A Vida desafia-te no Outro

O que é que a Vida faz de ti e que queres fazer da tua Vida?

 

António Justo

Há meses encontrei um par de amigos embebidos um do outro: Ele esbelto e nobre, todo leão, ela jeitosa e distinta, fazia lembrar uma gata persa. Viveram alguns meses primaveris mas já se nota neles o desgaste rotineiro, com o nevoeiro outonal a apontar para um inverno já sem folhas e com poucos vislumbres de nova primavera. Os dois são personalidades nobres e extraordinárias, jovens ainda! Como todos, sofrem porque não notam que o que querem mudar e combatem no outro é a própria parte (polo) ainda oculta que cada um de nós traz em si, sem se aperceber dela. Homem e mulher são dois polos duma mesma realidade: o Homem integral, a humanidade!

 

Por vezes, perdem-se no jogo das escondidas, num tactear temeroso de interpretação recíproca de gestos e intenções. É certo que o gato, quando quer o carinho de alguém, não se vem logo pôr no colo da pessoa. Primeiro começa por encostar-se às coisas que se encontram em redor dele, para se fazer notar, à espera que se lhe passe a mão, para, poder então, prostrar-se a seus pés. Neste rodeio esconde o seu orgulho e satisfaz a necessidade de maneira formal.

 

Depois das intimidades primaveris estão a acentuar a parte superficial (fenomenológica) do ser (o ego), num jogo fatal de distanciamento e aproximação no tapete do pensamento. Ela ama-o profundamente mas tem medo de ser desiludida duma imagem de homem distante; ele ama-a também mas tem medo da desilusão duma imagem de mulher distante. Chego a ter a impressão que os dois se vingam, um no outro, da mãe (da mulher e do homem) em reparação duma infância inocente perdida. Adoram a mãe em actos de feminidade e masculinidade distorcidas. Nos intervalos lambem as feridas. Enquanto o cordão umbilical subsistir, maior será o desejo de liberdade e maiores serão as estratégias inconscientes para se não libertar da mãe (da fixação num só polo). O corte do cordão umbilical levará à construção dum eu não dependente, dum eu que integra o outro nele mesmo. Doutro modo este será sempre um obstáculo a uma união que se tornaria, inconscientemente, num obstáculo à simbiose primeira e que se quer manter à custa duma autonomia simulada. Na relação, nuns acentua-se mais a necessidade de se definirem pela demarcação, noutros pela simbiose.

 

Os dois sofrem de dores que por mim passaram e passam: as dores que geram a diferença das estações e deixam a voz do vento (tempo) nos corações. Ele sofre porque a queria mas nota que ela resiste a ser à maneira como ele a gera: à sua imagem e semelhança ou pior ainda à imagem e semelhança de suas ideias e ideais. No seu sofrer, ele refugia-se nas alturas intelectuais da águia, cada vez mais distante da natureza e mais queimado pelo sol da razão, não se apercebendo dele próprio, devido a tanto ver.

 

Ela, hipersensível, sofre praticamente da mesma razão. Só que desce ao profundo dos sentimentos e, encharcada de tanta emoção, por vezes, pouco vê além dela, devido ao nevoeiro emocional que a envolve.

 

Se não fosse o problema comum, realizariam neles o paraíso terreal antes da queda de Adão! Um problema conhecido de cada um, numa vida de espreita atrás do tempo à espera do próprio momento. Os dois sofrem como cães de orelhas pendentes e de desejos castigados, e fingem coragem e soberania de um perante o outro: aquela soberania construída que os impede de se encontrarem porque ainda não descobriram os opostos a descobrir, neles mesmos. Concebem a vida e o outro como dia com sol sem amanhecer nem anoitecer. Não seria oportuno adiar a vida numa concepção. Também não chega viver um dia de cada vez! De facto, o nosso futuro pode ser atropelado pelo presente e afogado na cisma de porquês e de soluções!

 

Na ressonância da vivência quero descer à cave da vida e, contigo homem contigo mulher, fazer uma caminhada que é vossa e minha. Quando falo de ti, és tu e ele, ela e tu, e eu também! Em nós se juntam os polos opostos dum acontecer mais abrangente mas que persistimos em esquecer! Esquecemos a lei da complementaridade duma realidade maior  e de que somos uma parte!

 

Para possibilitares o verdadeiro encontro com ele/ela, terás de te concentrar no teu âmago e deixar de viver na e da distracção para te poderes reconhecer no todo e consequentemente nela/nele também. Ao encontrares-te no todo já “tens” o outro que então descobres em ti. Ele deixa de ser objecto, desejo ou projecção. Aí no encontro descobres a humanidade, a tua plenitude, passando a sentir o prazer da ressonância da feminidade e da masculinidade (do eu e do tu no nós), tudo em ti mesmo: os polos que pareciam antagónicos ao serem reconhecidos como parte essencial de ti mesmo geram novas energias e uma criatividade de auto-realização. A mesmidade ilimitada que surge da vivência da essência de si, de Deus e mundo no próprio centro, o eu-nós espiritual, entra na ressonância da relação pessoal e tudo compreende e supera. Então torna-se natural reconhecer a própria vulnerabilidade e nudez e deixar-se envolver e entregar ao outro; então torna-se natural perdoar e pedir perdão, desculpar e pedir desculpa; o perdão limpa e purifica o nosso espírito e fomenta a maturidade e a metanoia. As feridas causadas pelo querer ter razão revelam-se então como sombras que encobrem o outro e não passavam, muitas vezes, de formas de autopunição. Urge pedir perdão também a nós mesmos para podermos reconciliar os opostos e assim viver em paz connosco e com os outros. Torna-se importante pensar e questionar o próprio pensamento, para o poder então sentir. Torna-se importante ordenar a hipersensibilidade para se poder integrar a racionalidade do outro. Como se vê, somos todos muito iguais e muito diferentes; somos constelações onde acontece e se cruzam o eu, o tu e o nós.

 

Contas com o soalheiro da vida alegre mas não com o escuro da dor. A dor, porém, é a brisa que te leva para lá do tu e do eu, o lugar onde o tempo descansa e se perscruta a eternidade. Quando chegas a esse lugar, o passado e o futuro descansam para dar lugar ao brilho da luz imortal a cintilar no teu interior. Quando a chuva cai e o vento norte zune no teu ser, procura descer as escadas da meditação até ao teu interior. Uma vez lá, sentes o calor da energia divina a subir em ti. Então os nevoeiros do medo, da agressão começam a evaporar-se como o orvalho em manhã risonha. A paz e a alegria penetram em ti e tu emerges num agora eterno. Então as preocupações, desejos e receios não passarão dum bater distante de ondas à superfície dum mar profundo. Nesse oceano a minha alma ganha asas, chora, fala e canta e leva-me com ela ao cimo da montanha donde avisto o meu corpo, o meu ego, e sinto uma força maior que o puxa.

 

Na dificuldade, reservo alguns momentos para mim e começo por inalar a força positiva, a graça divina, que sinto a soprar em mim. Então o meu eu profundo e superior (ipseidade) – a minha permanência e a subsistência do mundo em mim – ilumina as dificuldades. Passo do pensamento e das sensações para o estado da intuição. Aí na cave do meu ser surge a fonte do bem e a energia da afirmação que transforma a disposição negativa em humor positivo fazendo reconhecer e sentir o aroma e o colorido da vida. Aí inspiro o bem, o belo e o amor num exercício de autossugestão que me leva a sentir o amor universal. Passadas as camadas do ego entro no meu âmago que participa do ser divino, o meu eu espiritual. Neste estado da minha ipseidade brota a vida eterna, a sabedoria e a força – a vida divina envolta no meu ser terreno.

 

Para embarcar e me compadecer com o outro com Deus e com o universo, não chega a introspecção, o discernimento; também é necessária a fé: a força positiva ascendente. No fluxo dos acontecimentos também o JC (Jesus) desceu aos infernos onde se encontram os indefesos e desamparados para os levar ao bem. Também eu, também tu descemos com ele para nele erguer a vida.  A experiência da paciência revela que tudo passa e que a graça, a benevolência, tudo sustenta. O desânimo leva-nos a olhar para o chão, prendendo-nos a ele. Fomos, porém, feitos para andarmos direitos e quando caímos nos levantar. Se, por vezes, nos encontramos encerrados na caverna, ao interiorizarmos a paciência do silêncio, notaremos o sol que nela entra e nos puxa para o alto.

