Quebrada a Barreira do Cartel dos Partidos do Arco do Poder na Alemanha

Na Alemanha, os partidos tradicionais vêm mantendo uma “barreira de fogo” contra a AfD (extrema direita, com 20% de apoio, defensora de uma política migratória radical) à semelhança do que acontece em Portugal com o CHEGA. No entanto, o líder da CDU, Friedrich Merz, quebrou esse tabu ao aceitar o apoio da AfD no Bundestag para endurecer a política de refugiados.  Em 29/01, a sua proposta foi aprovada com os votos da AfD, derrotando a esquerda, que vê o tradicional isolamento da extrema direita ser minado. Agora com o plano de 5 pontos da CDU em vigor, é de esperar uma histeria mediática. Também houve uma discussão acesa antes da votação. A resposta da AfD ao argumento da firewall é: “A chamada ‘Barreira de Fogo’ contra a AfD é uma alavanca para desligar a vontade dos eleitores.

A esquerda, que historicamente defende o internacionalismo contra o patriotismo cultural, reage com preocupação e assustada por ver minado o cartel de partidos que a favorecia. Para ela, a tática que sempre garantiu alianças da esquerda socialista (nalguns países da EU) agora pode passar a ser usada pela direita, unificando conservadores moderados e radicais. O clamor é grande porque isso permite a aprovação de propostas sem necessidade de negociações entre progressistas e conservadores. (Hoje no Parlamento alemão consagrou-se uma política de tática, um pouco à semelhança do que fez a esquerda em Portugal no governo da Geringonça).

Defende-se que a política migratória continue humana, mas com proteção reforçada para os residentes locais. A CDU mantém esse discurso, mas argumenta que, diante do aumento de ataques cometidos principalmente por sírios e afegãos, é preciso agir para impedir que criminosos permaneçam no país e reincidam em delitos. A CDU com esta iniciativa no Bundestag tenciona também reforçar as fronteiras da Alemanha, intento este difícil de concretizar atendendo às directrizes da União Europeia.

O debate político-partidário não deve ser baseado em táticas “barreira de fogo” (firewalls) que apenas protegem os interesses interpartidários, deve sim ser fundamentado numa estratégia objetiva e não meramente partidária para poder servir melhor o país. Porque é que o desenvolvimento da Alemanha é repetidamente bloqueado por jogos de poder ideológicos? Uma análise do estado da democracia na UE e exemplos internacionais ilustram o perigo de tais divisões.

Os deputados do Bundestag deveriam poder tomar decisões livres de constrangimentos tácticos partidários, para que as leis se tornem mais objectivas e sirvam melhor o bem comum. Em vez disso, a Alemanha continua presa numa teia de manobras político-partidárias, perdendo assim oportunidades futuras. A agitação emocional em todos os campos, muitas vezes por motivos oportunistas, está a manchar a antiga reputação do país.

Após 49 anos de participação ativa na Alemanha, estou chocado com o desenvolvimento irracional do discurso público – marcado por demasiada tática e muito pouca razão. Isto faz-me compreender como é que os movimentos extremistas conseguiram ganhar força na história. A democracia parlamentar debate-se consigo própria, enquanto a população é forçada a desempenhar o papel de espetador e se sente frequentemente desiludida pelos meios de comunicação social públicos.

A melhor tática para disciplinar um partido de extrema esquerda e de extrema direita é deixá-lo participar na governação, como se observou, em parte com o partido dos Verdes.

Querem uma barreira de proteção contra a extrema-direita, para a esquerda poder continuar a viver num nevoeiro de interesses.

Democracia significa trabalhar em conjunto, independentemente das clientelas de esquerda e de direita! A “Barreira de Fogo” tem vindo a dividir cada vez mais a sociedade e a prejudicar a democracia.

A viragem da Chanceler Merkel para a esquerda no que respeita à política de migração e de energia está a ser seguida pela viragem do candidato a chanceler da CDU, Merz, para a direita

 

António da Cunha Duarte Justo

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António da Cunha Duarte Justo

Actividades jornalísticas em foque: análise social, ética, política e religiosa

8 comentários em “Quebrada a Barreira do Cartel dos Partidos do Arco do Poder na Alemanha”

  1. Deixei de ser apoiante dos verdes alemães, após a morte trágica da principal fundadora, Dra.Petra Kelly.O partido mais tarde apareceram os chamados “Schickimicks ” (betinhos) comandados pelo Fischer grande amigo do Daniel Cohn Bendit que mudaram o lema do FRIEDEN SCHAFFEN OHNE WAFFEN,para o Frieden Schaffen mit Waffen. O que se passou hoje no Bundestag confirmou o que a maioria dos alemães pensam, ou seja segurança.Lamento imenso o meu antigo partido não ter reparado, o mais cedo ou mais tarde vinha acontecer.Um abraço desde a cidade Berço da Nação e mais desejar paz para o Mundo.

  2. Manuel Adaes , nos anos 80 os partidos do arco do poder tratavam os Verdes como hoje tratam a AfD. Só com Fischer no governo do Hesse se mudaram as posições. Eu era então o porta-voz do Conselho de estrangeiros de Kassel (35.000 estrangeiros) e entrava em todos os partidos e na altura fui admoestado por um funcionário da cidade por ter feito uma declaração à imprensa que deixava os Verdes em boa luz. Para mim os Verdes são demasiadamente ideológicos e como tantos outros filhos do movimento 68 não passavam de “betinhos” e continuam ainda hoje muito distanciados do povo e desmontando a cultura tradicional. O que está hoje em jogo, tal como ontem é o medo da perda de poder. Forte abraço aqui de Kassel.

