DA EUROPA DOS POVOS À EUROPA SUPERMERCADO


TRATADO DE LISBOA ENTROU EM VIGOR

António Justo
Hoje entra em vigor o Tratado de Lisboa, espécie de constituição europeia. Com o Tratado, a União Europeia dá um passo grande no sentido do Estado Europeu.

A Comissão Europeia passa a ser uma espécie de supra-governo acumulando competências à custa do Conselho Europeu, o que significa um maior distanciamento dos 27 estados membros. O Alto Representante PESC e PESD, espécie de Ministro dos Negócios Estrangeiros, adquire competências também supranacionais, o que limita a competência dos embaixadores dos países membros. O Parlamento Europeu, o único órgão da EU eleito democraticamente também ganha mais peso. A competência é da EU em matérias de política externa, de segurança e de defesa.

A EU adquire personalidade jurídica, o que lhe confere autonomia de representação e poder de decisão em organizações internacionais e países terceiros e manter neles “Delegações da União Europeia”, uma espécie de embaixadas da EU.

As decisões deixam de ser tomadas por unanimidade para passarem a ser determinadas pelos votos da maioria. Chega uma maioria de 55% dos votos dos países se ao mesmo tempo 65% da população destes países estiverem representadas. De futuro haverá mais necessidade dos países se reagruparem por regiões de interesses se não querem ser determinados pelas potências europeias. Portugal terá de andar mais atrelado à Espanha e esta a outros!

O Tratado de Lisboa inclui a possibilidade de um país poder abandonar a União. O catálogo dos direitos fundamentais não é obrigatória na Inglaterra porque daí os cidadãos poderiam colocar exigências vinculativas no que diz respeito ao direito a um lugar de trabalho; o mesmo se diga quanto à Polónia e à República Checa que receiam que através dele os desterrados da última grande guerra exijam indemnizações!

Os cidadãos europeus passam a ter o direito de petição através de referendos europeus. No caso de nos 27 países membros se conseguir um milhão de assinaturas para um determinado assunto, então a Comissão europeia tem de se ocupar com o tema.

Agora também podem fazer queixa no Tribunal europeu em Luxemburgo em casos relativos ao direito comunitário. Cidades e freguesias podem fazer queixa contra iniciativas de Bruxelas no caso de questões que não tenham de ser resolvidas a nível europeu. Aqui, o Supremo Tribunal Alemão puxou as orelhas aos políticos alemães obrigando-os a ressalvar direitos inalienáveis da democracia alemã. Por exemplo, em questões de mobilizações militares no estrangeiro o Parlamento alemão tem a última palavra e não a União Europeia. Projectos-lei da União Europeia têm de ser enviados aos 27 Parlamentos e estes têm direito a veto. Neste sector haverá um jogo do rato e o gato entre governos e parlamentos. Povos mais distraídos serão levados pela cantiga do governo. Relativamente à Alemanha, no caso do Parlamento Alemão não estar de acordo terá de enviar propostas de correcção à EU.

O Parlamento europeu também ganha mais peso. Este é o único órgão da EU eleito democraticamente.

A Europa agora passa a ter quatro chefes mas o maior é o presidente da Comissão, José Manuel Barroso.

Os ciclones do materialismo e do socialismo marxista dominam a EU
Com a entrada em vigor do Tratado de Lisboa as instituições tornam-se maiores e as pessoas mais pequenas; ganharam as Companhias poderosas, as grandes empresas, os Bancos e a Burocracia política e administrativa com os seus servidores. A Europa dos grandes ganha grandeza no mundo dos pequenos e ganha peso nos mundos dos grandes. A instituição vive do que tira ao membro e as instituições grandes vivem do que furtam às mais pequenas! Mas sem instituição também se não pode viver! Importante será o surgir de cidadãos conscientes e críticos!

Que a Europa se torne numa união de comunidades é mais que natural e óbvio. A questão é: que tipo de União Europeia? A dúvida fundamenta-se na falta de respeito pelos biótopos naturais e culturais e no espírito que a empurra! Os ventos que sopram na União Europeia são unilaterais porque determinados pelos ciclones do materialismo e do socialismo marxista acompanhados de rajadas turbo-capitalistas. Não há lugar para a cultura, para o cidadão nem para o Homem. Se na Idade Média, tal como hoje no Islão se exagerava com a religião, hoje exagera-se com o socialismo marxista. Antigamente a crença, hoje a ideologia! Cada vez se torna tudo mais igual ao nível da rasoura proletária e consumista. Em nome da ditadura da opinião e da tolerância, a indiferença cada vez se torna mais obcecante, nesta grande sociedade decadente. A indiferença é o primeiro passo para a intolerância! E, os nossos políticos apostam na indiferença e no desconhecimento. Esta é a hora das virtudes menores: da tolerância e do internacionalismo das multinacionais. A consciência humana será regulada pelo mercado, não fosse o cidadão um produto!

Portugal morreu com Camões e o Estado Português morreu com Salazar!

O povo português continuará, como dantes, ingovernável mas com folgo para ladrar à trela de mercenários, cujos interesses continuarão a ser os interesses que vêm de fora. Trata-se de marcar passo na continuidade.

Assim o problema da autodeterminação continuará a ser alheio a Portugal e aos portugueses na qualidade de indivíduos. A banalização a nível cultural já há muito tempo que começou a aplanar os terrenos para esta Europa, uma Europa compatível com a Turquia! O espírito crítico e a discussão deram lugar a gestas de embalar na televisão.

Mais tarde falar-se-á das comunidades portuguesas como antes se falava das províncias ultramarinas. Portugal continuará a ter uma alma maior que ele, só que, agora, fora dele!

Portugal morreu com Camões e o Estado Português morreu com Salazar! A uma forma de governo autoritária de alguns poucos seguiu-se uma outra forma de governo autoritária à custa de alguns muitos.

Facto é que os países perdem a Soberania sem discussão e tudo acontece democraticamente à margem do povo. Isto em outros tempos seria apelidado de ditadura! O povo ao renunciar à democracia directa para delegar a sua soberania na democracia representativa, com o Tratado de Lisboa só dá mais um passo consequente, a delegação da personalidade soberana.

Temos um tipo de cidadão cada vez mais distante da instituição e um tipo de instituição cada vez mais distante do cidadão. Com o novo tratado acaba-se com o impasse institucional para se passar ao impasse do cidadão.

A independência é como a virgindade, quando se dá por ela já se não é…, e depois, não há remédio, a diferença só se nota na cor do lençol.

© António da Cunha Duarte Justo
antoniocunhajusto@googlemail.com

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António da Cunha Duarte Justo

Actividades jornalísticas em foque: análise social, ética, política e religiosa

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