 

O desapego das ideias e das coisas, como ensinavam os padres da igreja, ajuda a suportar a bagagem dos medos, desejos e preocupações que a vida traz consigo. Ao descermos ao interior da natureza entramos em sintonia com o universo reconhecendo nela e em nós o sol e a sombra dele num jogo alegre com o destino. Se as sombras da frustração desanimam, o perdão dá consolação e paz. A água da vida com as suas ondas, que à primeira vista nos parece avassalar e empurrar para a margem, também nos suporta se tentarmos mergulhar no seu interior.

 

O sol brilha para todos. Quanto mais abrirmos as folhas do nosso ego (autoestima exagerada), dominando-o, mais o sol penetra e dá cor à folhagem da nossa vida fazendo aquecer e pulsar o nosso coração. Então os estames brotam do nosso gineceu, o pólen voa e a seiva corre. A sombra das ideias negativas, as preocupações materiais e espirituais afrontam-nos e muitas vezes nem notamos que o que traz o dia é o Sol.

 

Em tempos escuros, entro no silêncio do templo e, aí, aceito as dores do corpo e das emoções e, ao orar, esses laços se desfazem passando a sentir uma realidade nobre. Então as tempestades das ideias observadas do interior perdem as forças das suas ondas e o intelecto transforma-se num mar calmo. Aí já não guio a vida mas a vida guia-me em mim. No meu interior abre-se uma porta que dá para o jardim do silêncio onde vive a sabedoria. Dele surge a força que arreda a dor. Chamaria a esse lugar, o jardim da Trindade onde o material e o espiritual, a tristeza e a alegria se encontram em acção inspirada e não na reacção. Uma vez chegado ao átrio do silêncio notas todas as forças em oração e sentes os entretons e riqueza de bemóis e sustenidos para lá das vozes do ego. Aí no teu interior sentes o “Reino de Deus”, a verdade em ti. Então, sentado à margem da ipseidade já longe das lutas do ego ouves o rumor do mar e do tempo a dar consolação. A natureza levanta-se e anda e seu coração brilha e pulsa no Sol que chama toda a flora a erguer-se e a segui-lo. Então Deus fala, tu e ela, ela e tu, nós, com Deus, participamos do mistério. Deus beija a terra no Sol e beija o Homem na inteligência. Então no encontro com a natureza, Deus reza em nós, para lá do nosso estádio de deserto, savana ou floresta virgem.

 

A dor e as dificuldades são a nossa escola. Quando à noite me envolvo no universo, apagam-se as luzes do meu orgulho e a nuvem da humildade cobre o deserto do meu ego. Na fraqueza sinto o surgir da força universal que me suporta e traz ao colo. Sinto então a energia das ondas em mim, o outro lado da calma. As ondas e o movimento não deixam que a água do meu oceano apodreça. Sim, o sal da vida é doloroso e o desenvolvimento é esforço, mas imagina a água do mar sem sal nem movimento… O azedo faz parte da vida; ele é o sal que a tempera e lhe proporciona duração.

 

Tenho de procurar a verdade tal como o botão procura o sol no verde para poder brilhar no colorido das pétalas. O que muitas vezes espero do outro é simplesmente a satisfação do meu ego, aquilo que o rebaixa a ele e me opia a mim. Tal como o verde das folhas se perde para ressuscitar nas cores da flor assim deve morrer o meu ego para poder ressuscitar na realidade do novo Adão (o meu eu profundo e nobre). Uma vez transformado o ego, encontro-me no chão da divindade onde se encontram as pessoas da trindade: ela, tu e eu, no nós abrangente do Paráclito. Aí a dor passa a ser o tempero e o movimento a relação entre incarnação e ressurreição. (Para mim, a Trindade é a fórmula da realidade toda numa). À desilusão na vida emocional e à dor na vida corporal segue o louvor (agradecimento) na vida espiritual. A cruz apenas me acorda da matéria para o espírito. É necessidade inerente à vida onde o sol brilha e Deus nos sustém. Quanto mais alto fica o monte do calvário mais se avista da vida. A felicidade não se encontra ao nível do pensamento porque este é alérgico à dor e esta encontra-se no seio da natureza tal como o sangue no nosso corpo.

 

A vida é feita de dor e alegria, como o dia contem a noite. Dor e alegria são mais que experiência; são condição vital. A fuga à dor é uma força instintiva do ego; é prisão à concupiscência sem compreender a necessidade da prisão do ter pena de si mesmo. Por trás dos acontecimentos há energias. Muitos ideais religiosos pretendem uma reacção positiva a diferentes situações. Autonomia e autoestima são valores de inter-relacionamento numa realidade do nós em que floresce o tu e o eu.

 

As bofetadas do destino estão em relação com o ego, a zona inferior do ser. A chave para se apagar as dores exteriores encontra-se no interior do coração. A força e a vontade exercitam-se resistindo à fraqueza.

 

Não reajas ao primeiro estímulo ou à primeira ideia; espera um pouco, conta até dez, não resignes. Se sentes ódio, imagina o sol do perdão que abre o horizonte. Sofre com o outro a dor que ele talvez ainda não sente. Tem compaixão – essa qualidade de sofrer e se alegrar com a natureza no outro. Se te queres superar, ora; na oração – também na oração secular – encontras a ressonância do todo no louvor e no perdão.

 

Há dias, uma pessoa amiga de 35 anos, em S. João da Madeira, pedalava numa bicicleta, quando seu coração deixou de bater. Caiu para o lado, deixando dois filhos, de três e cinco anos, uma mulher e uma grande casa. A dor subiu às casas deixando, banhadas em lágrimas, a família e amigos. O meu amigo Toninha “desceu aos infernos” banhado em lágrimas para depois “subir aos céus” e nos poder receber com um sorriso, a nós que lamentávamos a morte do seu filho.

 

A dor extrema leva-nos ao conhecimento último sobre a realidade da vida. No centro do eu profundo, o instinto e o ego são iluminados. Nestes momentos nem a religião apresenta solução para o mistério da vida, apenas ajuda a recuperar energias para novas etapas num processo de contínua mudança que pressupõe um contínuo repensar e metanoia. Em momentos trágicos, só o espírito pode mover as energias latentes em nós. Humildade e paciência são o plinto para se superar a frustração, o medo e a dúvida. As ventanias do destino obrigam-nos a agarrar-nos ou a deitar-nos ao chão para depois nos erguermos. É a lei da vida. Também as rajadas do Outono tiram as folhas velhas das árvores para darem lugar a novas.

 

Resta-nos a generosidade e a compaixão. Faz bem a quem te faz mal. Ao perdoar, domestico o próprio ego. Na compaixão lavam-se as feridas da lembrança e regeneram-se as lágrimas engolidas. “Perdoai, como nós perdoamos”, diz o mestre da Galileia. Endurecimento é lei da matéria mas não do espírito. É preciso mudar a configuração da vida para poder mudar-nos a nós e mudar a sociedade.

 

Como a natureza segue o sol também nós temos de formar a vontade, uma vontade superior com uma meta teleológica a atingir. Para isso teremos de começar por nos perguntar o que queremos fazer da vida e o que a vida tem feito de nós. Para seguires a vontade superior teremos de depor as armas do ego, que são as armas da convicção e do querer ter razão numa realidade descontextuada. Teremos de entrar na ressonância universal. Para isso, além de procurar o bem é necessário entrar no relaxe corporal e espiritual, exercitando a fé integral. A resistência encontra-se em nós procurando fazer passar toda a energia da vida pelo pequeno fio de resistência que é o nosso ego (eu inferior). O ego serve-se das muletas do pensamento e do sentimento filtrando tudo à sua medida, encrustando a dor. Debaixo das ondas da dor descansa imperceptível a vida interior.

 

É preciso penetrar para lá das crustas físicas, mágicas ou mentais que constituem as órbitas do ego, para poder entrar em esferas superiores na ressonância da compaixão com o universo e com Deus que constitui o centro da ipseidade (eu nobre e profundo). Através do caminho da introspecção que conduz à vivência interior, o corpo e o espírito entram em sintonia começando tudo a fluir no amor.

