Os Municípios alemães empenham-se no Cultivo da Cidadania – Um Exemplo a seguir

As Comunas alemãs cultivam a Cidadania – Um Exemplo a seguir

Honrar os Idosos e as Famílias é Prática nacional

A RFA É FORTE PORQUE MODERNA E TRADICIONAL

 

António Justo
Na semana passada, desloquei-me à Baviera, Bad Wörishofen  para festejar o aniversário (90 anos) do meu sogro. Até aqui tudo seria normal se não fosse o facto de o vice-presidente da Câmara se deslocar a sua casa, acompanhado de um jornalista dum jornal da região. O vice-presidente da Câmara trouxe uma oferta da cidade e o jornalista entrevistou o meu sogro e fotografou a família; além disso, o vice-presidente entregou um documento da Câmara Municipal e um documento de parabéns do Chefe de distrito!

 

Cada comarca alemã tem a sua maneira própria de honrar idosos e famílias. Neste caso o representante da edilidade trouxe como prenda da cidade um cesto com uma toalha fina com insígnia da câmara, um licor e produtos cosméticos biológicos (à base de plantas, dado Bad Wörishofen ser uma estância termal)! A minha sogra pôs à mesa cervejas, uma garrafa de champagne e salchichas brancas (uma especialidade da Baviera) e pão.

 

O que aqui mais me surpreendeu, como estrangeiro, foi a abertura e a maneira simpática como o representante comunal e o jornalista falaram connosco, durante duas horas, sobre os problemas internos comunais e da maneira como davam resposta aos problemas locais apresentados.

 

Os municípios alemães homenageiam, além dos aniversários pessoais (90, 95, 100 anos), também os seguintes aniversários de casamento: bodas de ouro (50 anos), bodas de diamante (60), bodas de Ferro (65), bodas de Vinho (70). Semanas antes do aniversário a Comarca telefona à família para saber se é bem-vinda a sua visita.

 

O Presidente da RFA também assume o apadrinhamento honorífico para os filhos do mesmo pai e da mesma mãe, a partir do 7° filho vivo. Crianças adotadas são tratadas como filhos biológicos. Neste caso tem de ser feito um requerimento formal, nos departamentos concelhios, pelos interessados.

 

Na Alemanha, toda a pessoa recebe uma carta de felicitações concelhias ao atingir os 18 anos (maioridade civil).

 

A cidade mostra-se reconhecida pelo contributo dos seus cidadãos estando consciente que não é nada sem eles.

 

Uma sociedade que não deita ao esquecimento os idosos é uma sociedade honrada porque reconhece já o que é e vai ser nos que a construíram.

 

O meu amigo Dr. Jorge Santos, de visita à Alemanha constatava “é uma outra cultura e diferente modo de cidadania. Há um sentir comunitário e gratidão à memória. Ainda bem porque assim vive-se mais feliz”. Sim, cria-se um sentimento de pertença e até de maior compreensão por defeitos e problemas políticos, numa sociedade não anónima!

 

Já o livro dos Provérbios (16:31) reconhece ” Os cabelos brancos são uma coroa de beleza quando se acham no caminho da justiça.” Uma sociedade não envelhece se reconhece e honra os seus filhos e os seus pais!

 

Escrevo isto porque pode servir de exemplo, pelo menos a nível de paróquias, de Juntas de Freguesia e de Câmaras municipais, para a Lusofonia. Não chega homenagear publicamente só as pessoas da classe política e económica!

 

António da Cunha Duarte Justo

antoniocunhajusto@gmail.com

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A nova Ordem social e humana a implementar

O Mestre da Galileia inicia um novo Eixo da História

Deus não encarna numa Cultura mas no Homem

 

António Justo

“Mestre, vimos um homem a expulsar demónios em teu nome e procuramos impedir-lho porque ele não anda connosco…” – “Não o proibais… Quem não é contra nós é por nós…”. “Se alguém escandalizar algum destes pequeninos…melhor seria… o lançassem ao mar”. Se a tua mão…, se o teu pé…, se um dos teus olhos é para ti ocasião de escândalo, deita-o fora porque é melhor entrar no reino de Deus só com um dos olhos do que ter os dois olhos e ser lançado na Geena…” Mc 9,38-43.45.47-48 (1)

 

Dois pontos de referência: o Homem é mais que ele mesmo, é tornar-se.

