A suave Ditadura do Pensar politicamente correcto

Antigamente acreditava-se e hoje crê-se saber

António Justo
Cada sociedade, época ou pessoa tem a sua moldura de pensamento a valorizar o que abraça e inclui. Por vezes, o Zeit Geist opera como um tufão que tudo arrasta. Valores e convicções são submetidos à régua da moda que só conhece o certo e o errado (o que está dentro ou fora do seu caixilho), sem espaço para discordar nem para reciclar ideias. “Uma comunidade incapaz de lidar com o desacordo está mal preparada para o futuro”, constatava Timothy Radcliffe.

O Politicamente correcto é uma maneira de ser e de pensar adaptada a uma mundivisão do oportuno, a uma determinada ideologia ou sociedade que amarra o pensamento, a moral e a atitude aos próprios limites, sejam eles científicos, partidários, religiosos ou políticos. Quem se atreve a ter opinião diferente ou a pensar com a própria cabeça é, geralmente, visto como espanta pardais ou é colocado no rol de persona non grata. Zelotas da opinião só aceitam ideias extremas progressistas ou tradicionalistas. Desaprendeu-se a regra de ouro de Aristóteles de que a virtude se encontra no meio e como tal a regra constitui uma exigência a descer temporariamente do próprio miradouro para se abranger também outras paisagens.

Pessoas que seguem o politicamente correcto são, geralmente, simpáticas, conformes e conformistas; há as oportunas, alinhadas e consequentes, que aceitam tudo e estão de acordo com tudo (também não ouvem nem escutam, o que lhes seja adversário ou crítico; outras, satisfeitas, não precisam de tomar nada em conta, é mais fácil e cómodo excluir do que envolver-se); também as há distraídas com o pequeno defeito de se tornarem intolerantes para com pensares e opiniões diferentes ou não alinhadas à sua manada. Nos dois grupos delineia-se um denominador comum: tudo o que vem à rede é peixe.

Quer-se a igualdade mas por medo à diferença. Querem-se as pessoas todas citadinas e bem-educadas, não por amor à virtude mas por vergonha da província. Mas, no fim de contas, o problema não é da cidade nem da província mas sim um erro de pensamento: parecer que não cheire ao humos do próprio curral provoca medo ou agressão pelo facto de ser desconhecido ou diferente.

Vive-se num tempo hipócrita em que a crítica a velhos dogmatismos serve de subterfúgio para esconder a própria moralina e os dogmatismos do novo pensar conforme, da correcção civil e do género. Já Platão observava: “Muitos odeiam a tirania apenas para que possam estabelecer a sua”.

No panorama das opiniões, domina o vermelho e o rosa de um pôr-do-sol de estação outonal, já sem forças para contradizer o pensar dominante. É como nas autoestradas, o que importa é o sentido e a liberdade na aceleração.

A violência vivida e encenada substitui a realidade pelo debate. Assiste-se a uma conivência solidária e significante em que o medo e a infelicidade se irmanam numa emoção comum. Não interessa a coisa em si, o que dá sustento é a opinião.

Por fim surge o mecanismo da consternação que é movido e cultivado por um jornalismo de caracter político e comercial, interessado mais na lágrima que na acção. As pessoas são condicionadas ao papel de espectadores ou de eleitores que podem escolher, livres para escolher o que se lhe põe à frente através do ecrã da democracia.

O pensar politicamente correcto impede a liberdade de pensar diferente. O pensar diferente, ou até alternativo, não cabe no uniforme da política nem no credo dos meios de comunicação social.

George Bernard Shaw dizia: “As pessoas razoáveis adaptam-se ao mundo. Pessoas irracionais adaptam o mundo a si mesmas. Portanto, todo o progresso depende das pessoas irracionais. “

António da Cunha Duarte Justo
Teólogo e Pedagogo
www.anonio-justo.eu

 

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Thomas Piketty “o Karl Marx do nosso tempo”?

