José Gomes Rodrigues, assistente social, foi agraciado com o Prémio Municipal de Integração pela sua extraordinária dedicação em benefício da população de Neuss, durante 35 anos. Apresento aqui um bocado de história migrante documentada e narrada pelo próprio homenageado:
“Falar de si mesmo é ser-se suspeito, assim define a sabedoria popular sobre o que aqui irei relatar. Perdoem a minha ousadia, mas faço-o, obedecendo ao desejo de alguns amigos e instituições que solicitaram a descrição e o desenrolar dum acontecimento agradável de que fui alvo. As entidades alemãs desta cidade de Neuss, responsáveis pela inserção social dos imigrantes, decidiram agraciar individualidades e associações que se tenham notabilizado de diversas formas na integração desta população específica.
No próprio dia em que viajava a Portugal para participar no acostumado encontro anual de ex-colegas de estudos, recebo uma carta do Presidente da Câmara desta cidade solicitando a minha presença urgente na semana seguinte, dia 14 de Maio numa das novas salas de recepção oficial da Câmara. Teria sido uma das pessoas propostas, segundo o teor do convite, para a atribuição do prémio de integração da cidade (Integrationsförderpreis).
Esquivar-me, seria a melhor alternativa, mas, segundo o coordenador da efeméride, a minha presença era irrefutável. Após o regresso da cidade de Viriato e vestido a rigor, de fato bem polido e engomado, de gravata a condizer com as riscas verdes da camisa, lá me apresentei no bem delineado anfiteatro, há pouco inaugurado. A minha esposa e companheira fiel de longa data, acompanhou-me, não fosse o fato ainda engelhar ou os passos me conduzirem para outro local sem tanta praxe.
A sala estava repleta. Muitos dos presentes eram-me familiares, pois tínhamos cooperado e partilhado experiências e vivencias do ofício ao longo destes 33 anos de serviço. O meu trabalho estava, há anos, orientado na integração de estrangeiros ou, melhor dito, concidadãos oriundos de diversas culturas e do mundo. Estes totalizam, nesta cidade, dormitório da metrópole de Düsseldorf, mais de 15% dos habitantes o que perfaz numa população de 151.000 habitantes, 20 mil com cidadãos possuidores dos de passaportes de mais de 90 nacionalidades
Representantes das mais diversas associações, organizações e instituições que se dedicam à promoção sócio-cultural destes concidadãos não faltaram ao evento. O diversificado colorido partidário da cidade, os representantes das Igrejas e de outras religiões, coroaram, com a sua presença, a ocorrência. Uma orquestra da câmara emoldurou o evento.
Foram galardoados comigo, com um lindo certificado-diploma, devidamente autenticado com as insígnias da cidade e a assinatura do Presidente da Câmara, outras individualidades e grupos que se tinham notabilizado pelo esforço abnegado em prol da integração da população migrante. Ao ouvir o meu nome, entre os agraciados, alegrei-me, levantei-me do meu lugar e, após uma pequena apresentação oral sobre a minha ação profissional rebatido com algumas palmas por parte da assembléia presente.
Ao ser-me entregue este galardão pelas mãos do Presidente Conselho de Integração da cidade, em representação do Presidente da Câmara e, perante este importante auditório, revi, como uma película a cores, toda a minha vida profissional durante os 35 anos dedicados à emigração. Mergulhei nas minhas singulares raízes. Pensei nas gentes calejadas e bem temperadas pelo abrasador sol dos áridos campos da minha aldeia, Vila Nova do Campo, que marcaram o meu caráter e a minha maneira de atuar. Os diversos professores, os muitos colegas de escola e de seminário, os amigos que, durante tantos anos, comigo caminharam, estiveram presentes como atores neste rápido filme. Sou, nada mais e nada menos, o fruto das muitas encruzilhadas.
Agradeci o gesto tão simpático das autoridades civis e dediquei-o a todos com quem convivi e servi no meu caminho profissional e que foram os sujeitos e os obreiros desta pequena festa de reconhecimento publico. A minha família teve também, nesta efeméride, um lugar de relevo, não fosse a paciência e a necessária compreensão que sempre demonstraram.
Não sendo eu a pessoa indicada para nomear as razoes que levaram a esta nomeação, deixo aqui a tradução do alemão da proposta escrita apresentada pela responsável dos serviços de Integração sócio-cultural da Caritas, instutuicao que servi:
“Desde 1977 até Dezembro de 2010, o José Gomes Rodrigues foi Assistente Social, no departamento de Integração da Caritas. Antes desta data, tinha exercido funções pedagógicas como professor da escola complementar de Língua e Cultura Portuguesa das crianças e jovens nas cidades de Dortmund, Mulheim/Ruhr, Duisburg e Bochum.
Dedicou-se exemplarmente e durante a maior parte do seu tempo de serviço à Integração dos concidadãos com passaporte estrangeiro. Iniciou, deu forma e levou a cabo um grande número de projetos de inserção social. Duma forma exemplar, é de mencionar a fundação dum projeto piloto de teatro intercultural, em colaboração com a escola superior de teatro, a OFF-Theater da Renania do Norte e Vestfália. Ele mesmo manifestou-se talentoso como ator em palco. Esta iniciativa obteve tanto êxito, que lhe valeram três honrosos prêmios. Transformou-se, desde então, num campo de trabalho e um método pedagógico frutífero e prioritário na Integração intercultural dos concidadãos estrangeiros que ganhou raízes.
