Excelentíssimo Senhor Presidente da República Portuguesa
Prof. Doutor Marcelo Rebelo de Sousa
Excelentíssimos Conselheiros de Estado
Carta aberta solicitando a Vossa intervenção no tráfico de influências e na contenção da corrupção. Pedido de exercício do poder presidencial no sentido de restabelecer a dignidade da democracia e do Estado, bem como a reconciliação do povo português.
Excelência,
Saúdo-vos cordialmente mas não invejo o Vosso cargo e missão, atendendo à situação precária do país, de refém do capital financeiro internacional e do próprio Estado, invadido por uma classe oligárquica cúmplice que estende os seus braços sobre o Estado e suas instituições como o polvo sobre a sua presa. O estado de Portugal exige mudança e esta pressupõe uma energia hercúlea para a ousadia de o mudar. Que Deus lhe dê força porque das instituições que rodeiam V. Ex cia pouco haverá que esperar.
Sou um dos da multidão de portugueses que sofre e desespera, com um Estado que não dá bom exemplo nem oferece pressupostos para se apostar e confiar nele. Portugal parece ter aceitado perder o comboio da sua história e, com ele, o seu povo activo.
Atendendo a que os partidos se encontram numa crise de legitimidade e oferecem cada vez menos confiança aos cidadãos (50% não participa nas eleições);
Atendendo a que as elites portuguesas conduziram Portugal a uma situação deficitária catastrófica (à beira da bancarrota – sob controlo e interferência da Troica) e de sobrecarga das futuras gerações com a herança da dívida e de uma cultura hipotecada;
Atendendo à promiscuidade entre negócio e Estado e à consequente corrupção com benesses e subvenções dos políticos (PPPs das grandes negociatas com outros nomes e disfarçadas – ppp’s beneficiam à custa do Estado os tentáculos polvo das elites e dos boys- , os Bancos, as clientelas partidárias e de irmandades secretas, as concessões, as reformas vitalícias, etc.) que contribuem para a desmoralização do Estado e para a sua bancarrota;
Atendendo a que a democracia se encontra ameaçada ao tornar-se num instrumento de abastecimento para as diferentes elites que se aproveitam da promiscuidade entre Estado e sociedade civil e procuram, ad extra, legitimar-se com a substituição da ética e da moral por leis que eles próprios criam e interpretam;
É verdade que na República não temos cargos hereditários mas temos o compradio de clientelas (partidos, sindicatos e fundações) favorecidas com postos, comendas e privilégios, bem como irmandades elitistas secretas, que vivem na sombra do poder, influenciando-o, como é próprio da maçonaria. A compensação de políticos com cargos em empresas de comparticipação do Estado é execranda e escandalosa e reduz a zero a confiança nos órgãos de Estado, nos partidos e sindicatos, e com eles na democracia que, de facto, se torna, cada vez mais, numa democratura. Um exemplo: só o cinismo e a irresponsabilidade para com um país hipotecado e para com o povo simples com reformas tão baixas, poderão aceitar medidas como a proposta do orçamento governamental deste ano que faz disparar, as subvenções vitalícias atribuídas a políticos, de 700 mil euros para 18,8 milhões de euros; descaradamente serve-se, como é já tradição, a clientela 25 abrilista, quando as pessoas que trabalharam a vida inteira e que recebem uma reforma de 280 euros mensais vêem a sua reforma minimamente aumentada.
Atendendo a estas e outras considerações a política e em grande parte as instituições estatais, com o pessoal que as dirige, encontram-se desqualificados e deslegitimados. Nenhuma empresa privada poderia cometer tal aberração e sair-se sempre ilesa da situação!