Thomas Piketty “o Karl Marx do nosso tempo”?
A Desigualdade económica bloqueia o Futuro

António Justo
O especialista Thomas Piketty, professor de economia na École d’économie de Paris, no seu livro “O Capital no século XXI” mostra o surgir de um fosso cada vez maior entre ricos e pobres nas nações industriais. Provou que a riqueza se mantem durante séculos em determinadas famílias. O cúmulo da questão, como ele conclui, encontra-se no facto de os rendimentos do trabalho serem inferiores aos rendimentos do capital. A injustiça permanece e acompanha os diferentes regimes políticos e é fomentada pela crença divulgada de que “só não sobe na vida quem não se esforça”.

Piketty apresenta uma radiografia da desigualdade social proveniente da economia; este livro irá revolucionar a discussão política e económica; superará as discussões ideológicas, dado o seu autor ser uma pessoa íntegra e mais virada para a realidade empírica ao apresentar uma análise dos dados sobre os porquês da sustentabilidade da precaridade e de um certo determinismo económico e histórico. Este abuso só poderá ser corrigido por uma política forte e atenta. Numa sociedade consciente de ser constituída por cidadãos e não só por empresários, a riqueza terá de deixar de comprar a influência e o discurso público. O povo tem de reconhecer a sua dependência da economia e da política para a poder respeitar e transformar.

Numa entrevista à revista Spiegel (19/5.5.2014) Thomas Piketty, à pergunta se ele é “o Karl Marx do nosso tempo” respondeu, “de modo nenhum” e uma tal ideia só poderá vir da ousada afirmação de que ”O capital devora o futuro / o passado tende a devorar o futuro”, uma posição crítica ao capital herdado. Afirma que o seu livro fora escrito numa perspectiva histórica enquanto a obra de Marx é teorética. Piketty não alinha com o determinismo económico e histórico de Marx.

Para Piketty há uma lei que se repete através da História: “a taxa de rendimento sobre o capital excede, a longo prazo, a taxa de crescimento da economia” e constata: “Marx subestimou o potencial de crescimento que actua livremente através do aumento da produtividade e do aumento da população”. Para o crítico do capitalismo Piketty, a catástrofe que se tem de recear “não é económica mas política”.

O grande capital desestabiliza os Estados e fomenta a sensação de injustiça social na população. Enquanto o rendimento do capital é em média de “4 até 5% ao ano, na economia só cresce 1% por ano”. De facto temos assim a indústria financeira, o mercado de casino contra a economia real. Isto torna-se incompatível com uma sociedade democrática que parte do potencial de cada indivíduo e não do princípio patriarcalista da descendência. Por isso a conclusão de Piketty é lógica mostrando a incongruência entre Democracia e os seus princípios, implicando a sua análise uma crítica aos que se assenhorearam da Democracia e às ciências que as acompanham. Não há lógica entre Democracia e prática económica nem entre os seus princípios.

O grande Capital não se dá com a Moral

O capitalismo é, ao mesmo tempo consequência natural e testemunho da força das desigualdades; ele seria incongruente se por ele mesmo criasse igualdade, possibilitando, muito embora, o bem-estar de muitos. O grande capital não se dá com a moral, por isso precisaria das rédeas do Estado que o moderassem mas sem o coibirem a uma ideologia ou demasiado dirigismo. O facto de ele incluir energias injustas não justificaria a injustiça do seu contraente socialismo.

O liberalismo económico actual contradiz a democracia e o princípio cristão de se ganhar o pão com o suor do seu rosto e não com a especulação usurária (Legitima o trabalho individual e social mas não a exploração através dum mundo financeiro de jogadores sem escrúpulos). A riqueza, provinda do negócio com o capital, favorece quem tem muito capital, ao passo que a propriedade vinda do trabalho (economia real) favorece o indivíduo e essa é mais democrática.

O Mestre dizia: “pobres sempre os tereis convosco” porque conhecia os aspectos negativos e positivos da natureza humana; por isso aceitava a diferença a nível individual e social salvaguardando a premissa de que a diferença tem de estar sempre ao serviço do bem-comum e de cada pessoa em particular. De facto, a sociedade não se pode arquitectar em termos só ideológicos, só económicos, ou só políticos, por isso advertia: “Dai, pois, a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus” (Mat. 22:21) e acrescentava: “Nem só de pão viverá o Homem”.