 

Para facilitares o acesso aos reflexos da graça e à paz interior coloca-te numa posição agradável, inspira profundamente (respiração ventral) o sol e o amor e deita para fora a treva, expira os cuidados que tens em ti. Mergulha na energia divina, ela está em ti, está em tudo e cura tudo. Corpo e espírito mesclam-se um no outro. O corpo é expressão do espírito tal como a natureza é expressão do espírito universal. Tudo surge do espírito e se encontra a caminho dele. O universo vive em contínuo dar à luz, tu e eu, nele, também. A Terra regista no seu ser as diferentes regiões naturais/climáticas e também os ventos com as suas altas e baixas pressões que contribuem para um equilíbrio de afirmação e repouso a caminho de nova fase. Também as pessoas variam entre o entusiasmo e a depressão registando nelas as diferentes mudanças. Constatado este fenómeno comum à natureza e ao estado de alma das pessoas, há que intervir agindo para se não deixar ir na enxurrada de apenas reagir.

 

Amiga, amigo, desce à cave, despe-te da roupagem do ego que te não deixa sentir o calor e a maciez da pele do outro. Confia e confessa-lhe teus entusiasmos e mágoas. Desnudado e paciente transformarás os ferimentos do outro, modificarás aquelas dores que te fazem sofrer a ti e ao outro; elas transformar-se-ão em alegria para ti no outro. Em baixo, no chão da vida, nu experimentas a energia universal. Então sentes a energia do movimento de rotação e translação a convergir em ti e te descobrirás, com o outro, a caminho do ponto Omega de Teilhard de Chardin. Aí se junta a energia masculina e a energia feminina num só ser, o ser adulto. Então as ideias negativas, que são o veneno do sentimento e do pensamento criam novos espaços novas atitudes, salvando-vos um ao outro. Então os géneros não se juntarão para se afastarem. Um não quererá mudar o outro; não será mais professor um do outro, mas sim aluno um do outro. Um é a oportunidade existencial do outro para se poder desenvolver.

 

Desce à cave mas descobre, ajoelhado (a), em oração, na nudez assumida, a causa da resistência dum ao outro que impede a mudança para uma nova acção. Pela nudez passa e corre a água salutar que em vós jorra.

 

Enquanto o ego for movido apenas pelas forças centrípetas da inteligência e da emoção o eu adulto e o outro serão desvirtuados. Então seríamos meteoritos, que embora brilhantes, se encontram em queda livre, à margem das forças ordenadas nas órbitras da criação, faltando-lhe a ligação ao espírito do todo que tudo sustém (trindade!).

 

O Filho do Homem veio em Jesus e no Cristo e nós realizamo-lo também. Nele e em nós se reúne a deidade à criatura. Esta é a perspectiva: agir, ser senhor/a, e não apenas reagir como faz o escravo/a. Até a Terra reconhece que não é autónoma, reconhece e dá lugar ao Sol no seu ser. Fazemos parte duma ordem universal e do mistério para o qual importa orientar o nosso saber e sentir. Se entrares em ti, no âmago do ser, o espírito te guiará e não o ego. Não te tornes dependente; tens a gene do divino. Aceita a ordem universal a que pertences, não te tornes satélite e menos ainda meteorito. Não te sobrecarregues nem sobrecarregues o outro. Cada dia traz, para cada qual, a sua carga e esta já é suficiente.

 

O fatalismo tal como a liberdade da vontade são verdades condicionadas. Não podemos andar sem meta. Como o dia, trazemos em nós o sol e a noite, a alegria e a dor, a transitoriedade e a eternidade. Nós somos o sentido do ser!

 

Antes de tentares mudar alguém ou criticar uma situação ou nega-la pergunta-te primeiro qual é o ensinamento que ela te quer dar. Admite as leis da vida. Não fujas nem fiques na câmara escura do teu ser. Reconhece a luz. Se te orientares pelo espírito as mazelas perdem o brilho que o ego lhes empresta. O bem vence sobre o mal embora aparentemente pareça o contrário.

 

A dor duma pessoa centrada no ego (em si mesma) é mais forte porque não tem sentido. Só o tempo a apaga. O que se encontra nas esferas do espírito ultrapassa o tempo, conduz a uma maior consciência, uma compreensão integral dum todo complementar; nela se experimenta o sentido profundo da vida que não se pode confundir com o sentido dos remos que a empurram.

 

A dor pode purificar o ego egoísta no sentido duma identidade superior. O ego identifica-se no acontecimento e perde-se na percepção do mesmo. As vivências e experiências são oportunidades para dominarmos os acontecimentos sem nos tornarmos vítimas deles. Para isso, é necessário andar de braço dado com a vida no bem e no mal, para ir mais além.

 

Se desejas mudança em ti terás de mudar o teu ambiente, se desejas a mudança do outro tens de te mudar a ti primeiro. Sem mudança não há futuro e o presente não passa de recordação! A decisão é tua.

 

Quanto às feridas que uma pessoa tem é necessário deixá-las cicatrizar, doutro modo, quanto mais se arranha nelas mais elas sangram e se apoderam de ti. Se se torna difícil colocar os vestidos no cavide, por outro lado, também a nudez não é inocente…

 

Se queres ser tu, tenta pensar e agir a partir do nós! Nele fomos criados e a ele voltamos! De resto, “ama e faz o que queres” (como dizia já Santo Agostinho)!

 

António da Cunha Duarte Justo

antoniocunhajusto@gmail.com

www.antonio-justo.eu

Portugal não deve tornar-se o Cristo da Europa e do Turbocapitalismo

Os Erros feitos por todos devem ser sanados em Comunhão

António Justo

Entre os muitos E-mails de felicitações pela “Carta aberta de um Português a Ângela Merkel” houve um que via na “carta” uma “postura de joelhos” perante a Alemanha.

 

Portugal é talvez, na Europa, o país que mantem mais vivo, no seu inconsciente, o espírito europeu, de que foi pioneiro na época dos descobrimentos.

 

Portugal encontra-se, de facto, ajoelhado, a nível internacional, cumprindo uma penitência semelhante à que vem do pecado original mas de que se não pode limpar simplesmente.

 

A opinião pública, isto é, publicada   nos Media da “opinião correcta” europeia e em Portugal, não me parece adequada à seriedade da crise que enfrentamos. Ela perturba o espírito aberto e universal português, ao afirmar-se contra atitudes de tendência “racista” mas, ao mesmo tempo, dando relevância ao preconceito.

 

O problema de Portugal é estrutural e faz parte da crise europeia. Aquilo que leva muitas pessoas a esperar por um D. Sebastião é naturalmente a má situação em que se encontram e o irracionalismo da política europeia e portuguesa.

 

Naturalmente que se tivermos em conta as dívidas dos Estados europeus, Japão e USA, a coisa mais viável será, um dia, a catástrofe económica de todos; em nós (sul), o sintoma da doença comum é mais visível e os predadores do mercado vingam-se mais ainda, na sua caça, nos que não têm pernas tão boas para fugir.

 

Se Portugal reflectisse sobre o que lhe é genuíno (Guimarães, Sagres, crença original), aquilo que o fez grande, teria ainda muito a dizer à Europa e ao mundo. Daqui deveria partir o que urge fazer na Europa e que a poderia unir: os valores originais da cristandade (Síntese do espírito judaico, grego, romano e bárbaro), valores humanistas universais e um coração onde todo o mundo e todos os povos pulsam. Doutro modo continuarão a espalhar-se os espíritos de antanho que tinha guarida nos castelos: o poder e o controlo! Temos que reconhecer que a EU ainda não apresenta uma verdadeira alternativa aos Estados nacionais. Os USE não se devem perder de vista!

 

O Problema de Merkel é ser, também ela parte do problema, um elemento ao serviço do adiamento da catástrofe comum, dum sistema europeu corrupto beneficiador da anonimidade e das multinacionais. Como pode um português concorrer com a alta tecnologia alemã e como ordenado dum chinês de 50 Cêntimos? Isto foi querido pelos grandes!

