ECUMENISMO – CATÓLICOS E EVANGÉLICOs


Visita Papal – Um Ponto alto da Razão e da Fé

António Justo

Na discussão pública que precedeu a visita do Papa, o país de Lutero discutiu profundamente o que Bento XVI teria que mudar. Criou-se uma espectativa que ele traria uma “oferta” (reformas) no sentido duma protestantização da Igreja Católica. Temas como celibato, sacerdócio da mulher, comunhão, democratização das estruturas eclesiásticas, o abuso de menores, foram discutidos até à exaustão, principalmente por aqueles que não vão à Igreja e mantêm uma atitude anticatólica (revista Spiegel e outras). Também surgiram discussões sérias sobre necessidades de mudança. Criaram-se espectativas irrealistas porque estes problemas são assuntos de discussão a realizar no seio da Igreja. Além disso a Alemanha não é o lugar propício para proclamações papais. A discussão unira não só os críticos mas sobretudo os guerreiros ressentidos e intolerantes contra o Papa.


O teólogo Hans Küng tem defendido a formação duma “Coligação de teólogos, sacerdotes, leigos com bispos reformistas” esquecendo que na Igreja católica, orientada muito embora pelas cúpulas, as mudanças foram sempre provocadas pela base. Escreveu aos 5.000 bispos católicos do mundo mas não teve sequer uma resposta.


Naturalmente que a Igreja “sempre reformanda” precisa de contínuo aferimento ao mundo envolvente, sem medo, mas sem obedecer ao espírito do tempo nem a critérios meramente burocráticos. Os irmãos evangélicos já exercitam, em excesso, esse compromisso e não se nota que descrentes e católicos se tornem protestantes. Certamente são necessárias mudanças responsáveis, motivadas pela fé e pela misericórdia (1).


Facto é que os modelos de Cristianismo praticados pelas comunidades irmãs não se têm tornado em estímulos de mudança para a Igreja Católica de Bento XVI. O modelo protestante não convence à mudança do modelo católico porque apesar da adaptação evangélica aos movimentos seculares com democracia, pastores casados, ordenação de mulheres, pastores homossexuais, as suas igrejas ainda se encontram mais vazias que as católicas e a filosofia cristã não encontra maior ressonância no povo que nas zonas católicas, pelo contrário. Também por isto, o Papa não aceita mudanças no sentido duma protestantização do catolicismo nem que se reduza a discussão ao restrito ponto da moral sexual (2). O modelo de Igreja imperial como a anglicana (Commonwealth) também não convence pelo facto de não preservar a unidade de direito e doutrina. A Igreja ortodoxa russa parece demasiadamente comprometida com o poder político. Por outro lado, a região muçulmana com o seu rigorismo na moral sexual também não constitui um estímulo à mudança. Pelo contrário, a Igreja ortodoxa e o islão não sofrem das adversidades da modernidade pelo facto de se não terem aberto a ela, constatam muitos católicos.

Tudo isto, aliado a uma campanha secularista contra o Catolicismo não estimula Bento XVI a fomentar determinadas posições modernas do Vaticano II. Pelo contrário, passou a usar de novo a tiara no sentido da tradição antiga (símbolo do poder pastoral, sacerdotal e do magistério), possibilitou também a liturgia tridentina (nesta o padre celebra, em latim, para o povo e na pós-conciliar o povo celebra com o padre). Nesta fase da história o papa vê mais a necessidade de afirmar a igreja petrina esperando contudo que a mudança venha da fé.

Com a visita papal as ondas negras apaziguaram-se tendo-se ela revelado como ponto alto da razão e da fé, deixando os próprios críticos perplexos. Estes, embora insatisfeitos no que respeita às espectativas de reforma, manifestaram apreciação pelo que Bento XVI disse e fizeram referência à importância duma reflexão profunda sobre as suas palavras.


Bento XVI não abordou nenhum tema conflituoso. Concentrou-se nos fundamentos espirituais da igreja e da sociedade. Mostrou-se abalado pelos “escândalos na Igreja que escondem o escândalo da fé da morte de Cristo na cruz”.


Quanto aos protestantes, o Papa manifestou-se muito cordial; para além dos gestos simbólicos, mantiveram-se as diferenças. De facto, enquanto o protestantismo tem mais a ver com palavras e conceitos, o catolicismo tem mais a ver com imagens e mística. São ecossistemas sociais e geográficos diferentes. A Igreja Católica caracteriza-se por um pensar não tão elitista, mais global e universal, sentindo-se responsável tanto pelo hemisfério norte como pelo hemisfério sul, não se sentindo vocacionada a impor a visão do norte ao sul e menos ainda a visão duma igreja particular (alemã), como pretendem correntes teológicas europeias. A Igreja Católica sente-se chamada a ser mais o ecossistema da biosfera do que um biótopo.


Uma reforma da Igreja obedece a outros critérios que não a critérios políticos ou administrativos. O Papa respondeu indirectamente que igrejas não são grémios políticos. O barulho dos reformadores não deve esconder a falta de fé nem tão-pouco a pressão social de ser como os outros. No diálogo não se trata apenas de razão e de interesses mas de razão e de fé. Questões de fé não são negociáveis. “A fé dos cristãos não se baseia numa ponderação das nossas vantagens ou desvantagens”.