Há diferentes lógicas e todas elas serão certas na sua argumentação interna, mas para serem eficientes devem reconhecer-se como complementares e obedecer à razão superior. A lógica económica e financeira não pode continuar a assumir as rédeas da democracia e a transformá-la no cavalo que a serve e transporta. Já Platão advertia que a Ideia é a mãe que determina diferentes práticas e não o contrário porque a realidade vinda da observação é ilusória. A orientação por um mero pragmatismo, a que chegamos hoje, abole o pensamento; leva-nos a ajoelhar-nos perante uma opinião política que só segue a economia/finanças e ilude a sociedade com ofertas de liberdades individuais no domínio sexual ou do divertimento, como se a questão social se resumisse a um problema adolescente de luta pela emancipação da moral e de costumes entre gerações e de reivindicação da exatidão/verdade da própria ideologia em relação a outras.

Uma competição totalmente livre só beneficia o mais forte. Somos todos diferentes e por isso uma política de oportunidades para todos é sempre ditada pela diferença que faz os mais fortes.

Piketty constata que “A argumentação de que a sociedade de classes foi superada, é a expressão de uma ideologia republicana enganosa”. A progressão da desigualdade encontra-se hoje ligada ao desemprego.

Piketty sugere como início de uma tentativa de solução “Um imposto progressivo sobre o capital líquido da propriedade privada”; o melhor seria um imposto sobre o capital a nível global, para que as transacções financeiras do capital não circulem descontroladamente de uma nação para a outra. O imposto sobre o capital poderia, no parecer de Piketty, ser empregue para reduzir as cobranças sobre uma classe média demasiado sobrecarregada.

Consequentemente o nosso sistema político-económico terá de transcender as discussões ideológicas que não passam de cancões para embalar a classe média e a classe precária.
Seria atraiçoar o conteúdo do livro e do autor tentar coloca-lo numa discussão ideológica ou partidária que o assunto do livro pressupõe já ultrapassada ou numa mera discussão ideológica entre capitalistas e socialistas. Precisamos das duas facções.

As carências de todas as instituições humanas, sejam elas capitalistas ou socialistas, vem da precaridade do Homem. A falha original, que legitima a discussão, situa-se na concorrência entre indivíduo e sociedade. A sociedade/instituição aproveita-se, da necessidade de protecção e de mais-valia do indivíduo, para, em troca de protecção, assumir o direito de regulá-lo. O ideal da igualdade de direitos e de oportunidades pressuporia instâncias justas que os impusessem com justiça e a organização de firmas que deixassem de obter os maiores rendimentos na construção de armas para o fomento da guerra em vez do fomento da paz. O problema está no modo de chegar lá numa humanidade feita de desiguais com estruturas que fomentam os mais fortes na convicção de que estes é que garantirão o desenvolvimento e o futuro! Para se subir a escada da jerarquia só se consegue através da autoafirmação, o que torna a instituição numa sociedade dirigida por autoafirmados! Daí concluir pela opção de um sistema seja ele capitalista ou socialista peca já de si do equívoco de pressuposto de que o ser humano seria um anjo. Quanto a mim entusiasma-me o projecto JC, como protótipo do Homem a construir, começando pela revolucionamento do ser humano (esteja ele onde estiver) na descoberta da sua gene divina que levará cada pessoa a arrumar com os vendilhões do templo seja ele de caracter socialista ou capitalista.
António da Cunha Duarte Justo
Jornalista livre
www.antonio-justo.eu

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ELEIÇÕES EUROPEIAS REVELAM O RESSURGIR DOS NACIONALISMOS EUROPEUS

Fobias de extremos de Direita e de Esquerda como estabilizadores do Sistema

António Justo
Tudo fala do problema das novas forças de direita e esquerda que irão desestabilizar a União Europeia (EU) quando grande parte dos problemas virá do eixo Alemanha-França. A verdadeira ameaça da UE encontra-se nos problemas não resolvidos entre Alemanha, França e Inglaterra e na debilidade de países do sul.

