Mais empenho na política das regiões e menos na luta ideológica
É com satisfação que li nos meios de comunicação que o novo presidente francês Nicolás Sarkozy propôs a criação duma nova organização internacional – a União Mediterrânea – que deve abranger os países das margens norte e sul mediterrâneo incluindo Portugal. A inclusão das nações da margem sul do mediterrâneo, como parceiras privilegiadas da Europa traria muitas vantagens para Portugal e para os países latinos e além disso provocaria um desenvolvimento mais equilibrado dos países muçulmanos. Desde 1986 observo o esquecimento votado aos vizinhos do Norte de África, que no caso de se não desenvolverem causarão ainda mais problemas aos países latinos. Numa perspectiva de interesses meramente estratégicos da USA (defesa de Israel – valores ocidentais e Turquia como centro hegemónico do mundo Sunita) e dos interesses económicos da Alemanha, a integração da Turquia na Europa só viria a concorrer com os interesses dos países latinos. Também por isto se torna muito oportuna a iniciativa do presidente francês.
A nível de parlamento europeu interessa também criar irmandades não tanto partidárias mas especialmente das regiões. Tornar-se-ia incompreensível que a esse nível os deputados latinos por razões de ideologia se unam aos países de linha de tradição protestante defendendo os interesses destes a troco de inactividade de iniciativa em relação aos países do sul. Não quero com isto defender a luta cultural que passou da reforma e contra-reforma para a luta cultural neo-marxista e “burguesa”. Trata-se de aprender de uns e doutros no respeito mútuo e na defesa das regiões. Uma política a partir das regiões para as regiões conduziria à desmilitarização ideológica dos partidos corrigindo os desvios das regiões e do povo.
Os países ricos do norte e centro da Europa, que a partir do século XVI conseguiram ultrapassar os povos latinos, continuam na vanguarda e na determinação dos objectivos da EU, beneficiando deles. Todas as iniciativas no sentido Leste os têm beneficiado.
Na Alemanha, a facção mais católica (latina) tem-se revelado contra a integração da Turquia na Europa oferecendo-lhe um estatuto de relação privilegiada mas não de membro. Isto salvaguardaria os interesses europeus sem criar desequilíbrios culturais, especialmente numa fase em que a cultura árabe se encontra tão activa e contrária aos valores emancipadores europeus. Uma União Mediterrânica privilegiada além de favorecer os interesses de todos os países limítrofes do Mediterrâneo viria resolver o problema do cavalo de Tróia turco na União Europeia.
A iniciativa de Nicolás Sarkozy cria mais equilíbrio entre Obelix e Asterix. Os espaços do antigo império romano devem ser tido mais em conta na política europeia assim como a tradição goda em Portugal.
Esta deveria ser uma preocupação a estar presente na agenda de todos os países europeus latinos. Não se trata de se entrar na velha luta cultural entre os interesses do mundo católico e protestante mas de haver mais equilíbrio entre as regiões independentemente das suas crenças. De não esquecer, neste sentido, a importância da Polónia, que pertencendo mais a leste é culturalmente próxima dos países do sul. Os países católicos têm neles um factor enfraquecedor que é o neo-marxismo internacionalista militante que aposta na desintegração das culturas nacionais. Os países do centro-norte, actualmente menos afectos à ideologia, conseguem ser mais consensuais nas rivalidades naturais entre Estado, povo e ideologia partidária. Aquele fanatismo mais próprio das culturas nórdicas nos tempos dos descobrimentos portugueses foi superado pelos nórdicos devido à sua experiência dolorosa. Aquela doença moralista europeia foi transmitida, especialmente, como um vírus para uma certa elite portuguesa, a partir das campanhas de Napoleão contra Portugal, e reiterada com o comunismo russo. Um socialismo verdadeiramente português terá de aprender a conciliar valores éticos e ecologia com democracia. Doutro modo continuará a solucionar problemazitos da nação com grandes problemas a ter de ser resolvidos pelos nossos vindouros.
Sarkozy defende para já um tipo de organização semelhante à dos encontros do G8 onde participam chefes de Estado e de Governo no sentido dum desenvolvimento partilhado, advogando também a criação de um banco mediterrânico de investimento.
Importante seria que a União Europeia se empenhasse económica e estrategicamente como se empenha pela Turquia e outros países do leste. Sakozy parece querer fazer política sem pôr à disposição os interesses culturais europeus. Já como Ministro do interior conseguiu introduzir um momento de reflexão na maneira de organizar a sociedade. Tomou medidas no sentido de evitar que a tolerância popular se gastasse, impedindo assim o aumento do fanatismo na relação dos vários grupos nas zonas degradadas das grandes cidades.
Toda a sociedade precisa de sectores consensuais, dogmas. Princípios são precisos para se afirmar mas correm o perigo de perder a relação com o presente. Os dogmas ajudam a a resistir às modas que se revelam sempre como passageiras; recordem-se os entusiasmos marxistas que conduziram aos mesmos crimes que o nazismo.
Quem não tiver convicções não sobrevive numa sociedade pseudo pluralista como a nossa. As teorias precisam duma praxis suporte que possibilite novas teorias que por sua vez provoquem aferimentos na prática. Um pragmatismo humano pressupõe que não se esteja mas de costas viradas para o espírito. Precisamos duma vontade forte e do brilho duma luz como a que actuou desde os princípios da nacionalidade até 1580 sob a acção dos templários e dos beneditinos.
Desde há séculos a nação vive em estado de agonia à luz de velas ideológicas que criam um ambiente aparente de intimidade para grupos desenraizados aquartelados nas cidades mas sempre dependentes de ventos plebiscitários duma cultura conflituosa que vive da manipulação, da despersonalização e descaracterização individual e cultural. As tribos bárbaras querem instalar o poder bárbaro numa estratégia de guerrilha no assalto às regiões e ao povo!… Apoderaram-se das grandes instituições e das grandes metrópoles reduzindo todo o resto a província e o povo a servos já não da real gleba mas da oportuna ideologia.
A iniciativa de Nicolás Sarkozy poderia tornar-se uma oportunidade para aqueles que ainda não deixaram de acreditar no povo e na ecologia para se iniciar uma reflexão e um novo discurso situado e real.
António Justo
“Nas Pegadas de Portugal”