O velho Adão (Homem) significa a separação de Deus; o novo Adão (Jesus Cristo) significa a união nEle. O mestre da Galileia explica a diferença aos seus discípulos.

 

Para se ter acesso intelectual a este texto é necessário ter-se em conta o contexto social em que foi proferido. O texto enquadra-se na disputa que havia entre os Judeus defensores da tradição antiga de Moisés e os Judeus seguidores da Boa Nova de Jesus (N T). As disputas eram por vezes violentas e escandalosas. Era o embate duma tradição autoritária institucionalista e legalista, fechada em si mesma (AT – aqui o Homem é apenas objecto, destinatário de salvação) com uma visão radicalmente nova, aberta a todo o ser humano, em que o Homem é agente (NT- aqui o Homem é sujeito activo, receptor e emissor de salvação – possui o gene divino) sendo, nesta, o Homem e Deus o centro de tudo, num processo de evolução humana até à estatura do protótipo Jesus Cristo (JC). (2) Deus não encarna num livro mas no Homem. (3).

 

Um outro elemento do contexto está na discussão, entre os discípulos, de quem entre eles seria o maior. Não tinham percebido a nova maneira de estar e ser na nova ordem humana e social JC. Nela a dignidade vem de baixo, surge do servir, do interior onde se encontra o germe divino a desenterrar numa atitude de louvor a Deus bem condensada no Magnificat.

 

A atmosfera de competição religiosa, inveja, intolerância e do escândalo provocado levam Jesus a ter de explicar, de forma clara, o que ali estava em jogo: duas mundivisões quase antagónicas na maneira de entender o mundo, Deus e o Homem (de notar que no AT havia a vocação messiânica que desagua no JC, o problema estava nas diferentes facções e vivências; ao falar aqui de AT refiro-me à lei petrificada e alienatória que obriga as pessoas a terem medo e a andarem de cabeça baixa). Também os seus discípulos se embrenhavam nos conflitos, por vezes, ainda com o espírito velho e isso provocava escândalo entre os fiéis mais frágeis, aos “pequeninos” na fé. De facto, os discípulos queriam reservar para si a patente JC e construir muros, tal como os “fariseus„ faziam. Ainda não tinham compreendido que a porta de acesso ao divino e ao humano é o Homem no JC e não uma mera doutrina/lei.

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Jesus emprega uma linguagem simbólica e usa nela as imagens de expressão da época.

Embora o radicalismo das imagens pareça ser uma hipérbole, as metáforas usadas querem incutir no discípulo a seriedade e a radicalidade da nova maneira de ser e definir a Realidade e o Homem (democracia humana radical – eclésia). Nas metáforas, aqui empregadas usa-se o órgão pela função que desempenha (método de comunicação muito usado na Bíblia). As mãos, os pés fazem aquilo que se vê e que é natural a partir duma visão antiga legalista, opressora da pessoa e da liberdade individual. Por isso é preciso cortar radicalmente com a visão/olho e os meios/pé e mão que levam à sua realização. Na lei há uma mão (agir velho), um pé (submissão: porque Jesus é contra o domínio lava os pés dos discípulos), um olho (visão/mentalidade velha), que não pode ser assumido na Boa Nova; chegou a hora de usar o olho divino.

