Traição de Segredos como Prova de Democracia


WIKILEAKS – O SENTIDO DUM SENTIR UNIVERSAL

António Justo

Julian Assange e seus colaboradores fazem tremer o mundo dos poderosos com as suas revelações na sua plataforma WikiLeaks

Por toda a parte surgem cada vez mais alertadores (Whistfleblower) que chamam a atenção da opinião pública para questões que põem em perigo o Homem e o seu ambiente. Tornam públicos males e actos ilegais, corrupção, etc. que observam.

O” Expresso” teve acesso aos 722 telegramas dos EUA sobre Portugal recolhidos pelo WikiLeaks. Isto manifesta qualidade e profissionalismo jornalístico, ao dedicar capital ao jornalismo investigativo.

Muitas das revelações de WikiLeaks já eram conhecidas em países onde a imprensa vai funcionando razoavelmente.

Em geral, a documentação dos WikiLeaks revelou um certo autismo da administração americana. Os comentários dos americanos em relação aos europeus, reflectem também a agressividade de muitos europeus contra a América. Não passam de ofensas suportáveis entre amigos, atendendo à comunidade de destino de que participamos e participaremos.

WikiLeaks tornou mais consciente a gravidade da situação no Médio Oriente. Nas suas revelações também se deu a conhecer a impotência dos Estados contra o rearmamento nuclear no mundo. O Irão já possui raquetes que podem atingir a Europa. A Arábia Saudita e outros Estados árabes já fazem, há muito tempo, pressão para que os Estados Unidos da América intervenham contra o programa atómico do Irão.

Pelo que se vê da documentação, os dirigentes dos Estados revelam-se impotentes para resolverem os problemas. Isto obrigará o Presidente dos Estados Unidos e o Ocidente em geral a optarem por uma estratégia de diálogo entre os povos, já que o diálogo com os corifeus representantes dos povos tem levado, ciclicamente, ao fracasso, demonstrando, assim, o erro da política seguida.

Ao mesmo tempo que o mundo desejoso de transparência informativa rejubila, reagem outros contra a revelação posta ao público em geral. Surgem então, por todo o lado, ataques a Julian Assange, o chefe de WikiLeaks. Atacam Assange de autista como se grandes personalidades da História e da arte não tivessem sido autistas e maníacos e como se a sociedade não se encontrasse toda ela doente!

É interessante verificar que neste fenómeno, quem cometeu o erro da indiscrição foram diplomatas, políticos e sua administração, mas quem é atacado é o jornalista.

Em democracias, que ainda se prezam do nome, a liberdade de imprensa tem um significado constitucional, devendo o jornalista defender os seus informadores não os atraiçoando. A Alemanha, que dentro do sistema democrático em vigor tem uma das Constituições mais maduras do mundo, está do lado do jornalista. O jornalista tem o direito e o dever de recusar o depoimento relativamente aos seus informantes. Informação é um dever do cidadão dado o Estado receber a sua legitimação democrática duma informação ampla. A revista semanal alemã “Der Spiegel”, no seu número 50 defende: “A traição de segredos é uma legitimação da qualidade duma democracia”.

A informação é sempre boa; o problema encontra-se no detalhe e a dificuldade reside no facto de poucos terem tempo ou se encontram à altura de conseguir ver a conexão de factos e saberes. O Diabo encontra-se sempre nas entrelinhas e para as perceber será necessário ter já avistado as zonas avernais de sociedades e ideologias. A quantidade de informação não é acompanhada pela capacidade de compreensão. De costume, o denominado povo, anda sempre, atrás do acontecimento, a ladrar a qualquer coisa que se mecha, a nível de interesses imediatos e de sentimento mas, os malandros da informação sabem disso e também sabem que assim é mais fácil ganhar dinheiro e garantir melhor o emprego. Normalmente a realidade encontra-se em fora de jogo. O campo de jogo é a TV. O povo que lê não é tão influenciável,  mas muito escasso. De resto, sabe-se que a opinião é que vale e esta prescinde de fundamento. Eticamente grave é a aceitação popular de que “para se ser político tem de se ser mentiroso”.