Urge criminalizar o enriquecimento ilícito, acabar com as mordomias criadas para a clientela dos boys e novos-ricos; acabar com centenas de Institutos Públicos e Fundações Públicas que, mais que para servir o Estado, funcionam como tentáculos de grupos políticos e ideológicos para funcionários e administradores com 2º e 3º emprego; acabar com as administrações numerosíssimas de hospitais públicos; rever os salários de gestores públicos e cortar os benefícios fiscais aos bancos, às fundacões e aos partidos, acabar com as várias reformas por pessoa e as ajudas de custo, etc.
Precisa-se de uma lei de redução e de Reforma da Assembleia da República em que deputados e agregados passem a ser seus assalariados durante cada mandato, sendo sujeitos ao regime de reforma do INSS como qualquer cidadão. Torna-se urgente uma reforma do sistema político e da administração pública. Cf.https://antonio-justo.eu/?p=3421. Tudo isto só será possível se no país, à margem da política, houver uma discussão pública responsável sobre o estado da nação entre os intelectuais independentes.
A prática escondida da maçonaria (à semelhança da carbonária e da Loja P2), com os seus ritos e compromissos secretos de lealdade absoluta e exclusiva entre os irmãos, pode tornar-se numa ameaça à democracia; ela torna-se numa força de corrupção que através do seu tráfico de influências interage na política, na economia, na cultura e na justiça. O secretismo fomentador do compadrio organizado, o cinismo, o oportunismo mina e danifica a República nas suas bases e suborna qualquer órgão do Estado e até mesmo os interesses de Estado no palco internacional; de facto ela funciona como elo de ligação entre o poder político e o poder dos negócios e interfere nos diversos órgãos do Estado (Cf. https://antonio-justo.eu/?p=3444). Também a União Europeia com as suas redes de irmandades políticas e ideológicas (e as lóbis em Bruxelas) tem favorecido a corrupção em grande estilo em detrimento da ética e da moral, deixando esta de ter o seu efeito disciplinador. O povo encontra-se perante os seus governantes na situação do pobre Diógenes de Sinope, que, durante o dia, andava pelas ruas da cidade com uma lanterna na mão, à procura de um homem honesto.
Imagine-se que o Senhor presidente, no início da sua presidência tivesse a liberdade de começar por ler os levíticos à República, aos ministros e às elites instaladas no Estado, tal como fez o Papa Francisco aos Cardeais da Cúria, criando um seu conselho independente que possibilite a credibilidade dos ministérios e das instituições. O regime de Abril substituiu a política de censura de Salazar pelo regime de tráfico de influências. Este revela-se mais perigoso porque quem está fora não nota! Verdade é que nem o enegrecimento do regime de Salazar nem o branqueamento do regime de Abril ajudam o desenvolvimento.
Na sua maioria, o Conselho de Estado, que assiste V. Excelência, já jogou fora a sua credibilidade porque está comprometido com todo o sistema de um passado de clientelas e instituições que se apoderararm da democracia e levaram o país ao estado sem saída em que se encontra. Temos um Estado subornado sem condições de Estado. Temos uma Justiça enredada e comprometida que interpreta as leis como dizia Honoré Balzac: “…. as leis são como teias de aranha, através das quais passam os moscardos e ficam presas as moscas pequenas…”.
Urge a criação de grupos de trabalho ad hoc com peritos independentes que investiguem os diferentes sectores referidos no sentido de fazerem propostas para regenerarem o Estado, reorganizarem a administração e libertarem a Constituição da ideologia partidária que a iluminou; urge mandar fazer um levantamento das fontes da corrupção e da mafia dissimulada que se apoderou das instituições do Estado e da consciência pública e que agem a partir da escuridão e do sigilo como seitas seculares.
