BENTO XVI – O HOMEM CORAJOSO DA EUROPA

“O sangue não agrada a Deus”

A lição universitária pronunciada na universidade de Ratisbona (Regensburg) sob o tema “relação entre razão e fé” ficará na história e iniciará um período de maior coragem e transparência no diálogo intercultural.
O mundo precisa urgentemente duma resposta à questão: qual é a posição do Islão em relação à paz? O Papa está interessado num diálogo sério que aposte na conciliação de razão e religião, na complementaridade de ciências humanas e de ciências naturais. Também não chega que a Europa se limite a viver duma indústria de opiniões que abusa da liberdade de opinião. Por isso coloca a sua argumentação a um nível histórico-teológico na tentativa duma discussão clarificadora das diferenças e do que é comum às religiões e às culturas. Ele pretende com isto provocar um repúdio geral duma motivação religiosa da violência por parte de todos os dignitários de todas as religiões. Para isso necessita-se dum instrumento válido comum a todos, a razão, o logos.
O mundo e a Europa cada vez se tornam mais reféns dum terrorismo que se legitima religiosamente. Por outro lado os representantes religiosos não tomam posição contra a violência. À sombra desta vive muita gente poderosa sem escrúpulos sem se preocuparem com destinos individuais e de povos nem com o desenvolvimento histórico. Para a construção duma sociedade do futuro não é suficiente apostar só na lei natural e na estratégia do silêncio sobre a guerra santa e a violência. Através da história, a violência tem sido encarada como meio legítimo para se afirmar e dominar! Dos bons não reza a história…
O mundo islâmico radical sente-se provocado por um modernismo demasiado grego que o contradiz na essência e o paralisa. Assim, na sua acção prefere continuar a estratégia de expansão para o exterior através da aquisição de direitos e de sabotagem e de bloqueio interior. Segundo ele o modernismo seguido nos países de cultura cristã tornou-se no exemplo de como uma cultura se autodestrói. Preferem o homem açaimado à cultura fechada passando ao repúdio incondicional do individualismo diletante da cultura aberta ocidental e do seu materialismo. Aqui enfrentam-se dois parâmetros imperfeitos e auto-suficientes sem perspectivas de encontro. Por outro lado o mundo ocidental encontra-se em crise, sem saber o que quer nem para onde vai. O problema demográfico europeu leva-nos à situação do império romano entre o século III e V.
Em momentos de crise o Papado revelou-se como defensor da Europa no seu todo. Se antigamente eram as rivalidades senhoriais e de nações que punham em perigo a Europa hoje são as rivalidades ideológicas fechadas nelas mesmas, os egoismos e a consequente crise de identidade. A Europa, inconsciente e esbanjadora dos seus recursos culturais vive já dos rendimentos e não tem energia nem autoridade para dar resposta às questões e aos problemas colocados pela sociedade islâmica com uma grande espiritualidade e vitalidade.
A reacção do mundo ocidental ao mundo muçulmano tem-se situado entre perplexidade, ignorância e descrédito. Este expande no meio daquele e impõe-lhe os seus costumes. Em contrapartida na Turquia e no mundo islâmico as outras culturas são totalmente discriminadas segundo a divisa: em casa assimilamos e no estrangeiro construímos gettos. Sabem o que querem e não se deixam comprar, na consciência de que o futuro está do seu lado. Vivem com Deus na consciência de que quem O respeita se respeita a si próprio porque Este no idiário cultural é o próprio reflexo, o alter-ego de pessoas e culturas… No Ocidente a indiferença e o egoísmo pôs tudo à disposição em troca do Mamon; estamos de volta aos tempos bárbaros… Se o Ocidente tem dominado com a força económica e militar o Islão dominará com a sua força religiosa e com a consciência de “povo”. Ambos terão um denominador comum, não o respeito mas o medo. O Islão sabe que não é respeitado, que a sua presença se torna constante no medo que já reina em toda a Europa. Se outrora a sua melhor arma eram os cavalos hoje é o medo.
Se é verdade que a aceitação da liberdade religiosa e do pluralismo é algo que as religiões têm de aprender também é verdade que o secularismo não se pode apenas afirmar na incriminação das religiões.
