À PROCURA DE SEGURANÇA DE ACOLHIMENTO E DE CARINHO

Vida é Sol e Sombra – um dar à Luz expresso no Eco do Grito do Nascimento

António Justo
Somos eternos peregrinos sempre a caminho e a seguir o eco do grito primordial – aquela dor que nos separou do paraíso perdido, da harmonia vaginal, e que é a ressonância da consciência de se ser algo diferente daquele albergue a que se convencionou chamar terra. Desde que Adão comeu a maçã da sabedoria, desde que Jesus abandonou a gruta de Belém, desde o nosso grito ao sair do ventre da mae, andamos (como indivíduos e como sociedade) na procura de organizar a vida de modo a sentir-nos em casa, aquele recanto onde nos sentimos acolhidos e seguros embora conscientes de que a casa não é nossa. Da casa, do lar faz parte o aconchego familiar, a língua, a religião (cultura), o trabalho, o biótopo social, rituais, tu e eu, eu e o outro.

Devido a tudo isto, acompanha-nos um sentimento de soledade, vestígio de um sofrimento devido a circunstâncias adversas e a um amigo, a uma amiga que nos falta.

A pressão de trabalho e de pessoas exaustivas esvazia o nosso interior e em casos extremos chega a levar ao Burn-out. Por isso se torna importante a conversa pessoal com um amigo, a troca de carinho, tomar iniciativas, ouvir música, fazer até exercícios de inspiração imaginativa do Sol (Deus), da bondade reconfortante e exercícios de expirar e sacudir a noite e os pensamentos pessimistas. A arte consiste em sacudi-los nalguma fogueira onde produzam labaredas que aqueçam e iluminem a existência, longe do fumo que intoxica. Somos feitos de fumo e de luz, de frio e calor. Como na electricidade o negativo pode ajudar a levar o positivo a dar luz. Para isso se realizar torna-se necessário um impulso inicial, a iniciativa de alguém, num mundo de graça à espera da Graça de alguém que acenda a minha graça para eu poder acender a graça de alguém.

Já ao nascermos gritamos lançando para fora a dor do trauma da unidade rompida, no desconforto da saída do aconchego do ventre maternal. Nesta desolação torna-se difícil encontrar o sentido, torna-se difícil ouvir a voz de quem chama por mim, de quem sabe o meu nome.

No cá fora do ventre, permanece a nostalgia da procura de uma placenta maternal que transmita calor e o encontro de uns braços que dêem segurança.

Muitas vezes o fado da vida leva-nos à procura de uma relação, de um elo que possibilite reatar o sentimento amoroso do acolhimento original; frequentemente a resposta esvai-se num ecoar afastado que repete a sensação do primeiro grito num longe distante de outeiros petrificados que se sucedem uns aos outros.

Então, os braços e as pernas movimentam-se desordenada e instintivamente na procura de alguém, para alcançar o que tinha no ventre materno. Do amor e dedicação experimentada aprenderá a integrar em si a ordem ou a desordem transmitida. Cada um de nós traz consigo as circunstâncias (o “pecado” original do pó do caminho por onde passa.

Saímos do albergue/gruta na procura de outras grutas e ao sentirmos aí carinho criamos uma segurança interior, se a não recebemos na infância talvez passemos a ser peregrinos ou forasteiros contentes ou descontentes na procura vincada de acolhimento.

O buraco não enchido pelo carinho familiar cria a ânsia de ser amado e procura no outro além da relação o carinho que não recebeu. (Muitas vezes, o próprio danificado-depressivo, cria um ambiente enevoado à sua volta num determinismo que repete o ambiente da infância – uma sensação de relação baseada na negativa; estas pessoas foram castigadas na infância e continuam a castigar-se criando, por vezes, situações que repetem a disposição e desacolhimento da infância.

O Samaritano desce do Selim do seu Pensamento

Hoje a sociedade é muito stressante para os pais criando neles má-consciência pelo facto de não terem tempo suficiente para receber e dar carinho, especialmente aos filhos.… Muitos, desiludidos de objectivos não conseguidos, passam a vida a bater à porta, de parceiro em parceiro, de albergue em albergue, à procura do que não receberam e que por vezes não podem dar.

De facto somos como uma proveta de vasos comunicantes em que o equilíbrio se adquire na troca de dar e receber numa mistura de fluidos mais ou menos cristalinos. De facto eu sou eu e o que o parceiro me possibilite que seja e o parceiro é ele e o que eu lhe possibilito que seja. Cada um espera do outro, aquilo que não tem e, porque também o outro anda à procura do que lhe falta, então chega a criar-se caminhos paralelos, onde cada qual se encastela no selim do seu pensamento. O refúgio do sentimento no pensamento projectado pode favorecer uma vida dupla que prolonga a dor que o sentimento e a falta de acção não satisfizeram. Na falta de relação próxima, da troca de carinhos, talvez por um condicionamento psicológico (narcisismo), não se criam momentos nem rituais comuns possibilitadores de laços; acontecem então monólogos em torno do ego que em vez de reconhecer a riqueza mútua da complementação, passa a recorrer à auto-afirmação pela celebração da própria dança em torno de actividades e iniciativas que o distraem da própria vida. A vida em comum para ser bem-sucedida faria lembrar o agricultor que tem muitas espécies de frutas e procura, da mistura de algumas delas, fazer o melhor sumo. Se sou maçã e se convivo com uma laranja não haverá como deliciar-se com o sumo de laranja ou, no caso de se querer fazer o melhor, observar a melhor percentagem de maçã e de laranja para obter um sumo mistura que agrade aos dois. O demasiado açúcar pode tornar-se enjoativo e o demasiado aziúme pode estragar a digestão.