Enquanto se manifesta, na sociedade civil, uma tendência para fomentar o centralismo das nações europeias na União Europeia, e a expansão do globalismo, observa-se, por outro lado, uma crítica impiedosa ao centralismo do vaticano, a única comunidade global existente. Tenta-se responsabilizar o Papa não só pelo que ele deixa de fazer mas pelas consequências da secularização e dum modernismo “bastardo”. Com uma avaliação monocausal e tendenciosa, pessoas e correntes movidas apenas pelo imediato do fenomenológico atribuem a crise ao sistema romano procurando a solução apenas na remodelação do único sistema que se afirma como eixo e paradigma universal. A questão é fundamentalmente um problema de fé e de falta de identidade.


No encontro ecuménico, em Erfurt, Bento XVI advertiu: “O pensamento de Lutero, a sua espiritualidade inteira era totalmente cristocêntrica. Para Lutero, o critério hermenêutico decisivo na interpretação da Sagrada Escritura era «aquilo que promove Cristo». Mas isto pressupõe que Cristo seja o centro da nossa espiritualidade e que o amor por Ele, o viver juntamente com Ele, oriente a nossa vida.” “Esta constitui uma tarefa ecuménica central. Nisto deveríamos ajudar-nos mutuamente: a crer de modo mais profundo e vivo.“ A secularização tem feito de muitos pastores e teólogos meros assistentes sociais, ou até triviais bombeiros reparadores duma sociedade de incendiários que vão da economia até à ciência e à cultura.


O ecumenismo não se pode limitar à discussão sobre reformas estruturais, o problema de hoje é um problema de identidade e de vivência. De resto, já o Mestre de Nazaré dizia: “Na minha casa há muitas mansões”.


O Pontífice mostra-se preocupado: “Não serão as tácticas a salvar-nos, a salvar o cristianismo, mas uma fé repensada e vivida de modo novo, através da qual Cristo, e com Ele o Deus vivo, entre neste nosso mundo… A unidade fundamental consiste no facto de acreditarmos em Deus, Pai omnipotente, Criador do céu e da terra; de O confessarmos como Deus trinitário – Pai, Filho e Espírito Santo. A unidade suprema não é solidão duma mónada, mas unidade através do amor. Acreditamos em Deus, no Deus concreto. Acreditamos no facto que Deus nos falou e Se fez um de nós. Dar testemunho deste Deus vivo é a nossa tarefa comum no momento actual.”


“Mas a fé dos cristãos não se baseia numa ponderação das nossas vantagens e desvantagens”. “Uma fé construída por nós próprios não tem valor. A fé não é algo que nós esquadrinhamos ou concordamos. É o fundamento sobre o qual vivemos. A unidade não cresce através da ponderação de vantagens e desvantagens, mas só graças a uma penetração cada vez mais profunda na fé mediante o pensamento e a vida”. “Porventura não está o mundo a ser devastado pela corrupção dos grandes, mas também dos pequenos, que pensam apenas na própria vantagem?”


Realça a importância de se acentuar no ecumenismo aquilo que une na fé os católicos e os evangélicos. “A coisa mais necessária para o ecumenismo é primariamente que, sob a pressão da secularização, não percamos, quase sem dar por isso, as grandes coisas que temos em comum, que por si mesmas nos tornam cristãos e que nos ficaram como dom e tarefa. O erro do período confessional foi ter visto, na maior parte das coisas, apenas aquilo que separa, e não ter percebido de modo existencial o que temos em comum nas grandes directrizes da Sagrada Escritura e nas profissões de fé do cristianismo antigo.“


“ Porventura será preciso ceder à pressão da secularização, tornar-se moderno através duma mitigação da fé? Naturalmente, a fé deve ser repensada e sobretudo vivida hoje de um modo novo, para se tornar uma realidade que pertença ao presente. Para isso ajuda não a mitigação da fé, mas somente o vivê-la integralmente no nosso hoje. Esta constitui uma tarefa ecuménica central.“ Sim, doutro modo o catolicismo para ser moderno teria que andar sempre a correr atrás do protestantismo e este sentir-se-ia sempre na dianteira com a exigência de que o catolicismo se mude na sua direcção.

“Se o olhar se fixa nas realidades negativas, então nunca mais se desvenda o grande e profundo mistério da Igreja”.


Alude também à perplexidade de confissões históricas perante novas formas de cristianismo, muito dinâmicas mas “ por vezes preocupantes nas suas formas” tratando-se frequentemente de “um cristianismo de escassa densidade institucional, com pouca bagagem racional, sendo ainda menor a bagagem dogmática, e também com pouca estabilidade. Este fenómeno mundial põe-nos a todos perante esta questão: Que tem a dizer-nos de positivo e de negativo esta nova forma de cristianismo? “


“Em certo sentido, a história vem em ajuda da Igreja com as diversas épocas de secularização, que contribuíram de modo essencial para a sua purificação e reforma interior. De facto, as secularizações (expropriação de bens da Igreja, cancelamento de privilégios, etc.) – sempre significaram uma profunda libertação da Igreja de formas de mundanidade: despojava-se, por assim dizer, da sua riqueza terrena e voltava a abraçar plenamente a sua pobreza terrena”.


