PROFESSORES DE APOIO PEDAGÓGICO NAS ÁREAS CONSULARES


Consulado de Frankfurt sem Apoio Pedagógico Regional

António Justo

A urgência em racionalizar a administração e em dar resposta às necessidades da população exige colaboração e um cuidado especial de todas as partes. Nas áreas consulares onde se administra o ensino de português com professores sob a alçada de Portugal estão previstos Professores de Apoio Pedagógico. A Área Consular de Frankfurt encontra-se sem Professor de Apoio Pedagógico para os professores da responsabilidade portuguesa desde há mais de um ano. É de esperar que as autoridades portuguesas solucionem a situação. Não é razoável nem proveitosa a existência dum Professor de Apoio Pedagógico Regional que, a tempo inteiro, assuma o encargo de duas áreas consulares.


Nas áreas consulares não se precisa dum professor a tempo inteiro mas sim dum penso horário de um mínimo de 5 horas até a um máximo de 10 para dar resposta às necessidades pedagógicas e organizativas de cada área consular. Em princípio não deveria haver Professor de Apoio Pedagógico sem ter também cursos em que leccione, tal como faz a parte alemã em relação ao ensino sob a sua responsabilidade.


Os professores de ensino sob a responsabilidade portuguesa não podem ser deitados ao abandono sem alguém que, perto deles, os acompanhe e apoie. A eficiência do ensino depende também da relação entre os professores.


Constato, na qualidade de conselheiro da ara consular de Frankfurt, a necessidade da presença de um professor de apoio pedagógico que esteja, também geograficamente mais perto dos docentes, das escolas e das comunidades portuguesas desta área consular.


O perfil do/a Professor/a de Apoio Regional pressupõe, além de altas competências pedagógicas, empenhamento pessoal e capacidade de conversação com a administração alemã.


Encargos do Coordenador de Apoio Regional

Esta figura, mediadora de relações entre a estrutura central – a Coordenação Geral de Ensino de Português na Alemanha – e os docentes deverá:


  • responder às competências que lhe forem delegadas pelo respectivo coordenador;
  • colaborar com o professor de apoio pedagógico de língua materna da parte alemã;
  • criar elos de comunicação entre os docentes, as escolas alemãs e a coordenação de ensino, nomeadamente através de um boletim informativo regular;
  • promover iniciativas de vinculação do ensino do português às escolas alemãs, através da sua abertura aos alunos alemães;
  • promover a auscultação de ideias e sugestões dos docentes nas diferentes realidades de ensino;
  • proporcionar a troca de experiências entre os professores;
  • promover o apoio pedagógico e didáctico  a professores dos cursos de língua portuguesa em funcionamento;
  • mobilizar meios de respostas educativas às necessidades das comunidades portuguesas;
  • promover a organização de acções de formação pedagógica e científicas;
  • identificar, com os professores, os conteúdos programáticos em que os alunos encontram maiores dificuldades;
  • organizar, com os professores, materiais pedagógicos disponíveis numa plataforma online, capazes de dar resposta às carências detectadas;
  • fomentar a partilha e o intercâmbio entre os diferentes cursos de línguas e culturas portuguesas em funcionamento na área consular;
  • promover o intercambio de escolas alemãs com outras escolas em Portugal;
  • elaborar, anualmente, com os professores, uma lista de livros escolares a propor.
  • promover acções de formação para comissões de pais, em colaboração com os professores dos respectivos cursos.


Em benefício duma política de ensino mais virada para a eficiência e para o cidadão.


António da Cunha Duarte Justo

Membro do Conselho Consultivo do Consulado de Frankfurt

antoniocunhajusto@googlemail.com

A Fé é a Razão crítica no Monopólio da Razão e das Leis da Natureza


ANTICATOLICISMO UM DISTINTIVO DO FANATISMO MODERNO


António Justo


O jornalista Christopher Hitchens, antigo partidário do trotskismo e depois defensor da Guerra contra o Iraque, rufa, por todo o lado, os tambores contra Bento XVI. Desde que o Papa se insurgiu publicamente contra a política de Busch no Iraque surgiu nos media dos Estados Unidos da América uma campanha feroz contra o catolicismo que depois passou para a Europa. Ideólogos americanos e ingleses não perdoaram à Igreja católica o facto de ele ter condenado a guerra. A cruzada contra o papado é motivada por razões laicistas e por um certo desalento nas esperanças dos reformistas dentro da Igreja.