Em geral no Islão a discussão teológica não é conhecida. A discussão teológica sobre o Corão e sobre Maomé é mesmo proibida. Maomé e o Corão são declarados tabus bem como a sua análise histórico-cultural crítica. Mais que teólogos são juristas com as suas escolas de interpretação própria. Deus enlibrou-se no Corão e a única coisa que há a fazer é discutir a aplicação e as tradições, isto é pode-se falar sobre ética e política familiar, etc., isto porém no sector do direito islâmico, da scharia.
A ignorância crassa é constrangedora no que toca à discussão pública sobre as religiões e na maneira como agora se distorce a realidade dum discurso papal sem conhecimento do documento. Só interessam títulos de jornais, o resto é preenchido pela fértil fantasia superficial. O stress dos jornalistas não lhes permite mais que a leitura duma página DIN4.
Naturalmente que as ameaças infundadas do mundo islâmico não se fizeram esperar com ataques incendiários a igrejas, assassínio duma freira e seu assistente num hospital na Somália, o propagado “ataque ao Vaticano” pelo grupo terrorista “Armada dos Mudschahedin” do Iraque, sindicalistas na Turquia, etc. A reacção só vem dar razão ao discurso do Papa. A sua aula universitária era dirigida àqueles que apelam à violência e àqueles que não têm coragem de iniciar uma discussão séria para lá da hipocrisia e do oportunismo que tem dominado nas relações inter-culturais entre os contraentes. Ele queria iniciar “um diálogo sério e aberto no respeito mútuo”. Naturalmente que uma leitura completa do documento e a discussão séria viria perturbar aqueles que dum lado e do outro esperam mais da força da violência do que da força dos argumentos. Não querem passar à análise dos factos e das doutrinas e preferem ficar-se pela censura e na irracionalidade dos preconceitos.
Na sua aula académica na universidade de Ratisbona sobre a relação entre razão e fé, Bento XVI começa o seu discurso com uma citação marginal do Imperador Manuel II em 1391 em que este discute com um intelectual da Pérsia sobre a Guerra Santa (Dschiadd): O Papa refere que o Imperador estava interessado na questão central da relação entre fé e Violência e não apenas na discussão entre o diferente trato entre crentes (monoteístas) e infiéis e por isso na sua argumentação terá partido da Sura 2, 256 do Corão que diz “não haja coacção em questões da fé” , uma das suras mais antigas do tempo em que Maomé ainda se “encontrava numa situação de impotência e ameaçado” e por outro lado o imperador sabia que mais tarde foram introduzidas no Corão as determinações sobre a “guerra santa” passando por isso directamente ao problema da questão da relação entre religião e violência, afirmando de maneira rude “mostra-me, o que é que Maomé trouxe de novo, e aí só encontrarás coisas más e desumanas, ao pregar e prescrever o espalhar a fé através da espada”. O imperador continuou argumentando que o espalhar a fé com violência era absurdo e que essa fé se torna uma contradição e afirma: “Ela está em contradição com o ser de Deus e com o ser da alma”… “O sangue não agrada a Deus” e “não agir segundo a razão é contrário ao ser de Deus”…”Quem quiser levar alguém à fé precisa da capacidade de falar bem e dum pensar justo e não de violência e ameaças”…E Bento XVI continua a sua aula e diz “a frase decisiva da argumentação contra a conversão pela violência é: central no diálogo citado: “A frase decisiva nesta argumentação contra a conversão pela violência é: “Não agir segundo a razão é contrário ao ser (natureza) de Deus”. O Papa quer um diálogo sério entre as religiões e as ciências e para isso precisa-se do instrumento comum da razão. Bento XVI cita o Professor Theodore Khoury de Munster que afirma que para o imperador, um bizantino crescido com a filosofia grega isto é evidente, para a doutrina islâmica esta frase não é evidente porque “para o Islão Deus é absolutamente transcendente e a sua vontade não está ligada a nenhuma das nossas categorias nem mesmo a da racionalidade”.
Nesta aula Bento XVI tira a legitimação religiosa aos islamistas, o que os representantes do Islão não fazem.
Por outro lado o Santo Padre ao questionar algumas determinações do Corão sobre a “Guerra Santa” coloca indirectamente a questão se o Islão poderá conciliar fé e razão.
O Papa pretende que a discussão sobre o diálogo das religiões se inicie a sério a nível intelectual e académico dado que a que a política por questões óbvias só tem estado interessada em fazer das religiões uma papa-açorda e em instrumentalizá-las para os seus fins.