Falando da Igreja, o Pontífice recorda: «Eu sou a videira verdadeira»: isto na realidade, porém, significa: «Eu sou vós, e vós sois Eu» – uma identificação inaudita do Senhor connosco, a sua Igreja….” É consolador ler-se esta frase dum pontífice que é não só o grande intelectual/teólogo da época moderna mas também um místico. Nestas palavras por ele ditas pode sentir-se o surgir duma nova teologia que consegue passar do diálogo grego para o triálogo cristão. Nas liturgias que celebrou na Alemanha ele mostrou que é possível juntar intelecto e devoção a ponto de transformar eventos de muitos milhares de pessoas numa missa ou numa para-liturgia em momentos de alta devoção, de espírito recolhido e meditativo. Foi impressionante ver como milhares de pessoas se mantinham durante minutos em silêncio meditando nas palavras das suas homilias.


O Papa aponta para a vida cristã solicitando uma visão lúcida da mesma. Sim, não tem sentido esforçar artificialmente uma união dos cristãos quando a diversidade também é uma oportunidade de satisfazer diferentes rescritos de personalidade e de salvação. Os cristãos das diferentes mansões são irmãos e devem-se respeitar uns aos outros complementando-se. Quem critica por criticar ou julga com ressentimento/fanatismo não percebeu nada de cristianismo e menos ainda de fé cristã.


” Sei que muito se faz, da parte dos alemães e da Alemanha, para tornar possível a toda a humanidade uma vida digna do homem, e por isso quero aqui exprimir uma palavra de viva gratidão.”

O Santo Padre admitiu que a Igreja da sua terra natal “está optimamente organizada”, mas criticou nela “um excedente das estruturas em relação ao Espírito”. Talvez pelo facto dela se encontrar demasiadamente preocupada com os protestantes e demasiadamente preocupada com teologia e menos com espiritualidade. Já há muito tempo o Vaticano vê com relutância o facto de nas zonas cristãs de língua alemã se exigir um imposto dos cristãos para a igreja. Também por isso, Bento XVI incita a Igreja alemã a comunicar do espírito alegre doutras regiões católicas. “A Igreja na Alemanha continuará a ser uma bênção para a comunidade católica mundial, se permanecer fielmente unida aos Sucessores de São Pedro e dos Apóstolos, se tiver a peito de variados modos a cooperação com os países de missão e se nisto se deixar «contagiar» pela alegria na fé das jovens Igrejas.”

O serviço da Igreja além duma componente de competência objectiva e profissional “exige-se algo mais, ou seja, o coração aberto, que se deixa tocar pelo amor de Cristo, e deste modo é prestado ao próximo, que precisa de nós, mais do que um serviço técnico: o amor, no qual se torna visível no outro o Deus que ama, Cristo.”


Admoesta os bispos e quem tem cargos a servir na humildade dizendo: «Jesus, que era de condição divina, não quis ter a exigência de ser posto ao nível de Deus. Antes, a Si próprio Se despojou, tomando a condição de escravo…» (Flp 2, 6-8). A Auto-realização é uma consequência duma tarefa e vivência e nunca um fim em si mesma.


“Não é a auto-realização que opera o verdadeiro desenvolvimento da pessoa – um dado que hoje é proposto como modelo da vida moderna, mas que pode facilmente mudar-se numa forma de refinado egoísmo. Bento XVI já antes dizia: “faz-se uma espécie de terapia ocupacional; procura-se para cada qual um grémio ou pelo menos alguma actividade na Igreja… Não precisamos duma igreja mais humana, mas sim duma mais divina, então ela também será verdadeiramente humana.” O papa, afirma com os padres da Igreja: ”Deus fez-se Homem para que o Homem seja divinizado”.

„Não são as palavras que contam, mas o agir, os actos de conversão e de fé…. Agnósticos que, por causa da questão de Deus, não encontram paz e pessoas que sofrem por causa dos seus pecados e sentem desejo dum coração puro estão mais perto do Reino de Deus de quanto o estejam os fiéis rotineiros, que na Igreja já só conseguem ver o aparato sem que o seu coração seja tocado por isto: pela fé.”

Expressou também o sofrimento dos cristãos que são hoje os mais perseguidos e intolerados no mundo: “Às vezes sentimo-nos como que sob uma prensa, à semelhança dos cachos de uva que são completamente esmagados. Mas sabemos que, unidos a Cristo, nos tornamos vinho generoso”.


Uma sociedade extremamente masculina que impôs a masculinidade também à mulher revela-se especialmente agressiva contra uma igreja onde a feminidade é guardada a nível de fé.

O momento histórico que momentaneamente se atravessa não é o mais propício a reformas profundas. O Papa aposta primeiro na reforma das mentalidades, na vivência da fé e critica os dignitários que não se guiam pelo espírito de serviço e amor.


Se a terra precisa do seu húmus  também a comunidade precisa do seu húmus e este é a humildade. Bento XVI explica: “a humildade é uma virtude que no mundo de hoje e, de modo geral, de todos os tempos, não goza de grande estima. Mas os discípulos do Senhor sabem que esta virtude é, por assim dizer, o óleo que torna fecundos os processos de diálogo, possível a colaboração e cordial a unidade. Humilitas, a palavra latina donde deriva «humildade», tem a ver com humus, isto é, com a aderência à terra, à realidade. As pessoas humildes vivem com ambos os pés na terra; mas sobretudo escutam Cristo, a Palavra de Deus, que ininterruptamente renova a Igreja e cada um dos seus membros.”