Ed Koch, antigo presidente da cidade de Nova Iorque, pressupõe que por trás da campanha contra o catolicismo, esteja “a atitude da Igreja contra a guerra, contra o aborto e contra o reconhecimento da união homossexual como casamento”. A Igreja, embora “semper renovanda” não pode estar dependente das ondas e campanhas dos seus adversários. Precisam-se instituições estáveis e de confiança, não dispostas a mudar de opinião como cata-ventos. Estas campanhas obrigam a Igreja a ser mais consequente no conservadorismo, o que não favorece um certo agiornamento necessário.


Opinião bota-de-elástico favorece a Demagogia

A sociedade cada vez se torna mais vítima dum facilitismo sem raízes nem precisão. Aos poderosos, como a verdade só complica, basta-lhes a opinião. Os seus multiplicadores seguem as ideologias como as folhas das árvores o sentido do vento. Os meios de comunicação social transformam-se no bombo da festa. E o povo, sem tempo nem saber para entender o canto, segue o ritmo dos zé-pereiras da praça.


Hitchens, o guru do fanatismo contra o catolicismo, vê na religião em geral um “veneno mortal”. Tornou-se, assim, o estandarte de muitos que querem ver a ideia de homem associada ao animal selvagem. O laicismo, no seu programa de paganizar a sociedade, declarou guerra ao cristianismo a partir da revolução francesa, mas com a queda do socialismo real (muro da vergonha) adoptou o fanatismo que na Europa antiga andava ligado às crenças religiosas. Os prosélitos laicistas, que ambicionam ocupar os Estados, pretendem denegrir a única instituição moral global capaz de desmascarar os poderosos da Terra. Num mundo do ódio e da desordem tornar-se-á mais fácil impor a lei do mais forte no desdém duma moral superior que defende o direito dos fracos e oprimidos a uma vida digna.


O fanatismo anticristão, pretende o absolutismo laicista, o monopólio da razão e de certas leis naturais. Não suporta que centenas de milhares de pessoas se dediquem, sem receberem compensação económica, à defesa dos pobres e oprimidos e que a instituição, também ela pecadora como todo o terreno, levante a sua voz dando voz aos outros.


No tempo da globalidade não suportam a instituição global mais antiga do mundo a fazer-lhes sombra. Atacam toda a moral para, com a ruína dos valores, ruírem também os estados e reiniciarem os tempos das barbaridades e do politeísmo favorável ao caciquismo.


Gente de formação unilateral não suporta a existência pacífica de crentes e ateus, de republicanos e monarcas, numa relação de complementaridade. Aferrados na sua crença ateia e política combatem a crença dos outros desacreditando-a, como se toda a crença não fosse um salto no abismo!


Confiantes na ditadura da opinião bota-de-elástico, implementada por um partidarismo de ocasião e por um mercantilismo e socialismo ferozes, conseguem desestabilizar, apenas com palavreado e sem obras, muitos que vivem sob a trela da opinião publicada.

A iniciativa “Preservativos” ao “Papa em Portugal” vai distribuir 25 mil contraceptivos em lugares por onde o Papa passa. Vive-se de campanhas e não duma discussão diferenciada como se fosse exigido aos crentes o uso dos preservativos contra a própria consciência. As estatísticas de estudos internacionais provam que, nos países africanos com mais católicos, a SIDA está muito menos alastrada do que onde os preservativos são distribuídos. Ideólogos não suportam instâncias que apelam ao indivíduo a pensar pela própria cabeça e a decidir ponderadamente. No cristianismo, a nível moral, a consciência individual é o juiz superior. Isto pressupõe esforço individual e responsabilidade social.


Razão Cristã contra Monopólio das Leis da Natureza

A Fé cristã integra a razão e tornou-se na razão crítica ao monopólio da razão e das leis da natureza. A Igreja é necessária. A fé orienta-se contra a exclusividade das leis da natureza.

O processo da ressurreição, a vida eterna, um Deus humano em três pessoas (que não se contenta com o diálogo mas pressupõe o triálogo), a assunção, o celibato, são exemplos que não se deixam sintonizar com as leis da natureza, tal como a ideia não se deixa sintonizar com a realidade que descreve. A fé constitui um contrapeso às leis mecanicistas e deterministas da macro-física e às teorias do darwinismo social. O cristianismo segue a sabedoria do não só… mas também…


Com a fé cria-se um espaço crítico, uma dúvida contra o monopólio das leis naturais e da razão. A fé possibilita o alargamento do horizonte, ajuda a levantar os olhos transcendendo-nos dum ser reduzido a ovelha de boca na erva e de olhar no traseiro da vizinha! A fé cristã possibilita a libertação do imediato, a libertação de si mesmo, a libertação das ideologias, do Estado e da própria crença.