Jesus não manda lançar fora os dois olhos, as duas mãos, os dois pés na Geena. Sabe que a realidade se expressa de maneira bipolar e por isso escolhe exemplos de órgãos duplos. Isto porque a pessoa consta de duas componentes, a materialista e a divina. Trata-se aqui de deitar fora a parte má de nós. Aquela que nos impede a salvação e o acesso ao bem. Na nova visão do mundo iniciada em e por J C há uma dimensão trinitária, não apenas a dualista. Todos são chamados a sacrificar algo. O sacrifício por maior que seja ainda é pequeno comparado com o mais importante que é o reino de Deus e a tragédia da catástrofe que seria tornar-se lixo.

 

Também não chegam as obras porque também estas podem acontecer numa relação de objecto-sujeito e não de sujeito-sujeito (A ortodoxia deve ceder a uma ortopraxia relacional pessoal). Esta implica uma relação sujeito-sujeito (à imagem da relação entre Jesus e o pai no JC). O Homem novo é fundamentalmente desobediente ao ambiente porque é filho de Deus e não da lei.

 

O Filho do Homem quer reiniciar a criação e estabelecer uma nova ordem e uma nova mentalidade em certo paradoxo com a tradição. O que estava em questão não era a passagem duma crença para outra nem duma ideologia para outra. O que estava em questão era a destruição dos muros elaborados para a subjugação do Homem e em benefício de alguns. Tudo o que prejudica o desenvolvimento do Homem deve ser sacrificado. As coisas não têm valor se não servem o Homem. A grande viragem axial da História iniciada pelo JC é o reconhecimento (consciência nova) que o novo Homem se encontra no centro do ser, na divindade. Agora não se trata de descobrir Deus fora porque ele se encontra dentro, como se verifica no JC. Tarefa do Homem é integrar em Deus a sua parte de fora. Por isso o Cristianismo é muito mais que uma religião, não podendo, por isso, ser reduzido a uma cristandade, nem deixar-se abusar tornando-se preparador de ovelhas submissas para uma sociedade política e económica que se expressa mais pela exploração do Homem do que pela sua libertação.

 

A mudança (metanoia) não pode acontecer sem o corte total com a maneira de pensar e agir normal (habitual). A dor que custa o cortar com o passado, com o homem velho, não é nada em comparação com a nova vida. O Homem novo passa a ser fonte de vida, deixando de beber a água menos límpida trazida por outras vias/mentalidade patriarcalista proveniente duma sociedade de tribos ou de ideologias arrogantes. A pessoa nova é filha de Deus e não apenas adepta ou súbdita! A filiação divina concede a todo o Homem, por natureza, a dignidade de participar na divindade e tornar-se também obreiro de salvação. As estruturas exteriores são condicionalismos necessários mas a purificar também. O Homem, para entrar nesta nova ordem do Homem e da criação (novo eixo da História, nova infra e supraestrutura), terá que mutilar muito do passado e iniciar uma mudança de atitude. O Homem novo já não se restringe à verdade empacotada na roupagem da lei ou da cultura porque a verdade acontece na pessoa livre e sem medo de Deus nem do diabo. O valor da lei e da cultura, se não é contra o Homem serve de referência, podendo tornar-se numa pedagogia/liturgia de iniciação. Todos nós precisamos duma referência e esta implica também o reconhecimento da eclésia (Deus, a Realidade não é só pessoa mas também comunidade!); se não fosse a Igreja com o seu pecado, por muito estranho que pareça, (até o espírito precisa dum corpo limitado!) a cristandade não teria passado dos primeiros séculos e da vivência de pequenos grupos. Através da culpa e nela conseguiu afirmar-se no mundo entre sociedades também elas a viver da culpa (“Oh felix culpa”- reconhecia Paulo!) Sem a culpa teríamos perdido a memória! Ela faz-nos conscientes e abre-nos a porta de entrada para o JC. O seguimento do JC exige a auto-renúncia (deixar o homem velho) para assumir a atitude do JC e assim se tornar no sal da terra. Por isso é preciso cortar o lixo em nós.

 

Geena era a lixeira de Jerusalém; o fogo dessa fogueira era alimentado pelos restos (lixo) não aproveitáveis, aí lançados pelos moradores da cidade.