Apesar de todas as tempestades da história, a barca de Pedro tem-se mantido firme sobre as ondas do tempo e revela-se como a garante da continuidade desde os primórdios do cristianismo até á actualidade. Há que ser optimista e viver a alegria!

António da Cunha Duarte Justo

Teólogo e Pedagogo

antoniocunhajusto@googlemail.com

www.antonio-justo.eu

(1)      É verdade que o Papa funciona como uma espécie de constituição ou como o tribunal constitucional da Igreja. A sua preocupação não é muitas vezes a do padre que trabalha in loco. Aqui dá-se o encontro do pastor com a consciência individual pressupondo-se compromissos (casuística) que a nível de constituição não estão previstos (comunhão a separados, preservativo, não podendo tratar todos os divorciados da mesma maneira. Há muitos que sofrem sob o amor quebrado). A misericórdia é um característico cristão que abre muitas perspectivas pastorais.


(2)      Apenas um reparo sobre a hipocrisia do mundo: os pares querem fidelidade sexual e acham mal que o papa a exija. Críticos acusam o Papa de ser monarca ao escolher os seus ministros e aceitam como natural em democracia que o primeiro-ministro escolha os seus ministros. O discurso público não conhece a sabedoria cristã, apenas a sua moral ou os seus aspectos folclóricos. Para mais a sexualidade é um pequeno ponto entre muitos outros. As pessoas perdem-se nas proibições.


Falta de Cultura da Europa face a outras Culturas mundiais

Europa Berço da Cultura jurídica da Humanidade

Da Visita de Bento XVI à Alemanha

António Justo

O seu discurso no Parlamento alemão foi tido por todas as fracções parlamentares como uma aula académica de alto nível sobre os fundamentos intelectuais do Estado.

O ecossistema cultural ocidental já manifesta grandes buracos de ozono na sua cúpula metafísica que provocam um estado de perturbação e uma atmosfera decadente. Bento XVI mostra-se preocupado com o desenvolvimento da sociedade e recorda: “A cultura da Europa nasceu do encontro entre Jerusalém, Atenas e Roma, do encontro entre a fé no Deus de Israel, a razão filosófica dos Gregos e o pensamento jurídico de Roma. Este tríplice encontro forma a identidade íntima da Europa. Na consciência da responsabilidade do homem diante de Deus e no reconhecimento da dignidade inviolável do homem, de cada homem, este encontro fixou critérios do direito, cuja defesa é nossa tarefa neste momento histórico.”

“Os teólogos cristãos associaram-se a um movimento filosófico e jurídico que estava formado já desde o século II a.C., num encontro entre o direito natural social, desenvolvido pelos filósofos estóicos, e autorizados mestres do direito romano. Neste contacto nasceu a cultura jurídica ocidental, que foi, e é ainda agora, de importância decisiva para a cultura jurídica da humanidade. Desta ligação pré-cristã entre direito e filosofia parte o caminho que leva, através da Idade Média cristã, ao desenvolvimento jurídico do Iluminismo até à Declaração dos Direitos Humanos e depois à nossa Lei Fundamental alemã, pela qual o nosso povo reconheceu, em 1949, «os direitos invioláveis e inalienáveis do homem como fundamento de toda a comunidade humana, da paz e da justiça no mundo».

O acesso à casa da realidade tem várias portas, quem conhece apenas a razão ou o materialismo como porta de entrada reduz a realidade e a pessoa.

Bento VXI reconhece o contributo da ciência positivista do mundo, como “parcela grandiosa do conhecimento humano”, mas chama a atenção para os seus exageros e para o facto do banal funcional do dia-a-dia não poder ser suficiente fonte do direito nem a razão positivista poder atribuir-se o monopólio e considerar-se como o único critério de acesso à realidade. Bento XVI convida os deputados e a ciência à reflexão dizendo: “O conceito positivista de natureza e de razão, a visão positivista do mundo é, no seu conjunto, uma parcela grandiosa do conhecimento humano e da capacidade humana, à qual não devemos de modo algum renunciar.” Contudo, esta “não é, no seu conjunto, uma cultura que corresponda e baste ao ser humano em toda a sua amplitude… Onde a razão positivista se considera como a única cultura suficiente, relegando todas as outras realidades culturais para o estado de subculturas, aquela diminui o homem, antes, ameaça a sua humanidade. Digo isto pensando precisamente na Europa, onde vastos ambientes procuram reconhecer apenas o positivismo como cultura comum e como fundamento comum para a formação do direito, enquanto todas as outras convicções e os outros valores da nossa cultura são reduzidos ao estado de uma subcultura. Assim coloca-se a Europa, face às outras culturas do mundo, numa condição de falta de cultura e suscitam-se, ao mesmo tempo, correntes extremistas e radicais. A razão positivista, que se apresenta de modo exclusivista e não é capaz de perceber algo para além do que é funcional, assemelha-se aos edifícios de cimento armado sem janelas, nos quais nos damos o clima e a luz por nós mesmos e já não queremos receber estes dois elementos do amplo mundo de Deus.”