A igreja é uma obra de solidariedade universal para pessoas crentes e que serve os oprimidos da sociedade e também os não crentes. A luta destrutiva, a que se assiste contra a caritas que provém da fé, deve ser contrabalançada por exigências de verdade e serviço à comunidade. Toda a instituição é um mal menor a ser continuamente corrigida por cada um. A intolerância contra o cristianismo é tolerada e promovida apesar deste ser, nos tempos actuais, o grupo mais perseguido e ainda com mais mártires do que em qualquer época passada. Hoje ideólogos tornam-se milionários escrevendo livros e publicando meias verdades ou mentiras.


Também as pessoas que não se deixam orientar só pela razão têm direito a um lugar que lhes pertence e os acompanhe pela vida fora.


Pelas obras e não pelas palavras devem ser julgados. Há muitos lobos por todo o lado. Eles comem tudo e não deixam nada…


António da Cunha Duarte Justo

Teólogo e Pedagogo

antoniocunhajusto@googlemail.com

CORRENTES MIGRATÓRIAS: Antigamente a escravidão, hoje a emigração ( uma perspectiva para a discussão em voga )

CORRENTES MIGRATÓRIAS

Antigamente a escravidão, hoje a emigração

António Justo

Emigração e colonialismo andam de mãos dadas, numa História de conquistas, destruição e exploração. A sociedade produz vencedores e vencidos, ricos e pobres. O território de Portugal e Espanha foram primeiramente colonizados pelos Fenícios, Gregos e Romanos, assumindo até a língua dos colonizadores, para mais tarde passarem a ser colonizadores no século XV e XVI. O desejo de domínio e de libertação andam de mãos dadas. A colonização é feita pelas elites e a emigração dá-se no seio do povo! A pobreza, o clima, as catástrofes e a má política põem o povo em marcha no sentido do Norte. O direito de emigrar deve ser um direito humano!


Na emigração o povo procura saídas da carência na busca de melhorar a qualidade de vida. A ânsia de libertação e a demanda de novas oportunidades é uma constante na humanidade como vemos já no êxodo do povo hebreu. Levam consigo costumes, ideias e o gene. Rompem assim as fronteiras de países, raças e culturas.


Quem está bem não abandona a terra; satisfaz o seu espírito aventureiro indo de férias ao estrangeiro.


A má política é castigada com a emigração. Cada sistema económico e político têm as mesmas estruturas embora com ligeiras adaptações: Antigamente a escravidão, hoje a emigração! Não conhece mudanças qualitativas, apenas quantitativas. A dor e a felicidade não são quantificáveis, mantêm-se constantes, tal como a elite e o povo!


Na discussão política, o tema da emigração não deveria ser aproveitado para tirar dele dividendos. Todos os partidos, se forem honestos, terão de confessar o “mea culpa” em vez de atirarem pedradas aos telhados dos outros. A emigração por necessidade é a grande calamidade dos nossos tempos, tal com outrora a escravidão e a servidão. Só uma discussão académica distante poderá ignorar as tragédias humanas que se escondem sob o rosto levantado duma casa construída na terra para os da terra. Saíram sem casa e morrem longe da casa e da terra.


Os factores de emigração são complexos e os problemas humanos que ela encobre também.