Os egoísmos nacionais manifestam-se no rejuvenescer do nacionalismo que uma opinião pública controlada tenta vender como catástrofe de extremismos de Direita ou de Esquerda. Até às eleições a opinião pública via o risco da UE nos países de economia fraca; agora querem-no ver nas forças anti UE de esquerda e de direita. O que vem à tona é a desestabilização de uma Europa com a crescente fragmentação partidária e consequente insegurança dos tradicionais partidos do poder que se têm de orientar de novo para se manterem no poder. A sua má política provocou o descontentamento geral e manifestou-se nos eleitores contestadores.

Seria natural que o fenómeno do nacionalismo acontecesse no sul, em países com forte crise económica. Mas o maior indicador do problema europeu revela-se no facto de o nacionalismo se acentuar mais ainda nos países de economias fortes. O nacionalismo cresce nos países de economia fraca (Portugal honrosa excepção) porque se vêm expostos à exploração internacional e também aumenta nos países fortes porque as populações querem manter o seu alto nível de vida jogando à defesa e à custa dos mais fracos.

As eleições francesas questionam o eixo da UE: Alemanha-França

O Problema da UE é de cabeça e estômago. Se tivermos em conta o liberalismo económico adoptado pela EU na sequência da ideologia globalista, a Alemanha adaptou a sua política ao globalismo enquanto a política francesa, embora seja a segunda economia da Europa, não se adaptou às novas leis que determinam o mercado.

Na Alemanha o mercado e a política afirmam-se como dois parceiros em pé de igualdade, na França a política é mais dirigista reservando para ela o poder de dominar o mercado e a produção. A dicotomia que se observa na França entre economia e política repete-se entre política e sindicatos; a política tem medo dos sindicatos, não reagindo adequadamente à economia globalista. Daí a grande crise económica e estrutural da França.

Na França como nos países do sul continua a acreditar-se na independência e no poder todo-poderoso da política esquecendo que se esta não for bem controlada, as forças económicas facilmente compram os políticos passando a viver descansadamente com políticos e sem o incómodo de terem de estar atentos a políticas económicas nacionais.

A Alemanha é o melhor exemplo dos piores defeitos e das melhores virtudes de governação

O historiador Ralf Jaksch, afirma no HNA que a economia francesa é marcadamente mercantilista e como tal precisa da legitimação política o que a torna mais constante mas a incapacita de reagir tão atempadamente às forças do mercado. a economia francesa é uma influência duradoura mercantilista.

A política e os sindicatos alemães, mais flexíveis à competição económica, prepararam-se para a batalha da globalização, já nos finais dos anos 90, princípios de 2000; neste sentido uniu-se governo, oposição, sindicatos e patronato para organizarem compromissos a nível nacional para fazerem as necessárias reformas relativas ao mercado de trabalho e poderem manter-se na primeira liga da exportação. Deste modo, a Alemanha reagiu como povo e não só os grupos de interesse dentro dela, como acontece principalmente nas nações do sul. Assim a Alemanha tranou-se ainda mais competitiva e com produtos tecnológicos de maior qualidade, podendo assim manter preços estáveis de exportação porque não tem a concorrência de outros países, a esse nível. Devido a esta política alemã os seus custos unitários de trabalho só subiram 10% enquanto na França subiram 30%. Isto é muito relevante em termos de preços competitivos de exportação. A mercadoria mercantilista francesa não se adaptou à política económica liberal determinada pela UE e por isso o eleitorado castiga os partidos estabelecidos de maneira catastrófica. A França do Euro não pode recorrer à desvalorização da moeda como fazia antes com o Franco para regular a concorrência no mercado dos produtos. Mais ainda, um euro forte torna-se, num impedimento para economias europeias mais fracas que se encontram mais expostas à concorrência de mercados e produtos de fora da Europa. A arma da capacidade de concorrência através da desvalorização da moeda só poderia ser compensada com a desvalorização do euro o que implicaria uma guerra mais declarada entre as economias fortes e menos à custa das economias menos concorrentes. A guerra que antigamente se dava nos campos de batalha acontece agora nos bancos centrais e nas bolsas.