Ao falar “ sobre os fundamentos do direito”, Bento XVI adverte que o lucro material e o sucesso não pode ser o último critério e motivação para a actividade do político. “O sucesso pode tornar-se também um aliciamento, abrindo assim o caminho à falsificação do direito, à destruição da justiça”. “A política deve ser um compromisso em prol da justiça e, assim, criar as condições de fundo para a paz.”

Questiona a verdade sem fundamentos filosófico-éticos baseada apenas em estatísticas e votos de maiorias.

“É evidente que, nas questões fundamentais do direito em que está em jogo a dignidade do homem e da humanidade, o princípio maioritário não basta…”

Torna-se incompreensível que precisamente o Catolicismo seja hoje a religião mais atacada por uma camada intelectual desiludida que viu os seus ideais falhados na queda do sistema soviético e por um modernismo racionalista unilateral, quando esta religião foi a que possibilitou a distinção entre direito divino e direito de estado. “Dai a Deus o que é de Deus e a César o que é de césar”, dizia o mestre da Galileia.

“Ao contrário de outras grandes religiões, o cristianismo nunca impôs ao Estado e à sociedade um direito revelado, um ordenamento jurídico derivado duma revelação. Mas apelou para a natureza e a razão como verdadeiras fontes do direito; apelou para a harmonia entre razão objectiva e subjectiva, mas uma harmonia que pressupõe serem as duas esferas fundadas na Razão criadora de Deus”.

Hoje tudo parece ser negociável. “Vivemos num tempo em que se tornaram incertos os critérios de ser homem. A ética foi substituída pelo cálculo das consequências“, constata Bento XVI.

«Só quem conhece Deus, é que conhece o homem» – disse uma vez Romano Guardini. Sem o conhecimento de Deus, o homem torna-se manipulável”.

Independentemente do aspecto moderno ou conservador, de se ser crente ou ateu, facto é que o Papa é quem mais tem contribuído para a civilização ocidental no que ela tem de mais humano e genuíno. Ele considera-se “um colaborador da verdade”!

António da Cunha Duarte Justo

antoniocunhajusto@googlemail.com


Dúvida nas crenças laicas e nas crenças religiosas


Razão Religião e Espiritualidade

António Justo

Na praça cursam, em nome da Verdade, contribuições aparentemente evidentes mas ao serviço da desinformação. Um nexo de irreflexão camuflada de ideia abre caminho entre pessoas muitas vezes distraídas pela melodia acompanhante.

“Quem crê não sabe”, “A religião inventa, a religiosidade descobre”; “A religião alimenta-se do medo, a espiritualidade da confiança”; “ o esperar e a incerteza atingiram, agora, o seu fim”, apregoam os barateiros do mercado. Estes sabem que as pessoas anseiam por experiência e segredos interiores, devido ao desencantamento do mundo. As pessoas querem ser reconhecidas e ser integrais numa sociedade que as despreza e divide continuamente. O que muitas pessoas procuram é auto-realização. As ofertas do mercado, muitas vezes, reduzem-se a medidas de fuga de si mesmos e da responsabilidade social. O objectivo da espiritualidade não é auto-realização. A religião não promete a segurança deste mundo e está consciente que a fé não é (só) desejo e anseio. A fé implica uma dúvida colocada ao mundo. Pressupõe aceitar trazer consigo a cruz da dúvida. A espiritualidade não implica a liberdade de fugir à razão. De facto quem crê sabe e quem sabe crê! A felicidade surge do estrume da dor.

Tem-se a impressão que, na feira da espiritualidade, tudo é bom e se adquire, de graça. Deparámo-nos com frases feitas, de mistura indiferenciada, com a pretensão de revelar verdades a saldo, com tudo incluído no preço. E o público cansado, levado pela embalagem, sem se preocupar com o que se encontra dentro dela, aceita o embrulho pelo conteúdo. A música acompanhante é tão encantadora e o apelo ao sentimento tão colorido que não deixa lugar para a enfadonha razão fazer perguntas. Para os negociantes da auto-realização o conteúdo é arbitrário e o que lhes importa é formar opinião através da manipulação. Oferecem espiritualidade wellness a pacotes. A massa que anda na rua só tem no bolso uns trocos de cultura. Não tem culpa, só aguenta pensamento barato, porque já traz carga a mais na sacola; a palavrinha mágica que tudo justifica e faz das fezes ouro denomina-se “opinião”; opinião não precisa de fundamento nem de argumentação. O fundamentar enfraqueceria a convicção. “A principal causa dos problemas do mundo de hoje é que os obtusos estão seguríssimos de si, enquanto que os inteligentes estão cheios de dúvidas”  Bertrand Russel.