 

Jesus, nestas conversas com os discípulos, procura iniciá-los na nova mística (no novo Adão) que está a irromper na nova concepção da realidade na natureza JC e na sua comunidade. Ele está muito preocupado com o escândalo que uns e outros dão aos “pequenos na fé” ao defenderem posições numa práxis ainda do velho Adão.

 

Jesus corta com um Deus senhorial, que legitimava, consequentemente, todos os senhorios sociais e humanos. O lugar de acontecimento divino não é já a sinagoga, a lei nem a moral de costumes. O lugar do acontecer divino passa a ser o Homem, a terra. Deus desce à terra (encarnação!) e não ao templo nem a uma cultura, como era dantes (deslegitimou toda a cultura ou ideologia que se arroga para si o monopólio da divindade; neste sentido, também atitudes senhoriais da igreja petrina, e especialmente o Islão são um regresso a um “antigo testamento” legalista). Esta é a grande revelação do cristianismo. Deus entra no mundo pelo Homem, pelo JC e o acesso ao divino e ao humano é agora o Homem, através do seu protótipo e da natureza JC. As instituições, as leis, os gurus e as autoridades perdem a sua relevância. O ser humano, na convergência do JC atinge agora a sua maioridade, deixa de ser criança e de ser escravo do exterior. Nos nossos genes trazemos a divindade e a materialidade, temos uma personalidade múltipla. Daí a necessidade duma aprendizagem pedagógica. Por vezes o espírito encontra-se enterrado mesmo no fundo de nós. Necessita da ajuda dos irmãos (eclésia) e do Espírito Santo para adquirir consciência e realizar a natureza JC. A dignidade não vem do cargo nem do serviço mas do servir com a consciência de ser verdadeiramente um membro da família de Deus a realizar o Seu reino. Não há mestres, todos estão vocacionados a ser caminho, verdade e vida em serviço e interacção com o JC. Mesmo aquele que se usa de Jesus para expulsar os diabos, se o faz no seu espírito isto é suficiente porque o novo reino, não se confina à pertença a este ou àquele grupo, é uma atitude de tudo em todos num esforço comum de assumir a natureza JC. Na resposta que deu aos discípulos, Jesus condena a sua mentalidade de arame farpado, apontando para a tolerância do bem noutros ambientes. Não é relevante o religioso ou o profano, qualitativo é o serviço do Homem, ao Homem à medida do JC. Há muitos cristãos anónimos que actuam no espírito de Cristo e muitos cristãos registados que não entenderam o espírito (natureza) de Cristo, isto é, a realidade que são nEle. Há que aceitar a diferença, todos nos encontramos a caminho… A nova ordem não se delimita pelo muro das definições ou pertenças mas pela consciência da filiação divina. A nova orientação não é o templo nem a lei mas o Homem e em todo ele se encontra enterrado um tesouro a descobrir.

 

A nova ética é estar em serviço, não servindo nem sendo servido. Agimos todos para o bem na tarefa de realizar o JC em nós e no mundo. O JC não pretende substituir um sistema antigo por outro sistema. Ele sabe que os sistemas se definem pelo poder que legitima a violência entre si e contra terceiros. Por isso o JC aposta apenas no Homem, na pessoa humana, que é vítima de si mesma, das estruturas, da lei e até da moral. (Esta é uma razão porque a Igreja apela à transformação do homem a nível individual não se pondo à frente de revoluções) Na nova ordem do mundo e do Homem não há uns a dar ordens e outros a cumprir, nele todos são filhos divinos em atitude de servir uns aos outros no espírito de uns nos outros. O ajudar o outro é ajuda a mim na construção do nós. Se todos os filhos do rei são príncipes, todo o ser humano é príncipe na realeza divina. Por isso não pode haver escravos nem senhores, apenas filhos. Não se trata de se procurar a salvação mas de salvar-se salvando em comunhão com o JC no amor do Paráclito.

