ALEMANHA SOCIALMENTE EM ESTADO DE REVOLTA

Atmosfera de Combatentes opinativos contra Combatentes opinativos – Perigo de uma Democracia contra cidadãos

Três quartos dos alemães estão insatisfeitos com o governo de “coligação de semáforos” (SPD, FDP e Verdes); apenas 15% estão contentes com o SPD, 12% com os Verdes e 5% com FDP (1).

Segundo o portal Statista (2), se houvesse eleições federais agora, o SPD ficaria com 13%, a CDU/CSU 31%, os Verdes 14%, o FDP 4%, a AfD 22%, a Esquerda 4%, os Eleitores Livres 3% e os restantes 9%. Isto desconsola profundamente os partidos do arco do poder que veem o seu poder em perigo; agora, com unhas e dentes, tentam mover todo o povo contra os votantes da AfD, partido da extrema direita.

A população alemã encontra-se esgotada pelas crises, pela impostura governamental e cansada do “alarmismo persistente, da agitação, da estratégica de pintar as coisas a preto e branco e do facto de até os partidos democráticos se tratarem uns outros com um desrespeito perturbador. É hora de algo mudar! “, queixa-se o diário Augsburger Allgemeine, a semana passada.

Como as manifestações do fim de semana (20 e 21 de dezembro 2024) mostram com cerca de 900.000 participantes, a democracia parece firme, mas ao pedir a proibição da AfD com o argumento de se proibir o fascismo não é apenas infame, mas também antidemocrático. Deve-se ter em mente que a AfD já tem assento em muitos parlamentos. Dividir para governar faz parte da velha visão de mundo. Ambos os lados jogam e discutem principalmente com base em suposições. As pessoas querem lutar contra a “ideologia parda”, mas lutar também fomenta a resistência, como se pode ver com o militarismo e a militarização na nossa sociedade e suas consequências na mente e na influência do agir das pessoas. Manifestamo-nos contra, principalmente contra suposições, mas não contra a guerra. A nossa NATO também está agora a provocar manobras com 90.000 soldados na fronteira da Rússia. Seria chegada a hora de se refletir sobre verdades desagradáveis.

Eu, que acompanho de perto a vida política e cultural alemã há quarenta anos, nunca vi nem imaginava a possibilidade de vir a ver uma Alemanha tão agitada, emocionalmente aquecida e desequilibrada. O ambiente social é muito desconfortável (A movimentação das massas pelos media e políticos torna-se assustadora podendo permitir a conclusão que a opinião das populações é facilmente manipulável – Medidas Corona, Ucrânia, etc. – fenómeno este que desresponsabiliza também a histeria popular de outrora em torno de Hitler). Tem-se a impressão que a Alemanha e com ela a Europa estão imitando a polarização dos EUA. Todos parecem estar contra todos e com o argumento aparente de que todos estão preocupados com a democracia.  Vive-se uma luta que sofre de hipocrisia porque não se trata de uma luta por resolver os problemas do país nem tão-pouco de uma discussão temática objectiva, mas apenas de uma luta por defender posições de poder, o que tristemente concorre para desacreditar a Democracia.

Como expressão de tudo isto temos: Personalidades de partidos de esquerda e de direita descontentes a formar partidos alternativos (o partido de Wagenknecht quer a esquerda mais no centro  e Maaßen pretene fundar um partido mais conservador que a CDU); AfD (Alternativa para a Alemanha) contra a imigração e os meios de comunicação contra a AfD; camponeses contra o governo, supremo tribunal contra medidas do governo; Alemanha contra a Rússia, governo contra os “palestinenses”; habitantes sobretudo muçulmanos contra Israel;  luta entre três partidos da coligação governamental (SPD, FDP e Verdes), manifestações políticas e laborais. Temos também muitas pessoas contra o governo queixando-se que ele segue ideologias globais e não se preocupa com o próprio povo; por seu lado o governo cala e não responde.

A Coligação mudou de curso e encontra-se numa recessão que favorece extremismos.