Os agentes do mercado ideológico e económico estão empenhados em baralhar e destruir os ecossistemas culturais (Nações, religiões, etc.) e até os pequenos biótopos individuais. Só lhes interessa o indivíduo, a opinião, afirmações superficialmente lógicas e estatísticas. O indivíduo, fora dum sistema, perde o significado e facilmente se vence (o ecossistema protege o indivíduo dando-lhe a possibilidade duma identificação integrada). Os feirantes pretendem o caos recorrendo, para isso, ao dogmatismo da própria opinião. Quer-se no Ocidente pessoas revoltadas das religiões e da cultura; pretende-se pessoas revoltadas contra o próprio ecossistema cultural e para não se ter de argumentar basta insurgir-se contra a autoridade do ecossistema, identificando autoridade com capitalismo, com imperialismo ou abuso, sem se proceder a uma análise fundada das vantagens e desvantagens de cada sistema, seja ele mais capitalista ou mais socialista. Quer-se a vida gratuita sem contrapartida como se a espiritualidade ou a religião fossem o Exército da Salvação. Um irrealismo baseado num optimismo egoísta superficial parece pretender que a civilização ocidental se torne desconfortável.

Espiritualidade não é o clímax de welness espiritual

Quem contrapõe religião a espiritualidade reduz o problema à procura do sexo dos anjos. Deslumbrados com o brilho do jogo das palavras afirmam a espiritualidade e negam a religião, esquecendo que espiritualidade é uma qualidade do espiritual e concretamente uma determinada vivência religiosa: a experiência de si em relação com o outro num determinado contexto. Deixam-se enganar, como se uma qualidade existisse por si, como se um sentimento fosse possível sem corpo, ou se a espiritualidade se deixasse reduzir a um sentimento ou orgasmo espiritual.

A religião incorpora o espírito em diferentes espiritualidades. Cada ecossistema religioso (religião) com as suas espiritualidades constitui um cosmo de contextualização geográfico- histórica, cristalizado na língua, nos seus credos e utopias: a atmosfera do ecossistema.

Diria a religião está para a vela como a espiritualidade para a sua chama. A espiritualidade, a luz são a essência da religião. O sol, a luz é o movimento do movimento. O facto de a fome ser verdadeira e mais profunda que o aparelho digestivo, não nos justifica que neguemos a boca, devido às cáries dentárias que esta possa ter. Uns negam a fé, outros a razão como se estas não fossem apenas os dentes para ajudarem a digerir uma mesma realidade dura. Por muito espiritualizada que queiramos a boca, a realidade pressupõe nela os dentes para conseguirmos uma alimentação equilibrada. A espiritualidade, tal como a religião, embora razoáveis não se deixam aplainar pela rasoura da razão, apenas purificar. A razão põe tudo em questão como se o seu questionar fosse a razão das coisas. A razão sincera, como a fé sincera questionam-se a si mesmas. Uma e outra são como estrelas que nos levam a olhar para mais alto, para mais longe, sem negar o passado nem se agarrar a um futuro ilusório.

Seria uma regressão na história e no desenvolvimento querer ignorar o salto dado por Eva e voltar ao indefinido primitivo por muito gratificante que essa perspectiva se ofereça. A religião alerta-nos para a necessidade de religar o que a razão separou mas sem abdicar dela. A religião não se pode ficar pela crença estática num paraíso distante nem tão-pouco pela opinião individual. Ela quer acordar para o Sol que se encontra em cada átomo de nós em cada pessoa e instituição, no dia e na noite, num processo de encarnação e ressuscitação. A Realidade encarna na terra para com ela se elevar.

A Igreja aponta para Deus sabendo que a sua realidade se encontra no outro e não só nele. Dá uma perspectiva a uma espiritualidade não só pessoal. O facto de o Sol se encontrar em toda a natureza não pode ser reduzido a ela nem tão-pouco a um seu elemento. A espiritualidade não é o todo, não é Deus. Se o fosse o eu não seria.

A religião é também um sistema humano organizado com regras ao serviço duma pedagogia do divino onde as regras são para se dissolver tal como o sol dissolve o arco-íris que ele mesmo originou. O arco-íris, porém, no seu ordenamento torna-nos conscientes para a multiplicidade da cor na luz: o humano no divino. Cada cor da verdade tem o seu momento. O orgulho duma razão iluminada esquece uma simples verdade: no mundo do ser a luz só se percebe olhando para o escuro / a sombra. A luz sem sombra implicaria a ausência de todo o ser. O racionalismo puro produziria um Deus puro, indiferente ou com desprezo pela criatura. A arrogância da luz dos racionalistas iluminados é tão perigosa como as trevas do fanatismo crente. As duas são fanáticas porque excluem o outro, o diferente, de si. Só reconhecem a própria luz olhando para a escuridão do outro, desconhecendo que a escuridão do outro é a sua luz.

A religião como supra-estrutura cultural acarreta consigo a divisão e a limitação tal como a consciência do eu individual pressupõe a auto-afirmação perante o outro (um certo confronto dialéctico). A divisão porém não é o fim mas sim o caminho para se chegar à união. Instituições como pessoas, no seu processo de individuação (afirmação e demarcação), obedecem a dinâmicas semelhantes. Tal como o indivíduo não termina em si mesmo também a sociedade não deve ser fim de si mesma; encontram-se num processo a caminho da comunidade num horizonte aberto (Alfa-Omega). As religiões são sociedades com diversas espiritualidades em cada uma delas a caminho da unidade / comunhão. A religião não é mais que uma ponte destinada a religar o separado, tal como a razão é também uma ponte para o criado científico, são perspectivas cpomplementares da mesma realidade. O Cristianismo é mais que uma religião; nele Religião e espiritualidade não estão em contradição e Deus e Homem também não.