Quem decide sobre boa ou má informação na formação da opinião pública? Esta é uma avalanche determinada pelos que dominam a sociedade. Estes estão bem servidos e sabem que o povo come o que lhe dão.

Neste contexto, é de lamentar que o jornalismo português não tenha capital nem interesse em fazer investigações sérias, em casos importantes como os faxes do freeport e as irregularidades comuns nas empresas do Estado e PPP.

De resto sabemos já os rituais vigentes: Afirmações são desmentidas mas depois não aparecem factos a provar o desmentido!

A internet revelou-se num grande factor de democracia. A identidade da nova juventude passa pelo Facebook criando-se assim uma nova Ágora. (China e Irão bloqueiam-no).

António da Cunha Duarte Justo

antoniocunhajusto@googlemail.com

www.antonio-justo.eu

SUDÃO DIVIDIDO EM DOIS ESTADOS

Sul do Sudão mantido sob a Estratégia árabe da Guerrilha


António Justo

As ameaças, do governo islâmico de Cartum, de perseguirem os cristãos que vivem no norte do país (1,5 milhões de cristãos) caso o sul cristão (3.500 milhões de cristãos) se declarasse pela independência, não sortiram efeito. Os resultados do referendo com 99% de votos a favor da independência corresponderam às previsões. A consequência do referendo do povo da zona sul do Sudão será a divisão do país em dois estados. O pacto de paz de 2005 previa o referendo. O conflito entre norte e sul começou em 1983 quando o norte, de maioria muçulmana, impôs ao sul, cristão e de tradições africanas, a lei islâmica bárbara da charia. O conflito provocou dois milhões de mortos e milhões de refugiados.


O norte muçulmano já tinha ameaçado, no caso da separação, tirar os direitos civis e as possibilidades de rendimento aos cristãos do Norte.


“O Sul, com 8 milhões de habitantes, só tem um hospital que mereça este nome”, diz Hans-Peter Hecking, referente de Missio, depois duma visita à região. “Fora de Juba (sede do governo autónomo) não há um prédio público nem uma Igreja que se encontre intactos”.

O sul de cultura africana e cristã e o norte de cultura árabe e muçulmana não encontram a paz dado o Norte discriminar e explorar o Sul. O Norte não desistirá de impor a cultura árabe ao sul.


Organizações religiosas temendo que se origine um segundo Ruanda, alertaram as Nações Unidas e as organizações internacionais para a gravidade da situação. As igrejas cristãs tinham distribuído por todo o país uma oração apelando à paz e à coexistência no Sudão.


O mundo não pode continuar a fechar os olhos como tem feito até agora, quando se trata de pessoas africanas a serem sacrificadas ao terror de estados e grupos ou de sangue africano a correr.



Solução à maneira árabe não é solução

A declaração da independência do sul do Sudão está prevista para 9 de Julho. É previsível que aconteça no sul do Sudão, o que aconteceu com a criação do Estado de Israel. Os estados árabes estiveram de acordo com a sua criação e um dia depois da proclamação do Estado declararam-lhe guerra!


O Sudão árabe, ao impedir o plebiscito nalgumas regiões do sul, criou já condições e pretextos para continuar a sua estratégia de guerrilha no sul.


A consequência lógica será a guerra civil apoiada por grupos árabes do estrangeiro. O Norte que explorou o sul como fonte de matérias-primas e de escravos durante centenas de anos, quer continuar a impor a sua hegemonia muçulmana ao Sul.


Embora o Sul seja rico em água e em petróleo, metade da população vive de menos de um dólar por dia; a quota de analfabetismo atinge os 80% com a maior mortalidade de mães no mundo.


Fugitivos e refugiados, que regressam de mãos vazias ao sul, não recebem nenhum apoio do Estado.


