REFORMA DA CÚRIA VATICANA – MENOS PODER E MAIS SERVIÇO

O Papa Francisco impede o Carreirismo na Cúria

A Cúria Romana está ao serviço do Papa, que, como sucessor de Pedro, é o princípio perpétuo e visível e o fundamento da unidade tanto dos Bispos como da multidão dos fiéis.

O Sumo Pontífice apresentou a nova Constituição Apostólica “Praedicate Evangelium” (Proclamai o Evangelho) em que determina uma reforma da Cúria (1). A nova ordem para a administração do Vaticano foi promulgada pelo Papa Francisco no dia de S. José, 19 de março de 2022 e inclui numerosas modificações (2) entrando em vigor a 5 de junho (Festa do Pentecostes).

Todos os principais departamentos do Vaticano são agora definidos como dicastérios (ministérios do Vaticano) em referência directa com o Papa. Os dicastérios passam a poder ser dirigidos por pessoas que não são padres, bispos ou cardeais. Lê-se na Constituição: “Esta vida de comunhão dá à Igreja a face da sinodalidade; uma Igreja de escuta mútua “na qual todos têm algo a aprender”. Os leigos – e, portanto, também as mulheres – podem chefiar departamentos do Vaticano “para alinhar mais o exercício do ministério da Cúria com o caminho da evangelização que a Igreja está a seguir”.

O papa põe termo ao carreirismo e impede a formação de redes de poder, ao decidir que o limite de posições de topo no Vaticano será de dois períodos de cinco anos e nenhum clérigo pode servir na Cúria por mais de dois mandatos de cinco anos.

O papel da Cúria Romana passa a ter um maior caracter de prestadora de serviços para as igrejas locais em todo o mundo. “A Cúria Romana não se situa entre o Papa e os bispos, mas coloca-se ao serviço de ambos”.

A Secretaria de Estado assume o papel de um secretariado papal em nome de uma melhor funcionalidade. O Dicastério para a Evangelização fica sob a presidência directa do Papa (Artigo 55). A sua divisão em duas secções – disciplinar e doutrinal – estabelece uma clara separação entre as questões de disciplina e as questões de fé (talvez devido à experiência dos abusos sexuais).

Francisco acentua, no preâmbulo, o sentido espiritual da cúria no sentido da sua última encíclica “Fratelli tutti” sendo o seu enfoque na evangelização ou missão.

A questão do cânone 129 do Direito Canónico, que limitava os cargos ao clero como competência governativa na Cúria, terá que ser remodelada!  Segundo o especialista em direito canónico Padre Gianfranco Ghirlanda S.J a Constituição decide que não é a ordenação, mas sim a missão canónica que conta.

No passado, a forma de colegialidade foi respeitada e estabelecia um certo limite. Agora o único limite para a colegialidade é o próprio Papa. No futuro as decisões serão mais burocráticas e, em última análise, o papel do Papa é enfatizado (3).

O documento da Constituição da Cúria tinha começado a ser preparada em 2014 pelo grupo consultivo do Papa (Conselho de Cardeais) e esteve sujeito a propostas e consultas das conferências episcopais.

António da Cunha Duarte Justo

Pegadas do Tempo

(1) “A Cúria Romana é a instituição que o Pontífice Romano usa habitualmente no exercício do seu supremo ofício pastoral e da sua missão universal no mundo.” Com os dicastérios já não há distinção entre congregações e concelhos papais.

(2) Art. 15: Os membros das Instituições Curiais são nomeados de entre os Cardeais residentes tanto dentro como fora de Roma, aos quais se acrescentam, na medida em que são particularmente peritos nos assuntos a tratar, vários Bispos, especialmente Bispos diocesanos, bem como, de acordo com a natureza do Dicastério, vários sacerdotes e diáconos, vários membros de Institutos de Vida Consagrada e Sociedades de Vida Apostólica e vários fiéis leigos. https://press.vatican.va/content/salastampa/it/bollettino/pubblico/2022/03/19/0189/00404.html

(3) https://de.catholicnewsagency.com/story/praedicate-evangelium-was-sie-in-der-neuen-verfassung-vielleicht-uebersehen-haben-10403 .

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António da Cunha Duarte Justo

Actividades jornalísticas em foque: análise social, ética, política e religiosa

15 comentários em “REFORMA DA CÚRIA VATICANA – MENOS PODER E MAIS SERVIÇO”

  1. Dividimos o mundo entre bons e maus, os do leste e os do ocidente. Agora mais do que nunca, antes de debater há necessidade de marcar posição, para que não te confundam. Em fim, estamos todos entrincheirados em extremos e tudo agora exige um alinhamento ideológico sem precedentes.