 

Com o JC o Homem alcançou a sua maioridade e plenitude (transformação do velho Adão no novo Adão), tendo de se regenerar a partir de dentro, numa caminhada do Jesus para o Cristo. No cadinho da nossa vida teremos de expulsar o lixo, aquilo que nos impede de resplandecermos a divindade.

 

Quem entra na relação com JC encontra-se na fonte da vida que é o Paráclito, passando este a agir nele. JC quebrou os muros do eu para mergulhar no nós, na divindade, onde cada pessoa assume a consciência de todas as pessoas numa imanência transcendente (corpo místico e realidade trinitária).

 

António da Cunha Duarte Justo

Teólogo e Pedagogo

 

(1)                 Para Marcos o acesso a Jesus Cristo só é possível mediante uma mudança radical de atitude e mentalidade, uma visão espiritual (ver com o olho de Deus) porque, num mundo que vive sobretudo de exterioridades e da afirmação pelo contrário, a identidade do Messias encontra-se oculta, precisando duma pedagogia especial, duma iniciação (catarses do intelecto e da prática) para se poder chegar a ela (evolução do Adão velho para o novo Adão). O JC encontra-se na intimidade do céu com a terra, por isso é preciso subir ao céu para poder compreender a terra. Os discípulos, ainda mal iniciados, discutiam acerca do céu e da terra mas principalmente a nível de intelecto e da velha mentalidade (olho do domínio) sem a “vivência” da fé que parte da intimidade/unidade (reino de Deus) e não da divisão.

(2)                 Resumindo: A mentalidade semita de estrutura autoritária tribal representada num Deus distante e legalista (Moisés, AT) com a subjacente concepção de Homem escravo, objecto de salvação, é contrariada pela nova atitude judaica expressa no JC que reconhece em Deus o pai e em cada Homem um filho de Deus e como tal sujeito de salvação; esta mundivisão desautoriza as instituições e as leis que se afirmem no sustentáculo da velha mentalidade. Esta nova consciência de ser e estar no mundo é de tal modo revolucionária que levou os historiadores a considerar o JC como eixo da História. De notar que apesar de 2000 anos passados ainda prevalece nas pessoas e nas instituições a velha mentalidade. A “democracia de filhos de Deus” em que cada Homem é realmente “príncipe herdeiro”, continua, duma maneira geral a ser uma utopia cristã.

(3)                 Deus não encarna num livro, numa língua, numa cultura mas no Homem. O centro do acontecimento não está na Bíblia, no Corão, no Templo, na nação, no costume, no chefe mas no Homem, filho de Deus. A lei, a tribo, a nação, a cultura não podem subordinar o Homem individual. Cada ser humano, como filho de Deus faz parte duma realidade maior! A sua dignidade é intocável (Daqui os direitos do Homem). A incarnação/inlibração de Deus no Corão constitui um retrocesso histórico; por isso continuam a subjugar o Homem à sua cultura. Com JC a referência de pensamento religioso passa a ser uma pessoa e não um abstrato, um constructo. O organigrama de pensamento e social tem de ser elaborado ao contrário, pondo a pirâmide ao contrário. Pensar o eu a partir do nós, do nós divino.

 

EGIPTO QUO VADIS?

“O Islão não oferece soluções”

 António Justo

“Segundo estimativas de especialistas, os militares egípcios, com pessoal em uniforme e civil, são hoje os maiores dadores de emprego no país”, como descreve a notável revista alemã “Cicero”, August 2012, num artigo sobre o Egipto. O negócio dos generais cifra-se entre 10 e 40% da economia egípcia, refere ainda a revista.

Agora, com o islamista Mohammed Mursi na presidência, os militares perderam influência no aparelho do Estado. Apesar disto, Mursi (que vem do seio da radical Irmandade Muçulmana), terá de se moderar nas suas pretensões de maior islamização do país, se pretende conseguir impulsionar a economia que só será viável num clima de estabilidade política e social. Também não poderá renunciar às receitas do turismo, outro factor modernizador a domar o zelo e a fúria inicial de forças islamistas que pretendiam irradiar da cultura egípcia o que não fosse islâmico.