 

“Em 1953, a Alemanha …ficou sem dinheiro para fazer mover a atividade económica do país – tal qual como a Grécia atualmente”. Os países credores internacionais (entre eles a Grécia) tiveram consideração pelos problemas de reconstrução da Alemanha e facilitaram-lhe a recuperação económica mediante renúncia a parte dos créditos. A Alemanha deveria ter isto em conta possibilitando aos países do sul capital suficiente para poderem mover a sua economia. Naturalmente, não se pode tornar na fiadora de todos os países carenciados e menos ainda em seu bode expiatório! Importante é que a Alemanha seja fiadora para proveito de Portugal e não para que os predadores internacionais assegurem melhor o seu dinheiro, lucrando apenas eles com isso. Importante é também que a balança económica entre países a nível de importação e exportação seja equilibrada, favorecendo-se uma maior importação dos países deficitários. A Troika exige reflexão e mudança mas apenas no seu sentido. A EU é irreflectida e em muitos aspectos antieuropeia. A Alemanha investe muito mais nos imigrantes turcos do que nos imigrantes doutras nacionalidades. Investe onde vê contrapartidas económicas (grande mercado turco) mas neste caso privilegia precisamente aqueles que são contra o espírito europeu! A mera consideração económica sacrifica valores civilizacionais que depois faltam para se conseguir um consenso baseado no génio europeu. Acusam-se os países do sul de consumirem mais dinheiro do que o que produzem. Por outro lado o banco central europeu cria notas do nada para apoiar apenas os bancos e os que com eles jogam.

 

A emigração da indústria empobrece ainda mais os países do sul. Encontramo-nos numa fase em que as pessoas são preparadas para afirmarem a “opinião correcta” publicada e para se renderem incondicionalmente a poderes anónimos: o fascismo com a sua promiscuidade entre Estados e capital afirma-se cada vez mais no inconsciente europeu. A nível internacional tem-se espalhado na opinião pública um socialismo rasteiro, um turbocapitalismo totalitário aliado à ideologia árabe sem alguém que apresente observações razoáveis ao que acontece. O problema do futuro da Europa e de Portugal é uma questão moral e de princípios. Aqueles que nos aparecem como inimigos não o são, na realidade. Nós é que somos demasiado fracos e permitimos que eles avancem.

 

Os países do sul encontram-se num beco sem saída. Portugal deveria recusar-se a pagar as dívidas. Os credores ao exigirem juros exagerados assumiram também o risco que qualquer fiador corre. Porquê esta promiscuidade entre Estados e bancos? O pior que Portugal poderia fazer seria aceitar renegociar as dívidas, como fizeram impensadamente os Gregos. Através das últimas negociações responsabilizaram a nação grega e assumiram a responsabilidade, a posteriori, também pelos causadores do desastre de que também eles são vítimas, coisa que não estava prevista nos acordos anteriores. Com os novos asseguraram os seus direitos os dinossáurios financeiros internacionais.

 

Não questiono a escolha das elites, o que questiono é a mentalidade que as envolve e o facto da generalidade dos que as escolhem se encontrarem demasiadamente condicionados e longe do acontecer económico e político para poderem formar opinião à altura do problema. A opinião pública corresponde à opinião publicada e não à realidade factual!

 

Não me ajoelho perante Merkel mas pelo que oiço na imprensa portuguesa e agressões latentes em muitas pessoas, preocupa-me, o espírito que chega a atingir, por vezes, a expressão racista. Estou bem consciente de que o que acontece agora nas margens da Europa atingirá também o centro; a intensidade da crise será só uma questão de tempo. A irresponsabilidade como Mário Soares e outros falam, que deveriam saber um pouco mais do que o geral da população, é preocupante; isto leva-me a apontar, em artigos de perspectivas diferentes, para a complexidade do problema.

 

O problema europeu, para mim, é uma questão de consciência/identidade europeia que tem actuado sem uma ética de base, e por isso decadente. Destrói sistematicamente a herança judaico-cristã e greco-romana em favor duma ideologia pragmatista, bárbara,  sem tecto metafísico que a cubra. Portugal segue a mesma onda de derrocada e de abdicação que a Europa segue, perdendo, deste modo, qualquer autoridade moral para chamar a atenção da Europa para os seus grandes ideais atraiçoados. Compreendo a queixa de Portugal mas não o que faz para se recuperar os valores que o tornaram grande, como civilização.

 

Ao observar o discurso do dia-a-dia ganha-se a impressão de que “casa em que não há pão todos berram e ninguém tem razão”. Neste momento difícil em que nos encontramos seria importante a activação da inteligência emocional para não cairmos no preconceito banal.

Naturalmente que a Alemanha tem sido muito radical e unilateral nas exigências que tem feito. A política e as instituições europeias têm falhado e poem os custos dos erros institucionais na conta do povo e dos países desprotegidos. De facto, em nome do bem-comum, os Estados europeus encontram-se atolados pelo próprio paternalismo e têm aturdido o povo com a opinião publicada; os portugueses têm aguentado corajosamente as investidas dum turbo-capitalismo radical e desumano. Quem mais se aproveitou das instituições e mercados comunitários terá de assumir responsabilidade e também  ceder a muitas das exigências de países que se encontram na eminência da falência.

 

O facto de Merkel não ter razão (por só adiar a derrocada em que nos encontramos), a crítica que se lhe faz também não é razoável. Não se constrói uma USE sem compromissos vinculativos. Uma crítica a fazer-se terá de ser dirigida aos proteccionismos que protegem os países e as firmas mais fortes e destroem empresas e países sem capacidade investidora. Os paternalismos nacionais chegam a usar os dinheiros dos impostos para subsidiar interesses de multinacionais farmacêuticas, etc. impedindo assim uma concorrência leal.

 

Os países fortes subsidiam fiscalmente as suas empresas, o que países menos fortes não o fazem e isso cria uma situação de desequilíbrio na concorrência das economias entre países. As empresas ainda rentáveis para os Estados pequenos são-lhe tiradas em nome duma privatização que não é leal dado vir encher apenas os bolsos dos predadores do alheio. Destrói-se assim a classe média e a colectividade. A legalidade em que se baseia a EU com a sua Troika está ao serviço da imoralidade de elites anónimas que engordam à custa do mal que fazem a outros.

 

Países em perigo de falência pensam que se a Europa alterasse os critérios de convergência de défice de 3% para 5%, relativamente aos critérios de convergência, resolveriam metade do problema! Isto porém concederia uma vantagem também aos povos mais fortes e apressaria a derrocada conjunta.

 

Portugal para voltar a ter o brilho do Ocidente em questões de génio e de identidade ocidental terá de abandonar o jacobinismo de que se infectou com a revolução francesa, terá que trabalhar de maneira a produzir o suficiente para se alimentar sem precisar de recorrer continuamente à emigração usada como credora (com remessas) de uma sociedade que vive acima das suas possibilidades.

 

O espírito português assim como nasceu das gentes galaico-portuguesas do norte, também morrerá com elas. Os ventos de Bruxelas e de Lisboa têm-se revelado contra o génio português!

 

António da Cunha Duarte Justo

antoniocunhajusto@gmail.com

www.antonio-justo.eu

 

CARTA ABERTA DE UM PORTUGUÊS A ÂNGELA MERKEL


Bem-vinda a Portugal

António Justo

Prezada chanceler Ângela Merkel! Também eu lhe quero escrever uma carta, que pode ler durante a deslocação a Portugal! Aqui vou ser benévolo porque o que espero de si é ajuda e a ajuda que nos pode dar é louvar o povo, admoestar as nossas elites e motivar alemães investidores a estabelecerem-se em Portugal. Pedia-lhe também que chamasse a atenção dos portugueses para redescobrirem as suas raízes germânicas (temos no nosso vocabulário cerca de 600 palavras germânicas), uma vertente cultural e de génio que garantiria futuro à nação.

 

Helmut Kohl, seu promotor, dizia: “não quero uma Europa alemã mas uma Alemanha europeia”! Os povos do Sul acusam-na de querer uma Europa alemã. Eles só aceitaram a união da Alemanha sob a condição de esta ser vinculada à Europa. Sabiam que V. Excia. tem um povo muito trabalhador e forte, e que isto poderia vir a criar problemas de concorrência a outros povos não menos conscientes de si, mas talvez menos eficientes, numa Europa das nacionalidades que parece renitente em reconhecer os sinais dos tempos. A Alemanha perdeu a guerra e apesar disso, depois de destruída, com muito trabalho, conseguiu reconstruir-se e posicionar-se de maneira vantajosa a causar inveja aos vencedores. Isto apesar das indemnizações feitas aos vencedores e do apoio que presta a outros povos, o que lhe tem granjeado admiração e simpatia de todos os povos fora da Europa.