  2. Manuel Rafael Nhamirre, as armas do fogo contra a liberdade e a intolerância para com opiniões diversas tornam-se cada vez mais visíveis nos discursos que se propagam. As armas que matam ucranianos e russos são fabricadas pelos altifalantes que formam a opinião pública. É triste constatar-se como se manipulam as pessoas. Se observamos as pessoas de leste e do ocidente o que querem é viver em paz! Mas os poderosos que conduzem as nações estão interessados em fazer do povo forragem para canhões em nome de interesses e de direitos anónimos. Em nome da Rússia, em nome da Ucrânia os chefes destes países instigam o povo à guerra. O mesmo se diga da guerra que USA/EU/OTAN fazem em nome da liberdade e da democracia. Uns e outros são os responsáveis. Mete nojo quando se ouve falar muitos políticos cujo interesse parece ser só o fomento da guerra! Infelizmente a guerra é uma vaca onde mamam sobretudo os grandes. Vejam-se as guerras da Europa, da Rússia, dos USA, do Japão, da China, etc. tanto sangue corrido, tanta vida destroçada!

  3. António,estas reformas,trará vantagens na Igreja ou não ??? Oq q poderá mudará na Igreja, com esta reforma ???
    FB

  4. Alegria Piaget, a vantagem desta Constituição penso ser de responder aos sinais dos tempos sem cair no espírito do tempo (zeitgeist) e de chamar os seus ministros a serem verdadeiramente comprometidos com a missão de Jesus: pregar e dar testemunho do evangelho. O facto de os dignatários só poderem estar no Vaticano no máximo dez anos impede a formação do mofo institucional e a organizacao de interesses de grupos! A Constituição traz com ela uma mudança de mentalidade; não sendo já tão acentuado o caracter de governo pois a preocupaçã o colocada em primeiro plano é o aspecto espiritual e de serviço missionário (exemplo do bom samaritano) para a Cúria! Ao incluir os leigos na Cúria (mulheres e homens), esta deixa de ter um caracter meramente clerical e representar todo o povo de Deus nela. Uma inovação de relevo é o facto de homens e mulheres não consagrados passarem a poder assuir altos cargos dentro da instituição. Para isso ser possibilitado deixa de ser a ordenação sacerdotal o aspecto determinante para exercer um cargo mas sim o chamamente do papa que pode ser dirigido a qualquer. Inicia-se um processo de desclericalização da Igreja. Na Cúria fica toda a Igreja empenhada; não se pode ficar pelo aspecto burocrático! Trata-se de testemunhar a fé!

  5. O Carismático Alegria Piaget
    Com oq então,é uma boa notícia,sobretudo aos Cristãos Católicos,certo ????
    Oq é o Espírito Zeitgeist ????

  6. Eu diria “Zeitgeist” é a crença própria da época e que imperceptivelmente é criada por elites empenhadas relevantes e pelas necessidades imediatas do povo! Resumindo, Zeitgeist (espírito do tempo) é o pensamento generalizado de uma geração ou época que determina a atitude da maioria das pessoas numa certa sociedade e numa certa época. Ao Espírito do tempo medieval contrapôs-se o Espírito do tempo modernista em que vivemos; em tempos vindouros outros espíritos do tempo se insurgirção contra o nosso (maneira de pensar e actuar).

  7. P Albuquerque Dias , discutimos esse tema algumas vezes, lembras? Aquilo está no ADN da maioria daquele povo… Começaram mal no Novo Mundo, continuaram mal, estão mal, ficarão sempre mal, mas com um savoir faire angelical e diáfano… Venha a presidência que vier .. infelizmente… deixam sempre uma pegada de merd@ por onde passam…
    FB

