Reestruturação Consular

A luta dos estabelecidos contra a política

O imbróglio administrativo
Uma instituição de serviços de Estado no estrangeiro não pode ser avaliada apenas por critérios operacionais e de serviço meramente burocrático. Ela tem de corresponder a critérios de gestão, de acção e de intervenção mais alargados. Além disso é necessário o controlo da eficiência. Esta pressuporá necessariamente iniciativas e processos desencadeados na população alvo.

Uma reestruturação consular, como pretende o governo, exige do Secretário de Estado grande força e clarividência num domínio demasiado minado e estreito.

Devido ao carácter rotativo rápido dos políticos, as suas decisões estão demasiadamente condicionadas às informações do aparelho administrativo público. Este não só emperra o processo como manipula as decisões políticas dependentes de relatórios feitos pela própria administração pública. Cai-se assim num ciclo vicioso invertendo-se os termos. A política que deveria determinar a acção administrativa passa a correr o risco de ser determinada por esta. Isto torna-se especialmente grave em bastiões do sector público onde domina a monocultura política, como na educação, de conotação politica demasiadamente esquerdista. Isto dificulta a actuação de qualquer governo independentemente da sua cor, acrescentando-se ainda os problemas das diferentes facções dentro dos próprios partidos e na administração.

As próprias inspecções que esporadicamente acontecem são efectuadas por funcionários demasiadamente penhorados pelo próprio sistema e dependentes dos subterfúgios da própria administração que possui na mão peões e trunfos de que o próprio inspector está dependente. A política decide mas quem se ri é a administração consciente de ter o folgo mais longo.

Um Estado forte precisa duma administração forte e leal mas salvaguardando-se sempre a primazia da política em serviço do Povo.

Políticos conscientes, ao serviço do Estado e do Povo, terão de recorrer também a estudos externos no seu período de formação de opinião e de decisão. O trabalho das lobies é hoje tão perfeito no sentido de criarem areais de monocultura ideológica transpartidária, que mantêm uma rede cada vez mais coerente nas várias instituições públicas: política, administração, sindicatos, conselho das comunidades, jornais de expressão migrante, associações, representantes de jornais, etc. Constata-se cada vez mais a formação duma oligarquia que ocupa os vários areais políticos e sociais que nada tem a ver com os ideais dos diferentes partidos nem com os interesses do povo: maquiavelismo individual puro. Corre-se o perigo de na consulta de diferentes instituições se ouvir apenas uma opinião. Assim não chegam os relatórios internos da administração, nem as exigências de grupos de pressão, é óbvio o recurso a relatórios ou estudos de comissões ou institutos independentes. Nas comunidades lusas da Europa as pessoas na ribalta, de quem a opinião pública e a política se servem, são tão poucas e tão pouco diferenciadas que dificultam a formação duma visão suficientemente objectiva da realidade. Assim na voz dos representantes falta geralmente a ressonância popular, atendendo a que quem fala mais que representante é uma personalidade circunstancial e demasiadamente circunstanciada. Nesta apagada e triste realidade coxia a emigração lusa na Europa e a administração pode dormir à vontade, sem perigo de que alguém a acorde. Se alguma insónia há é apenas quando aparece algum “atrevido” que lhe queira pedir contas… Portugal persiste em querer dormir a paz dos cemitérios. Se alguém ousa bater as palmas logo é condenado como perturbador da tal paz. O problema é que a paz construída pelos que vivem das manjedouras do estado se perpetua à custa das insónias do povo e dum Estado que assim não pode responder aos anseios, aos sinais dos tempos.

Neste ambiente há que perguntar-se: quem pode criticar quem? Quem serve quem? Quando se passa da hora dos acomodados para a hora dum Povo?

Opta-se pela crítica pela crítica, pelo pensar de campo ou trincheira. Na ausência de apresentar alternativas ou se engraxam os sapatos de amigos ou se atacam pessoas.

Não chega estar presente é preciso ser-se eficiente

É urgente a reestruturação de Portugal, a reestruturação de Consulados e de Embaixadas não só no que respeita ao seu aspecto organigrámico mas de redefinição de objectivos e estratégias e de tarefas do pessoal.

Não há uma relação de equivalência entre o peso da estrutura e o trabalho e acção produzida.
São demasiado altos os custo a suportar com diplomatas que primam pela ausência nas comunidades lusas e na comunidade onde estão inseridos. Que têm feito? Administrado a miséria no marasmo da Bela Adormecida?
As novas tecnologias obrigam a remodelação, simplificação e maior eficiência no trabalho. O fluxo migratório obriga à versatilidade institucional de apoio. Precisa-se da racionalização de serviços aferidos às realidades existentes.
Com a inserção de Portugal na União Europeia criou-se um outro centro de gravidade da acção política. Enquanto que na Europa as representações diplomáticas passarão a ter mais um carácter económico e mercantil, as representações fora da Europa continuarão a ter os pólos políticos e económicos como antes da União Europeia.

Uma reestruturação consular com uma consequente reclassificação dos postos consulares é mais que óbvia.

Da minha experiência com o Consulado-Geral de Frankfurt posso afirmar que a existência duma Vice-cônsul é suficiente dado que a presença do Cônsul só se terá feito notar pelos gastos. Não critico com isto o cônsul, o problema é estrutural; a estrutura não incita à criatividade nem ao empenho. Necessários são servidores no activo e não funcionários representativos. Às vezes os representativos até estorvam o trabalho de trabalhadores com ideias e elan vital (ânimo).