Uma atitude equilibrada exige de nós humildade e altruísmo, compaixão e sintonia. Todos somos feitos de barro mas, uns e outros, podemos tornar-nos jarros onde o outro possa beber. Importante é a boa vontade e a bonomia para com o mundo exterior a nós. O Bom Samaritano (em Lucas 10:30-37) consegue encontrar o judeu a um nível que supera a inimizade secular entre os judeus e os samaritanos.

O samaritano desceu do seu jumento, acolheu e tratou o judeu que jazia ferido no chão, tratou-lhe as feridas com óleo e com vinho, símbolo da consolação, colocou-o no seu jumento (de igual para igual), e levou-o para um albergue.

O albergue é o símbolo do mundo interior do judeu, da sua ipseidade de que ele é hospedeiro no acolhimento da consolação dada/recebida. O samaritano ajudou sem tornar o outro dependente; retirou-se no momento oportuno em que o hospedado se torna senhor da própria “casa”. O salvado traz em si a salvação que deverá procurar, dentro não fora.

Em cada um de nós há uma gruta onde se encontra o pai e a mãe (Deus) à espera. Muitas vezes passamos a vida a viver em casa dos outros, à procura de nós, passando sede e frio quando no nosso interior se encontra a gruta de Belém onde os anjos estão prontos para nos receberem e aclamarem também. Aí encontramos a confiança básica original semelhante à que tínhamos no ventre materno. Então a confiança nos leva a entrar na ressonância divina, e a fé dá repouso porque nos oferece a confiança no bom fim de tudo o que fazemos ou acontece. A vida tem sentido e direcção porque nos encontramos três em comunidade e a caminho: eu e tu a seguir a Verdade.…

Uma nova situação lembra o eco do grito primordial, aquele grito que nos lançou na aventura da liberdade, condicionada também pela experiência original. No grito anunciava-se o medo de um fim que afinal se tornou no início de um caminho para uma ordem maior, saímos de uma gruta pequena para entrarmos no regaço eterno do universo. Do presumível fim veio a vida; a infinidade que atemorizava tornou-se princípio de nova vida. No fim de cada trajecto, de cada decisão há sempre uns braços abertos a receber-nos mesmo quando os não vemos por puro medo ou pelo barulho do grito. A razão é fria e distante como o universo mas Deus deu-nos o coração que tudo une e abrange com seu calor e acolhimento que a tudo confere o brilho do carinho. Não há luz que mostre o amor mas não há amor que apague a luz! Só o coração consegue derreter o gelo e produzir o fluido que une e torna visíveis as galáxias.

Encontramos espiritualidades, a caminho, que nos podem ajudar a chegar a casa e a sentirmo-nos bem nela. A segurança interior não comporta o medo que se quer agarrar a coisas fixas/seguras porque só se torna seguro quem aprende a andar por cima das águas. Nas janelas do teu interior até os véus dos teus dogmas e das certezas se esvaem. Surgimos do grito do medo mas no nosso interior e no mundo que ordenamos verificamos que há sempre uma oferta benévola, uma luz que espera por nós, que se encontra em nós. Uma vez no centro da nossa ipseidade, na nossa casa interior, descobrimos que o seu tecto é o universo e que no seu centro se encontra a divindade que nos move nele. Sinceridade e honestidade são meios que nos ajudam a chegar lá sem invalidar a tensão existente entre indivíduo e comunidade, entre a parte e o todo.
António da Cunha Duarte Justo
Pedagogo e Teólogo
www.antonio-justo.eu

PS. Texto a ser publicado em próximo livro

RIR ESTIMULA AS HORMONAS DA FELICIDADE – DIA DO RISO

Um dia sem riso é um dia enevoado e sonolento

António Justo
À primeira vista, a celebração do dia do riso parece descabida; mas até não é, porque pode tornar-se em ocasião para pensarmos sobre os seus efeitos e deste modo tornarmo-nos mais saudáveis, alegres e sociais.

O riso activa as hormonas que actuam nas células. É comunicativo, espalha alegria e faz bem à saúde do corpo e do espírito. Estimula o sistema imunológico, desce a pressão arterial e activa as energias de auto-cura; fomenta o optimismo, a coragem, a serenidade e facilita o contacto e confere sucesso social.

A Gelotologia é a ciência que estuda os efeitos do riso (terapias do riso e do humor). Investigadores científicos descobriram que um minuto de riso pode ser tão refrescante como o exercício de 45 minutos de relaxamento. O riso é o melhor meio contra o estresse porque aumenta a endorfina, a hormona da felicidade. Massageia 70 músculos do rosto e movimenta outros 80. Irradia simpatia e benevolência.

