Morreu o Rei da Arábia Saudita um grande Promotor do Terrorismo

O Comprometimento do Ocidente com o terrorismo internacional

António Justo
Ontem, 23.01, morreu Abdullah, o rei da Arábia Saudita. Para se perceber a paciência do Ocidente com o maior fomentador do terrorismo islâmico sunita, interessa ter-se presente os interesses económicos e as inter-relações de importações e exportações entre o Ocidente e os países produtores de petróleo.

 A Arábia Saudita financia o terrorismo internacional e a construção de mesquitas fora dos países islâmicos.

Na Arábia Saudita as mulheres têm poucos direitos. Só podem sair de casa na companhia de um homem, não podem conduzir carro e só podem estudar e casar com consentimento prévio; não possuem quase nenhum direito de decisão. Desde 2001 já podem requerer um bilhete de identidade.

Pratica-se a tortura, o espancamento, o açoitamento, a privação do sono, a torção dos membros, choques eletrostáticos, assim como a ameaça de mordidelas de animais; há execuções públicas como castigo normal para crimes como: assassinato, adultério, sabotagem e apostasia.

Apesar de tantos crimes contra a humanidade e contra os direitos humanos o Ocidente é o grande aliado da Arábia Saudita.

Como exemplo refiro informações da HNA segundo as quais a Alemanha em 2013 fez exportações para a Arábia Saudita no valor de 1,7 mil milhões de euros (máquinas, produtos químicos, veículos e peças de veículos. A exportação de armas foi de 316 milhões de euros. Em 2013 as exportações da Arábia Saudita para a Alemanha atingiram os 9,2 mil milhões de euros. Além disso a Alemanha, em 2011, fez investimentos directos na Arábia Saudita no valor de 713 milhões de euros e em contrapartida a Arábia Saudita investiu na Alemanha, no mesmo ano, 25 milhões de euros. A Arábia Saudita fomenta o wahhabismo (interpretação fundamentalista do islão) que produziu al Qaida e a ideologia do “Estado Islâmico”.

O dinheiro compra tudo; até a consciência democrática defensora dos direitos humanos não escapa.
António da Cunha Duarte Justo
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Primeiro a Dignidade humana depois a Instituição

Terror das Ideologias camufladas sob o Pretexto da Religião e da Liberdade quando a Estratégia é dominar o outro

António Justo
Com o atentado de Paris, o Islão não foi insultado, quem foi insultada foi a humanidade, a dignidade e a liberdade humana. A instituição não sofre, quem sofre são as pessoas, sejam elas islâmicas ou não. Neste atentado há vítimas humanas e elas é que se devem recordar e defender. Ao defendermos o Islão ou Charlie estamos a esquecer as vítimas de um lado ou do outro. A vida e a dignidade humana é que devem estar no centro da discussão e acima de cada instituição seja ela religiosa ou secular.

Se libertarmos o homem libertamos a religião, se defendermos a dignidade individual está defendida, deste modo, a liberdade em geral e também a religiosa. Ao defender-se a dignidade humana como bem superior a tradições e instituições, contribuiremos para um diálogo construtor de paz, solidariedade e libertação humana e com esta para a disciplinação das instituições.

Somos uma sociedade com pessoas e grupos que andam a diferentes velocidades e cada um construindo a sua felicidade na demarcação de tempos e regiões como forma de sentir o próprio existir; é isto que provoca detritos e desgastes… O problema vem da afirmação de um em relação ao outro, de se procurar construir uma identidade baseada na diferenciação cultural e ideológica perante um outro que se exclui.

Foi atacado um grande símbolo da liberdade duma França não só laica mas também jacobina. Foi também atacada a liberdade universal, um direito humano fundamental muito embora fosse, também ela, símbolo de um tempo ideológico parado que legitima a própria posição no poder atacar a outra. Na discussão é manifestamente calada a luta provocante de um radicalismo esquerdista contra a religião. Se antes o Estado (para desenvolver a própria identidade se serviu da religião, hoje o estado laico procura afirmar a sua servindo-se da ideologia materialista ateia) antes era aliado da Igreja hoje tornou-se em seu contraente aliando-se à ideologia esquerdista secular ateia. A guerra destes contra tradições religiosas observa-se não só depois da república mas ganhou força com a centralização do poder em Bruxelas (UE). A europa precisa naturalmente do vitalismo religioso e secular mas não na contraposição de uns contra os outros. A “César o que é de César e a Deus o que é de Deus”, não sendo legítimo que a ideologia secular açambarque para si também o lugar de Deus.