Restam imensos problemas por resolver: a repartição da dívida externa do Sudão de 37 mil milhões de dólares, que correspondem às entradas do fomento do petróleo com os seu poços no sul; o problema dos pipelines que levam o petróleo para o Norte, donde é exportado; o plebiscito impedido na região sul rica em petróleo Abyei, Nilo Azul e Southern Kondofan e adiado para um prazo indefinido.

O caminho da liberdade do Sul é muito difícil atendendo à situação, à hipocrisia ocidental e à má informação dos defensores da liberdade na Europa e no mundo.


É interessante constatar como o mundo é injusto na sua política de informação e como esta é tendenciosa na reacção a querer provocar. Nesta zona onde morreram mais de dois milhões de africanos, tal como já aconteceu noutras zonas africanas, o mundo assiste sem se admirar de tal. Para o Ocidente o sangue de mil sérvios e cosovares na Europa revelou-se mais importante que o de milhões de africanos, deitados ao abandono! A África continua o continente a explorar, por capitalismo e comunismo, por árabes, chineses, ocidentais e orientais. São a factura a pagar pelo petróleo do mundo árabe. Como se o sangue da áfrica negra não fosse igual ao dos brancos!


O sul do Sudão, na sua miséria, só é ajudado por organizações humanitárias. Seria importante que paróquias e juntas de freguesias europeias se tornassem parceiras de paróquias e administrações locais africanas para as ajudar a sair do ciclo vicioso de opressão e pobreza. Deste modo seriam salvaguardados os biótopos de cultura africana e de cultura cristã, porque, a experiência da História ensina e resume: onde a cultura árabe entra os outros biótopos naturais estão condenados a desaparecerem para darem lugar à monocultura muçulmana. Sabe-se da agricultura que onde domina a monocultura o solo é destruído!


O Apoio que, com os nossos impostos damos ao Kosovo não deve ser negado ao Sul do Sudão. Doutro modo a ONU apoia os árabes onde estes gritam por liberdade e pratica a tolerância da opressão árabe nas suas zonas de domínio. O petróleo pode mais que humanidade e humanismo juntos! A pessoa humana na sua dignidade e direitos pessoais continua a não fazer parte da agenda das instituições e dos povos. Não chega o grito da liberdade da fome e de consciências incomodadas. Necessita-se dum grito da liberdade que surja da humanidade e do humanismo para o Homem!


António da Cunha Duarte Justo

antoniocunhajusto@googlemail.com

ASSALTO À GRAMÁTICA E ÀS LEIS


Ideologia pela Porta traseira do Dicionário e da Lei

António Justo

Enquanto representantes de Homossexuais masculinos e femininos procuram diluir os sexos a nível da lei, querendo ver substituída nas Constituições de diferentes países a palavra “sexo” pela palavra “género”, a presidente do Brasil, Dilma Rousseff, no seu discurso de posse usou a forma presidenta para acentuar o sexo da ocupante (a!)  do cargo de presidente. São duas medidas, de alta eficiência, duma mesma estratégia moderna de lavagem ao cérebro.


A esquerda portuguesa quer ver a palavra “sexo” banida do art. 13º da Constituição e vê-la substituída pela palavra “género”. Como refere a RR on-line de 21.01.2011, ” ‘Sexo’ é uma palavra que sublinha a diferença entre homem e mulher, enquanto “género” é muito mais abrangente, porque em vez de apenas dois tipos – feminino e masculino – a nova expressão da moda abrange cinco: feminino, masculino, homossexual feminino, homossexual masculino e híbrido.”


Se uns se afirmam através da ambiguidade outros recorrem à acentuação do contraste!


Presidenta está para o sexo como homossexuais para o género


A palavra presidente que vem do particípio presente latino praesidens/entis, tal como outras palavras originadas de palavras com terminações idênticas (ens no nominativo e entis no genitivo e ente(m) no acusativo ) assume a mesma forma no masculino e no feminino, distinguindo-se o género prático pela forma gramatical do artigo masculino ou feminino que a precede. Temos assim: o presidente, a presidente, o servente, a servente, o estudante, a estudante, o intérprete, a intérprete, o doente, a doente; o amante, a amante, etc.