Já os romanos sabiam que o bom humor (humor = seiva do corpo) estimulava corpo e alma. Na Idade Média havia os bobos da corte, especialistas em fazer rir em função terapêutica.

O riso muda ideias fixas e cismas e altera a maneira de ver as coisas. Pessoas com tendência a fixar-se em ideias podem recorrer ao exercício do riso porque este abre as portas do coração, fortalecendo a comunidade e a participação em grupo, além de libertar agressões estancadas. Corta todo o nó criado por pensamentos e hábitos ao criar a distância necessária para se poder reconhecer melhor as coisas. Rir liberta o cérebro irrigando-o com oxigénio; fomenta a criatividade e aumenta a actividade (Cheguei a fazer exercícios de risadas nas aulas, com espanto dos estudantes, mas com bons resultados, quando observava o seu cansaço). Quem ri cria conexões encontrando no riso o melhor remédio que nos torna soberanos em relação a tudo.

“Muito riso pouco juízo” dizem os desmancha-prazeres ou aqueles que observam alguém que ri por tudo e por nada. Aristóteles (na Poética) dava um lugar mais alto aos temas sérios/nobres (tragédia e épica heroica como género elevado) e um lugar baixo aos temas risíveis – sátira e comédia (imitação de condições inferiores). Talvez isto expresse um sentimento geral que a nossa cultura acentuou.

Tudo isto tem também a ver com os diferentes sentimentos que podem estar na origem do riso e com as intenções individuais e sociais a ele ligadas. O riso leva a transcender os sentimentos embora se descubram diferentes sentimentos em diferentes espécies de riso: riso amarelo, de escárnio (ofensivo), ridicularizador, inocente, disciplinado, descontraído, condescendente, aberto, irónico… O riso mais saudável será aquele onde se ri para alguém e não de alguém! Um bom exercício, ao levantar será rir ou fazer que ri, porque o simples gesto facial de rir engana o cérebro, activando nele os mecanismos correspondentes.

Rir chega até a ser factor democrático; nele nos abrimos descontraidamente e nos tornamos iguais no grupo e, por vezes, até contagiosos, num tipo de comédia inclusiva.

Rir às gargalhadas é vento quente que leva toda a nuvem colocando toda a gente sob o mesmo sol. Como a chuva do choro confere o verde à planta assim o sol do riso lhe dá o colorido das pétalas. Um dia sem rir é um dia sem sol, um dia enevoado e sonolento. O rir provoca o bom humor porque não se leva a sério.

Quando passar por alguém sorria; esta é a melhor maneira de saudar alguém que não conheça; além de se tornar em luz para alguém ilumina o seu próprio corpo.

O cúmulo da seriedade seria não rir para evitar rugas na cara!
António da Cunha Duarte Justo
www.antonio-justo.eu

UM POVO CULTO NÃO DEVERIA SUPORTAR A TV QUE TEM

Os Poderes contestados de Ontem reúnem-se modernamente nos Canais de TV

Acabo de chegar de Portugal. Uma estadia, na Quinta Outeiro da Luz, muito rica em contactos e em experiências humanas confortantes. O brilho da gente e do clima contrasta com a negrura e a baixeza de muitos programas da TV. Os responsáveis da TV parecem ter a intenção de educar o povo para o mórbido para o acaçapado, quando a sua missão não deveria ser educar mas informar e instruir!

É horripilante o nível das cadeias de TV. O povo continua a ser emburrecido com histórias emocionais de roubos, suicídios, assassínios e quejandas; tudo explorado até à exaustão duma lágrima que turva a inteligência. Notícias, que deveriam ter lugar apenas nos jornais locais, são exploradas pela TV na intenção de fomentar uma consciência ligada ao espírito coitadinho e a instintos primitivos; programas com moderadores, muitas vezes, sem nível, mas democráticos para que a estupidez também encontre representatividade nos canais virados para a sentimentalidade e a negatividade; enfim, uma cultura para mais engordar a plebe. Até o povo sensato parece não notar que está a ser encharcado com imagens e conversas baratas tendentes ao alheamento, numa perspectiva de lavagem do cérebro. Deixa-se levar e até gosta do sentimento satisfeito que o torna cada vez mais na mesma, porque “com papas e bolos se enganam os tolos”. Quanto menos o povo consiga conectar mais facilmente será de levar!

O mais lamentável é que a classe académica e gente bem pensante suportem a banalidade e não proteste contra. Um povo abandonado a feras vestidas de cordeiro e a discursos banais.

Quanto ao discurso político transmitido: uma miséria! Apenas discurso partidário para embalar o zé-povinho! É rara a discussão política objectiva sobre temas e se tal a desoras; o que interessa são os ardinas políticos da praça e todo um enredo em torno do dito e do não dito: uma conversa fiada para desinformar.