No atentado de Paris, temos dois agressores ociosos cada um defendendo o seu tempo e a sua geografia, não notando que o espírito motivador é o mesmo e o dilema está nas diferentes velocidades do mesmo veículo. Uns foram vítimas do fanatismo religioso, por vezes, encoberto por representantes e defensores da instituição religião e outros foram mortos em nome de uma liberdade defensora do regime secular que, com as suas caricaturas, não para de provocar os muçulmanos como se viu também no Iraque, Afeganistão e norte de África. A violência grassa em diferentes nomes e com diferentes graus de gravidade encobrindo a violência escondida entre exploradores e explorados.

Este atentado irá fanatizar, amedrontar e legitimar medidas mais controladoras da autoridade estatal em relação aos cidadãos; irá prolongar o abuso e exagero do mundo secularista contra os heterodoxos do seu sistema; isto pretendem os extremistas por trás de Charlie, de al Qaida e as elites de uma preponderância americana, todos interessados em dividir para mandar. A estratégia é a mesma: numa massa anónima à disposição com uns que combatem em nome de Deus e outros que lutam em nome da liberdade ou de interesses económicos.

As leis do Ocidente cada vez se tornam mais apertadas e, assim, a nossa sociedade se torna cada vez mais igual à deles enquanto protela a consciência de uma subtil exploração em via. Enquanto nos distraímos com palavras e não agimos com boas obras vale tudo usando, uns e outros, como seu melhor meio de autoafirmação, o ataque.

No meio de tudo isto, o cristão sente-se chamado à liberdade e à paz, mesmo contra o próprio ponto de vista, mas por outro lado sofre ao constatar que quem ganha é o violento, porque as massas são conduzidas por estes.

Portugal terá de estar atento para se não tornar em lugar de trânsito para extremistas. Importante será observar os movimentos salafistas e grupos apoiados pela Arábia Saudita (construção de mesquitas) defensora da corrente fundamentalista wahabita. Atrás do estabelecimento de relações económicas junta-se o contrabando de ideologias. Uma premissa nos deve levar à contenção na discussão: Portugal, com 0,4% de muçulmanos, não tem razão para alarmismos e entretanto o islão renovar-se-á.
António da Cunha Duarte Justo
Jornalista
www.antonio-justo.eu

(1) Como tudo elabora a sua razão em nome do bem contra o mal, o passo consequente e imediato é a luta, a luta dos melhores contra os piores; como cada qual só conhece o miradouro da sua verdade, não há verdade mista, os maus são os outros. Tudo luta pela sua verdade e pela sua paz e por isso divide a realidade em duas partes: a verdadeira e a falsa, a boa e a má, a nossa e a dos outros; este facto faz de todos delinquentes, uns em relação aos outros. A guerra passa a ter razão porque esta nasce na cabeça; como cada um quer o melhor, torna-se lógica a luta pela vitória do “bem”.

Terror em nome do Islão, quem prova que não?

Do Diálogo cínico entre Representantes islâmicos e democratas

António Justo
Tornou-se num lugar-comum, representantes de instituições islâmicas, em situações semelhantes às dos atentados de Paris, se desculparem dizendo, tratar-se de um atentado contra o islão, ou ainda, que “eles não são muçulmanos!”. Seria incorrecto a Instituição islâmica julgar-se vítima, quando em seu nome e também através de estados islâmicos se espalha o terror por todo o mundo.

(Não falo aqui da responsabilidade do Ocidente, atendendo ao espaço e já ter tratado o tema noutros artigos).

É verdade que não se pode taxar um grupo inteiro de culpado do que acontece em seu nome. Uma “desculpa de mau pagador” para sacudir a água do próprio capote, perante desinformados. Seria negador da realidade e testemunho de hipocrisia negar que a “guerra santa” (Jihad) e os atentados têm a ver com o Islão.

Torna-se urgente um diálogo sério que ajude muçulmanos e não muçulmanos. Os muçulmanos moderados, para se tornarem verdadeiramente credíveis, têm que demonstrar que os extremistas invocam, injustamente, as suras do Corão para justificarem a sua luta. O Encargo de prova recai sobre as associações muçulmanas. Os eruditos e responsáveis do islão teriam de dizer publicamente que o Corão não é para ser seguido à letra e as suras não são válidas universalmente. Aqui se encontra o busílis da questão porque nenhum mestre ou mufti se atreve a afirmar tal, dado entenderem as suras do Corão como directamente ditadas por Deus (no Corão nota-se que Alá mudou de opinião aquando da mudança de Maomé de Meca para Medina – isto poderia servir de motivo para os peritos muçulmanos permitirem a análise histórico-crítica praticada nas ciências teológicas).