Cada religião, com o respectivo Deus e correspondente mundividência de Homem e mundo, faz parte dum sistema de ecossistemas naturais e culturais, com expressão própria mas com necessidade de interpretação e de desenvolvimento. Para se poder falar com propriedade de termo, em questão de espiritualidades e de religiões, teria de ser feita uma hermenêutica das diferentes religiões e culturas bem como das diferentes espiritualidades e éticas.

Lógica e dialéctica habitam na mesma casa, não se podendo afirmar que religião é lógica e espiritualidade é dialéctica como pretendem manipuladores de conceitos metendo tudo no mesmo saco.

A religião como a razão alimentam o ego para que este se torne semente numa terra (biótopo) fecunda e ser árvore na floresta da comunidade humana.

António da Cunha Duarte Justo

Teólogo e Pedagogo

antoniocunhajusto@googlemail.com

Não ao encerramento do Consulado de Portugal em Frankfurt


Carta do Conselho Consultivo ao Ministério dos Negócios Estrangeiros

António Justo

O Conselho Consultivo da área consular de Frankfurt reuniu-se ontem das 15 às 21,30 horas, em Frankfurt, para dar expressão às preocupações dos utentes da área consular. Entre outra iniciativas a tomar foi preparada a seguinte carta hoje enviada às autoridades.


“Ex.mo Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros

Ex.mo Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus

Ex.mo Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas



O Conselho Consultivo junto do posto consular de Portugal em Frankfurt, no âmbito das competências constantes do artigo 16.º, n.º 4 do Decreto-Lei n.º 71/2009, de 31 de Março, face à eventual decisão do Governo português em encerrar este Consulado, vem por esta via apresentar a sua discordância e veemente protesto por tal medida, alegando o seguinte:

– Desconhecem-se os motivos concretos para uma tal medida súbita, sem que tenha sido efectuada previamente alguma consulta, quer junto do Consulado quer junto deste Conselho Consultivo quer do Conselho das Comunidades Portuguesas ou ponderadas medidas alternativas.

– Após análise das repercussões extremamente negativas que uma tal medida representará para a comunidade portuguesa afectada, e sem que se afigurem quaisquer motivos justificativos, o Conselho Consultivo alerta para os seguintes factos:

– Calcula-se residirem nesta área consular entre 25000 a 30000 portugueses, com tendência a aumentar nos últimos meses, distribuídos por 3 Estados Federados (Hesse, Renânia-Palatinado e Sarre) com uma superfície correspondente a metade da área geográfica de Portugal continental;

– Trata-se de uma das representações consulares mais antigas de Portugal na Alemanha, já remontando a 1960 e um ponto de referência para todas as gerações de portugueses. Ao encerrar o Consulado, é cortado o elo de ligação de uma vasta comunidade portuguesa com o seu país, facto altamente desmotivante e que levará muitos a naturalizarem-se alemães e a não inscreverem os seus filhos no registo civil português;

– Realce-se que nas últimas eleições presidenciais foi este posto consular que obteve uma das maiores percentagens de votantes, o que significa o elevado grau de responsabilidade da comunidade pertencente a esta área consular. Tal encerramento priva não só a população directamente afectada de qualquer assistência como a levará à completa desmotivação no envolvimento da causa nacional, nomeadamente nos actos eleitorais ou até no envio de poupanças para Portugal.

– Frankfurt representa para a Alemanha, depois de Berlim, a capital, um centro político e económico dos mais importantes e decisivos do país, facto pelo qual se encontram acreditados nesta cidade mais de 90 consulados de outras nações, sendo um dos últimos a abrir o Consulado-Geral de Angola.

– De realçar ainda a importância atribuída a Frankfurt pela Comunidade Monetária Europeia (é nesta cidade que está a sede do Banco Central Europeu).

– Relembramos também, que este Consulado é ainda de crucial importância como centro de apoio aos altos representantes governamentais ao fazerem escala no aeroporto internacional de Frankfurt, uma das principais plataformas giratórias da Europa.

– Trata-se ainda de um centro económico de vital importância internacional, onde se realizam algumas das feiras de maior repercussão para os expositores portugueses (como por ex. a feira dos têxteis, salão automóvel, ou ainda a feira do livro).

Ao encerrar este Consulado, o Estado português abandona assim um ponto de mais alto prestígio internacional e de vital importância económica, política e cultural.

Num momento em que a economia portuguesa necessita de impulsos à exportação, e a Europa está atenta à política portuguesa, consideramos que o eventual encerramento da sua representação consular em Frankfurt significaria não só uma medida extremamente negativa para a comunidade que serve, mas também um falso sinal sob o ponto de vista de estratégia económica.

– Finalmente, o encerramento também não seria compreensível nem aceitável sob uma eventual perspectiva de medidas de austeridade. A rentabilidade do Consulado foi confirmada através dos investimentos técnicos, de formação profissional nos últimos anos, da abertura de concurso para admissão de mais um funcionário a partir do início do corrente ano, bem como do regresso ao serviço de um outro funcionário a partir de Abril último, por instruções do MNE.