Cada partido apresenta-se como uma rampa de salvação vendo a do adversário como a rampa para o inferno. Cada qual com os seus dogmas e conversas intermináveis socorrendo-se da falta de informação factual e de argumentação concreta de um público à deriva, até porque só entende os cabeçalhos e os títulos das notícias. Conversa, só conversa! Porém, a conversa nunca é certa, se deixa espaço para reticências. Numa sociedade quer entupida/autossuficiente quer castigada, falta a informação e o interesse por ela, devido às instituições dos boys que tudo minam e dominam.

Temos de deixar a ilusão de que alguém nos virá salvar. Nós é que temos de nos salvar. O povo português é de memória curta e muitas vezes infantil ao pensar que a alternativa, no tempo de eleições, vem de um outro partido. A República começou empestada de ideologias e oportunismos e continua fiel a esta tradição. A juventude abandona o país; fica o hábito acomodado e autossatisfeito a continuar a má tradição.
Boa noite, Portugal!
António da Cunha Duarte Justo
www.antonio-justo.eu

Ética da Responsabilidade pressupõe uma Educação para a Liberdade

A liberdade passa pela revisão da gramática – Nossa matriz da vida

Por António Justo
É essencial o empenho pelo estudo dos problemas humanos sob a perspectiva duma ética da insubmissão, porque a prática do hábito e da submissão levou a História a repetir-se, na continuidade de um poder medíocre e violento, que governa o mundo.

Hoje já se reconhece a submissão, a rotina e o medo como factores que impedem o desenvolvimento humano e sociológico, porque conduzem à subjugação, à técnica e aos automatismos do imediato consumista e a uma moral ad hoc. Albert Einstein advertia: “Os grandes espíritos sempre sofreram oposição violenta das mentes medíocres. Estas últimas não conseguem entender quando um homem não se submete, sem pensar, aos preconceitos hereditários e usa a inteligência com coragem.”

Não se trata de educar para uma revolta violenta contra os sistemas vigorantes (isso foi o que se fez durante toda a História em lutas, guerras e guerrilhas reactivas); a consistência ou inconsistência dos Estados actuais é o resultado dessa prática do grupo mais forte que impôs o regime, em que cada país se encontra no momento. Enfim, a História tem sido uma cadeia ininterrupta de assaltos e contra-assaltos. Como este é um dado de sustentabilidade negativa, no prolongamento de um passado centrado na violência e no poder, sem sentido pelo viver, será necessária a propagação de uma revolta integral da consciência (alma e inteligência acordadas e reunidas na intuição) que possibilite uma maneira de estar pacífica centrada na pessoa e não nos grupos de força, de maneira a acordarmos para o sentir integral da vida.

O conhecimento oficialmente propagado é confuso e baseia-se na divisão e confusão que conduzem à concorrência, ao conflito e à violência; isto porque assim se estabiliza os grupos de atitude violenta.

A acção pragmática e a razão, no seguimento da ambição, conduzem à eficácia mas não produzem felicidade; em vez de integrarem os polos extremam-nos no sentido de dividir para imperar (veja-se a definição partidária na sua dinâmica contra o integral); comporta uma dinâmica do abstrato e da generalização, distante da vida baseada na moral da lei, mas não no indivíduo concreto; o sistema da autoafirmação na definição contra o outro já assume, em si, o princípio da corrupção e da violência.

Como vimos no quarto estádio da ética, o estádio do amor que integra as partes numa dinâmica de maximização do indivíduo e da comunidade (à imagem da fórmula trinitária) a perspectiva deve incluir todas as perspectivas centradas na pessoa. (O aspecto utópico talvez se situe apenas no momento de projectar a acção e responsabilização individual para o grupo).

A mudança qualitativa só poderá dar-se mediante a mudança da gramática! Aprender a aprender para libertar/responsabilizar o Sujeito

A actividade escolar orienta-nos para o utilitário e eficaz impondo a luta competitiva numa estratégia do ‘alarga os ombros e deita abaixo’, se queres subir. Trata-se de uma educação irreflectida, feita de automatismos que conduzem a um viver no sótão do pensamento muito longe da vida concreta e em que se procura compreender tudo menos a nós mesmos, menos o nosso sentido e o sentido do nosso viver. Não respeita as características do indivíduo. Começa por forçar o intelecto e negligenciar a emoção e a acção, não se preocupando com o desenvolvimento da personalidade.

A escola e a educação partem de diretrizes e planos de enquadramento destinados a encaixar o cidadão numa dada intenção política, que ensina, à sua maneira, a perceber o que é, mas não a perceber o como é nem o como podia ser. Instrumentaliza-se o indivíduo, a vida e até os ideais dela. Na escola, deixa de haver indivíduos concretos para serem desvirtuados no mundo do rebanho centrado num pensar abstracto desresponsabilizador. Na sociedade, tal como na escola, só há lugar para a manada de complementos tornados predicativos de sujeitos indeterminados. Há que personalizar e reabilitar o sujeito indeterminado. A frase com o seu sujeito, predicado e complementos torna-se no símbolo de uma sociedade (massa) e de uma vida empedernida em funções sem respeito por cada termo em si; aplica-se uma gramática/didáctica que não compreende o termo/palavra independentemente da sua função e, deste modo, não lhe possibilita liberdade nem responsabilidade própria. Uma gramática das funções contrapõe-se à realidade da mudança contínua porque fixa os termos/pessoas no tempo cronológico e num meio já determinado. Para mudarmos a sociedade e a vida teremos que começar por consciencializar a gramática, nosso rescrito de vida, para assim, consciencializando-nos dos seus parâmetros, sermos capazes de criar novos, o que pressupõe começar por revolucionar a gramática (reflectindo o seu caracter estigmatimo) ou pelo menos a sua didáctica! A mudança qualitativa só poderá dar-se mediante a mudança da gramática!