  8. Muto bem amigo ! Mas segundo nos dizes, a Reforma da Igreja não vai além dos aspectos administrativos da Cúria.
    A meu ver é pouco…pois o fundamental não é a burocracia, mas a DOUTRINA, a SUBSTÂNCIA, o papel da Igreja, a função dos sacerdotes… a tua “arte” , chamada TEOLOGIA , a dos PADRES DA SANTA IGREJA !
    Não sei se vais concordar comigo, pois mexer em DOGMAS é , para muitos TEÓLOGOS, acabar com a nossa Religião, é pôr em causa o CATECISMO, a nossa FÈ . Falas em vários artigos de opinião contra o racionalismo, como se fosse um mal…como se a liberdade de pensar devesse auto limitar-se, ou pelo menos condicionar-se. Esquecer que foi Deus que nos criou assim, que evolução do Homem é, no geral, para melhorar as sociedades …Esquecer que foram as novas ideias que nos levaram ao grau de bem-estar em que se vive actualmente, à diminuição dos pobres e ao triunfo dos direitos do Homem e da Democracia (que, não sendo o ideal, nem sequer perfeito , ainda é o melhor dos sistemas de Governo), esquecer isso tudo, não liberta a Igreja dos erros do passado, nem motiva os crentes, nem faculta o aparecimento de novos caminhos que tragam as “ovelhas tresmalhadas ao redil “… Que aproximem as pessoas de Deus Criador de todas as coisas, designadamente da Natureza, que valorizem as descobertas científicas… Que relancem o apoio à EDUCAÇÃO, à FILOSOFIA até ao MISTICISMO….que faça , naturalmente, ressurgir a esperança na VIDA DEPOIS DA MORTE, sem purgatório, nem inferno…
    Sem reformas, sem as reformas adequadas, a Igreja irá decrescer, definhar,.. Temos um PAPA PARA A MUDANÇA, como não tivemos há dois ou três séculos que luta para MUDAR, mas os cardeais antigos, os TEÓLOGOS dogmatistas, não querem mudar porque há muito vivem longe do Povo Cristão!
    Acabei por fazer um sermão, despropositado, pois nem era para ti, preclaro amigo! Foi o que me saiu , ao acabar de ler o teu artigo com epígrafe Papa Francisco impede o carreirista da Cúria !

  9. Obrigado pela reflexão que fizeste e corresponde também ao que eu penso; pelo seu caracter teológico e litúrgico, mais que um sermão, foi uma homilia que agradeço muito!
    Sim, temos um papa jesuíta, expressão da graça de Deus para o nosso tempo. É muito contestado em determinados ambientes clericais e políticos mas é uma grande personalidade, muito oportuna e respeitado em diferentes meios intra et extra muros!
    Quanto à remodelação no vaticano mais que motivada pelo aspecto burocrático ela vem no sentido de dar resposta à necessidade de maior vivência cristã no Vaticano; a Cúria vaticana encontrava-se bastante hermética e mundanizada. Procurei apenas apresentar a Constituição apostólica sobre a Cúria Romana (https://press.vatican.va/content/salastampa/it/bollettino/pubblico/2022/03/19/0189/00404.html ).
    Sabes, quando escrevo procuro fazê-lo para um público não “judeu” como Paulo, salva seja a comparação. Muito dos que me leem não são crentes e circulam em torno da política, maçonaria, Scientology, budismo, etc. mas gostam de me ler por fazer dos meus textos um caldo de pedra em que eu costumo colocar um pouco de azeite cristão! Como constato nestes grupos de grande influência um exagero exacerbado da razão onde pretendem um Deus tão abstrato que não cabe nela o Deus dos Cristãos e também, pelo que observo nos nossos governantes europeus que me dão a impressão de não serem eles a dirigir-nos mas sermos dirigidos por uma inteligência artificial, meto, de vez em quando, o pé na poça apenas para dizer que a abertura da racionalidade deixa de o ser quando pretende expurgar tudo (o humano) o que não passe pelo crivo da razão. Tens toda a razão que o que tornou mais exposta a nossa civilização foi a sua capacidade de integrar razão e religião como complementares. Tomás de Aquino via longe!
    Quanto ao purgatório e ao inferno mais que afirmá-los ou nega-los (o que eu chamaria de racionalismo exacerbado) temos que os ver teologicamente no contexto (individual e social) de toda a filosofia e mística cristã e nas simbologias (e mitos que ultrapassam e são mais abrangentes do que realidades históricas) só compreensíveis em contexto, tal como acontece nas filosofias e místicas de outras mundivisões!
    É isso mesmo! Os padres têm de voltar a ser povo, testemunhos de Cristo e da Igreja! Foi a Igreja que elevou o povo à categoria de dirigente (clero ao lado da nobreza) dando, numa sociedade dividida em classes, a possibilidade aos filhos do povo conseguirem subir aos mais altos postos dos priveligiados. Na altura, se não fosse o celibato os clérigos seriam apenas recrutados das classe nobre! Agora o clero terá de descer para as camadas menos altas sem se confundir com elas.
    Obrigado, caro CMartins; sempre que escreves enriqueces-me e inspiras-me muito e logo si alguma coisa em reacção como acabas de constatar!
    Um forte e justo abraço, caríssimo amigo

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