Discurso sobre Emigração com Diferentes Conotações ideológicas


Como uma discriminação latente conota a emigração com “populacho”, muitos académicos não suportam que se fale duma cultura dos “senhores doutores” e subserviência cunhal para não dizer cunhada. Portugal sempre foi hipócrita no trato das questões de emigração. A má consciência da nação, a inveja de muitos e a irresponsabilidade política que vê saldadas muitas dívidas do Estado com as remessas dos emigrantes, têm o descaramento de conduzir um discurso leviano e enganador baseado nas diferenças entre a emigração dos anos 60/70 e as de hoje, como se a emigração de ontem fosse uma emigração de necessidade e a de hoje uma emigração de liberdade. Como se os erros de ontem desculpassem os mesmos erros de hoje. Vive-se dum discurso abusador dos emigrantes, entre miserabilismo e eufemismo. O perfil dos novos emigrantes comunga da mesma realidade do dos anos 60/70: a necessidade. Usam-se argumentos de mau pagador e confundem-se alhos com bugalhos ao colocar-se no mesmo panelão emigrantes, luso descendentes, funcionários do estado e contratados especiais de universidades ou de grandes empresas! O Portugal progressista parece só conhecer especialistas que saem do país!… Os emigrantes (Auswanderer) da Alemanha em Portugal são também eles emigrantes /imigrantes, só que com um outro estatuto, que não o dos emigrantes portugueses. Não foi a necessidade económica mas a mais valias do lazer, de sol e do coração português que os levou a ir para Portugal gozar da sua reforma, no entardecer da sua vida. Na Alemanha quando a opinião pública fala dos seus emigrantes, fá-lo manifestando pesar. Pesar por ter alimentado e formado os seus cidadãos e os ver sair, quando deveriam ficar para produzir para a nação. Na Alemanha, em assuntos de emigração, assiste-se a um discurso de cidadania e de interesses de povo quando em Portugal (nos ambientes oficiais) se fala não de cidadãos mas de emigrantes de cara suja e de emigrantes de cara lavada!


Aos acomodados do sistema, é-lhe incómoda a tecla da necessidade e da má administração, mas muitos dos que falam com eufemismos sobre a emigração de hoje, são aqueles que se ganham bons honorários em projectos e seminários blablabla para ou sobre emigrantes. O ideário português sobre os emigrantes desmascara-se a si mesmo quando, emigrantes de hoje, se sentem na necessidade de se distanciarem dos seus antigos companheiros de destino, afirmando que têm melhores qualificações que os de ontem, quando, em grande partem vêm substituir os emigrantes de ontem nos mesmos trabalhos. Antigamente respondia-se “não vá o sapateiro além da chinela”; em linguagem mais democrática talvez seja mais adequado dizer-se: não vá a chinela além do sapateiro. Os nossos emigrantes hoje, como ontem, são vulneráveis no mercado de trabalho. Não falo naturalmente dos destacados do estado e de muitos da segunda e terceira geração integrados na vida social do país de imigração. A ilusão e a miopia impedem-nos de reconhecer a realidade precária em que se encontram.


É uma dor de alma assistir-se ao esvaziamento de Portugal. O esforço de Portugal feito na formação escolar não é eficiente se ao mesmo tempo não cria lugares de emprego que lhes dê saída para a vida. É verdade que o ensino universitário em Portugal duplicou nos últimos dez anos sem que o mercado de trabalho lhes dê saída. Vão então para o estrangeiro ocupar lugares, as mais das vezes não correspondentes à sua qualificação. O contribuinte pagou a sua formação e vê-o sair para ir enriquecer outras economias. Há alguns académicos altamente qualificados que são contratados pelo estrangeiro como fazem grandes empresas internacionais junto das universidades dos vários países. Seriam necessários pactos entre universidades nacionais e estrangeiras, entre universidades e empresas nacionais e estrangeiras para que Portugal não só exporte mão-de-obra mas tenha contrapartidas. Não há espaço para projectos profissionais nem familiares. Os finalistas de cursos ficam à deriva. A situação obriga, a necessidade manda e cada qual safe-se como puder.


A emigração, para países de expressão portuguesa, deveria ter prioridade alta para o país de envio e de acolhimento. O português é dos poucos povos no mundo que mais se adapta e integra no país de acolhimento, sem criar problemas.


Atacar a emigração de ontem e justificar a de hoje é cumplicidade com os exploradores do povo. Demagogos da palavra deveriam apostar menos no orgulho balofo colectivo para apostar no orgulho da produção colectiva e individual da nação. Precisa-se dum portuguesismo de obras e não apenas de garganta empertigada. O orgulho nacional é, de facto, o pouco que ainda resta a muitos que, para desviarem a vista de si mesmos, olham para a incompetência política nacional com um sentimento indeciso de saudade masoquista!


Uma mudança de paradigma face à diáspora portuguesa não se alcança com medidas centradas apenas em aspectos estatísticos, como é o caso do Observatório da Emigração para informar sobre fluxos migratórios, de seminários de igualdade de oportunidades entre homens e mulheres, de iniciativas formativas/informativas e de sensibilização, por vezes mais preocupadas em aplicar fundos da União Europeia e em dar ajudas de custo aos soldados do partido. Os dinheiros bem aplicados no apoio a associações seriam mais rentáveis.