Aristóteles e a Platão apresentam-nos achegas de reflexão sobre os valores perenes que nos resguardam de um viver de slogans alienantes formadoras de atitudes e virtudes oportunas para o momento socioeconómico em que se vive. O valor perene é integrante e como tal não define (é inclusivo não colocando o fim, o limite), destrói barreiras porque parte de uma visão integral da vida que deixa de ser esquartejada no tempo e consequentemente desconhece o medo enfreador. Onde há medo há sofrimento, há um ferido e uma batalha perdida. Quem propaga o medo é inimigo do homem e da liberdade. Por isso a missão é libertar todo o homem, seja ele muçulmano ou cristão, seja ele socialista ou capitalista, porque só então cairão as correntes e as muralhas dos prisioneiros que se encontram dentro e fora dos muros. O autoconhecimento conduz à experiência do suor de sangue no Horto das Oliveiras e à expressão individual de cada um na qualidade de ressuscitado.

As palavras são como o vento que passa e o exemplo é como a torrente que arrasta. O problema da mudança permanece bicudo pelo facto de um sistema só se mudar qualitativamente quando os seus membros se mudarem, isto é, quando grande parte dos indivíduos se mudarem, o que significa um processo de mudança imensamente lento, porque centrado em cada pessoa.

Obedecer/desobedecer para crescer!

A lei, a ideologia, o pensamento não muda basicamente, o que faz mudar é a atitude, o comportamento. Enquanto construirmos a nossa identidade identificando-nos com um sistema, país, religião, filosofia ou cultura, estamos a fugir de nós e a procurar a segurança fora de nós. Esta é a tragédia. Esperamos de fora no ter o que não somos conscientemente (no ser interior). Isto não quer dizer que não devamos pertencer a um partido, a uma religião, ou a um grupo qualquer, como meio e campo de acção, mas não como algo de identificação ou onde se procura a honra ou o poder. A natureza não conhece nenhum elemento que em nome do grupo se mate ou mate alguém. Só o Homem chegou a tal corrupção desnaturada prescrevendo a morte de pessoas em nome do grupo ou instituição; tal corrupção é tão descarada a ponto de a inscrever como norma em livros sagrados! E o que é mais grave a palavra mágica “religião” serve para conter as inteligências políticas e os intelectuais que se desobrigam na confusão das interpretações ao gosto da bondade ou maldade do cliente, em vez de se centrarem na qualidade da filosofia da religião.

O país, a nação, a política, a ciência e a religião não existem para serem servidos, devem ser meios de servir e fazer o bem. O ser humano é superior às instituições, está antes delas; estas são para o servirem e não o contrário. É contra a natureza o fanatismo bem como considerar uma instituição material ou espiritual como o bem. Estas pecam por delimitarem, definirem (ao determinarem o limite, o fim) de uma realidade que o não tem. O poder reside na divisão! Toda a ideologia como toda a instituição comete o pecado de se arrogar e usurpar a bondade que se encontra na pessoa. Só a pessoa é o lugar do bem e do mal. As instituições e até o sistema mental transferem a vida individual para as ideias e para as relações humanas de maneira a serem servidas por estas; conseguem-no ao determinarem a sua identidade na fronteira que separa o que deveria estar unido e rouba ao indivíduo a sua auréola pessoal transladando-a para a instituição e fomentando a dependência do indivíduo em vez da sua independência (Confrontar o dolo e o beija-mão de personalidades mesmo non gratas à população!). O Jardim infantil das sociedades em que nos encontramos faz lembrar a dança em torno do bezerro da Babilónia! Age-se sob o pressuposto que o que as pessoas precisam é de uma música qualquer para poderem dançar, independente do valor ou ética da “música”. Fala-se de emancipação mas na realidade a mesma sociedade que a defende, a rebaixa, entregando a dignidade humana às feras da praça pública. Isto não elimina o reconhecimento dos dons e do serviço em comunidade, com a comunidade e para a comunidade. Na comunidade há uma relação de sujeitos e não de objectos (o lado oposto da moral de Nicolau Maquiavel) o que permite uma outra interpretação dos dons e serviços porque a comunidade amplia o membro na complementaridade, não o rouba. É necessário criar uma pedagogia da certeza do incerto. Para isso são necessárias pessoas adultas e de boa vontade.

A Certeza do incerto

Temos de reconhecer também os limites do nosso sistema de pensamento e tornarmo-nos conscientes do seu condicionamento ao preconceito; de facto não há conceito sem preconceito. As forças de poder material ou ideológico usam do preconceito sem passarem pela reflexão; usam até da lógica para embrulharem a razão; servem-se na escola do preconceito, ensinando-nos a viver dele sem nos consciencializarem de que o preconceito é apenas um instrumento necessário para chegarmos à apreensão da realidade intelectual, sendo ao mesmo tempo uma oportunidade e um perigo falsificador de realidade. O problema da realidade começa com a ideia dela.