A população baloiça insuspeitamente na onda das páginas dos jornais e do tempo; juntou-se o populismo dos de cima ao populismo dos de baixo. No meio de tudo isto há muito boa gente a viver da cólera oportuna e aclimatada.

O povo incitado manifesta-se nas ruas ou recolhe-se dentro das quatro paredes da própria casa. Na “rua” e na arena pública só se notam combatentes opinativos contra combatentes opinativos e todos eles com o rei na barriga. Enfim, uma atmosfera própria de guerra em que o barulho atordoa a inteligência. Muitos já renunciam a ver televisão ou a ler os jornais.

Os regentes da EU que parecem ter renunciado à Europa puxam a si os lençóis e depois admiram-se que o povo se queixe do frio! O facto de o povo reagir é um grande sinal de desenvolvimento porque o povo é inocente e como tal desejoso de paz.

A solução seria utilizar os partidos estabelecidos para prosseguirem políticas baseadas na vontade do povo e numa discussão de tópicos factuais. De louvar é o empenho de um povo que à sua maneira demonstra que a política não lhe é indiferente. Por isso por vezes se tem a impressão que os políticos alemães têm medo do seu povo quando o que os devia mover deveria ser a responsabilidade pelo bem comum e o respeito!!

No meio de tudo isto só ajuda o bom humor. Numa atmosfera provocativa com respostas provocantes há que contar com violência contra violência. Numa sociedade alemã que antes parecia madura chega-se a ter a sensação de que a democracia chegou a um ponto de virar as pessoas contra as pessoas chegando-se a um estado ambivalente de ver democracia contra democracia. Isto num país europeu com tanta influência torna-se preocupante. Por outro lado, a Alemanha tem estofo suficiente para aguentar até grandes ondas revoltas devido à sua estrutura orgânica de Estado com uma Constituição resistente a ventos ideológicos.

Minha Alemanha, quem te viu e quem te vê!

António CD Justo

Pegadas do Tempo

(1) https://www-berliner–zeitung-de.translate.goog/news/umfrage-drei-viertel-der-deutschen-mit-ampel-koalition-unzufrieden-li.2176571?_x_tr_sl=de&_x_tr_tl=pt&_x_tr_hl=pt-PT&_x_tr_pto=sc&_x_tr_hist=true

(2) https://de.statista.com/statistik/daten/studie/953/umfrage/aktuelle-parteipraeferenz-bei-bundestagswahl/

(3) Novo partido na Alemanha: https://antonio-justo.eu/?p=8945

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Publicado por

António da Cunha Duarte Justo

Actividades jornalísticas em foque: análise social, ética, política e religiosa

15 comentários em “ALEMANHA SOCIALMENTE EM ESTADO DE REVOLTA”

  1. A globalização e a posição europeia quanto à guerra na Ucrânia só podiam levar a isto. O atual chanceler alemão é um anedota. A vassalagem aos USA um suicídio. O hostilização dos benefícios da energia barata russa um desastre . O motor da UE gripou. O mundo em que vivemos até final do séc. XX já era, é passado e faz apenas parte da história! Os políticos Europeus e Mundiais são medíocres. A crise social vai agravar- se. O futuro dos povos está hipotecado! A UE é uma instituição com défice democrático: os seus órgãos não são eleitos por ninguém, sãos negociados nos areópagos do poder ; o único órgão eleito, o Parlamento europeu não decide nada ! Tudo incompreensível e inaceitável.

  2. A globalização e a política de centralização de Estados têm sido realizadas sob a perspectiva do interesse de elites contra o viver das pessoas e contra a importância das regiões que são os meios onde vivem as pessoas! E nós encontramo-nos numa das maiores viragens da história. Dividir para governar faz parte da velha visão de mundo, mas os políticos continuam repetindo as velhas mantras; o mundo da Internet tem vindo a desmonopolizar o saber e isto cria primeiramente desorientação nas pessoas e ao mesmo tempo muitas dores mas estas não são mais que as dores do parto da passagem que está a parir uma nova consciência de caracter mais humano porque muito abrangente na perspectiva de uma nova cultura social do nós e do uns com os outros (e não uns contra os outros). Às guerras em via e ao militarismo como crença dos Estados opõe-se uma nova consciência nascente e que indirectamente vem repor a nobreza da consciência cristã já não como cristandade, mas como cristianismo. Infelizmente a União Europeia não se fundamenta nos valores genuínos da Europa expressando-se apenas em termos económicos e de poder! Temos uma Europa e democracias sem alma e isto leva à entropia.