Os defensores da globalização apresentam como meio de solução, para os problemas económicos da França e dos países do Sul, a flexibilidade do mercado de trabalho e a diminuição das cobranças e dos encargos das empresas. Isto implicaria menos dinheiro na bolsa do trabalhador e do que vive da assistência social. Esta estratégia apenas empurra os custos da concorrência estrangeira para as camadas socias mais carenciadas e transpõe a guerra dos preços dos produtos, entre as empresas fortes, para a concorrência entre as camadas carentes das nações fora da Europa e as da Europa.
A Eleições para o PE da UE ainda vão fazer correr muita tinta.
António da Cunha Duarte Justo
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Rússia e China – O Eixo da Política do Séc. XXI?

UCRÂNIA ENTRE IMPERIALISMO RUSSO E OCIDENTAL

António Justo
A Ucrânia, tal comos a região das Balcãs, na primeira grande guerra mundial, dá ocasião ao surgir de uma nova configuração política das potências determinadoras do futuro no séc. XXI.

A Rússia, ao ser contrariada pelos interesses da EU/NATO na Ucrânia, demostra ostensivamente a sua reivindicação ao direito de ser reconhecida como potência mundial; para tal vira-se para a China e para a América Latina em oposição à política dos países da NATO. Utiliza uma estratégia própria na combinação oportuna de “ vendas de armas, instalações militares e grandes projetos econômicos, de infra-estrutura e de energia”. A nova estratégia de parceria com a China pode mudar o eixo axial da política no séc. XXI. O negócio entre a Rússia e a China da construção da conduta para fornecimento de gás à China e a construção de um canal transoceânico da Nicarágua como alternativa ao canal do Panamá, são passos que indicam determinação no sentido de as duas potências se unirem num projecto comum.

Ao avanço da presença do Ocidente ao longo das fronteiras da Rússia e na Ucrânia, a Rússia contrapõe a sua presença, como potência mundial, na América Latina.
A presença política arrasta consigo o negócio. Então, países como a Alemanha aceitarão o desenrolar natural dos acontecimentos e orientar-se-ão pelo brilho do negócio. Esta ofensiva económico-estratégica revela-se tão desesperada que pode determinar a divisão da Ucrânia.

Piora o clima entre as potências mundiais logo surgem centros ciclónicos devastadores das mais belas paisagens e dos mais belos biótopos culturais. Por trás das ventanias que arrasam florestas e destroem a bonomia do clima entre amigos e familiares, encontram-se interesses políticos, económicos e estratégicos. Quem aspira a mais organiza-se em grupos de interesse porque sabe que no governo ou na oposição sempre se recebe mais do que no seio do povo.

Os grupos da Ucrânia, agora divididos e guiados pelas forças de ventos invisíveis, a modo das árvores no vendaval, batem-se uns contra os outros à mercê dos centros ciclónicos do poder. Os que se querem orientar pela Europa e os que preferem seguir a Rússia. Em nome da soberania popular dá-se a redistribuição de poderes e influências.

A Ucrânia, o maior país da Europa, tem 44,6 milhões de habitantes sendo 77,8% de etnia ucraniana e 17%, de russos e romenos está em perigo de ser dividida. O povo ucraniano já foi vítima do genocídio provocado por Estaline que vitimou milhões de ucranianos e da ocupação nazi que matou muitos milhões de pessoas, sofre as consequências de se encontrar como fronteira de dois imperialismos: o russo e o ocidental.

Quem pensa em termos humanos e de povo é contra a intromissão estrangeira; quem pensa em termos estratégicos e de poder compreende a luta das potências: uns a favor dos russos, outros a favor do ocidente.

Um país sobrano deveria ter a possibilidade à autodeterminação.

Uma Alemanha interessada em acordos de comércio com o leste, uma EU interessada num acordo de associação, e uma federação russa amedrontada, não são indícios de bons resultados para a Ucrânia; a Rússia sente-se ameaçada economicamente pela EU, militarmente pela Nato e socialmente pelos valores ocidentais de liberdade e democracia. A UE defende os seus interesses económicos e estratégicos na Ucrânia argumentado hipocritamente de pretender a salvaguarda dos direitos humanos e de um Estado de Direito. Infelizmente não usou da diplomacia para saber antepor-se aos combates armados entre a população ucraniana nem teve em conta uma Rússia traumatizada pela queda da União Soviética. A Rússia tem os mesmos interesses na Crimeia e nas zonas orientais da Ucrânia como os ingleses no Gibraltar e nas ilhas Malvinas…

Uma Ucrânia endividada até à garganta com a dívida do gás e quase na bancarrota. Deve à Rússia 2,6 mil milhões de Euros pelo que Putin tenciona, a partir de Junho, só fornecer gás à Ucrânia a pronto pagamento. Até à ocupação da Crimeia vendia o gás à Ucrânia 30% mais barato, devido à Ucrânia permitir lá a base russa.