Alguns já se anteciparam a uma análise cuidada sobre a etimologia e semântica da palavra colocando a palavra “presidenta” no dicionário. Quem pode pode! (1)


A arbitrariedade parece ganhar, cada vez mais, espaço. A demasiada preocupação de socialização da língua pode, em muitos casos, conduzir à sua proletarização.


Uma má consciência, justificável em relação à mulher e ao feminismo, não é suficiente para justificar pontapés na gramática. Para que uma asneira se torne norma não deveria bastar repeti-la muitas vezes, ou chegar o argumento de “autoridade” de lugares altos. O número da população falante, um argumento de peso, não deve oprimir formas de falar mais complexas e mais diferenciadas em outras zonas da lusofonia (2). O povo merece um ensino primoroso na escola.


Não está aqui em questão o uso de novas flexões para palavras tradicionalmente ligadas ao sexo masculino e para as quais faltam correspondentes formas gramaticais femininas.


O interesse pelo cuido da língua portuguesa a nível internacional deveria empenhar-nos num esforço de superar as conotações de região, moda, salvaguardando-se contudo o seu uso específico regional! Até que uma palavra tome lugar no dicionário (norma) é preciso que passe pelo cadinho do tempo. Uma língua viva precisa continuamente de criar palavras novas e de assimilar também os estrangeirismos. Estes são, muitas vezes, ditados por interesses comerciais e por uma propaganda que não tem respeito pela própria língua.


A lexicologia, ao falar da proveniência dos vocábulos da nossa língua e do enriquecimento do léxico, faz referência ao contributo dado pelos povos que viveram no país, aos neologismos e em especial à via erudita e à via popular no processo de formação das palavras originadas do latim. Hoje, os novos gramáticos deveriam acrescentar a estas vias, a via ideológica. De facto, uma “gramática generativa” e compêndios escolares tornaram-se no meio mais eficiente para fazer interiorizar forças ideológicas, entretanto infiltradas nos organismos dos Estados.


A língua, por mais democráticos que queiramos ser, não pode ser usada a bel-prazer. A gramática não se aprende apenas por osmose, precisa de especialistas formados em academias interculturais.


Assim, com todo o respeito pelos biótopos regionais, não sou presidente pelo facto da minha esposa ser a presidente, nem Doutor por ela ser doutora ou vice-versa, como quererá levar a crer o Dicionário Priberam da Língua Portuguesa: “http://www.priberam.pt/dlpo/dlpo.aspx” ao apresentar a palavra presidenta.


Militantes da Ideologia servem-se dos lugares altos para espalhar os seus interesses. Lobbies, supranacionais encobertas, concentram as suas redes de influência nos corredores dos ministérios e dos parlamentos a nível nacional e internacional. Para isso utilizam não só a legislação (decretos e leis) mas até a gramática. Por trás da sua estratégia esconde-se a vontade de mudar o inconsciente dos povos e o seu condicionamento sócio-cultural, através da criação de novos mitos e conceitos operantes no consciente popular. A fomentar este processo encontra-se a ingenuidade de muitos políticos e multiplicadores de opinião.


No passado a gramática e as leis transmitiam regras mais ou menos consensuais. Eram fruto dum processo sério de análise por especialistas e de aferimento na prática.


Na era dos lobbies do oportunismo interesseiro, os militantes da ideologia e do poder, não submetem o seu produto à retorta do consenso, optam por dirigir-se directamente, às fontes do Estado e da consciência popular. Assim, o veneno da ideologia, metido pouco a pouco no sistema circulatório da Nação, é assimilado directamente por um povo que habituado às conservas do mercado, trata da mesma maneira o legado cultural, engolindo tudo o que se encontra já mastigado por não importa quem.



O interesse pelo cuido do português a nível internacional deveria preocupar-se no fomento duma língua moderna, expressão duma civilização intercultural preocupada em impor-se no mundo e não envolvida em guerrilhas de trincheira ao serviço duma estratégia de impor conotações de ânimo leve, selam elas da região, da moda ou da ideologia. A política da Língua e o ensino da gramática, no contexto intercultural português, não deveriam ser utilizados como instrumento de ideologia e de poder.