António da Cunha Duarte Justo

António da Cunha Duarte Justo
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O Papa quer conciliador a tradição com a época moderna

Contra um iluminismo subserviente
O mundo islâmico reage extremamente intolerante e outros procuram a sua chance na afirmação pela contradição.
A tolerância não poder ser uma estrada de sentido único como até agora. É legítima a pergunta de até que ponto a tolerância pode tolerar a intolerância. Os países islâmicos têm que empreender algo concreto para provarem na prática que é apenas preconceito a ideia que corre de que o Islão anda de braço dado com o terrorismo e com o fanatismo.
Alguns parecem querer continuar no status quo dum diálogo hipócrita contentando-se com a discussão sobre a oportunidade ou não oportunidade das citações para assim passarem à ordem do dia sem sequer terem preocupado com o conteúdo ou a leitura do texto completo. A outros só lhes ocorre o argumento de águas passadas que não movem moinhos recorrendo ao baú da traça das faltas da Igreja de antigamente. É que pensar faz doer e o saber exacto responsabiliza.
O erudito Papa quer não só reconciliar mas sobretudo conciliar a tradição com a época moderna e contemporânea, a aldeia com o mundo global. Lança a iniciativa de se integrar a fé e a razão como dois pratos da mesma balança. Doutro modo encontrar-nos-íamos a caminho duma grande catástrofe. Como interessado no diálogo responsável Bento apela à boa vontade para que o diálogo não continue unilateral. O Islão não pode continuar a adiar o diálogo nem com as outras religiões nem com o mundo secular. De facto no mundo islâmico o mundo secular não existe, nele não há lugar para os ateus, agnósticos e as outras religiões são extremamente discriminadas. O actual presidente do Irão tem uma visão muito reduzida de vida social e da História ao afirmar: “ a vós pertenceu-vos o passado, a nós o futuro”.
Em todas as outras culturas a economia se desenvolve a largos passos enquanto que nos países islâmicos a riqueza continua na mão de poucos e ao povo inocente só lhes deixam a religião como tubo de escape. Manipulam-no possibilitando-lhe apenas uma pseudo expressão política no gesto de queimar símbolos ocidentais e em rituais de punhos serrados, que só põem a nu a sua fraqueza. O seu exército é barato e fácil de mobilizar: homens, mulheres e crianças atrás do facho da religião. Os muçulmanos emigrados para a Europa mais cultos e com mais dinheiro já não alinham nesses rituais públicos, de auto-afirmação. Os chefes semeiam o caos mas aí de quem os lembra dele!
O mundo árabe não pode ser deixado só na sua situação de oprimido – opressor. O Papa defende-o também com o seu discurso. Ele quer uma política do bem e quer lançar pontes. A sua função é servir a humanidade, dentro das suas limitações naturalmente. “O maior entre vós deve ser o vosso criado”. O Papa e muitos como ele já estão fartos de tanta conversa fiada entre religiões e povos, entre políticos, partidos e cientistas. Todos têm falado em nome do bem do povo, da nação, da ciência ou de Deus com posições dialécticas e absolutas à custa duma realidade mais digna e da opressão do povo cada vez mais na mesma. Há meses atrás dizia um jornalista do Egipto, ao falar sobre o mundo muçulmano numa conferência em Berlim:”Nós encontramo-nos numa situação desesperada. O Estado é despótico e incalculável (caprichoso) e nos programas de TV os chefes religiosos debatem se será islâmico ter estátuas nuas no jardim, enquanto que, todos os que de qualquer modo o podem, abandonam o nosso país”.
Bento XVI conhece bem os problemas da Europa e do Mundo. Ele quer que se dê uma oportunidade ao futuro! Com o discurso e a argumentação de carácter científico o Papa dirige-se não tanto à generalidade mas especialmente aos cientistas, aos do poder e quer dizer que o lugar da discussão deve começar pela ciência, que o seu lugar é a universidade e aqui não deve reinar a hipocrisia mas a força dos argumentos. Neste meio argumenta-se com nível mas não se poupa ninguém. É que a opinião pública e a política vivem bem das meias verdades e da lei do oportuno. As populações vivem desinformadas e os “comerciantes” não gostam que se fale da realidade concreta porque isso seria inoportuno para os seus negócios e talvez até não educado. Vivem do comentário e dum espírito dialéctico já ultrapassado pela nova física. Preferem o papel de mortos a enterrar mortos!.. no seguimento da bandeira de algum papa Nobel preso da dialéctica na praça dum mundo que não está convencido dos seus próprios argumentos.
Infiltração subcutânea sem contrapartidas
Bento XVI respondeu bem a muitos “reaccionários” que o criticavam. Não se desculpou porque não havia nada de que se desculpar; lamentou a incompreensão, o equívoco provocado. Quem se desculpa acusa-se! O problema não está tanto nas palavras por ele ditas, mas sim na capacidade para as poder entender e no interesse de alguns em distorcê-las. O seu discurso é científico para especialistas. Estes têm estado ausentes.
Permito-me fazer uma marginal observação à incompreensão que alguns me têm feito relativamente à escolha da citação de Manuel II Palaiologos feita pelo Papa. Eu penso que a escolha foi bem pensada e oportuna:Certamente que ele queria estabelecer relações e comparações entre aquela época e a nossa época e uma certa crise que lhes é comum. Queria apresentar certas semelhanças entre a cor local de então e a de hoje. Hoje como então há o problema da separação entre os cristãos bem como a questão do voluntarismo divino; hoje como então a ameaça muçulmana está muito presente; hoje como então dominam a indiferença e o desinteresse entre os cristãos; hoje como então é necessária uma discussão e um diálogo sério e sem papas na língua ao serviço dos povos; hoje como então o diálogo só se reduz a interesses económicos. Na altura o Imperador bizantino Manuel II Palaiologos estava preocupado em superar o cisma de 1054 entre os cristãos; ele queria organizar a defesa contra os invasores osmanos (turcos); ele fazia o apelo à união das duas Igrejas para poder resistir à pressão islâmica, o cristianismo dividido facilitava o caminho dos invasores; ele queria um diálogo autêntico, também a nível de princípios e de concepção responsável para todos os povos enquanto que os seus parceiros estavam apenas interessados na submissão das regiões dominadas através da espada e em acordar a tolerância religiosa entre as religiões do livro. Facto é que o apelo do imperador em 1393 não foi ouvido e em 1453 os Turcos chegaram mesmo a apoderar-se de Constantinopla passando a chamar-lhe Istambul.
O mundo em que vivemos parece um mundo maluco e contraditório. O pensador Bento XVI exige um diálogo sem mitos subjugado à razão e os nossos iluministas e esclarecidos exigem silêncio e hipocrisia do esclarecido Bento. Os nossos racionalistas já parecem ter medo da razão. Um iluminismo subserviente europeu parece actuar sob o lema: aconteça o que acontecer sou o amigo do inimigo do meu rival.
O Frankfurter Allgemeine de 17.09.06 refere laconicamente: “ Mundo às avessas: O homem de Deus advoga a causa da razão e os esclarecedores (Aufklärer) dão a preferência à obscurantista proibição da crítica”.
A confusão, o oportunismo e o medo podem muito!…

