja peregrina não nos deixando tropeçar na culpa e no erro.

O Espírito da Verdade é um fogo que como parte da sarça ardente não se extingue!

Hoje, como outrora, o Espírito desce. Não em chamas visíveis, mas no fogo silencioso que arde nos corações que O acolhem. Ele não nos promete facilidade, mas coragem; não ausência de conflito, mas unidade na diversidade.

Que o Pentecostes não seja apenas memória, mas acontecimento—em nós, através de nós, apesar de nós. Para que, no pensar, no sentir e no agir, sejamos, afinal, testemunhas d’Aquele que é, que era e que há de vir.

 

António da Cunha Duarte Justo

Pegadas do Tempo

 

(1) https://antonio-justo.eu/?p=6511

https://antonio-justo.eu/?p=9249

https://abemdanacao.blogs.sapo.pt/pentecostes-e-o-tempo-alto-da-1640805

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