Se atribuo a uma percepção ou ideia a mesma realidade existencial (o mesmo conceito de existência) que dou à realidade das coisas, identifico imaginação ou ficção com a existência do objecto, dando-lhe assim uma outra forma de existência. Daqui o necessário respeito por cada instrumento de acesso à Realidade seja ele os sentidos, o sentimento, o intelecto ou a intuição. Aqui se situa o busílis da questão entre real e irreal, religião (fé) e ciência (opinião). Por isso prefiro situar-me na realidade da metáfora ao descrever ou interpretar as manifestações de um real mistério que é o mistério do real presumido na metáfora ou nas diferentes parábolas físicas, linguísticas ou culturais. Razão é a capacidade de julgar entre duas ideias, no caminho da crença ou da opinião; o problema começa com a valorização do juízo feito.

O primeiro passo a encetar será a consciencialização e auto- consciencialização da estrutura falsa e falsificadora vigente em nós mesmos e nas diferentes estruturas sociais. Não podemos destruí-las porque se o fizéssemos destruiríamos o homem e a sua a cultura. Uma nova educação terá de tender a distinguir entre os preconceitos necessários e os preconceitos nocivos e a encarar a resolução de problemas sob uma perspectiva individual responsável que parta da perspectiva do nós para o eu gratificado.

Não se encontra a certeza no ser pelo que, para o bom viver, há que se dedicar aos modos de ser. Na falta da certeza há que descobrir e experimentar como é o falso e como é o verdadeiro. Trata-se de começar a gatinhar.

Urge uma revolução cultural centrada na formação individual para se poder libertar a pessoa de velhas estruturas para tornar possível a transformação do homem e, através deste, da sociedade; uma revolução que parta do interior integral e se oriente para o interior de cada um (autoconhecimento, consciência da ipseidade) através da aquisição de um novo sistema de pensar e dum novo conhecimento. O entendimento e o pensamento são como a língua; a linha da fronteira de uma língua limita o horizonte do falante; limita o horizonte intelectual e limita a circulação fora dela. Trata-se portanto de criar uma linguagem universal que toque o coração de cada indivíduo e a inteligência das instituições.

O ser humano é um milagre em contínua criação que não deve ser domesticado nem encarneirado por instituições em quem a manada projecta a aura e o horizonte do próprio ser, com desejos provindos de recalcamentos num eu não consciente. Também a borboleta para poder voar teve que passar pela mudança progressiva. A meta da pessoa não é o paraíso nem o nirvana, mas sim a sua floração no ressuscitado.

A degradação do Homem e da sociedade parece irreparavelmente inexorável porque as instituições que a constituem (fruto da precaridade individual), são incapazes e, consequentemente, produtoras de crises. Neste sentido torna-se inoportuna uma avaliação dos valores que nos conduzem à precaridade da consciência (hipocrisia, inveja, sede de poder, nacionalismo, racismo, etc.). Temos construído a casa sobre a areia, partindo do princípio que se alcança paz com mãos de guerra. Enquanto a esperança se basear no medo não haverá solução pacífica. Por isso Cristo resume a vida integral: “eu sou o caminho, a verdade e a vida”. Para lá chegar é preciso aprender a pensar fora dos modelos que nos prendem.

À maneira de conclusão

Se queres ver a Lua não esperes pela noite, o seu melhor rosto é ao pôr-do-sol. Porque não vivemos o presente na realização da felicidade, adiamo-lo e com ele a nós para um amanhã em que projectamos esperanças (tornamo-nos progressistas ou conservadores sem ter consciência do agora que culpa o passado ou espera no futuro, encobrindo, deste modo, a própria violência interior, que se revela na carência do presente). Reféns da causalidade, adiamos a resolução da paz para outros, para os vindouros, tornando-a um energúmeno do futuro que nos leva a fugir de nós e a distrair do presente. O passado (é a memória feita tempo), presente (o acontecer no eixo do tempo/fora do tempo) e futuro (é projecção feita tempo); passado e futuro são aspectos de algo que deveria ser só presente (Kairós), o fora do tempo. A vida inteira é viver e morrer, esforço e paz, contínua mutação num processo de integração dos próprios polos.

A via tem dois sentidos e a vida também. Seguindo no sentido contrário da via dificultamo-nos a existência, dando-lhe pernas de aflição e ambição/conflito, porque atados à trela do tempo. O hábito e a acomodação é tempo morto na rotina que nos empedernece.

No escurecer do pensamento levanta-se o amor que não é desejo mas sensação inocente do infinito; então chega a intimidade da noite escura onde só as estrelas falam do milagre que o universo faz brilhar nos nossos olhos. Só na noite surgem as estrelas, só no silêncio da mente se ganham asas para voar até ao firmamento onde o muro das ideias, culturas, anseios e preocupações já não fazem sombra.