António da cunha Duarte Justo

Membro do Conselho Consultivo da área Consular de Frankfurt, Alemanha


MARIA – MAIO – FÁTIMA


EXPRESSÕES CONCRETAS DA FEMINIDADE

António Justo

Maio é o mês das flores (maias), é o mês de Maria (da feminidade), o mês do povo. Maria, tal como a natureza em Maio, assume as mais diversas expressões. As diferentes devoções a Maria são, também elas, manifestações da multiplicidade da realidade e das imagens da alma humana. A natureza feminina manifesta-se em Fátima, a 13 de Maio de 1917. A região de Fátima já era, antigamente, um lugar alto a nível de forças telúricas; com as aparições da cova da Iria torna-se também num altar da espiritualidade feminina.

Maria insurge-se contra a guerra e contra os extravios da Rússia. O Povo Português, tal como nos séculos XIV e XV, recorda-se da sua missão histórica de dar “novos mundos ao mundo” nos descobrimentos, e redescobre-se, pela voz de três pastorinhos, na missão de levar a Rússia ao bom caminho, através da oração. Este foi um ponto alto da consciência nacional portuguesa. Num momento em que a Portugal se alienava de si mesmo com guerrilhas ideológicas e as nações se encontravam em guerra, consegue iniciar um movimento com repercussões mundiais na luta contra o comunismo de carácter estalinista e marxista.


Maria, tal como a alma humana, tem mil rostos. Expressa-se como mãe, rainha, virgem, auxiliadora, a Senhora de Lurdes, de Fátima, etc. Nela se manifesta também a nossa geografia espiritual, o nosso ser de paisagem no tempo e no espaço. Em Maria se expressa a escrituras e a tradição, a espiritualidade e a teologia, o rito e o folclore. Nela, tal como em Cristo, encontra-se o ser humano completo.


A teologia feminista procura ver nela sobretudo a dimensão humana (1). Maria é a mulher expropriada. Ao pôr-se na disponibilidade do acto criador, Maria, e com ela a mulher, é libertada das correntes que a submetem ao homem e à sociedade. Na sua disposição e abertura ao espírito ela torna-se o protótipo da criação, da arte – o dar à luz em si. Torna-se a imagem de todo o artista cujo programa se realiza no Magnificat. Nele se revela o segredo do processo de expropriação, o programa para todo o homem e mulher na integração da polaridade, superando assim a exploração e o domínio sobre o outro.


Um pensar caracteristicamente masculino, o racionalismo exacerbado, não entende os meandros duma realidade, toda ela, formada na/da complementaridade. Por isso, nos seus excessos repudia Maria, repudia a religião, que são a força e o símbolo da realidade feminina na humanidade e no universo. O povo, com as suas exigências integrais, é um factor correctivo da história do pensamento humano demasiado elitista e selectivo, e pelo facto, não integrador.


Na teologia feminista Maria, como todos os símbolos religiosos, pode ser vista das mais variadas perspectivas. Maria é ao mesmo tempo submissa e insubordinada. O movimento emancipador das mulheres procura em Maria marcas em que se apoie. Muitas vêem nos evangélicos, na sua acentuação só em Cristo, a esconjuração dos restos da feminidade na religião


O feminismo radical, de carácter mais masculino, numa estratégia polarizante, procura conquistar terreno vendo em Maria a deusa das origens. Independentemente dos abusos masculinos, na interpretação do divino, deve recordar-se que o Cristianismo original não é de conotação sexual nem se deixa reduzir a interpretações, a perspectivas e maneiras de ver próprias do tempo. Estas dependem do desenvolvimento da consciência humana e do espírito correspondente a cada época, dando às interpretações uma certa relatividade. Fé mais que um credo é uma vivência, uma mística e só assim universal na sua integralidade.


Os Tempos estão maduros para se compreender o Significado de Maria, a Mitigação do Machismo histórico


A História profana, e em parte a história religiosa, tem sido uma história masculina, uma história de machos. Com o irromper dos novos tempos, do século XXI vai sendo tempo de integrar na sua feitura histórica o pólo feminino da humanidade.


Os tempos vão estando maduros para compreender o significado de Maria. Muitas das imagens de Maria são pré-cristãs. Maria cristianiza as deusas pagãs e assume as suas residências num processo espácio-temporal evolutivo. Nela se reúnem todas as metáforas femininas e se encontra a abertura do limiar do tempo novo. Maria é a Deusa secreta do Cristianismo e um apelo à Humanidade para reconhecer a complementaridade da vida. As suas aparições expressam também o grande poder da realidade do inconsciente individual e colectivo.