António da Cunha Duarte Justo

antoniocunhajusto@googlemail.com

(1)     (Aqui a repetição da palavra “pode” é inocente como todo o poder; esta não tem género e vem do verbo latino “potere, possum, potui, posse” e não de “fodere, fodio, fodi, fossum”; se escavássemos um pouco mais no fosso da etimologia talvez pudéssemos menos mas criássemos mais e melhor!)

(2)     Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Macau, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe, Timor-Leste.


OPINIÃO E REALIDADE – IDEIA E VERDADE


A Vida não engana, as ideias é que nos enganam! (3)

António Justo

A nossa opinião traz a cor dos nossos óculos. É monocromática, enquanto a realidade tem todas as cores do arco-íris. Com as lentes do nosso pensamento configuramos o mundo, a nossa maneira de ser, a nossa opinião e mentalidade. Além disso, usamos uma matriz de percepção selectiva, dirigida para a realidade apreendida como objecto e não como sujeito (ser em processo). A natureza dá-nos assim, para nos individuarmos, a possibilidade de ver a sua fluência transformada em camada de gelo, e assim nos podermos deslocar nela sem vertigens. Assim da órbita do pensamento criamos uma realidade virtual só para nós, separando-nos da natureza tal como a Lua se separou da Terra.


Fixados no movimento de rotação em volta de nós mesmos (do nosso ego) não pressentimos que estamos enquadrados em outros movimentos e forças, que fazemos parte duma Realidade complexa sob a força centrípeta dum Sol material e espiritual. Tal como o Sol continua a ser parte imperceptível da matéria até ao seu mínimo átomo, assim o Espírito faz parte do nosso corpo até às profundidades da nossa alma. O sol brilha na natureza como a intelig1ência no Homem. Como o Sol dá vida à natureza também o Espírito no Homem poderia dar maior brilho e honra à natureza humana, animal e vegetal.


Afirmar-se ou definir-se pela própria posição estática, pelo seu ponto de vista, é tão perigoso como se a Terra se afirmasse sem o Sol. O próprio ponto de encontro de si mesmo na própria rotação pressupõe a existência de outras órbitas e forças de transacção, a existência do outro, como parte também ela formadora da própria identidade. Para entrarmos em nós pressupõe-se então a distanciação de nós mesmos no outro, na outra parte que nos forma e alarga. Alarga não só na perspectiva do sistema mas no sentido metafísico como o entende Heidegger em “Ser e Tempo” ao distinguir entre “as coisas do mundo” e o “Ser”, entre o nosso ser ôntico e ontológico.


Geralmente vive-se da fixação na ilusão da própria visão longe da Realidade que não se deixa reduzir aos canais do pensamento mas acontece na dinâmica do sempre novo, sempre diferente. A ideia é abstracção, uma paisagem da vida a partir da janela da nossa pessoa, condicionada ao nosso saber e sentir. Não vemos a realidade, interpretámo-la através da janela distante dos nossos sentidos. Somos tradutores dum texto comum em que as letras todas correm lá no profundo de cada um de nós e simultaneamente em toda a realidade.


Longe da vida e à caça de vivências, ficamos presos nas laçadas das nossas opiniões. Confundimos a realidade e a verdade profunda com as condutas de acesso a ela: as condutas das opiniões e concepções, os pipelines das civilizações ou as maneiras de ver em voga. A vida torna-se no negativo (filme) da realidade. Na velocidade da dança e na riqueza superelegante da roupagem torna-se difícil descobrir o rosto da vida. A vida não engana, o que engana é a vertigem das ideias! Em vez de identificar o pensamento com a realidade, será óbvio reconhecer no sistema de pensamento um sistema de abordagem e de condução, no cruzamento de outras órbitas. Para evitar a frustração do próprio engano e do engano dos outros, há que descer à profundidade do ser onde a vida corre como ribeiro imperceptível na floresta da realidade. No mais íntimo de nós mesmos, não só na rota das órbitas, encontramos o mesmo Sol que procuramos lá fora. A opinião é uma pobre membrana aberta à osmose do ser todo que é a Verdade! Nestas condições, passo a ser todo na complementaridade do eu – tu – nós.