  3. A esquerda defende o patriotismo (amor à pátria: o meu país é o melhor) e opõe-se ao nacionalismo (supremacia da nação: o meu país é melhor que os os outros).

  4. Mário Lobo, obrigado pela menção. Já agora como também fiz referência no artigo aos aspectos mencionados aproveito para esclarecer, de maneira não exaustiva, a minha ideia que se encontra por trás deles. É verdade, enquanto o nacionalismo enfatiza a primazia da nação, o patriotismo acentua um amor equilibrado pelo país, e o internacionalismo acentua a cooperação global. Tanto em partidos de esquerda como de direita se encontram exageros num sentido ou noutro.
    O nacionalista exalta a nação e defende a autonomia do Estado e a autodeterminação dos povos. Também acentua a identidade nacional e cultural; por vezes o seu sentimento extremo pela própria nação leva-o a desvalorizar outra nação. Por complexos pode pensar que a própria nação é superior às outras.
    O patriota acentua o respeito pelas instituições, tradições e história do país orgulhando-se delas e dos seus valores. Empenha-se pela participação cívica e pelo bem comum; o seu orgulho nacional não é exclusivista nem sente superioridade em relação a outros países. Não poupa a crítica ao país entendendo-a como construtiva em relação ao governo e à sociedade.
    O Internacionalista valoriza mais a cooperação a diversos níveis entre países e coloca os interesses da humanidade acima dos interesses nacionais. Porém a ideia cosmopolita de uma cidadania global baseada numa identidade humana comum não pode legitimar o despir a pessoa das suas características e valores que lhe emprestam uma certa identidade. Corresponderia a submeter a pessoa e as diferentes sociedades apenas ao aspecto da lógica mental. Numa sociedade cada vez mais complexa não é fácil encontrar-se um denominador comum concreto.
    Também a procura de soluções globais ou de grupos de países como é o caso da EU não implicaria necessariamente de se afirmar desrespeitando os biótopos culturais no seguimento de ideologias autoritárias. Muitos problemas hodiernos que surgem na procura de solução para as referidas perspectivas vêm da sobreposição de uma definição sobre a outra ou de se considerar apenas o aspecto antagónico que os conceitos ou perspectivas (internacionalismo, patriotismo ou internacionalismo) implicam.

  5. O nacionalismo implica sempre a superioridade do estado, face aos seus elementos e face aos demais estados.
    O patriotismo cultural não implica a diminuição da cultura dos demais países. Entra é em colisão com as “esquerdas” modernas e altermundistas que querem reduzir tudo a uma abstracção onde tudo caiba.

  6. Mário Lobo, totalmente de acordo no que diz relativamente ao patriotismo cultural. Não consigo enquadrar a nível de argumentação a afirmação de que o nacionalismo implica sempre a superioridade do estado. De facto, o nacionalismo não implica sempre a superioridade do Estado ou da nação. Existem diferentes formas de nacionalismo: algumas, como o nacionalismo chauvinista, promovem essa ideia, enquanto outras, como o nacionalismo cívico, focam na identidade e autodeterminação sem desvalorizar outros povos. Além disso, o patriotismo e o internacionalismo podem coexistir com certas formas de nacionalismo.

  7. Boa noite Justo!
    Hoje só vou comentar o assunto “Quebrada a Barreira…
    É o tema de hoje no telejornal a que assisti! Mas explicas melhor.
    Finalmente foi quebrado o tabu Merz aceitou o AfD! Isto para fúria de todos os outros.
    Mas só assim a Direita se consegue impor! Acho que tb foi uma estratégia poucos dias antes das eleições.
    Beijinhos,

  8. Boa tarde MManuela,
    O tema do cartel dos Partidos é assunto muito importante e naturalmente os media afectos aos governos passá-los-ão rapidamente ou a desoras!
    Na Alemanha é vergonhoso observar-se como, no passado, o arco do poder (governos com partidos que se alternam no poder) tem defendido a sua clientela em postos políticos e da administração. Desta tática tem-se aproveitado principalmente o PS e a esquerda em geral que nos momentos a ela propícios era solidária independentemente das fronteiras do partido. A direita conservador mais ligada à moral não tem seguido essa tática e tem sido prejudicada com isso. Uma estupidez porque deste modo tem sempre a esquerda na ribalta da imprensa a combater os conservadores além de ver pessoas independentes, como muitos católicos a apoiá-la.
    Merz teve o grande mérito de pôr a descoberto esta tática enganosa e antidemocrática e de mostrar que quem não está interessado em resolver os problemas da naç1bo é o SPD e os Verdes que funcionam apenas como travão e isso era favorecido pela tática do cartel partidário e de estabelecer a “Barreira de Fogo” contra a AfD.
    Creio que o que terá encorajado Merz é a experiência da CDU na antiga Alemanha socialista e a personalidade de Trump que com os seus erros e confusões mostrou muita coragem ao provocar o etabissement político em vez de continuar uma política baseada na hipocrisia de operar nas portas traseiras.
    Forte abraço
    António Justo

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