Em suma, o Estado encontra-se envenenado e arruinado, por isso chegou a hora em que Portugal precisa de um Presidente que siga o exemplo do Papa Francisco! Um presidente que reúna à sua volta homens-bons e de boa vontade: conselheiros diferentes e não os tradicionais conselheiros feitores ou cúmplices da corrupção instalada nos alicerces da República e com uma orientação do país mal-intencionada. (Não me queixo das pessoas pois todas elas são brilhantes mas queixo-me das suas obras que se vêem num país arruinado e num Estado minado que só produz novos-ricos e dependentes e tem a descaramento de tudo legitimar em nome do 25 de Abril.) (1)
Precisamos de inovação, capaz de valorizar a democracia e de mostrar às novas gerações que o poder das estruturas mafiosas da corrupção não tem futuro porque não assenta no trabalho honrado e sério e continua a ter no cerne das suas contexturas um espírito degradado baseado no companheirismo cúmplice oleado por idealismos e valores de conversa fiada sobre liberdade, igualdade e fraternidade, só para inglês ver, destinada a legitimar o poder da influência estabelecida. (2)
O problema está na mentalidade criada e fomentada, está no Portugal encoberto e de bípedes embuçados nos partidos, na economia, na justiça e nos Média. A estes se deve o mal-estar e o mal-andar do país bem como a consciência malformada de um povo que não tem um pensar conservador profundo nem um pensar progressista sério. Uma observação cuidada sobre o estado do país permite a conclusão que os dançarinos do poder que temos, adiam Portugal, entretendo o povo com meia-dúzia de tretas progressistas e com alguns remates conservadores em fora de jogo.
Peço perdão! Não tomem a sério o que digo porque pensar faz doer e os que mandam só gostam da música dos arraiais porque a festa da nação essa acabou, acabou porque no arraial não se reconhece o povo!
Excelência, senhores conselheiros de Estado, Santo Agostinho dizia: “Quando a arma que mata defende a liberdade e a vida, os Santos choram mas não acusam”!
Senhor Presidente, auguro-lhe muitas felicidades e uma presidência inovadora com grande sentido histórico e de futuro; que V. Ex cia não fique na história como mais um presidente mediano servidor de um sistema estatal medíocre instrumentalizado e danificado pelo contágio ideológico da multidão dos emboçados a ele encostados. Só o amor pode mitigar o poder e a corrupção, como afirma a tradição cristã portuguesa.
António da Cunha Duarte Justo
antoniocunhajusto@gmail.com
(1) Portugal foi grande quando tinha uma ideia e um ideal próprio; os portugueses deixaram de ser grandes quando se iludiram com o dinheiro, com o facilitismo e com o pensar irreflectido dos de fora. Portugal tornou-se estranho a si mesmo quando os que tinham na mão a sua força foram ao beija-mão das invasões francesas. Portugal perdeu então os grandes ideais europeus contentando-se com ideias e ideologias, mastigadas pela boca francesa e mais tarde pela boca da Rússia; o oportunismo engravatado ganhou foros de Estado dando origem a uma elite de novos-ricos como se Portugal se reduzisse a um aviário de criação de frangos de aviário. Portugal encontra-se num momento deplorável e muito triste da sua História por se ter rendido ao comando de uma elite de dançarinos políticos estrangeirados que vê o seu futuro assegurado, não na produtividade do país, mas na subserviência ao estrangeiro e nos postos que este lhe proporciona fora de Portugal. Também para um alinhamento ordenado dos partidos, Portugal precisaria de fazer um referendo sobre a sua pertença à Nato, à EU e à Zona euro. Doutro modo dá razão aos que vivem da confusão e apostam no bota-abaixo e numa política caótica e empobrecedora de Portugal, porque no seu enfraquecimento vêem melhor assegurados os seus votos!
(2) Portugal precisa de pessoas que se empenhem por Portugal e pelo seu povo e não de amigos da onça e da ideologia. Urge a moderação da influência dos instalados e o fomento das mais-valias do povo português para que este consiga, com o tempo, tornar-se no actor da própria História e se desenvencilhe do poder de tanta gente cínica e simpática que manipula as instituições e brilha com alguns feitos adquiridos à custa do empobrecimento cultural e social do país. Então não seria preciso que estes mostrassem tanta compaixão pelos pobres porque também eles produziriam e cada um receberia o suficiente.