A Ucrânia, depois das eleições de 25 de Maio, irá ter de compreender amargamente a frase de Bismark: “Estados não têm amigos, apenas têm interesses”.

As missões de observação eleitoral da OSZE julgarão sobre o decorrer das eleições. Depois delas surgirá a discussão sobre quem as reconhece e quem não. As eleições não conseguirão o problema da Ucrânia que nela resume o conflito entre a Rússia e o Ocidente e entre população pro-Rússia e pró-EU.

A Rússia é o maior país do mundo mas nas suas infraestruturas, é de facto, em grande parte, um país de terceiro mundo.

O futuro irá aproximar ainda mais a Rússia e a China até por razões de afinidade na defesa da integridade territorial e devido à sua extensão e aos povos separatistas.

No séc. XIX combatiam-se os estados, no séc. XX as ideologias e no século XXI combater-se-ão as culturas. Com a queda da União Soviética (1998) acaba-se o mundo bipolar para se iniciar a multipolaridade. Das guerras passar-se-á às guerrilhas; na formação de novas constelações, a guerrilha muçulmana tem-se mostrado a única arma estratégica eficiente contra a prepotência da guerra económica. Livre-nos Deus desta perspectiva real para o futuro.
António da Cunha Duarte Justo
www.antonio-justo.eu
antoniocunhajusto@gmail.com

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Origem do Português e do Galego

A Língua portuguesa é a Irmã gémea do Galego

António Justo
A Academia Brasileira de Letras fez um levantamento sobre a língua portuguesa e verificou que esta tem atualmente cerca de 356 mil unidades lexicais.

A grande riqueza do português provém na sua maioria do latim e do grego e das línguas das tribos ibéricas: galaicos, lusitanos (marcas de origem indo-europeia e miscigenação com os celtas, anterior às invasões romanas), etc. e dos invasores germânicos do séc. V (cerca de 600 palavras de origem germânica) e dos ocupantes mouros (berberes e árabes do séc. VIII que enriqueceram o português com 600 até mil palavras); com os Descobrimentos o português continuou a enriquecer-se integrando palavras dos novos povos no seu léxico; actualmente a preponderância da cultura anglo-saxónica favorece a integração de palavras inglesas. De notar que o português não só recebeu palavras das culturas com que contactou mas também deixou crioulos e palavras noutras línguas (O japonês também tem cerca de 600 palavras de origem portuguesa).

O galaico-português era o idioma falado nas regiões de Portugal e da Galiza, no Reino de Leão, que devido à divisão política do mesmo espaço geográfico, posteriormente começou a diversificar-se nas línguas portuguesa e galega. A partir do séc. XII a literatura apoderou-se do galaico-português de modo, a o português se diferenciar no século XVI da língua galega, sua irmã gémea.

A língua portuguesa é a evolução do latim que, como língua veicular literária e cultural, se expressava de duas formas: a maneira de falar intelectual (erudita) e a popular; assim, na formação do Português, encontramos a forma clássica – a língua do Lácio falada até uma certa altura e depois mantida pelos eclesiásticos, poetas e prosadores, como veículo da cultura intelectual e por outro lado a forma do latim vulgar que era falada pelo povo e que abandonada a si mesma se ia modificando mais e mais, com um certo acompanhamento do linguajar erudito. O mesmo se dá hoje: distingue-se a maneira de expressar (especialmente na escrita) de uma pessoa sem grande formação e uma pessoa formada. Os próprios escritores latinos, que utilizavam a forma clássica, referem também o falar do latim vulgar do povo; os escritores romanos referem-se ao falar do povo com os termos “sermo vulgaris”, “cotidianus”, “plebeius”, “rusticus”, etc.