Por isso se tornam difíceis declarações públicas por parte de muçulmanos e se dificulta um diálogo onde os intervenientes, se comportam como o gato, a fazer batota em torno do leite quente! A gentileza junta-se à falta de honestidade intelectual ao distrair os públicos com aspectos mais ou menos moralistas ou de conveniências e vivências sociais, em vez de ir ao problema de fundo que se encontra nos princípios doutrinários imanentes ao sistema e aqui só em segunda mão na situação social injusta em que, por vezes, vivem. (1)

Os teóricos islâmicos têm de demonstrar, nos países para onde imigraram, como é que o Islão é compatível com as formas de democracia com separação de estado e religião, e com os direitos humanos. Este seria o primeiro passo ao serviço da integração e de um diálogo sério entre islão e democracia. Um tal diálogo ajudá-los-ia a dar o passo para a reforma do islão (E porque não até, desenvolvendo uma outra forma de democracia?). Seria um atestado de pobreza se o viessem a fazer apenas a partir das universidades europeias, obrigadas a fundar faculdades islâmicas para formarem os professores de religião islâmica nas suas escolas.

No Corão há muitos versos onde se apela à violência contra “Kuffar” (não muçulmanos = indignos de vida, também apelidados de porcos e macacos, cf. sura 8,22 e sura 5,59-60). “A paz islâmica só se alcança, quando todos os cristãos, Judeus e pagãos forem extirpados” (Corão, sura 9,33…). Na Alemanha tem sido proibida a publicação do livro “Minha Luta” de Hitler, o Corão, em contrapartida tem sido distribuído aos milhares pelas cidades alemãs. Nem se exigem notas explicativas para versos apeladores à violência, como se queria exigir em relação a “Minha Luta” caso fosse publicada.

Não sou defensor da proibição de livro nenhum, só me horroriza o cinismo de uma sociedade que actua com dois pesos e duas medidas e como é fácil levar o povo, ontem como hoje. Hitler que defendia a superioridade da raça germana e o extermínio dos judeus é proibido, o Corão que considera a religião muçulmana como única e apela ao extermínio dos diferentes, não é questionado. Não é de negar que em “Minha Luta” e no Corão se encontram também muitas frases humanas e muitas contradições que ajudam quem luta. Da neblina e da confusão só podem viver melhor os mais espertos. (2)

Segundo historiadores, as religiões, geralmente, não estão na origem das guerras. A origem encontra-se em desigualdades econômicas na sociedade. As religiões actuam como aceleradoras porque implicam maior comprometimento ao dar mais importância à acção.
Continua em “Primeiro a dignidade humana depois a instituição”
António da Cunha Duarte Justo
Jornalista
www.antonio-justo.eu

(1) Aquando da minha actividade na qualidade de representante dos estrangeiros da cidade de minha residência lutava pelos direitos dos turcos e dos estrangeiros, pude observar, num espaço de 15 anos, uma grande mudança de atitude na sociedade muçulmana, antes muito pacífica e as mulheres com menos lenços na cabeça, embora vivendo em gueto. Com o tempo tornou-se mais agressiva, à medida que via surgir dela gente formada na universidade. A partir de então organizavam-se sobretudo na defesa dos próprios interesses, entendendo solidariedade no sentido muçulmano. Um facto é que de mais de cem nacionalidades (e muitas religiões) a viver na cidade quem não aceitava integrar-se eram, de uma maneira geral, os muçulmanos. Alguém dirá mas também a raça cigana não se integra; facto é que não se afirma na definição contra a sociedade que os acolhe e permanece uma minoria em qualquer vila ou cidade. Naturalmente a sociedade aberta deve também ela aguentar uma certa tensão. O problema surge quando falta a solidariedade social e se legitima a luta como maneira de se fazer valer e uma sociedade maioritária discrimina. Se não houver um esclarecimento e empenho no sentido da integração então as nações tornar-se-ão mais cépticas quanto à recepção de muçulmanos. Aqui não está em discussão a questão da sociedade ocidental mas apenas a relação entre dois modelos de sociedade vigentes. A sociedade consta de todos e precisa de todos mas todos solidários e em colaboração de modo a cada um realizar a sua felicidade à sua maneira.
(2) Digo isto porque sou amigo dos muçulmanos e crítico do Corão e dos Hadhit (Hadiz) e gostaria de um diálogo em que a pessoa humana seja respeitada e defendida, pense ela o que pensar, mas que se olhe com espírito crítico para as instituições que alinham as pessoas em torno de si para fins fomentadoras de domínio e imperialismos à custa da humanidade. O Islão só ganhará com uma reforma profunda.