 

Naturalmente, de Vossa parte é necessário mais respeito no trato dos parceiros europeus. O preço da paz na Europa não se reduz apenas ao aspecto económico. A paz interna só pode ser conseguida com uma europa social e confiante. A política de subvenções até agora seguida é injusta e como tal fomenta conflitos (a manteiga europeia é mais barata em Marrocos que na Europa); não podemos ter uma Europa protectora do comércio internacional e das suas finanças que não proteja, ao mesmo tempo, todos os seus cidadãos.

 

No dia 12 de Novembro, V. Excia. vem a Portugal. Certamente, não nos vem ler os levíticos porque estes já lhe são lidos na Alemanha, com as acusações que muitos seus conterrâneos lhe fazem, culpando-a de esbanjar com o estrangeiro os dinheiros que os contribuintes pagam, de hipotecar o futuro dos netos da nação, e outros queixando-se que se encontrariam em melhor companhia com o marco alemão do que com o Euro enquanto outros alegam que V. Excia. não faz o suficiente pela Europa, e que quer exportar o espírito alemão para a EU (União Europeia).

 

Não se preocupe, só quem age faz erros e a Europa sofre de velhice pensando que pode viver dos rendimentos, numa altura em que as culturas e os continentes se reorganizam e quem não estiver atento perderá o comboio da História. Hoje que já não resolvemos os problemas nacionais com medidas nacionais, nem através da guerra, precisamos, mais do que nunca, de espíritos lúcidos e sem medo. Numa Europa do relativismo decadente precisamos de pessoas e nações com vontade forte. Portugal e a Europa necessitam de restauração.

 

Nota-se uma desconfiança geral, por toda a Europa, quanto ao projecto de construção dum Estado federal europeu (USE)! Muitos erros têm sido feitos com uma cúpula da EU (União Europeia), longe do povo e das regiões, demasiadamente fixada na economia e no comércio sem considerar a alma que lhe deu o ser e possibilitou o seu corpo. No meio de tantos erros e da complexidade do projecto EU toda a gente barafusta perdendo de vista o projecto supranacional que é a construção daquilo que lhe garantirá o futuro: os USE! Os inimigos de tal projecto aproveitam toda a ocasião para uma crítica destrutiva, agarrando-se só aos erros que têm sido cometidos sem terem em conta os sinais dos tempos e o que urge fazer. Naturalmente que o neoliberalismo que a EU tem seguido é destruidor de microorganismos e de toda a erva rasteira do grande biossistema cultural europeu. Aqui há que arredar caminho, para não criarmos espaço para os dinossáurios especuladores universais, sem abdicar do projecto que urge: a criação dos USE. Cada vez é maior a parte do povo socialmente excluída ou que vêem a sua participação social em perigo. Excluídos da sociedade, perdem o sentido de pertença, tornam-se infelizes e desmotivados a participar. Resignam e vêem-se na necessidade de se defenderem de tudo o que lhe é estranho…

 

Sabe, os meus conterrâneos, ao contrário dos seus (que aprenderam com a guerra), foram habituados a saltar para a rua, ao som de fanfarras ou de palavras de ordem ideológicas, pensando que uma revolução ou uma mudança axial histórica como a que se encontra em via, se realizam em festa e que se resolve o problema acabando com elites, com os “fachos” (pessoas com dinheiro ou posição) confiando que os mandantes lhe assegurariam o pão. Estes porém serviram-se do Estado para eles e o povo só agora começa a acordar. Tinha-se esquecido da experiência de que “quem se deita com crianças acorda molhado”! A responsabilidade do Estado, da nação e do povo está principalmente nas nossas elites, egoístas, sem consciência de povo nem responsabilidade nacional histórica.

 

Senhora chanceler, não se admire, se houver muita gente a fazer barulho na rua falando de tudo menos da própria vida e dos próprios erros. Os que mais reivindicam são geralmente aqueles que melhor vivem e a quem é indiferente a situação do Estado e que, em situações de perigo, tal como os governantes, metem a cabeça debaixo da areia, à imagem da avestruz, marimbando-se para o Estado e para a maneira como vive o povo. Este que pague a conta! Bem comum e povo é, para muitos, um estrangeirismo, ou, quanto ao primeiro, algo estranho e quanto a povo depreciativo! Infelizmente, nós, quando nos referimos ao povo, não entendemos o mesmo que os alemães entendem quando falam de Volk (Povo), e isto é sintomático; nós quando empregamos a palavra “povo” incluímos nela a ideia do coitadinho como se se tratasse da classe inferior, de algo estranho ao ser de Portugal. Muitos dos nossos meninos engravatados da capital, continuam a ser os envergonhados da província, acantonados em Lisboa, renegando as suas origens – a província – não aceitando o f(v)olklore e ostentando o trofeu do doutor, o feitio citadino, como algo que “nos” distingue e eleva da terra e do tal “povo”.

 

Sabe, senhora Merkel, esteja atenta quando fala; as mesmas palavras não têm o mesmo sentido na Alemanha e em Portugal, cada palavra tem o seu cenário de fundo, o seu espírito; a língua alemã é muito concreta, com cheiro a terra e povo e a língua portuguesa também ela completa é porém muito abstracta com cheiro a Corte, precisando de mais intermediários, que se aproveitam do cargo e da interpretação!

 

Para ter uma ideia da urgência em restaurar a mentalidade portuguesa, cito-lhe uma frase que ouvi de uma pessoa amiga que pertence à elite portuguesa, a qual, referindo-se aos cortes que o governo tem em mãos, afirmava convicta: “com os cortes “nós” é que sofremos, o povo, esse já está habituado a sofrer e por isso não lhe dói tanto”. Esta mentalidade levou-nos ao ponto onde nos encontramos, e isto também tem a ver com o que se entende por povo! Sabe, senhora Chanceler, a nossa governação distribui o mal pelas aldeias e reserva o bem nos seus subterrâneos (Bunker) da cidade, cortando cautelosamente nos privilégios dos beneficiados do sistema e tirando desmedidamente à boca dos que vivem com dificuldade (a tal incoerência entre capital e província!). Por estas e por outras, não venha massacrar mais o povo dizendo-lhe que deve tirar mais à boca; venha pedir contas às nossas elites, conceda-nos créditos a baixos juros e mande-nos firmas alemãs para Portugal como nós mandamos portugueses trabalhar para a Alemanha.

 

Doutora Merkel, também os há que são nacionalistas, não patriotas, de esquerda e de direita, os eternos descontentes contra a Europa e há também os indecisos que pensam que Portugal se encontra na África ou na América do Sul e que a salvação lhes virá de lá como nos gloriosos tempos dos descobrimentos! Põem as suas esperanças fora deles e isto é erro fatal. Muitos sentem-na como uma desmancha-prazeres que nos vem acordar de sonhos tão altos e tão belos que nos impediam de sujar as mãos no banal do dia-a-dia. Os governantes sabem que o povo precisa dum tubo de escape para evacuar tanta dor, tanta escuridão tanto fel. Muitos ainda não se deram conta que nos encontramos num momento axial da história e que ou se constrói a federação europeia ou as nações serão esmagadas pelo poder económico doutros blocos, dado, o momento histórico em que nos encontramos, ser a fase de transição da era das concorrências/confrontos nacionais para a era das concorrências/confrontos entre civilizações (culturas). (Naturalmente que em muitos aspectos têm razão nas críticas que fazem contra a maneira como são destruídos biótopos culturais e no facto de se continuar com a estratégia de afirmação de egoísmos nacionais injustos). O período mais longo da História da europa sem guerra é este em que vivemos. A nossa paz no futuro e o nosso bem-comum só poderão ser assegurados por um estado federado europeu (USE), com todos os problemas inerentes ao processo. Não podemos regredir para a época das guerras nacionais. Mas também não podemos deixar destruir o humanismo e os direitos humanos individuais europeus por poderes anónimos e demoníacos em acção. As regiões mais fracas também não podem ser abandonadas aos mais fortes que tudo pisam e atropelam como elefantes.