António da Cunha Duarte Justo

Pedagogo e teólogo

antoniocunhajusto@google.com


A criatividade segue o Interesse


A Vida não engana, as ideias é que nos enganam! (2)


António Justo

As ideias circulam à volta das nossas preocupações como as abelhas à volta do favo. Não chega tomar consciência das próprias ideias e sentimentos. A disposição está na base das nossas vivências. Não somos enganados pela vida mas pelas ideias que fazemos dela. Para irmos buscar as soluções à fonte da intuição necessita-se de calma para passar os muros do ego. Este produz muitas ideias e sentimentos com que nos identificamos e a que nos agarramos, mas, frequentemente, não passam de ruído, de roupagem. O tesouro de cada um é mais que a roupagem que o encobre. O tesouro da criatividade encontra-se enterrado no campo da vida, como revela o evangelho. Encontram-se muitos talentos enterrados em nós, à espera de descoberta enquanto dançamos a dança dos outros sem descobrir a harmonia da orquestra do nosso interior. A verdadeira intuição dá-se no fluxo da criatividade, lá onde tudo flúi (panta rei), onde tudo é movimento e mudança. Aqui, no âmago de nós mesmos, descobrimos o que é importante para nós e para os outros. Uma vez descoberto aquilo que é importante para nós, a criatividade em nós vai desenvolver respostas e métodos de realizarmos o que descobrimos. A criatividade ao dar resposta ao que é importante para nós premeia-nos com a sensação do sentido realizado.


A pessoa, para quem é importante ser amada, desenvolve todas as formas da criatividade que a levam a ser amada. Para quem é importante a comida, desenvolverá formas de criatividade especiais na arte de cozinhar, criando receitas novas, etc. O sistema do nosso pensamento pode enganar mas a alma não. A criatividade segue o interesse. Trata-se de descobrir se somos nós que fazemos experiências ou se as experiências nos fazem a nós.


É muito importante habituar-nos a escutar e ouvir o sábio que temos dentro de nós, escutar o coração e a razão. O coração tem razões que a razão não vê, dizia Pascal. Neste caso a decisão estará mais perto da verdade. Em questões de diálogo, podemos, então, embarcar com o outro sem o perigo de o aprisionarmos ao nosso lago ou de nos deixarmos arrastar nas suas águas.


A vida é uma grande aventura, aberta em todos os sentidos. O nosso interesse é que determina o roteiro. No mar da vida há muita gente ao sabor das ondas sem timão nem vela porque não descobriu o seu interesse, a sua meta! Para o conseguirmos será preciso transpor as encostas das ideias e sentimentos para se alcançar novas perspectivas. Se queremos ir e ver mais longe há que confiar na visão que vem da intuição, de sentimentos que se alimentam também de dimensões para lá do tridimensional espácio-temporal. Nela se encontra a parte com o todo, se encontra o Alfa com o Ómega; o mar irmana-se com o monte, na nascença do rio. Aqui começa o mistério da relação e do encontro que se expressa na visão cristã, da Realidade como relação tríade.


Na intuição sentimentos e ideias submetem-se a um processo semelhante ao da larva no casulo, que perde a sua forma exterior para se tornar em borboleta! Nela flúi a gratidão e a compaixão que nos identifica e une.


Compaixão e gratidão impedem a enxurrada dos sentimentos formando como que uma espécie de GPS interior. Em vez de nos fixarmos nas curvas da estrada e nos diferentes letreiros (ideias e sentimentos leves) concentramo-nos na condução que leva à meta. A vida é bela, é encontrar-se a caminho na peregrinação universal!


A vida não engana, quem engana são as ideias e, por vezes, certos sentimentos embrulhados nas dobras do pensamento!


António da Cunha Duarte Justo

antoniocunhajusto@google.com