António da Cunha Duarte Justo

P. S. Esta posição é uma tentativa de resposta a alguns comentários e correio electrónico que recebi em relação ao artigo “Bento XVI – O Homem da Europa “.

António da Cunha Duarte Justo

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Mobilização de Soldados para o Líbano

Depois de muito debate a Alemanha resolve mandar um contingente de 2400 soldados da marinha em missão de paz para o Líbano. Esta mobilização tem como objectivo a vigilância das fronteiras marítimas do Líbano para impedir que o Hisbollah receba armamento por mar. Esta missão permite o controlo de barcos sob suspeita mas não lhe dá poder para apreensão de armas; esta será a missão das autoridades libanesas. Com esta missão a Alemanha gasta 46 milhões de Euros em 2006 e 147 milhões em 2007.
Para a Alemanha o envio dos soldados, que dentro de 10 dias se encontrarão no Líbano, é considerado um acontecimento histórico atendendo a que a Alemanha actua pela 1ª. vez perto das fronteiras de Israel. A Alemanha assume assim pouco a pouca um lugar relevante na estratégia militar europeia e mundial.
Espera-se que esta medida seja um primeiro passo no sentido dum verdadeiro armistício nas fronteiras do ódio para que o povo sofra menos.
Contra os inimigos da mobilização a próprio chanceler alemã Ângela Merkel afirmou que na defesa de direitos internacionais não se espera neutralidade.
Naturalmente que a questão posta é: com isto a Alemanha torna-se parceira da solução ou do conflito? Muitos alemães não estão contentes com a mobilização porque os critérios internacionais são demasiado moles não correspondendo às exigências e à qualidade da norma alemã. Além disto a missão inclui três perigos: o peso da história nas relações com Israel, o perigo real dum conflito no momento de controlo e o peso da duração da missão a que se não prevê um fim.
Naturalmente que o maior problema para a paz são as armas que entram através da fronteira terrestre e aqui tornar-se-á mais difícil e arriscada a missão de controlo.
Só com o esgotamento dos arsenais se poderá chegar à paz e convencer o Hisbollah ao desarmamento e a passar duma força terrorista a um partido entre outros. Por outro lado a entrega do arsenal do Hisbollah ao exército libanês corresponderá a uma hisbollahização do exército libanês. A situação não promete!…
Por um lado as companhias de armamento fornecem armamento em regiões de tensão sem que a política o proíba e por outro lado gastam-se somas gigantescas na reparação dos estragos provocados.
A União Europeia apoia o Líbano com 900 milhões de Euros para infra-estruturas. A retirada de Israel de Gaza não impede as acções palestinianas. Dinheiros europeus foram empregues na edição de livros escolares com propaganda anti-israelita. No Líbano domina o Hisbollah. O dinheiro corre sem qualquer conceito para o desarmamento.
Porque não empregar a energia que corre para o aparelho militar em empenho político. Com esta acção o Ocidente sente que já fez muito enquanto que o problema fundamental entre israelitas e palestinianos continua. O que é necessário é uma clara solução de dois estados com uma fronteira reconhecida pelas duas partes. Deste modo indirectamente Hamas reconheceria o estado de Israel. É sarcástico o facto de ter sido necessária uma guerra para que o mundo civilizado tomasse mais a sério o conflito