Também a rivalidade vigente, entre o Tribunal Constitucional, Militares e Presidente, pode revelar-se como factor moderador das intenções do Presidente e impedir confrontações. Entretanto os islamistas, com a sua maioria parlamentar, demonstraram que não tinham soluções para os problemas do país: alimentação, escola e hospital. Até setembro terá de ser elaborada uma nova constituição a ser aprovada por plebiscito.

“O Islão não oferece soluções” disse Amr Mohammed Musa, Ministro dos Negócios Estrangeiros do Egipto em entrevista a “Cícero”. Amr Musa  foi escolhido para ministro das Relações Exteriores, a desejo dos militares, para indicar uma certa continuidade pró-ocidental e que a política anti-israelita não será o caminho da política externa.

O ministro dos meios de comunicação social (estatais) é Salahedin al Maksud, também ele, membro eminente da Irmandade Muçulmana. O programa de promoção do islamismo encontra-se assim em boas mãos. Uma inovação da TV estatal egípcia revelou-se no facto de o noticiário passar a ser apresentado, depois de 50 anos, por uma jornalista com véu islâmico na cabeça. Esta inovação foi exibida como sendo uma “vitória da Revolução de 25 de Janeiro”. A agenda da “Irmandade Muçulmana” é longa; agora que se encontra no poder, exercê-lo-á com decretos, não precisando, para já, de recorrer à violência física. Entretanto a censura acentua-se e a insegurança nas comunidades não muçulmanas também. O objectivo declarado da Irmandade Muçulmana fundada em 1928 é estabelecer uma ordem social subjugada à moral do Corão e à jurisprudência da Sharia islâmica.

Informação estrutural enganosa ou factual descontextuada

Nos sistemas muçulmanos, a formação de uma oligarquia militar corresponde, por vezes, por muito contraditório que pareça, a um elemento diferenciador duma sociedade de cunho religioso monolítico e hegemónico onde perspectivas seculares civis se tornam difíceis. Os militares, tal como na Turquia, formam como que uma pequena nobreza, que se tem revelado como elemento correctivo do islamismo absorvente e omnipresente. Ao contrário da democracia ocidental que favorece a alternância dos partidos mais fortes no governo, o sistema hegemónico muçulmano favorece o fenómeno dual: dum lado os militares e do outro, os imames (cabeças das mesquitas: o seu poder de mobilização política pode verificar-se nas demonstrações organizadas e realizadas às sextas-feiras logo a seguir às orações nas mesquitas) e a revolta terrorista. Por muito estranho que pareça os militares têm-se revelado como parceiros mais sérios em relação ao estrangeiro atendendo aos interesses comuns. De lembrar, neste contexto o ataque sistemático dos grupos islâmicos radicais contra a formação de exércitos e a organização policial estatal, no Afeganistão, Iraque, etc.

Se aos países ocidentais, o que mais os une é o sistema liberal capitalista (competição em torno do trabalho/consumo), aos países muçulmanos/árabes une-os a religião muçulmana que é ao mesmo tempo programa de vida e ideal político…