  3. Um dos pilares mais fortes da Europa, em desmoronamento!
    Impensável, há muito poucos anos!!!

  4. Mafalda Freitas Pereira , penso que depois que se deu o Brexit a Alemanha sentiu-se desapoiada e especialmente com o conflito geopolítico a desenrolar-se na Ucrânia determinou ser apenas um apêndice dos Estados Unidos e deste modo atraiçou a Europa em favor do mundo anglo-saxónico…

  5. António Cunha Duarte Justo : não concordo consigo. A evolução da situação económica e política na Alemanha nada tem a ver com o Brexit do Reino Unido. Tem mais a ver com a vassalagem aos USA e as consequências da guerra na Ucrânia.

  6. Nuno Moreno , isso disse-o no meu comentário! Mas como assisti às reacções da sociedade alemã na imprensa no tempo de preparação para o brexit e os esforços da Alemanha para um entendimento entre EU e Londres, considero-o um factor naturalmente não monocausal, que concorreu para a Alemanha se subordinar totalmente aos Estados Unidos/NATO. O eixo Berlin-Paris também não tem funcionado como seria de esperar. Quanto à vassalagem foi explicitamente determinada com a viragem da actual coligação governamental. Antes certamente com a chanceler Merkel o jogo era diferente porque tinha que jogar com os interesses da Europa-Alemanha-USA. A Alemanha ainda hoje se encontra vinculada ao tratad “1+4”.

  7. … o que pelos vistos resultou num descalabro para a própria Alemanha.
    É isso? Como será se Trump vai para Casa Branca?

  8. Mafalda Freitas Pereira , creio que o enfraquecimento da própria Allemanha já estava a ser preparado pelos EUA desde há muitos anos. Os Estados Unidos queriam reduzir a potência geopolítica mundial da Rússia a uma potência meramente regional como afirmou distraidamente o presidente Obama; a NATO oferecia-se para os EUA um bom meio de afirmar os seus interesses na Europa mesmo contra promessas feitas a Gorbatscow e que beneficiavam a Europa. Também o boicote dos EUA anterior à guerra contra a construção do gasoduto Nord Stream entre a Alemanha e Rússia e mais tarde sabotado são factos contra a Alemanha e contra a Europa (no meu entender!)! O negóio entre a Alemanha e a Rússia que beneficiava toda a Europa ia estragar entre outras coisas o negócio do filho de Biden na Ucrânia. A Alemanha e a EU que optaram pelo globalismo liberal têm imenso medo que Trump ganhe. Com Trump encontram-se duas concepções de política em confronto e também por isso se fala tanto de Trump.

  9. António Cunha Duarte Justo, a Alemanha tem de entender-se com os países membros da UE. Sentir falta de apoio do Reino Unido? O Reino Unido nunca esteve com os dois pés na UE. Está vassalagem aos USA e o virar de costas a um parceiro económico estratégico para a Alemanha, no setor da energia, só foi e é possível com o atual chanceler Alemão: um anedota ! Todos os povos da UE vão sofrer com as consequências, e muito!

  10. Nuno Moreno, no comentário afirmei: “Mas como assisti às reacções da sociedade alemã na imprensa no tempo de preparação para o brexit” e segui a discussão económica e intelectual, isso levou-me a incluir o aspecto do Reino Unido como um factor certamente não determinante a sentir-se mais só na EU que é um centro onde se jogam interesses e no meu entender interesses mais a favor do núcleo anglo-saxónico do que do núcleo latino! De resto, acho totalmente lógico o argumento que diz relativamente ao actual Chanceler. Pelo que me é dado observar ele deixa-se levar sobretudo pelos Verdes que de partido da paz se tranformaram em partido de guerra. O que ainda não consegui entender bem é ver que a CDU/CSU também apoia a militarização da Alemanha quando, em termos europeus, ela teria de acontecer dentro do concerto dos países europeus com iniciativas de dfesa comuns, penso eu.