Somos levados pelas ondas das influências políticas, religiosas, individuais e sociais de que nos temos de libertar. Eu noto em mim uma grande prisão, que é a consciência da defesa de valores cristãos que reconheço como inalienáveis para o futuro mas que me levam a ter medo do Islão. Um medo que me leva a não viver no presente com o medo do que acontecerá no futuro.

Num mundo em que se aspira a autoridade e posição social já não se é livre, o mesmo se diria pela ânsia de ser virtuoso ou bom; contudo, na falta de liberdade é melhor estar-se preso pela ética, desde que se tenha consciência disso. Se tenho a força de ser eu já não tenho medo de ser bom nem mau; na virtude e no pecado assumo ser eu conscientemente. Então desta perspectiva compreenderei a própria compreensão e a dos outros, ciente de que nesse entremeio se realiza a transformação que possibilita o milagre. Se me compreender compreendo o mundo e ao compreender-me viverei em paz com ele. Uma cultura ou uma pessoa fechada na própria órbitra como a Terra em volta do Sol circunscreve-se a si subestimando a realidade do universo. Se queremos descobrir o universo teremos de não dar relevo à própria giratória. Esta é a diferença entre um satélite e uma estrela.
©António da Cunha Duarte Justo
Jornalista e Ex-professor de filosofia aplicada
www.antonio-justo.eu

Níveis da Justiça e da Ética no Desenvolvimento das Pessoas e das Culturas

A Virtude da Tolerância desafia a Virtude da Coragem

Por António Justo

O medo, o anseio por segurança, a leviandade mental são característicos de uma sociedade em redemoinho que destrói a personalidade e impede a reflexão individual do cidadão para o engavetar em padrões sociais medíocres.

A insegurança e o medo domam as energias criativas e impedem a compreensão da vida, conduzindo a uma situação de pânico que provoca uma reacção de ânsia de sucesso imediato material e espiritual. A insegurança e a arbitrariedade no julgamento de práticas políticas e religiosas fomentam um moralismo preconceituoso e precipitado longe de uma ética reflectida abrangente. Deixa-se de combater por ideais nobres para se pelejar com guerrilheiros que se encontram mais próximos ou que são mais oportunos.

A falta de discernimento conduz a opiniões precipitadas e intolerantes, pela positiva ou pela negativa. Daí a importância de distinguir entre ética e moral e de constatar a evolução da ética e dos costumes a nível de pessoas, instituições e civilizações para possibilitar um diálogo interactivo e produtivo entre pessoas e culturas. As culturas só têm a oportunidade de se aproximarem ou de se guerrearem. Se a sociedade continuar com a mesma política dos últimos 60 anos a guerrilha proliferará de maneira avassaladora.

Ética é a orientação consciente por regras ou normas; implica uma conduta de vida criteriosa e ter a capacidade de decidir com discernimento entre acções boas e más.

Moral diz respeito ao cumprimento das normas por que se orienta a maioria e que correspondem a determinadas ideias/imagens na vida interpessoal. As normas adoptadas podem ser aplicadas consciente ou inconsciente.

Podemos considerar quatro etapas do desenvolvimento da ética e das sociedades que a praticam:

Na primeira etapa é permitido castigar uma acção sofrida com uma acção pior. Exemplo: alguém rouba algo e como castigo é-lhe cortada a mão (cf. lei da Sharia no islão); o homem é o lobo do homem (homo homini lupus!). Na segunda etapa da evolução ética passa a ser aplicado o princípio de talião que corresponde a responder a uma acção com outra acção correspondente: “olho por olho e dente por dente” (vingança igual). A terceira etapa que se encontra já no Antigo Testamento, no Hinduísmo, Confucionismo e na Filosofia grega, orienta-se pela “regra de ouro” que determina: “Não faças aos outros o que não queres que te façam a ti” ou “Faz aos outros o que queres que te façam a ti”. A quarta etapa da ética é a ética das Bem-aventuranças, a ética do amor ao inimigo e do vingar o mal com o bem; é declarada no Sermão da Montanha mas muito difícil de praticar e em certos conflitos levará até à eliminação do bem, tal como aconteceu com a crucificação do maior Mestre aparecido na História. Pelas obras se mede a qualidade ética das acções, que se tornam mais ou menos virtuosas.

Virtude é a capacidade de comportamento determinado por um valor. Pressupõe uma decisão baseada numa atitude e numa mundivisão (experiência de vida, idealismo). A virtude tem como actor contra ela (o vício) a agressão (o outro lado da calma) dado a agressão parecer o meio natural de autoafirmação (movimento egoísta contra altruísta) na intenção de formar e afirmar identidade.

O filósofo Aristóteles distinguia entre duas espécies de virtudes: As virtudes racionais (dianoéticas) inteligência, sabedoria, o pensamento científico, etc. e as virtude éticas ou da vontade. Para se determinar a virtude, Aristóteles elaborou o padrão do Meio-termo, o meio justo (Mosóteles), vulgarmente dito na expressão, “a virtude está no meio”. Por exemplo, coragem é o meio entre covardia e imprudência (Temos o momento da falta, o momento da virtude e o momento do exagero, exemplo: falta: Sofrer de injustiça – virtude: justiça – excesso: praticar a injustiça).