Nas sociedades muçulmanas não se tem revelado possível o desenvolvimento duma cultura cívica/secular (possibilitadora duma democracia aberta) por razões teológicas, antropológicas e sociológicas. Enquanto o ocidente se orienta pela fórmula cristã “dai a Deus o que é de Deus e a César o que é de César” (princípio de distinção entre realidade secular e realidade religiosa: Homem por um lado como ser divino e por outro como ser secular), as sociedades de cunho árabe não conhecem esta dualidade deixando tudo para Deus, sem nada para o Homem numa atitude de súbdito e, consequentemente, de ser definido e controlado apenas pela religião. A mitologia ocidental ao conceber o Homem como filho de Deus reconhece no Homem os genes divinos e consequentemente o direito do Homem à individuação e à personalização. No Islão não há o conceito de Homem como filho de Deus nem tão-pouco o Homem pode ter comunhão com Alá tanto no aquém como no além. Isto ocasiona diferentes antropologias e diferentes sociologias, com as consequentes maneiras de estar no mundo e de se compreender o Homem e a política. Se nos países de influência cristã o Homem é concebido como ser autónomo, anterior ao religioso, nos países de influência islâmica o Homem é concebido como súbdito, só tendo sentido dentro do religioso, da Uma (a grande comunidade islâmica). Aqui, o ser humano individual não tem consistência pessoal, só grupal. Daí o facto de, quando se fala em democracia, assim como quando se fala em direitos humanos, os ocidentais e os árabes compreenderem coisas totalmente diferentes.

Geralmente, os jornalistas e os políticos ocidentais, quando avaliam os acontecimentos nos estados árabes e quando falam de integração de estrangeiros equivocam-se porque julgam que as palavras e as manifestações públicas duma cultura são equivalentes às da outra, quando, muitas vezes expressam precisamente o contrário do que se diz delas. Enquanto o Ocidente aposta sobretudo na força militar e na expansão económica os países de influência árabe apostam tudo na religião e na expansão da procriação.

O entusiasmo e optimismo dos meios de comunicação ocidental nas notícias sobre o Norte de África e outros conflitos internacionais leva o público a avaliações não aferidas à realidade meramente factual.

A informação publicada, além de ser equacionada em perspectivas políticas condicionadas pela própria localização política, sofre do equívoco de falar de realidades que, muitas vezes, não passam de projecções da própria mundivisão sobre a dos outros. Temos assim uma informação estrutural do satus quo enganosa ou factual descontextuada.

Por vezes tem-se a impressão de se viver no século V do império romano, assolado, ao mesmo tempo, interna e externamente. Os tempos que se aproximam para o norte de África e para a Europa pressagiam muita instabilidade! Todos terão de mudar muito a nível de mentalidades e de estratégias de poder!

António da Cunha Duarte Justo

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DOCUMENTA documenta dOCUMENTA (13)

Maior Exposição mundial de Arte Contemporânea

 

António Justo

Na provisoriedade de cada orientação, a dOCUMENTA (13) quer ser uma orientação desorientada. Serve a investigação artística aplicando-se às formas da natureza, do intelecto e da vida pretendendo informar sem formar. Também se quer sentir humana desde que  na pele do símio. Pretende estabelecer uma aliança entre os diferentes domínios que vão do sensual ao especulativo, da prática à teoria, do político à ecologia. Esta dOCUMENTA quer conhecer sem reconhecer, desejando assim ser integral sem se tornar integradora nem parte integrante. Contenta-se com a vaidade e o histerismo do momento.

 

Kassel, uma cidade de província da Alemanha, com 200.000 habitantes, consegue ser, de quatro em quatro anos, o centro de peregrinagem, por cem dias (desta vez, de 9.06 a 16.09.2012), dum público que ronda o milhão de visitantes; este confere, durante esse tempo, um ar exótico à cidade. Kassel quer-se metrópole ao tornar-se o templo, o lugar de estadia que procura conectar todos os espaços e expressões: do físico ao psicológico, ao cultural, ao histórico, ao tecnológico, do real ao fantástico.

 

Pretende ser o vínculo dos lugares e dos feitores da arte contemporânea a nível mundial. Numa palavra, para quem vive nesta linda cidade: pretende ser o umbigo do organismo artístico global. Um umbigo já elevado, atendendo ao estado avançado de gravidez, próprio de artistas e especialmente devido à posição da chefe absoluta da Documenta, Carolyn Christov-Bakargiew, que se encontra em contínuo de estado de graça e em “estado de esperança”. Nos seus enjoos de estado não admite parteiras na grande sala de parto. Segundo ela, os artistas não devem estar presentes na discussão pública para que os seus objectos de arte não sejam perturbados por outros objectos de atenção, salvo o seu papel de matrona.