O Conselho Consultivo está consciente das dificuldades que o país atravessa, mas não poderá aceitar de modo nenhum medidas radicais que conduzam ao encerramento deste posto consular, sem que sejam previamente estudadas, em conjunto, outras alternativas de poupança, como por exemplo, a redução dos custos de arrendamento, de funcionamento do posto, ou a redistribuição da rede consular, entre outras.


Frankfurt am Main, aos 3 de Outubro de 2011


Os membros do Conselho Consultivo da Área Consular de Frankfurt”

A Comunidade encontra-se consternada perante  a medida de encerramento em consideração. Não se observam critérios justos nem racionais que levem ao encerramento do vice-consulado. Portugal pode poupar imensamente mais aqui na Alemanha sem ter de encerrar serviços de atendimento ao público.


Seria importante que o MNE organizasse uma pequena comissão encarregada de fazer uma análise das medidas de poupança a realizar nas instituições do Estado português na Alemanha.

Fica a esperança de que por fim prevaleça a razão e a justiça.

António da Cunha Duarte Justo

antoniocunhajusto@googlemail.com


Diplomatas de Carreira defendem as suas Mordomias – Vice-Consulado de Frankfurt Vítima de Interesses duma Classe

Vice-Consulado de Frankfurt Vítima de Interesses duma Classe

Porque fecham Vice-Consulados e não Consulados

António Justo

Um consulado faz o mesmo trabalho que um vice-consulado. O chefe dum consulado é um diplomata de carreira, mais para representar do que para trabalhar. E isto com a agravante que, no consulado ele ainda sobrecarrega os outros funcionários com trabalho seu e ocupa um escritório. Um Vice-cônsul faz o trabalho dos dois mas mais modicamente e mais próximo do povo.


As despesas com um Cônsul português na Alemanha chegariam para manter um vice-consulado. Pelo que consta, um cônsul além do seu ordenado tem direito a um subsídio mensal de renda de casa entre 3.000 e 4.000 euros, e um subsídio de representação de 7.000 euros mensais. Um consulado tem o seu cônsul, um vice-cônsul e outros empregados. Se o Governo nomeasse, em vez dum cônsul de carreira, apenas um vice-cônsul residente no país do Posto consular, poderia empregar o subsídio de residência que gastaria com o cônsul no aluguer das instalações para um vice-consulado e os sete mil euros de representação poderiam ser aplicados produtivamente. A redução de dois consulados para vice-consulados, na Alemanha, disponibilizaria dinheiros suficientes para se manter os vice-consulados de Frankfurt e de Osnabrück . Um cônsul custa ao erário público pelo menos 15 mil euros por mês.


Diplomatas de Carreira defendem as suas Mordomias

O Governo encontra grande oposição ao seu plano de reestruturação e poupança nas embaixadas e consulados de carreira. Aí poderia o Estado poupar fortunas mas não parece ter poder contra a classe dos diplomatas. Estes querem manter a maior parte de postos de carreira preferindo acabar com os vice-consulados, porque nestes não são precisos diplomatas de carreira. Será que Paulo Portas não tem poder para emagrecer este gordo couto, ou será que o poder corrompe? Uma nação economicamente ajoelhada torna-se ridícula nas regalias que dá às suas mordomias de representação sem obter nada em contrapartida. Naturalmente que as embaixadas se prestam param se tornarem reservados de ilustres dos partidos.


De facto, o encerramento dum vice-consulado encontra o apoio do corpo diplomático porque o vice-consulado faz o mesmo trabalho dum consulado não precisando, para o efeito,  pessoal diplomático. Este opõe-se, por isso, à passagem de Consulados a vice-consulados. Sabe-se porém que, duma maneira geral, Vice-consulados servem melhor o público do que os consulados.

O MNE ao seguir à pressão dos diplomatas não toma a sério as medidas de poupança.


O Estado deveria fazer contas. A falta de assistência aos portugueses desmotiva o envio de receitas para Portugal, fomenta a naturalização alemã bem como a ida de pessoas idosas para Portugal. Tudo problemas complicados. É preciso emagrecer a máquina e aproveitar a reforma para salvar as instituições que funcionam bem. A crise é uma grande oportunidade para finalmente se tomar a sério o Estado e o povo. Se se poupam na reforma os senhores do olimpo, a credibilidade de Portugal, para resolver a crise, torna-se nula. Senhor ministro Paulo Portas, aproveite a oportunidade para ficar na história como um estadista valente. Heróis só são possíveis em tempos de crise, há que não deixar passar a oportunidade. É preciso arrumar com as teias de aranha que ainda restam no corpo diplomático. Diplomacia é boa se não for construída à custa de privilégios que afastam do povo e obstruam o melhor servir!


Como constatamos a vida é luta e muitos dos que lutam alcançam um lugar ao sol na sociedade. Os diplomatas defendem afincadamente os seus privilégios porque sabem disso. E o povo, ingenuamente, queixa-se em vez de se levantar e protestar com eficácia. Democracia corre o risco de se tornar num álibi para justificar o domínio dos que sempre dominaram e viveram demasiado bem à custa dos Estados e dos Povos!


António da Cunha Duarte Justo

Conselheiro Consultivo do Vice-Consulado de Frankfurt

antoniocunhajusto@googlemail.com