Uma decisão política consensual é impossível atendendo a interesses em jogo. Posições partidárias e posições do Conselho das comunidades têm em conta muitas vezes o público-alvo e não a coisa em si, pelo que não são isentos. Pior ainda quando, como acontece muitas vezes na emigração, elementos pertencentes à administração diplomática ou consular acumulam o posto de representantes eleitos ou de posições partidárias; então pesa mais o próprio interesse do que o do Estado e do Povo. Aqui tem o Secretário de Estado grande margem para poder decidir por razões de estado e de serviço atendendo à confusão de interesses vigentes. Que autoridade tem a crítica ou não crítica da chefia dum sindicato das representações diplomáticas que há anos recebe o seu ordenado pelos serviços prestados no consulado de Hamburgo sem lá estar? Com o seu ordenado o Estado podia manter dois empregados em serviço.

Importante é que se mantenha a eficiência dos serviços. Neste caso a existência duma supra-estrutura da qual dependam serviços com uma direcção de simples Chefe de Serviços ou de lojas do cidadão. Na realidade o que se precisa é de serviços do cidadão com estruturas baseadas numa filosofia mais operacional e de serviço. De facto com o mesmo dinheiro é possível servir mais e melhor possibilitando o aumento de agências e escritórios consulares. Também, como já defendo desde 1980 seria necessária mais flexibilidade para esses serviços podendo eles deslocar-se periodicamente a regiões com certa concentração de portugueses. Com poucos gastos podiam os serviços deslocar-se ao povo e além do mais criar laços. Atendendo ao carácter disperso das comunidades portuguesas porque não a criação de “consulados” itinerantes?

É verdade que a Convenção de Viena sobre Relações Consulares regula o Direito Consular. Esta ao mencionar as categorias, consulado-geral, consulado, vice-consulado e agências consulares, não legitima que se mantenha o monolítismo e a inflexibilidade por alguns apregoados. No organigrama em questão, importante é que se salvaguarde a legalidade das decisões, o serviço e o controlo orçamental. Se é verdade que confiança é boa, em questões deste género o controlo é melhor!

Há postos e honrarias a mais sem que se veja qualquer resultado a nível de ideias ou de iniciativas. Não chegam os relatórios empolados duma administração (cada vez mais fim em si mesma) tendente a justificar-se, que apenas presta contas perante ela mesma atendendo a que a rotação política é tão rápida que não permite o seu controlo eficiente. A política está sujeita a relatórios de folhas Dina 4 pacientes. É necessário o controlo da eficiência. Onde estão os planos prospectivos e de actuação anuais ou bienais feitos por responsáveis de serviços, por cônsules, por conselheiros, etc? Quer-se viver sem rei nem roque nem o diabo que lhes toque! O povo não sabe sequer porque e para que lá estão. Nada visível.

Quais os resultados a nível de realização de projectos e a nível de influência no meio, no âmbito da região consular ou estatal? Pura e simplesmente não existem. (Em 1998 pedi à Conselheira de Ensino na Alemanha que apresentasse um plano de actividades relativa à Alemanha; a sua reacção foi de incompreensão como se eu tivesse cometido um crime de lesa-majestade, atendendo que esse direito advoga apenas aos superiores hierárquicos; estes naturalmente contentam-se com os tais relatórios escritos para inglês ver!).

Não chega a mudança da organização é também necessária uma mudança das mentalidades. Portugal necessita ser reestruturado dos pés até à cabeça. Nos serviços do estrangeiro precisa menos de pessoas que vão dar passeio à sua própria honra, que passeiam a sua imagem, precisa-se mais é de obreiros de serviço, abertos ao povo concreto, atentos ao capital nas suas interligações, empenhados na cultura como forma de presença lusa e de relacionamento entre povos e multiplicadores e naturalmente inteligência para perceber o espírito do tempo e do mercado e assim reagir atempadamente.

Este é um campo minado em que os donos dos feudos declararão de persona non grata quem pretenda entrar no feudo ou apenas pronunciar-se diferenciadamente sobre o assunto. A opinião pública tem muitas vezes muita dificuldade em perceber o que está em causa atendendo a que nas instituições do Estado se aninhou uma rede de interesses de conivência entre interesses particulares e interesses de grupos instalados depois do 25 de Abril. O argumento com os emigrantes é mais uma panaceia de que se servem. Independentemente dos nomes Dr. António Braga ou Dr. José Cesário, atacam-nos apenas, sem contrapropostas criativas verdadeiramente servidoras do Povo e do Estado. Esta é em muitos casos uma guerra dos instalados adversos à mudança porque incapazes de se mudarem. Tornam-se a voz do comodismo, do jogo do empata e do princípio de Peter!

Precisamos de políticos fortes que não se verguem aos interesses sejam eles da administrarão ou de grupos de pressão. Importante é a razão, e a salvaguarda do serviço do povo. A contenção de verbas não pode naturalmente permitir o esbanjamento noutros lugares. Os 3,6 milhões poupados através da racionalização deveriam ser investidos no serviço dado os emigrantes terem sido considerados até agora apenas como fontes de receita e não como investimento. Os emigrantes precisam duma política que também os beneficie a eles. Uma política limitada a redução de custos orçamentais não se justificaria por si mesma e menos ainda num sector já de si abandonado a si mesmo.

O mesmo se diga da aplicação dos fundos da FRI (Fundo para Relações Internacionais) que por vezes se dedicam a iniciativas de carácter duvidoso.

Naturalmente que cada macaco só pode cantar no seu galho. Mas não chega espantar o próprio mal. É preciso reconhecer o sofrimento do Povo simples que não consegue um galho na árvore, contentando-se com o chão sombrio da árvore e com o olhar para os que povoam os galhos.

António Justo

António da Cunha Duarte Justo
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António da Cunha Duarte Justo

Actividades jornalísticas em foque: análise social, ética, política e religiosa

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