FALÊNCIA DO MODELO RELIGIOSO E DO MODELO SECULAR?

Republicanismo e Terrorismo em Luta contra a própria Descrença
Atentado de Paris – Cultura árabe e sua Ficção em Efervescência

António Justo
O mal é como o cuco; procura ninhos alheios onde coloca os ovos que outros chocam.

Não nos encontramos num conflito religioso como a república, o cinismo ou a ingenuidade da ‘correcção política’ nos quer fazer entender; trata-se, por um lado, de um confronto de culturas em que uma cultura árabe, através da religião, quer afirmar a sua supremacia geoestratégica contra outras supremacias e mundivisões; trata-se da falência de uma política ocidental de estratégica errada que tem desestabilizado o mundo árabe e as sociedades ocidentais e trata-se por outro lado dos paradigmas da ciência (razão) e da religião (sentimento) falidos que se confrontam num estado secular vazio e desautorizado.

Estados malcomportados recusam-se a encarar as consequências das suas ideologias, políticas económicas e realidades sociais por elas criadas, pensando que os problemas com que se debatem se podem iludir e adiar, bastando para isso qualificar o efervescer da sociedade como conflito religioso ou como uma questão de estrangeiros, extremistas e racistas descontentes. Isto não passa de uma impostura fraudulenta, de que a república secular se serve, para jacobinamente desacreditar a religião dos seus cidadãos para melhor poder continuar a desobrigar-se num modo de vida ad hoc.

O cerrar fileiras da classe política europeia e o sucesso da “marcha republicana” de Paris, não nos pode iludir do facto que os modelos da religião, da ciência e da política falharam, encontrando-se a sociedade no início de um caos de guerrilha e de asilo interior. Profanaram o templo do povo e agora andam à procura dos cacos!

O Ocidente perdeu o sentido, não me refiro ao religioso; perdeu o seu tecto metafísico, abusou de si e dos outros; agora colhe os frutos do que plantou.

A alienação ideológica, religiosa, secular, científica e política, em que se tem vivido, demole todos os padrões acabando na autodestruição. Na falta de sentido e visão global da vida, resta a guerrilha da opinião em nome de não importa o quê. Uns combatem em nome da república contra Deus, outros em nome de Deus contra a república, cada qual atrás da sua bandeira, sem contar com o próximo. Chega a ter-se a impressão que um estado ou uma religião que prescindisse de combater perderia os seus heróis e os seus santos/mártires.

Numa sociedade moderna estressada, tudo passa a ser soldado num campo de batalha em que todos se provocam; os caricaturistas lutam pela liberdade, os islamistas combatem pelo seu Maomé e os tolerantes lutam contra a intolerância dos intolerantes. Na nossa luta pelas verdades republicanas tudo se julga bom sem notar que justifica a luta pela luta e procura o sentido nela.

Se se observam as coisas mais de perto, pode chegar-se à conclusão que o combate é o mesmo e tem a mesma fonte: islamistas e caricaturistas combatem a própria incredulidade. Os radicais da república, da liberdade ou da religião têm problemas de balance, faltando, na sua personalidade, o equilíbrio entre sentimento e razão, passando assim a um estado de recalcamento, nuns da religiosidade (afecto), noutros da racionalidade. E como racionalidade e afectividade não se juntam o homem combate-se a si mesmo.

Na Europa o povo sente-se inseguro; não se sente levada a sério pela classe política e tem medo de falar espontaneamente porque o seu falar pode não corresponder ao pensar politicamente correcto que determina o que é opinião boa ou opinião má e isto tem consequências drásticas imediatas no seu ambiente de convívio, porque, de repente, pode ser deitado ao ostracismo, pelo simples facto de pensar diferente da manada ou dos seus diferentes pastoreios. O pensar politicamente correcto, tem medo do pensamento diferenciado e, para manter a sua hegemonia, logo coloca uma opinião não conforme, na esquina ou cena dos extremistas de direita ou de esquerda. Isto acontece na escola, entre colegas docentes, entre amigos ou conhecidos e em meios sociais como Facebook, etc. Deste modo se evita uma maneira de estar racional e humana porque evita o pensamento logo à partida e impede a prática da tolerância.