 

Muitos dos meus conterrâneos aprenderam na época do 25 de Abril que era mais fácil colocar um bom professor na rua do que dar um mau diploma a um mau estudante. Fomos em parte prejudicados por uma fornada de académicos de Abril que passaram a aquecer o seu lugar em postos relevantes de empresas e do Estado (A cunha e o nepotismo tinham muito poder!). A formação foi mais orientada para a carência do que para a competência. Pensava-se que a liberdade e a igualdade eram gratuitas e que a responsabilidade era substituída pela desobriga do partido. Seria importante que a sua vinda a Portugal motivasse as novas gerações portuguesas a adoptarem o modelo de formação profissional e de trabalho alemão. Sabe, chanceler Merkel, ao lado de muitos portugueses espertalhões encostados ao Estado e a sociedades, há muito bons portugueses que trabalham ou emigram para sustentar a má governação já crónica na nação. A culpa não é deste ou daquele partido, o problema é institucional: uma mistura de mofo medieval com jacobinismo da revolução francesa, um verdadeiro vírus da mentalidade moderna portuguesa. Isto não quer dizer que em Portugal não haja grandes cabeças nas nossas elites; não, pelo contrário, só que cada um pensa só em si ou no grupo a que pertence. A massa cinzenta parece não quer sujar as suas mãos.

 

Dona Ângela, tenho um pouco de esperança que o seu empenho pela construção da Europa a leve a evitar que Portugal se torne num achado para o enriquecimento dos dinossáurios das finanças internacionais através de privatizações de empresas significativas portuguesas. Enquanto o Estado alemão salvaguarda, nas suas empresas, os interesses nacionais, Portugal corre o perigo de, com as suas privatizações, só servir interesses internacionais do Goldman and Sachs e de pessoas a eles ligadas. Monstros internacionais querem tomar conta da nossas empresas de energia, águas, saúde, banca, seguros, etc. para através delas ditarem preços aos clientes e ao Estado. É verdade que o Estado alemão e a economia europeia também sofrem com as manipulações do Goldman and Sachs, do Citygroup, do Wells Fargo, e de outros, mas, a RFA, como potência mundial, encontra maneira de defender os próprios interesses entre os grandes porque também eles dependem do seu bem-estar. Nós os pequenos, estamos entregues à bicharada, precisamos de quem nos defenda dos predadores internacionais e dos parasitas de Portugal, até, convosco, aprendermos a andar por nós. Os nossos estadistas têm de aprender a comportar-se como instituições estatais.
Onde há muita luz também há muita sombra! Uma “Europa” que foi a luz do mundo encontra-se na penumbra, confrontada nos seus tenros valores de solidariedade e democracia por pragmatismos desumanos e por mundivisões egocêntricas e anónimas fortalecidas pelo oriente. A RFA sonhava com uma Europa à sua imagem, uma EU estável, soberana, numa Europa das regiões capaz de enfrentar futuros desafios da Ásia e da estratégia troiana árabe.

 

O nosso futuro, não se revela promissor, só deixa prever desilusão e uma vida cada vez mais precária na saúde, assistência social, reformas, trabalho.

 

Eu venho dum „povo de descobridores” que de tanto se fixarem no atlântico e no sonho das ideias altas perdem o solo debaixo dos pés. Falam deste, culpam aquele como se a glória dum descobridor não se pudesse medir com a dum trabalhador. Naturalmente que cada povo tem a sua maneira de actuar. Um Norte mais formiga um Sul mais cigarra; e agora, que o tempo frio da escassez se aproxima, começa a guerra do palavreado. Um porque cantou o outro porque trabalhou demais, cada qual tem o seu arrazoado. Nem a formiga vive só de pão nem a cigarra do seu cantar. A vida é luta e quem pensa que há algo de graça perdeu toda a graça.

 

Na Alemanha, alguns seus conterrâneos dizem que seria melhor que os países com dificuldades abandonassem o euro para assim poderem refazer as suas economias e desvalorizar a sua moeda de maneira a poderem fazer concorrência ao estrangeiro com os seus produtos mais baratos. Outros falam da criação dum euro mole ao lado do forte. Isto significaria marcar passo no desenvolvimento dos USE.

 

Fico triste quando vejo pessoas do meu povo a associar o seu nome ao de Hitler; não ligue, geralmente fazem-no as cigarras não as formigas. Alguns até querem que a Alemanha recomece agora a pagar os desastres da guerra que provocou como se não tivesse havido já as reparações impostas internacionalmente; imagine-se que os portugueses começassem agora a exigir reparações pelas invasões árabes, pelas invasões franceses e os colonizados pelas colonizações…

 

Portugal há já séculos que anda ajoelhado, não por culpa dos outros mas por mérito próprio. Olhamos demasiado para os nossos monumentos e esquecemo-nos do dia-a-dia. O facto do grande escritor alemão Schiller ter dito que daria toda a sua obra para poder ter escrito “Os Lusíadas” não justifica que a Alemanha tenha agora de nos alimentar. O trabalho honrado dos portugueses espalhados pelo mundo, enriquecendo outros povos, só honra o luso emigrante e demonstra a incompetência das nossas elites para criar condições capazes de os alimentar dentro dos seus muros; não nos dá direito a pôr exigências a outros povos, como fazem alguns. As diferentes velocidades de desenvolvimento das economias, é que é necessário ajustarem!

 

A lusofonia é grande mas só será maior através da vontade de ser e do próprio trabalho não se podendo dar à veleidade de viver dos rendimentos dos seus antepassados nem de sobrecarregar o futuro dos filhos com dívidas.

 

Também o facto de a nossa colonização ter sido “meiga” tem a ver com o espírito universal português e com a nossa fraca organização de Estado, em termos de nação, o que se revelou positivo também para povos desorganizados que descobrimos.

 

Muitos dançam ainda ao som da cantiga da “culpa alemã”, em vez de procurarem entender porque é que a Alemanha é forte e porque é que outros que ganharam a guerra o não são e porque não analisamos seriamente a razão da nossa situação crítica. Os governantes portugueses quiseram ser bonzinhos pondo o país e o povo à disposição duma Europa sôfrega. Confundiram o Estado e os seus parasitas com a nação. Por isso Portugal chegou onde está. Os governos alemães e os sindicatos, que procuram ter em conta, primeiramente o bem-comum do seu povo e depois os interesses dos filiados, são acusados agora de nacionalistas.

 

Acusam V.Excia. de lhe ter subido o” poder à cabeça” como se não fosse dever dum eleito governamental defender também os interesses do povo que o elegeu. Os nossos não o fizeram, e queixam-se agora dos outros, esperando deles beneficência.

 

Os partidos portugueses, que assumiram a responsabilidade dos governos, foram outrora apoiados económica e ideologicamente pelo estrangeiro. Depois mostraram-se agradecidos para com os que os apoiaram pondo-lhes à disposição uma nação que lhes não pertencia. Por cima das irmandades partidárias deve estar o povo e o país.

 

Prezada Ângela, ajude Portugal! Admoeste os políticos, ensine-os a defender, como você, os interesses nacionais sem se tornarem nacionalistas. Ensine-os a não confundir o património cultural e económico português com o património do partido ou do grupo de amigos e conhecidos seja em que situação for.

 

Nós também percebemos que os construtores da EU têm que nos contar muitas mentiras para verem se conseguem, com pequenas guerrilhas, a unidade dos USE, sem guerra, ao contrário do que se deu com o processo de unificação dos USA.

 

Uma cultura que sempre liderou o mundo encontra-se, de momento, receosa… A chance de cada Estado está na USE e na peculiaridade de cada país poder encontrar um prolongamento da sua identidade nas ex-colónias e assim vir a dar à luz um mundo mais humano e solidário.

 

De momento o problema da Europa é ser uma união sem soberania e o problema de Portugal está em ter um estado soberano sem nação nem povo.

 

Prezada chanceler, a carta tornou-se longa; também isto é uma característica nossa: falar muito e deixar os outros fazer. Com a vossa ajuda arregaçaremos as mangas e começaremos a construir a nação à imagem do que a Alemanha fez, depois da guerra e do que fizeram os nossos antepassados na fundação da nação e nos descobrimentos.