  11. António Cunha Duarte Justo, se bem interpretei, penso que com Trump agravar-se-á o que já está tão grave, já que as duas concepções de política em confronto poderão entrar em rota de colisão.

  12. Mafalda Freitas Pereira , penso que se ele ganhasse os Estados Unidos não apoiariam mais a Ucrânia com armas e isso iria provocar grandes problemas para a Europa porque teria de dispender muito mais biliões de Euros do que dispende já agora para a Ucraina para compensar o apoio dos EUA. Por outro lado creio que a importância da geo-política como determinante da orientação do mundo se enfraqueceria revertendo mais no sentido de interesses nacionais. Sim a colisão será mais para os países que em vez de praticarem uma política de relações económicas com todos os países se virão obrigados a criarem alianças económicas não monopolares. Penso que se Trump ganhar os países europeus se virão também eles a pensar mais em si. E até aventuraria dizer que a guerra na Ucrânia acabaria rapidamente e os países europeus ver-se-iam libertos para resolverem os próprios trabalhos de casa que estão ainda por fazer e um dos pontos seria acabar com a guerra europeia das sanções contra a Rússia. Vivemos todos no mesmo barco e importa fazermos todos por nos entendermos. O tempo que apostava nas confrontações com argumentos de ideologias ou valores darão lugar a tempos mais pacíficos. Mas neste sentido não vejo envolvidos Trump nem Biden, a isto leva-me a observação subjectiva dos sinais dos tempos que apontam para um início de uma cultura da paz e não cultura da guerra como o mundo tem seguido no passado.

  13. Estas demonctrações são de grande significado para a Alemanha porque provocam espírito crítico de vários cantos e perspectivas. Importante é vermos e reflectirmos sobre o que as várias expressões em democracia pretendem concretamente para que surja uma consciência mais fortalecedora de um um estado de direito cada vez mais democrático: para isso ajuda naturalmente a concorrência partidária e uma discussão público não partidária. Acho neste sentido esta discussão interessante: https://www.youtube.com/watch?v=0BRNWXm8wQE

  14. António Cunha Duarte Justo, que é feito da Aliança Atlântica ??? Já não está em vigor?
    Difícil senão impossível acompanhar tantas e tão
    complexas políticas que em todo o mundo se alteram muito rapidamente.

  15. Mafalda Freitas Pereira , a NATO é uma aliança militar e no meu entender encontra-se sobretudo ao serviço da Geopolítica nas mãos dos Estados Unidos e como tal dependente da política interna dos EUA (Trump já deu o sinal e a Europa desde então sofre porque tem de pensar ela mesma no seu sistema de defesa), a acrescentar a insegurança veio o conflito militar na Ucrânia e a EU ao seguir fielmente os interesses dos EUA descuidou os seus. Nós porém vivemos demasiadamente preocupados com o momento e com os interesses políticos quando o que determina o mundo é a economia e as finanças e a política encontra-se ao serviço delas. Segundo previsões em 2050 a China será a primeira potência mundial, a Índia a segunda e os Estados Unidos a terceira. Vivemos em tempos emocionantes em que o desenvolvimento se torna observável por nós mortais, quando antigamente as pessoas não assistiam em 100 anos a menos mudança do que nós em dez anos. O importante é não nos deixarmos arrastar pela corrente e observar com humor tudo o que se passa: precisamente por isso. Quanto à NATO li as determinações dela feitas em Espanha: um espírito arrogante e militarista respira delas e nelas se pode ainda respirar a justificação do colonialismo e a legitimação de intervenções da NATO em países que contrariem os seus interesses estratégico (militares, económicos e políticos).

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