Também o peregrino, no seu caminhar, se sente como parte dum todo; o povo, a natureza respondem ao chamamento interior. Também por isso, será inútil muito do esforço de padres na tentativa de racionalizarem (masculinizarem) certas práticas e promessas dos crentes a Nossa Senhora. A razão é também ela demasiado masculina e unilateral para poder compreender a outra parte da natureza humana. Assim assiste-se a um exagero (polarização) tanto na análise como na prática religiosa: Animus contra anima.


De momento assiste-se, porém, a uma tendência de espiritualizar a natureza, num regresso aos cultos pré-marianos e a um politeísmo de carácter biotópico particularista. A masculinidade, com a sua maneira de pensar racionalista acompanhante, domina toda a sociedade e até os recônditos mais genuínos da feminilidade (“sentimento”) o que conduz a uma reacção social de fuga e de acentuação do outro extremo, a irracionalidade. O irracionalismo, em voga, favorece tudo o que está fora da tradição bíblica e da tradição católica. Refugia-se, muitas vezes, numa interpretação feminista de espiritualidade à la carte, dirigida apenas para a corporeidade e adversa à razão. O mundo da racionalidade usual não deixa espaço para imagens, ficando estas, quando muito, limitadas ao mundo da religião e da arte. A capacidade de compreensão simbólica torna-se, no dia a dia, cada vez mais difícil. A alma porém revela-se e fala através de imagens. O desequilíbrio manifesta-se no negócio com os devocionais e o esoterismo florescente. Há que reconciliar a masculinidade com a feminidade, a razão com a intuição.


Maria é a mulher fértil que transmite a vida. No princípio está a mãe original. A mulher traz a vida sem a intervenção do homem. Maria virgem e mãe é a metáfora dum novo começo. As imagens de Maria surgem da base. Ela torna-se o protótipo, a mulher, a mãe da humanidade; ela encontra-se no centro de cada mulher, de cada homem e da natureza.


O humanismo de Jesus foi em parte absorvido pela cultura. O problema é que um humanismo radical pretende abdicar da tradição, da memória, da terra que possibilita a vida: a mulher. Na memória é que se procria e se dá o nascimento espiritual.


Da Sociedade Machista para a Sociedade integral

“Aquele que faz a minha vontade é meu pai, minha mãe e meu irmão”. O mestre de Nazaré estoira com os papéis a que as pessoas se encostam, sejam eles familiares, sociais, políticos, religiosos ou de sexos; faz a revolução das revoluções. Com Jesus e com Maria irrompe o tempo do homem-mulher adulto. Homem e mulher estão chamados a integrar em si o animus e a anima, o masculino e o feminino. Para João a filiação divina (adulta) só acontece no Espírito Santo, na liberdade criativa. Supera-se a dominância do género! Maria, a pessoa, engravida por obra do espírito santo, por força do Espírito e não apenas pela obra do macho. A dimensão do espírito é reconhecida como essencial, como formadora da realidade mas não definível nem localizável numa só dimensão particular. Com Maria e seu filho, o Homem-Mulher emancipa-se da tribo e do papel sexual e social que desempenha. O seu valor acontece na ipseidade que implica uma relação já não binária (da dialéctica) mas trinária (da trindade), não já pela afirmação pela contradição (de opostos objectivantes) mas na afirmação na complementaridade (relacional personificante). Passa-se para uma estratégia/vivência já não apenas de diálogo mas de triálogo.


Para o evangelista Mateus Jesus reúne em si as esperanças dos judeus na adopção de Jesus por José, descendente da casa de David (tradição), e a esperança de toda a humanidade no totalmente novo como filho do espírito (O Homem novo surge duma virgem e não de alguém com poderes sobre ele – O Homem/Mulher da Nova aliança é o novo Adão/Eva, o Homem/Mulher em contínua recriação). Reúne a tradição e o novo numa identidade nova e própria. Ele é o esperado que através do espírito apresenta o totalmente novo, não precisando dum legitimação fora dele; é o Homem novo. Deus intervém assim, histórica e misticamente, através do espírito. A imagem judaica tradicional de Deus é superada. Maria, na anunciação e concepção, embora ligada a David, indirectamente através de José, realiza nela a aliança histórica de Deus ao povo de Israel alargando essa aliança a todo o indivíduo, a todo o cidadão do mundo, através do gerar por acção do espírito. (Naturalmente que na bíblia se trata de teologia e não de mera Biologia ou de História, como gostariam os racionalistas que sonham com uma igreja muda, ou uma forma de pensar masculina do “divide et impera”.) O acto legitimador não se reduz ao institucional histórico, ele passa a ser o Espírito que sopra independentemente de condicionamentos e condicionalismos.


