10 de Junho de 1580 – Luís de Camões parte, levando consigo o último suspiro de um Portugal dourado.
De celebração em celebração, embrulhamos a alma da pátria em folhas de jornal, como sardinhas de feira popular. Queimamos incenso sobre o corpo ainda quente da nação, enquanto ela, entre golfadas de fumo e discursos vazios, agoniza em festa.
Camões, o trovador do destino lusitano, cantou-nos quando éramos aurora. Nas páginas d’Os Lusíadas, o sangue dos heróis ainda corre, mas secou nas veias dos que nos têm governado. O sol da ideologia queimou as cores da nossa bandeira, e as revoluções, como vagas traiçoeiras, arrastaram para o abismo o que nos restava de identidade.
Dizem que, ao morrer o poeta, morreu Portugal. Talvez. Mas a terra não sepultou a semente. A classe política, sim, é cadáver – um fantasma que vagueia pelos corredores do poder, surdo ao ritmo do povo, cego à chama que ainda bruxuleia nas cinzas. “Fraco torna fraca a forte gente…” E nós, filhos de uma escrava e de revoluções alheias, deixámos que nos vendassem com os trapos da Libertas, da Agar, de todas as quimeras que nos roubaram o rosto.
Mas Portugal não morre apesar de muitas loucuras ideológicas e nos últimos tempos dos interesses do deus Mamon de Bruxelas que suborna os humanos para obter suas almas. Não morre enquanto respirar fé e coragem, enquanto lembrar que foi à sombra da cruz e da espada que conquistámos o mundo. Pátria e fé eram uma só carne, um só destino. Hoje, porém, perdemos o povo no labirinto das ideologias, e sem ele, a pátria é apenas um nome esvaziado, um barco à deriva sob o voo circular dos abutres.
Agora, a missão é outra: não basta restaurar – é preciso redescobrir. Os Homens-Bons de hoje não partirão em caravelas, mas em busca da própria alma. Terão de navegar “mares nunca dantes navegados”, não de água salgada, mas de consciência. A Taprobana a vencer já não é a distância, mas o materialismo que nos engoliu, o Estado que nos devora, a religião que se esqueceu de rezar.
Teremos de ousar, como os “egrégios avós”, mas sem infantes que nos guiem. A bússola será a dor, o desespero de uma terra que já não nos reconhece. E quando acordarmos, talvez descubramos que a verdadeira liberdade não tem fronteiras – é como o mar, que não sabe onde começa nem onde termina.
Então, Portugal não será apenas um lugar no mapa, mas um verbo: criar. Já não conquistaremos terras, mas relações; já não levantaremos impérios, mas consciências. E quando o céu se rasgar por fim, não serão canhões que ecoarão, mas as cores do arco-íris, derramando-se sobre nós como uma nova aliança.
Até lá, seguimos. Entre a névoa e o sonho, entre os Velhos do Restelo e os loucos que ainda acreditam. Porque um povo que já foi mar não pode viver eternamente de joelhos.
Viva um Portugal que se redescubra à luz do bem e da verdade e se empenhe na construção de uma cultura da paz e abandone a cultura da guerra!
António da Cunha Duarte Justo
Pegadas do tempo