Estas divergências encontram-se ainda hoje nas formas populares e de escrita de qualquer língua a nível fonético, morfológico e por vezes até sintático. A população não consumidora de “alta cultura” usa menos palavras para se exprimir metendo por vezes numa só palavra outros sentidos ou conotações, enquanto a pessoa mais culta recorre, para tal efeito, a maior diferenciação e consequentemente a uma maior gama de palavras.
No território que hoje constitui Portugal e Espanha, já se falavam várias línguas, antes dos invasores latinos chegarem. Entre elas a mais falda era a céltica. O Vasco conseguiu resistir ao latim.

De resto, pelos fins do séc. IV a língua vulgar falada por toda a península era a forma vulgar do latim, o “romanço”. Com as invasões dos alanos, suevos e godos e depois dos árabes, o romanço foi enriquecido com palavras novas dos falares dos invasores. A língua, naqueles tempos abandonada a si mesma, sem disciplina gramatical que lhe desse formato evolutivo, decaiu modificando-se segundo as regiões, pois já não havia a administração romana para lhe dar sustentabilidade nem uma regulamentação da língua, a nível suprarregional. Entre os falares surgiu o galego-português que se modificou algo, devido à independência de Portugal alcançada por D. Afonso Henriques e à obrigação do uso do português então “arcaico” ordenado por D. Dinis para os documentos escritos em vez do latim. Assim, temos hoje o idioma português e o galego; a maior diferenciação do galego deu-se a partir do séc. XVI. Embora se possa provar a existência do galego-português no séc. VII (e o português proto-histórico – um latim bárbaro) só a partir do séc. XII surgem textos completos em português notando-se então a influência da literatura sobre ele.

Numa missão civilizadora, os trovadores que cultivavam a poesia e a música por gosto, contribuíram muito como estabilizadores e fomentadores da língua. Ao irem de castelo em castelo espalhavam também ideais e a dignidade da mulher. Os segréis faziam da arte de trovar uma profissão. Os jograis tocavam vários instrumentos e cantavam versos alheios (artistas da boémia). Muito do legado antigo encontra-se nos Cancioneiros Primitivos.
O lirismo galego-português é do mais genuíno e documenta-se como uma poesia de romaria a Santiago de Compostela e nas romarias aos santos. Segundo Celso Ferreira da Cunha deve “considerar-se como obra de síntese de diversas influências, sobretudo da poesia popular e da poesia latino-eclesiástica”. Tinha duas correntes poéticas: a cantiga de amor que denuncia influência estrangeira, e a cantiga de amigo de caracter popular tradicional. Esta é a primeira manifestação genuína do lirismo peninsular.

Um documento importante do português Arcaico é o Testamento de D. Afonso II (1214) que começa assim:” En nome de Deus. Eu rei Don Afonso, pela gracia de Deus, rei de Portugal, sendo sano e saluo, temete o dia da mia morte, a saúde de mia alma e a proe de mia molier, raina Dona Orraca, e de meus filios e de meus uasssalos…”

No português histórico temos a fase arcaica do séc. XII, XIII e XIV (as terminações arcaicas em “om” deram origem às terminações modernas em “ão” e “am”); segue-se a fase de transição do séc. XV e finalmente a fase moderna, com início no séc. XVI até hoje. No séc. XIV e XV introduziram-se na língua muitas palavras do latim erudito e do grego; o séc. XV foi muito profícuo em mestres da língua (Garcia de Resende, Fernão Lopes, Eanes de Zurara, Rui de Pina, Frei João Alves); a língua passa a ter o seu eixo já não em Santiago de Compostela mas em Lisboa; o séc. XVI produziu grandes mestres da língua como Gil Vicente, João de Barros, António Ferreira, mas o maior de todos eles, o grande mestre do português moderno foi Luís de Camões com “Os Lusíadas”. Camões é um grande entre os maiores da literatura mundial, como afirmava já o grande Friedrich von Schiller, grande poeta, filósofo e historiador alemão que trocaria a sua obra pela glória dos Lusíadas de Camões.

No séc. XVI dá-se a grande diferenciação do português em relação ao galego.

António da Cunha Duarte Justo
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