No Magnificat, as vítimas tornam-se sujeito da acção. A salvação vem de baixo e não de cima, como querem os poderes/pensares racionalistas e o poder estabelecido. Hoje, mais que nunca, necessita-se de uma exegese, duma história, duma política com uma veia mística. No caminho místico dá-se a convergência da transcendência com a imanência, do masculino com o feminino.


Não podemos reconhecer só a terra como deusa, como quer o feminismo radical (lógico) infecundo nem só o céu como horizonte descontextuado como pretende a dialéctica do pensar masculino. Num processo aberto à mística conseguir-se-á reconciliar o mundo das ideias com o da realidade, o mundo do espírito com o da matéria, as elites com o povo. Seria falso desmiolar os mitos. O mito age a partir do que está escondido, na confluência da força vertical com a força horizontal. Todo o componente da realidade está integrado num todo global complementar, num sistema dinâmico relacional na interligação dos campos físico, fenomenológico e espiritual como manifesta a visão trinitária.


No mês de Maio por todo o mundo católico se observa grande actividade em torno de Maria. Muitas vezes as celebrações litúrgicas são orientadas por leigos. Nestas liturgias marianas privilegia-se a feminidade. A reza do terço é uma forma de meditação global que integra nela a inspiração e a expiração em ritmo complementar. Em liturgias, paraliturgias e actos seculares deveria dar-se mais relevo ao papel da feminidade.


Um aspecto importante que se enquadraria dentro desta espiritualidade seria a introdução de ritos de imposição das mãos em todas as paróquias. Aí, todos os participantes, em resposta à diversidade dos dons do espírito santo em cada um, poderiam criar ritos em que, também o tratamento de corpo e alma, a cura dos fiéis presentes se tornassem práticas usuais, mediante a imposição das mãos por parte dos fiéis. Isto corresponderia a uma necessidade real e cuja vulgarização poderia ter como orientação a bênção dos enfermos realizada em Fátima nos dias treze, bem como certas práticas dos movimentos carismáticos. As liturgias marianas poderiam tornar-se num exercício com expressões mais adequadas às necessidades do lugar e do tempo, num dar resposta aos sinais dos tempos. Maio é um apelo à política, à religião, à economia a integrar na sua masculinidade o outro pólo da realidade que é a feminidade. Esta encontra-se oprimida pela dinâmica dum poder e dum pensar todo ele masculino.


António da Cunha Duarte Justo

Teólogo e Pedagogo

antoniocunhajusto@googlemail.com


(1) Sabe-se da investigação teológica que o modo de pessoas compreenderem a bíblia depende muitíssimo da sua pré-atitude. A cabeça do leitor, formata à sua medida um texto virtual a partir do texto bíblico que tem pela frente. Também o modo de compreender o texto se processa diferentemente. Enquanto que leitores ligados à igreja compreendem o texto num contexto global bíblico, leitores sem experiência eclesial procuram o acesso ao texto através da perspectiva histórica.  O mesmo se dá em relação a nível de culturas. O animus, com  a sua maneira de pensar masculina polar exclui , a anima como maneira de pensar mais integral (feminina).

BÉLGICA PROIBE O USO DA BURCA ISLÂMICA


Da Multicultura para a Intercultura

António Justo

O Parlamento belga decidiu ontem (29.04.2009) por unanimidade a proibição do uso da Burca em público às mulheres islâmicas. As infractoras passarão a pagar uma multa de 25 Euros ou a sujeitar-se a prisão de 7 dias. Para a Lei entrar em vigor necessita ainda da aprovação do Senado.


A sociedade vê no uso da Burca e do Lenço um sinal político reaccionário e uma expressão de repressão da mulher e dum poder machista cimentado pela religião.