António Justo
Alemanha

António da Cunha Duarte Justo

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Do Deserto da Transcendência à Desumanização do Ser Homem

“ Não agir segundo a razão, não agir segundo o logos, é contrário à vontade de Deus”.
Isto questiona não só a compreensão islâmica e mas também a de muitos guerrilheiros.
Há quem comece a fazer comparações desvantajosas entre o Papa João Paulo II e Bento XVI tirando ilações menos adequadas. Enquanto que João Paulo II acentuou primordialmente a moral na sua acção, o novo Papa acentua a questão de Deus (a teodiceia), a teologia na relação fé – razão. Não é do seu estilo (ocupar-se com coisas menores) moralizar nem condenar os moralismos inerentes a regimes, mundivisões, culturas, religiões ou políticas. Ele concentra-se no essencial, no primordial.
Numa opinião pública (oriental e ocidental) em que o banal é critério de orientação o homem erudito só poderá ser mal-entendido. Só estorva, pelo que é necessário arrumar com ele mediante um louvor ou uma crítica, numa palavra, o essencial está a mais…
BentoXVI não vem advertir ou proibir. Ao mesmo tempo que admira a beleza e o erótico da fé bíblica, ele não considera a cultura da época moderna má ou ateia. Ele reconhece o desenvolvimento do pensamento moderno, ao contrário daqueles que querem voltar aos tempos anteriores à renascença ou ao iluminismo. Ele quer que a ciência se liberte também ela de moralismos, de protagonismos para se deixar orientar por uma razão completa que não exclua metodicamente a questão de Deus da ciência. De facto uma ciência que exclua a questão de Deus torna-se incapaz de dialogar com as culturas. Para lá do folclore e da economia há algo mais. E uma razão que só valoriza o empírico é encurtada. O ilustre intelectual não quer ver a fé agrilhoada a uma razão prática kantiana e “assim ser-lhe negado o acesso ao todo da realidade”. Também critica a teologia liberal do século XIX que com o seu método histórico-crítico reduzia muitas vezes a fé a uma moral. Ele defende uma razão aberta não reduzida ao experimental, ou melhor, a uma percepção sensorial redutora.
Naqueles que orientam a opinião pública, os dançarinos do sonho, prevalece o músculo e a acrobacia sobre a maça cinzenta, nos debates e nos Media.
O vulgo julga que religião é igual a religião e que Deus é igual a Deus. Mas aqui é que está o problema central: a compreensão de Deus é que separa o Cristianismo do Islão. Consequentemente o conceito de Homem não é o mesmo para o Islão e para o Cristianismo, o mesmo se diga do conceito de sociedade.
O Deus dos cristãos não age contra a razão nem se deixa reduzir ao “razoável”. No cristianismo até os ateus se tornam seus profetas. Tanto a ciência como a fé operam como parceiros, como correctivos da razão. Naturalmente que será lógico que numa parceria razão – fé não poderá haver lugar de imunidade para uma ou para outra.
O Islão, tal como o racionalismo iluminista extremo, relega Deus para o deserto da transcendência. Aí não é permitida a interacção entre Deus e o Homem. Esta é a compreensão que o papa vem questionar. Ele pretende superar o pensar dialéctico no seguimento dum pensar bipolar integrador do todo numa interacção dialógica do ser e do estar (confrontar a interacção trinitária: matéria – espírito – expressão). O iluminismo e o Islão ao separarem a razão da fé cometem o erro do encurtamento. É verdade que com as duas guerras mundiais o Homo europeus superou todos os medos passando a experimentar na pele a ausência de Deus, dum deus que não interferiu parecendo indiferente. Este equívoco porém, penso eu, provem de gerações ainda presas ao pensar dialéctico que ainda se não deram conta da nova época histórica da ciência iniciada por Einstein e colegas. A discussão cristã da fórmula da vida trinitária poderia ajudar a superar a ideologia dos opostos. Trata-se duma realidade, duma fórmula e duma tentativa de encontrar resposta para o ser e para o estar.
Permanece a esperança de que o Islão se deixará interpelar quando os muçulmanos europeus ganharem peso no mundo árabe. Até agora têm corrido o perigo de se serem reduzidos a seus tentáculos.
O que os conselheiros do Papa devem ter em atenção é que Bento XVI não perca de vista os problemas concretos que afligem a Igreja. Estes porém são ninharias em comparação com a crise do mundo ocidental e em especial da Europa. No cristianismo que deu à luz a Europa é natural que o representante do catolicismo, vendo os problemas a nível global, tem mais competência para analisar as questões globais do que aqueles que mourejam nas nacionalidades. Ele sabe que como a civilização ocidental nasceu com o cristianismo também morrerá com a morte deste. Como homem universal está interessado na fé transcultural consciente porém de que no Cristianismo se encontram todas as respostas às questões da vida.
Também a razão terá que, no respeito pelos símbolos, purificar a praxis mágica e sacramentalista.
Na sua viagem à Baviera o papa alemão apontou para os verdadeiros problemas do futuro.