 

De facto, a arte, como acto criativo, é um contínuo estado de parto, muitas vezes sem a responsabilidade de ter de se preocupar com o objecto parido nem com o seu sentido. É-lhe suficiente o momento da mudança e de conexão sem se fixar no lugar porque este poder-se-ia tornar em limitação física duma realidade que ultrapassa a possibilidade dos sentidos. Aqui arte e religião tocam-se mostrando-se aquela intolerante perante esta. (Recordar o conflito da escultura da torre, do artista Stephan Balkenhof, que na torre duma igreja estragava o conceito da Documenta 13.)

 

Daqui a necessidade duma orientação desorientada que, por mal dos seus pecados, tem de se socorrer de objectos de arte bem físicos mas aproveitados e alargados pelo intelecto. O intelecto torna-se aqui uma necessidade para que o lugar criativo tenha um tecto num lugar que se pretende considerar como o espaço universal onde toda a espécie de parto é possível.

 

Um problema da dOCUMENTA será não poder transpor o espaço e o tempo. O ser só se apreende situado, significando, por isso mesmo, no seu ser-aqui, limitação. O problema do acto criativo não está no acto criador em si mas no seu tempo e na sua roupagem… Temos de nos contentar com a roupagem e falar de roupas ganhando assim, nesse proceder, a impressão, de transcender o próprio vestido. Também por isso, o artista é um eterno insatisfeito, tendo de se reduzir a produzir o episódico, a gerar apenas História, podendo apenas imergir na sua roupagem, muito embora na procura do seu espírito.

 

A Direcção da dOCUMENTA, para criar mais fascínio, pelos objectos de arte expostos no exterior, associa-lhes histórias dirigidas à imaginação intelectual, dado o objecto nu, sem a roupagem intelectual, deixar falar apenas a própria nudez num mundo que se quer tudo mais. menos inocente. Aqui tudo se torna objecto, objecto para cobrir e encobrir. O observador, esse, é objecto de arte e o artista o seu complemento.

 

A História também se escreve com a arte e especialmente com o amor aos factos e aos objectos.

 

Na dOCUMENTA encontra-se muita arte, muitos artistas e também pensadores.

 

António da Cunha Duarte Justo

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Circuncisão no Islão e no Judaísmo: Acção Criminosa

Tribunal alemão toma uma Decisão corajosa

 

António Justo

A circuncisão de meninos no Islão e no Judaísmo, segundo a sentença do Tribunal Distrital de Colónia, constitui uma agressão criminosa.

 

Mais importante que a liberdade de religião é a integridade corporal e a autodeterminação da criança, argumenta o tribunal, na sua decisão de ontem, 26.06.2012.

 

O direito de autodeterminação das comunidades religiosas não se pode sobrepor ao direito humano da integridade corporal.

 

Este julgamento terá consequências muito importantes.

 

Esta decisão deveria ser um acto de encorajamento para políticos e outros tribunais no sentido de intervirem mais corajosamente em crimes de base cultural como casamentos forçados e crimes de honra, ainda muito em voga em determinadas culturas.

 

Até agora, o corte do clitóris das meninas (praticado em grande parte do mundo muçulmano) era considerado acto criminoso no Ocidente, mas o sofrimento do acto agressivo da circuncisão de meninos ainda não tinha chegado à consciência das pessoas.

 

A decisão do Tribunal é uma vitória contra a barbaridade e leva uma consciência mais sensível a actos culturais que não respeitam a dignidade e a integridade da pessoa e constitui um apelo ao respeito pelo direito dos que não têm voz.

A matança ritual de animais, como no caso muçulmano e judio, em que os animais são mortos duma maneira brutal porque morrem sangrando, não foi proibida na Alemanha por “respeito à religião”. Também aqui será necessária uma consciência mais afinada.

 

António da Cunha Duarte Justo

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