A virtude depende de um valor mais alto. Na história da ética reconhece-se como valor mais elevado, a felicidade, Deus, o paraíso (nirvana), espiritualidade… A virtude pressupõe educação, hábito e relação interior através da compreensão, da alegria e do sofrimento.

Max Klopfer, na sequência de Aristóteles, nomeia, para a determinação de cada virtude, as seguintes características gerais: a) o meio entre dois extremos (aspecto formal), b) fundamento num bem maior (aspecto material); e para uma determinada virtude as características especiais dela: a) baseada numa determinada situação e b) relacionada a uma determinada pessoa (subjectividade).

As virtudes encontram-se todas numa relação de reciprocidade. Platão fala de quatro virtudes cardeais: sabedoria, coragem, prudência e justiça. Aristóteles fala de 14 virtudes: Sabedoria, coragem, prudência, justiça, serenidade, serenidade nobre, generosidade, magnanimidade, elevação, honra, amizade, dignidade, indignação justa, sinceridade, destreza social.

O cristianismo acrescentou-lhes, fé, esperança e caridade. A Burguesia do século XIX acrescentou-lhes as virtudes secundárias: ordem, aplicação, limpeza, pontualidade, etc. Hoje, a sociedade europeia parece esgotar-se na virtude da abertura e da tolerância esquecendo que estas são virtudes secundárias de outras virtudes oprimidas por uma sociedade demasiado preocupada com o pragmatismo político.

O homem no decorrer do tempo histórico foi deixando as marcas do seu desenvolvimento ou reacção às experiências sociológicas e antropológicas prévias.

Ética da lei

Na tradição judaico-cristã vale a orientação pelos dez mandamentos, em especial o amor ao próximo e a Deus (Mat. 22,37-40). Não se trata aqui de preceitos exteriores mas de configurações internas fluidas, não empedernidas na letra mas a serem sempre actualizadas pela atitude sempre nova e viva. A referência cristã mais que de um livro ou norma é a pessoa do JC. A ideia base é a igualdade de todas as pessoas baseada na semelhança de toda a humanidade com Deus. Friedrich Nietzsche lamenta a herança cristã dizendo: “Na igualdade das almas perante Deus é dado o padrão de todas as teorias dos mesmos direitos para todos”.

A ética muçulmana, essa sim, é uma verdadeira ética da lei ou do livro que dificulta qualquer teologia porque Deus se formaliza no Corão não dando lugar à teologia, quase se esgotando na jurisprudência.

Ética do dever – orientação pelo senso comum

Kant criou a ética do dever como um tipo especial da ética que se fundamenta na racionalidade humana. Para o filósofo o dever é claro e incondicional; a acção não depende de condições pelo que se torna num imperativo categórico desde que o modo de agir possa ser generalizado e a dignidade e liberdade da pessoa respeitada.

Os estoicos já tinham ligado a moral ao dever, fundamentando-a na ideia do direito natural, baseado na natureza e que tinha como objectivo o domínio dos afectos e do prazer. Seguir o prazer pressuporia desconhecer a essência do próprio ser; para o estoico, é sábio e livre quem ultrapassa a felicidade e a infelicidade; para ele tudo é indiferente. No outro polo desta filosofia encontrava-se o epicurismo.

Ética do útil (Utilitarismo)

Epicúrio (um 341 a.C.) centrava a ética no proveito individual dirigido para a felicidade e o prazer. Pretende fomentar necessidades que maximizem o prazer e o mundanismo radical. Enquanto para Epicúrio o objectivo era a felicidade individual, para os anglo-saxões era a felicidade do grupo.

Nos países anglo-saxões (Bentham, 1748-1832) o critério de avaliação da acção é o princípio da utilidade para todos os participantes. Bom é o que é útil para todos; a diversidade das necessidades individuais não conta grande coisa.

Segundo O. Höffe a ética utilitária inclui 4 princípios: o princípio das consequências (não interessa a atitude mas os resultados para decidir da acção); o princípio da utilidade (a avaliação das consequências orienta-se pelo bem abstracto, trata-se de consequências úteis); o princípio do prazer (o fim último é a felicidade, bom é o que dá prazer e traz alegria); princípio social (não conta a felicidade individual mas a de todos).

O utilitarismo favorece o direito das maiorias. Hoje, o fim não pode justificar os meios, estes têm de ser aferidos pelos direitos fundamentais do Homem.

Ética da responsabilidade

O agir responsável pensa nas consequências que a acção actual tem para as próximas gerações. O ser humano tem de julgar ética e moralmente as consequências da sua maneira de agir. Não se pode fazer tudo o que se pode, embora a técnica o possa permitir, a vontade tem limites se quer assumir responsabilidade e garantir sustentabilidade. A ética da responsabilidade presume uma educação para a liberdade; uma educação que não instrumentalize o medo como meio de tornar o Homem maleável e funcional no sentido das instituições actuais.
Continua em “Ética da Responsabilidade pressupõe a Educação para a Liberdade”
©António da Cunha Duarte Justo
Jornalista e Ex-professor de filosofia aplicada
www.antonio-justo.eu