O diálogo entre as diversas religiões presentes na cidade constituiu também um dos seus campos de atuação tendo, com as suas diversas iniciativas, aproximado os indivíduos na sua diversidade biográfica, cultural e religiosa. Provocou o conhecimento recíproco, o respeito e a aceitação mútua entre as diversas religiões de maior presença nesta sociedade: o cristianismo e o Islão, entre outras. O interesse e tenacidade que demonstrava no seu atuar era de tal ordem que ultrapassava o seu horário regular de trabalho.
Apesar de desligado atualmente destas funções, por escolha própria, e por idade, continua a dedicar-se como voluntário e mostrando muito interesse nestes projetos de inserção”. Até aqui a responsável pelos serviços!
Termino este trabalho descrevendo o testemunho de alguém que deixou escrito no facebook.
“O José Rodrigues vai ser, na próxima segunda-feira, homenageado pela Câmara da cidade de Neuss, na Alemanha, com o prémio de integração „Integrationsförderpreis „ Esta condecoração serve para reconhecer o grande contributo deste português na área das integrações dos povos e das culturas nesta cidade germânica, na Renânia do Norte e Vestefália. Destaca-se que José Rodrigues foi ao longo dos anos Assistente Social da Caritas. Ultimamente, deslocou-se por alguns meses a Moçambique, onde está envolvido em projetos de promoção social. Sem a mínima dúvida, José Rodrigues, é na atualidade uma das personalidades da Comunidade Portuguesa na Alemanha que mais simbolizam um espírito puro de humanidade. Uma das suas áreas profissionais preferidas foi o diálogo intercultural a nível religioso. O nosso parabéns e nosso reconhecimento!“
Perdoe-me quem me achar ainda suspeito, mas a minha intenção foi e continua a ser simplesmente a de elevar a comunidade portuguesa e de valorizar as nossas raízes.
Continuo, e sem estar preso a horários a disponibilizar os meus serviços como solidariedade humana e crista. O voluntariado dá-me asas para sonhar num mundo mais justo, onde e ser cristão se traduz, antes de mais, numa maior responsabilidade na edificação da sociedade, nos moldes da fé que professo.
Procuro libertar-me do peso dogmático e dum certo espiritualismo passivo, que me possam afastar do bater do coração do homem da rua que é meu próximo. O seu passaporte ou a crença religiosa que possam professar tem pouco ou nenhum peso nas minhas decisões.”
www.antonio-justo.eu
Obrigado Antonio Justo por ser justo ao publicar este reconhecimento dessa cidade alemã para com este cidadão português que ja ha muitos anos , pelo seu trabalho e dedicação aos outros, atingiu o estatuto de Homem Universal. O Zé Rodrigues , sempre com um ar despassarado e naïf, não suporta e nunca suportara os excluidos das sociedades ricas e os pobres do dito do terceiro mundo. Andei com ele uma semana na Alemanha e assisti à representação do tal famoso teatro intercultural. A sala a barrotar com gente de todos os cantos do mundo, o Zé conhecia e falava com cada uma das pessoas. Era impressionante o seu contato e a vontade de ajudar a todos. “O Zé porque é que não te candidatas a autarca ?” perguntava-lhe eu a brincar.
“és parvo Heitor” respondia o Zé. Não sabia uma unica palavra de alemão, mas compreendi todo o teatro,là estavam os excluidos e a luta pelos seus direitos e pela possibilidade de integração na sociedade onde vivem. No dia seguinte levou-me aos escritorios de uma grande personalidade da cidade, para quê ? Queria que eu fosse com ele a pedir uma bomba de tirar àgua das entranhas la para um lugar de Moçambique, onde talvez Deus tinha passado, mas os homens do Poder tinham esquecido essas populações. Qual foi o meu espanto, um mês depois estava a bater à minha porta de Paris para darmos uma saltada às paroquias dos portugueses com o seu Amigo Missionario vindo de Moçambique, para “surriparmos” uns “euritos” para
as 8000 crianças que frequentam as escolas daquelas terras abandonadas. O meu Amigo Zé é assim, nunca tem vergonha pedir para os mais pobres…Pedir para ele ?
Livra-me Deus! Tem uma barriga tão grande e jà não precisa. Diz ele a rir.
Como dois vagabundos ,pelas ruas de Berlim e em Neuss, olhavamos o espectaculo do Mundo e alimentavamos a esperança de um mundo melhor… Andar com o Zé , é viver esta sensação.
Tenho honra de ser seu Amigo e para mim, são estes os Portugueses de êxito das nossas Comunidades.
Convivium Lusophone JHeitor
Prezado e ilustre
João Antonio Rebelo Heitor, editor-livreiro em Paris
Muito obrigado pelo seu depoimento que também confirma a ideia que tenho do amigo Rodrigues que conheci mais de perto quando participei activamente num colóquio organizado por ele sobre Bilinguismo.
Um grande abraço para si e muito êxito nas obras que tem em mão.
Gostaria de um dia poder publicar algo através do senhor!
Abraço