António da Cunha Duarte Justo
Teólogo

António da Cunha Duarte Justo
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A Armadilha do Diálogo e da Compreensão

Dado que tanto terroristas como muçulmanos pacíficos baseiam o seu agir no Corão que é o fundamento imutável e obrigatório da fé, dos valores, do agir e do direito não pode haver diálogo entre as culturas sem o conhecimento do livro Corão. Consequentemente terá que ser permitido falar do conteúdo do mesmo…
O diálogo não é uma questão de somenos importância reservada a ingénuos ou a bonzinhos que confundem diálogo com engraxar ou com o jogo do empisca.
O futuro das democracias na Europa dependerá da maneira como reagirmos ao Islão.
A obrigação obsessiva em que se sentem os europeus para a compreensão conduz à armadilha da compreensão. Um diálogo aberto ajudará o Islão e todos os outros.
Para o diálogo não é suficiente a afirmação de que o Islão é uma religião pacífica. Alguns apelam para o tacto no trato com os muçulmanos. Ora, eles não são crianças, o que se necessita no diálogo é veracidade, sinceridade e abertura. Doutro modo o diálogo torna-se em campo de acção de hipócritas e oportunistas. A dor, a sombra de hoje anuncia o sol de amanhã… Um diálogo universal, num mundo global só é possível sob a plataforma da razão. Já antes de Jesus, a Bíblia reconhecia “ Muita sabedoria, muita aflição e quem aumenta o saber, aumenta a dor”….
A “guerra santa” não é racionalmente sustentável. Àqueles que misturam alhos com bugalhos apresentando as cruzadas como espécie de guerra santa isso é perverter a realidade. As cruzadas nunca foram santas nem com base no evangelho. Também não foram guerras de conquista mas sim de reconquista. (Lembre-se a acção de D. Henrique e seus homens na fundação de Portugal). Além disso vivemos hoje.
Hoje, só o Islão defende o direito de defender a religião, a fé com a espada. Daí a oportunidade da frase do imperador bizantino: “mostra-me o que Maomé trouxe de novo e encontrarás coisas más e desumanas, como o direito de defender pela espada a fé que pregava”. Os extremistas do Islão tornaram-se a expressão da religião, pervertindo assim o todo.
A indústria da informação não está interessada em ouvir o que se diz. Ela está preocupada no como ouvir, como utilizar, dizendo-se o mesmo dos destinatários. Observa-se uma cumplicidade mútua.
Amigos, podemos fazer história mas não na continuação da guerra com outros meios. Não precisamos de esperar pelas catástrofes para nos mudarmos, para aprendermos. Rememos contra a catástrofe contra a violência, talvez com palavras duras mas com um coração manso no sentido de servir no seguimento da luz… a luz da possibilidade real.

António Justo

António da Cunha Duarte Justo

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