 

António da Cunha Duarte Justo

antoniocunhajusto@gmail.com

www.antonio-justo.eu

Portugal entre o Colapso financeiro sem a Troika e a Ruina com ela

Estados fortes e Plutocracia contra Estados débeis e Pobres

Recuperar a Honra de Portugal

António Justo

“Temos uma mentira institucionalizada no país… que não deixa que as coisas tenham a pureza que deviam ter” ”, diz o general Pires Veloso. Quando, os bem alimentados da nação, se atrevem já a falar assim é mesmo grave o estado da nação e justificada a insatisfação. O actual regime democrático, mais que fruto do desejo de liberdade e de bem comum, foi cinicamente construído amoralmente e baseado na manipulação ideológica que permitiu muitos “iluminados” arrogantes apoderarem-se do Estado, e manter o povo na submissão, já não sombria mas risonha. Pessoas corruptas, com o apoio militar, instauram um estado corrupto, sem razão crítica, sob o pretexto dos abrilistas serem os libertadores de Portugal. Sanearam Portugal à sua imagem e semelhança! O povo, atraiçoado pelas elites conservadoras e pelos oportunistas engravatados da ocasião, deixou-se enganar e agora acorda molhado. O maior roubo que se pode fazer a um país é tirar-lhe a esperança, a autoconfiança e a dignidade. Construímos uma democracia duvidosa em que políticos não são responsabilizados pelo seu mau comportamento mas o cidadão sim. As ideologias e os interesses pessoais e de coutos sobrepuseram-se aos de povo e nação.

 

Urge sanear o País desde o Estado à Constituição

A atitude do ministro Nuno Crato, mandando reavaliar todas as licenciaturas que foram atribuídas com recurso à creditação profissional, deveria ser um primeiro passo no saneamento do Estado no sentido de desinstitucionalizar a corrupção; deveria passar-se a rever também as medidas que possibilitam tal creditação. O trabalho seria colossal porque teria de chegar também aos diferentes órgãos de Estado e a uma revisão da constituição portuguesa, nascida sob auspícios ideológicos e partidários! O resto é só maculatura.

 

O saneamento da nação implicaria coragem e vontade para o abandono de regalias adquiridas na base de legislações nepóticas (favoritismo!) e de acções como as de forças de pressão orientadas apenas pela ganância à custa da destruição da economia nacional, tal como acontece com a greve dos maquinistas e outras. Um país que orienta a sua acção na base de aquisição de regalias mata de início a solidariedade e destrói-se a si mesmo impossibilitando a governação.

 

Há muitos portugueses que anseiam pela revolução, esperando que a rebelião comece em Espanha. Os alemães, os franceses e os Ingleses temem a instabilidade do Euro; mais que a desgraça da Grécia ou de Portugal, preocupa-os sobremaneira a insatisfação popular incontida duma Espanha ou duma Itália. As consequências para o projecto EU (Euro) seriam catastróficas. Por enquanto entretemo-nos com a periferia; com o tempo também a França passará a entrar na dança.

 

Uma Alemanha que exige contenção económica aos países menos fortes como Grécia, Portugal, Espanha e Itália, continua a endividar-se apesar duma economia florescente. Endividando-se aposta já na inflação que aos outros não é permitida devido a um Euro de várias velocidades! (A RFA, no seu orçamento federal para 2013 prevê, nos seus gastos totais, 33,3 bilhões com a dívida federal que ocupa o terceiro lugar, depois da defesa também com 33,3 bilhões e dos gastos no âmbito laboral e social com 118,7 bilhões). No que respeita a endividamento para empréstimo, o Estado alemão não tem dificuldade com isso, porque ganha com a diferença do crédito (pede dinheiro emprestado a 2% e empresta-o a 6% ou mais). Por outro lado o banco central europeu empresta dinheiro aos bancos a 1% em vez de o emprestar directamente aos Estados deficitários, favorecendo assim a usura dos bancos que depois concedem créditos a terceiros a preço especulativos. Não será que no caso duma reforma monetária quem mais sofrerá será quem mais poupou? O Japão e os USA não se encontram em melhor situação que a EU. Só que o dólar é suportado mundialmente, podendo os USA produzir bilhões de notas por mês sem que o mundo berre, ao contrário do que faz com a Europa. É que a Europa apesar das diferenças gritantes ainda reserva um bom óbolo para os desfavorecidos do sistema e da natureza e isso desagrada aos tubarões do mercado.

 

Povo vítima de Instituições corruptas e da própria Apatia

 

Os responsáveis pelo colapso económico não são chamados à responsabilidade pelo Estado português que, ao contrário do que acontece na Islândia, assalta a carteira do povo, poupando a dos que se encheram. Facto é que o povo português foi vítima dos governos de Portugal e da especulação financeira internacional. O apoio da EU (União Europeia) e a concessão de créditos aos países pobres parece ter sido para estes poderem fazer compras aos países ricos e ao mesmo tempo terem a oportunidade de beneficiarem as grandes empresas para a competição internacional da nova realidade global (turbo-capitalismo). “Confiaram” na capacidade política e financeira dos políticos estatais e agora vem a Troika, controlar a nação sem se interessar pelo Estado nem para onde foi o dinheiro. Como precisam dos seus mercenários governamentais para executarem as suas exigências não lhes tocam.

 

Os povos da periferia, com uma elite política não habituada a deitar contas à vida, deixaram-se iludir com promessas e histórias de paraísos turísticos, etc. Esta elite, “comprada”, com postos e ordenados especulativos internacionais, permitiu a destruição das pescas, agriculturas, têxteis e das pequenas e médias empresas da nação; pior ainda, concretizam, ainda hoje com zelo, medidas europeias tendentes a destruir as regiões e os seus produtos específicos em benefício das grandes multinacionais estrangeiras e de latifundiários. Agora que a periferia (Grécia, Espanha, Portugal, Itália, etc.) se encontra na dependura especula-se no centro da Europa, se não seria melhor estes Estados optarem pela antiga moeda para melhor regularem o próprio mercado, ou se não será melhor um euro “duro” e um euro “macio”! Tudo desculpa para manter o terreno conquistado!

 

As multinacionais receberam parte dos apoios da EU, destruíram as pequenas e médias empresas e foram-se embora deixando os consumidores dependentes da importação que essas mesmas firmas agora servem, a partir do estrangeiro. Um enredamento bem perpetrado! O chanceler Helmut Kohl preparou as grandes empresas para a concorrência internacional e o chanceler Schroeder açaimou o operariado para a concorrência com o operariado exterior…

 

As nações ricas, cada vez mais ricas ainda, criaram nelas também uma pobreza cada vez mais à medida da pobreza da periferia. A introdução do Euro correspondeu ao abandono da economia social tradicional em favor dum liberalismo económico americano (anglo-saxónico), tendente a criar os Estados Unidos da Europa à medida dos USA.

 

Porque há-de pagar a crise quem não tem dinheiro? Porque não se põem os mais ricos a contribuir para se resolver a crise? Estes já não trazem benefício para o Estado, numa fase em que o capitalismo comunista de Estado (China) tem poder económico e político para aniquilar o capitalismo de cunho privado (de multinacionais internacionais). Os magnates do dinheiro e as nações mais fortes têm-se permitido humilhar os povos da periferia porque ainda notam que estes se mantêm ordeiros. A situação está a tornar-se tão séria que só uma revolta popular séria poderá levar muitos representantes do povo (políticos mercenários) a arredar de caminho, porque a credibilidade internacional destes só vale na medida em que conseguem manter o próprio povo sem a revolta. A não ser que se aceite o surgir de grupos radicais no Ocidente à imagem dos grupos Al Qaida (sistema de guerrilha!).

 

Os que se assenhorearam do Estado português (revolução de Abril no seu aspecto de assalto às instituições) começaram por, da sua janela, anunciar o poder e a liberdade para o povo e por roubar-lho pela porta traseira! A fusão de interesses mafiosos entre políticos, instituições, administradores de empresas públicas e conluio com a justiça inviabiliza um Portugal honrado.