Mulher prisioneira na “gaiola da virgindade” e na “gaiola do Islão”

Embora o Estado esteja obrigado à neutralidade tem que respeitar o ambiente cultural da sociedade maioritária. Não aceita que a religião determine regras humilhantes para o indivíduo ou que castigue os seus membros por infracção às suas regras. Não tolera que um grupo minoritário abuse da tolerância da sociedade maioritária para fomentar medidas intolerantes. Muitos vêem a mulher prisioneira na “gaiola da virgindade” e na “gaiola do Islão”! Muitas jovens menores querem casar para assim evitarem a lei da virgindade.


A sociedade de acolhimento observa que as pessoas chegam a um país onde há liberdades que logo são combatidas pelas organizações maometanas que dão cobertura ou fazem vista grossa a assassinatos honrosos, casamentos forçados, etc. De facto, em Berlim, onde se encontra uma forte colónia turca, só em 2007 foram registados 378 casos de casamentos forçados, segundo informação da “Casa das Mulheres” de Berlim; em 2005 tinham sido registados 330 casos. O aumento dos registos é explicado com o aumento de coragem e da consciência individual das afectadas.


Acusam as associações turcas e islâmicas de só se empenharem na defesa e imposição dos seus direitos religiosos contra os direitos individuais sem se interessarem pela criação de instituições de apoio aos membros necessitados, por exemplo, criação de casas de refúgio para mulheres ameaçadas (Casas das mulheres)…


O argumento de que há extremistas em todas as religiões não deve preparar o caminho ao islamismo militante que, sistematicamente, impede a integração dos seus membros nas sociedades em que se encontra. Facto é que, ao contrário do Islão, os crentes de outras religiões não põem em risco a vida quando não seguem as regras da sua religião. Partem do princípio que os turcos /muçulmanos desprezam as leis das culturas onde se encontram, ao contrário dos outros imigrantes.


As nações em que se encontram grandes comunidades islâmicas são confrontadas com a confissionalizacão do público em geral. Este fenómeno, porém, observa-se também no militarismo ateu contra a sociedade religiosa e em especial contra o Catolicismo. Não seria legítimo culpar monocausalmente os muçulmanos de provocarem militantismos religiosos e seculares nas sociedades para onde emigram.


Esta reacção da Bélgica, uma nação que foi exemplar nas oportunidades que deu aos estrangeiros, torna-se compreensível dado o comunidades turcas e as mesquitas só porem exigências aos estados onde se encontram, não se integrando como fazem as outras etnias. Assim assiste-se a uma importação contínua de noivas da Turquia, a exigências de nas escolas haver uma sala de oração para muçulmanos, casamento por coacção, casamentos religiosos com menores a troco de dinheiro (14 anos), etc. Imagine-se que em nações muçulmanas como a Turquia, onde cristãos são discriminados no exercício do culto e da religião, um cristão levantasse a exigência de querer na escola pública um lugar para poder rezar! Facto é que na Alemanha, pelo menos numa escola pública, os muçulmanos conseguiram um lugar de oração para eles; imagine-se que todas as outras religiões se lembrassem de colocar a mesma exigência. Tudo isto é possível devido ao desplante de uns e à falta de critério dos outros.


O assunto do interculturalismo é muito complexo atendendo aos diferentes modelos morais e às matrizes específicas de identificação cultural. O Islão, certamente conseguiria mais aceitação na Europa, se deixasse de perseguir e descriminar os cristãos nos seus países.


Facto é que, os imigrantes muçulmanos se encontram num paradoxo de sociedades com exigências contraditórias: dum lado, a sociedade islâmica que corresponde a um colectivo patriarcal religioso e do outro a sociedade maioritária que corresponde a um colectivo secularista também ele militante: Dois credos irreconciliáveis! Dum lado uma religião autoritária e hegemónica e do outro um estado laicista prosélito: um e outro de carácter ideológico; duas fés contraditórias que não se suportam uma à outra.


No aspecto da capacidade de integração, certamente que o povo português é o mais exemplar de todos, em todas as sociedades onde se encontra! É chinês com os chineses, americano com os americanos, brasileiro com os brasileiros. Certamente por isso o Luxemburgo fomentou uma política de imigração que privilegia os portugueses no acesso ao Luxemburgo.

Todos temos a aprender uns dos outros. por isso não podemos fechar-nos nas gaiolas culturais como se o mundo não existisse sendo formado dos mais diferentes biótopos em complementaridade e simbiose. Daí a necessidade do passo da multicultura para a intercultura. A identidade duma pessoa desenvolvida consta de muitas identidades subjacentes.


António da Cunha Duarte Justo