 

Chegou a hora da mudança (conversão) ou da revolução! Como podem ricos e políticos dormir, quando há já gente com fome! Será que a globalização, a EU terá de acontecer à custa da fome. A Europa conseguiu a paz acabando com a fome; agora, que a fome vem, prepara-se a guerra. O povo começa a perceber que os seus governos têm os seus interesses salvaguardados sob a capa dum Estado “padrasto”.

 

O problema não está tanto na escolha de alternativas mas na mudança de mentalidade das elites governamentais (partidárias) que nos têm governado e administrado e dum povo habituado a dançar ao ritmo duma música tocada por outros. Não tempos tido governos nem partidos com capacidade para administrar um Estado e menos ainda uma nação. Os mesmos parlamentos que levaram o país à ruina perderam a autoridade para governar Portugal e a Troika que o governa agora não está interessada nem no povo nem na nação.

 

Resta ao povo a metanoia, não comprar produtos estrangeiros e chamar o Estado e os gestores financeiros ao rego da nação. Estes porém sabem que o povo, como a criança, só berra e não actua. Daqui a falta de esperança com a agravante de que a reconciliação do povo com o seu Estado significaria mais uma vez abnegação. As pessoas sérias do Estado deveriam proceder a um saneamento do Estado e das leis que protegem os que vivem encostados a ele. Só assim poderiam os administradores da miséria readquirir a honra perdida para Portugal poder voltar a cantar “Heróis do mar” e da terra também!

 

António da Cunha Duarte Justo

antoniocunhajusto@gmail.com

www.antonio-justo.eu

DEPRESSÕES BIPOLARES E DEPRESSÕES UNIPOLARES


Não há Razão para se envergonhar

António Justo

Uma pessoa diagnosticada com depressão unipolar, depressão bipolar, burn-out, borderline, ou outra doença, não deve ser colocada na gaveta do preconceito. Deve ter-se muito em conta que o paciente é uma pessoa como outra qualquer e com direito a ser tratado não como doente, mas como os considerados “normais”, com todo o respeito, dignidade e consideração. De facto não há ninguém que seja cem por cento são. Todos temos alguma “telha” e se pensamos não tê-la, ainda pior: isso significa que ainda não a descobrimos e quem sofre com ela são os outros. A pessoa faz parte da natureza com momentos estáveis e com outros menos estáveis; como a natureza, trazemos em nós as altas e baixas pressões psicológicas que originam dias soalheiros e chuvosos. Fazemos parte dum globo com diferentes zonas climática, ideias e ideologias. Há pessoas com regiões de alma mais instáveis com tsunamis, tempestades incontroláveis. Neste estado há que ir ao psiquiatra para conseguir estabilizar o próprio clima.

 

No meio de tudo isto há um problema grande que é o próprio preconceito e o preconceito dos outros no que toca à avaliação da doença.

 

As depressões unipolares tornaram-se entretanto socialmente mais aceites; especialmente o burn-out (esgotamento), adquirido pelo demasiado estresse, por se ter trabalhado demais e por não se ter poupado, indo mais além do que as próprias energias permitiam.

 

Mundialmente, cada vez mais pessoas sofrem de depressões unipolares. Depressões unipolares são as depressões em que as pessoas só sofrem de disposições depressivas enquanto nas depressões bipolares as pessoas sofrem de fases de depressão e de fases de euforia. Estas são mais raras e menos aceites pela sociedade. Há entretanto grandes diferenças de expressão de depressão e de grau de bipolaridade. Pessoas com depressões unipolares chegam a sofrer mais do que pessoas com depressões bipolares porque aquelas só têm fases depressivas. Naturalmente, tudo depende do grau da depressão que pode ser leve, média ou grave. O estado grave de depressão é descrito por doentes como o “inferno na terra”. Naturalmente também bipolares, nas fases de depressão, podem chegar a tais estados.

 

No dia-a-dia as pessoas de convívio com pessoas bipolares têm a tendência a verem em tudo que os pacientes fazem ou dizem como resultado da doença. Isto dificulta a disponibilidade do bipolar em reconhecer a bipolaridade. Todos nós temos características doentes e saudáveis. O alto grau de inteligência, de charme e brilho que muitos bipolares têm, só em parte terá a ver com a perturbação. O doente bipolar nota facilmente, quando está na fase de depressão, porque sofre (nesta fase é fácil reconhecer a doença). Sente-se, porém, muito bem na fase eufórica, não sentindo o patológico dela; reconhece a própria personalidade nela, considerando a fase depressiva, estranha à sua natureza, o que torna difícil o reconhecimento da própria doença.

 

Quem convive com uma pessoa unipolar ou bipolar, na sua fase depressiva, deve ter em conta que ela, por vezes, fica incapacitada de agir e de tomar iniciativa; muitas vezes tenta mas não consegue. Por isso o paciente precisa muito do acompanhamento e apoio de pessoa íntima para que aquele aceite o que ela diz e cumpra com a medicação. Muitas vezes o bipolar aceita tomar a medicação (estabilizadores de humor) na fase depressiva (fase desagradável de sofrimento) mas quer interrompê-la na fase eufórica (de felicidade). Na fase depressiva, às vezes, o paciente bipolar (tal como acontece com doentes de borderline) tende a ver a causa da sua infelicidade fora de si, criticando extremamente um pseudo-adversário que é responsabilizado pela sua situação e sofrimento. Na fase eufórica sente-se entusiasmado, fala muito, saboreando a sua genialidade e o seu aspecto excepcional e original, mas confundindo, muitas vezes, a fantasia com a realidade. Também chaga a ter prazer em fazer o destrutivo jogando com o risco.

 

Muitas vezes o psiquiatra diagnostica uma depressão unipolar em vez duma bipolar porque o paciente só se dirige a ele na fase de depressão unipolar sem mostrar as características da fase eufórica.

 

A oscilação de humor e das fases de maior ou menor acção pode, a nível social e individual, ser gerida de maneira a não se prejudicar a si nem aos outros. Se a doença ajuda a pessoa na sua vida social laboral e artística é uma questão de gestão pessoal se não interferem negativamente com terceiros. Há muitas pessoas, que se não tivesse sido a doença, não teriam atingido a celebridade que atingiram: Fernando Pessoa, Hermann Hesse, Sigmund Freud, Victor Hugo, Winston Churchill, Wolfgang Amadeus Mozart, Charles Chaplin, Napoleão Bonaparte, Abraham Lincoln, Elvis Presley, Woody Allen, e milhentos outros.

 

A criatividade de grandes artistas e personalidades mundiais foi, muitas vezes, alimentada pela doença bipolar.

 

Escrevo este artigo na continuação doutros textos “Distúrbio Bipolar ou Transtorno Bipolar” https://antonio-justo.eu/?p=1428 e “Distúrbio Bipolar”  https://antonio-justo.eu/?p=1200&cpage=1#comment-20291, para complementar aspectos tratados e comentários a eles feitos, e só com o sentido de ajudar. O motivo que me levou a escrever sobre isto foi o facto de conhecer grandes amigos que tinham esta doença e que viviam, por vezes, uma vida dupla de sofrimento a nível privado e de alegria a nível exterior.

Só nos podemos ajudar a nós mesmos ajudando os outros! Mas nós também fazemos parte do outro!

 

Aqui na Alemanha há muitos grupos de auto-ajuda e em Portugal e no Brasil também. Muitos são gratuitos, havendo outros em que se paga um contributo para despesas com programas próprios. No Porto há um grupo com o apoio duma médica especialista em depressões unipolares e bipolares: http://www.adeb.pt/

 

Se a doença for demasiado forte, chega a bloquear a pessoa. A fase depressiva pode matar a criatividade ou tornar a pessoa incapaz de se expressar artisticamente, por grandes fases. Importante é estar com eles porque sofrem muito embora não pareça. Os amigos são muito importantes e uma fé forte também. O diálogo na intimidade com Deus, ou com o universo, torna-se libertador e ajuda a tirar o gosto de azedo que a vida, por vezes, tem.

 

Quem tem a doença deve procurar assumi-la, não tendo vergonha de a ter. A vida dos chamados “normais” é, muitas vezes, mais “doente” ainda, que a daqueles que a normalidade considera doente. A esta, falta-lhes, por vezes, um pouco da sensibilidade que aqueles parecem ter a mais.

 

António da Cunha Duarte Justo

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