Por todo o mundo há incêndios e incendiários mas a sociedade encontra-se à chuva e o busílis é que ninguém sabe onde abrigar-se. O que a sociedade civil critica na sociedade árabe, como a prática do gueto, pratica-o ela mesma, na medida em que cria os seus guetos de opiniões e mentalidades cerradas (partidárias, religiosas, ideológicas) numa sociedade declarada aberta mas com carris ideológicos que determinam o desencontro das pessoas.

Por vezes tem-se a impressão que, na opinião pública, estados laicos se servem do islão e da religião para segundas intenções. Onde se procuram culpados não se procura solução; ao poder interessa manter as massas distraídas e em filas para que uns se contentem com o ter razão e outros com ter o poder.

A classe política, em muitos sectores, brinca com o fogo, contentando-se com o rumor do ventre da sociedade que se expressa em posições antagónicas de grupos, por vezes direccionados, que se desqualificam uns aos outros e deste modo ilibam os governos de responsabilidades. Além de não saberem lidar com sentimentos só sabem enquadrar a realidade em termos alternativos de sim-não e de ou-ou.

Continua em “O pensamento está de férias em tempos emocionais”
António da Cunha Duarte Justo
Jornalista
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Acto terrorista de Paris contra Provocação satírica da Revista Charlie Hebdo

Dois pesos e duas medidas

António Justo
É uníssona a voz dos políticos ao denunciar o massacre de Paris como um ataque à democracia e à liberdade de imprensa.

Os três assassinos, agora mortos, estavam em ligação directa com al Qaida e com o “Estado islâmico”. Um interessante pormenor é o facto dos serviços secretos americanos estarem mais informados sobre os três jihadistas do que os serviços secretos europeus.

Várias instâncias dos Estados europeus encontram-se imensamente preocupadas pelo facto da guerrilha islâmica ameaçar estender-se à Europa, especialmente através dos retornados jihadistas da Síria e do Iraque, bem preparados em estratégias de ataques terroristas.

O 7 de Janeiro foi um dia negro contra os jornalistas, o dia 9 foi um dia de alívio em que a polícia conseguiu matar os 3 terroristas que, em nome de um deus, executaram, pelo menos, 16 pessoas.

O chefe redactor da revista satírica Charlie Hebdo dizia “prefiro morrer de pé do que viver ajoelhado”. Certamente uma crença que testemunha independência e nobreza de caracter mas, por outro lado, desconhece a realidade de que tudo se encontra entrelaçado. Quando os extremos se repelem precisa-se de critério e capacidade para encontrar o meio-termo.

Vivemos numa sociedade aberta e a sátira vive da provocação. Certamente é legítimo criticar as instituições e seus representantes nos seus desvios nas suas palavras e acções mas não é legítimo ferir os sentimentos dos fiéis quando se pretende apenas ridicularizar os fundamentos da sua fé, como fez a revista ao chacotear o mistério da trindade dos cristãos, desenhando provocadoramente pai-filho-espírito santo em comum acto sexual.

Este já não é um acto de liberdade mas de libertinagem. A revista Charlie Hebdo provocava os sentimentos religiosos e mais que temas muçulmanos caricaturava temas Cristãos. Os cristãos já tinham metido a revista, 14 vezes, em tribunal, por causa de abuso e ridicularização, mas perderam todos os processos. Isto porém não legitima de longe o acto bárbaro praticado pelos extremistas islâmicos. É difícil uma justificação do uso das armas em certos conflitos bélicos mas nunca se justifica o uso de armas (violência física) contra caricaturas ou palavras.

O que para uns é expressão de liberdade para outros é libertinagem e como também aqui não há um meio-termo não será fácil apaziguar os opostos.

Isto torna-se compreensível num tipo de sociedade interessada em dividir para dominar, quando seria mais natural uma filosofia social que fomentasse o agir dos cidadãos num espírito inclusivo convergente e de complementaridade; naturalmente com um espírito crítico, mas consciente de que cada qual é parte integral e necessária do mesmo todo. Extremismos revelam sempre falta de critério, de respeito e de empatia. A violência é energia negativa que leva à luta e luta provoca luta. Quem semeia ventos colhe tempestades.

Por outro lado, o mesmo Estado laico (por exemplo a Alemanha) que defende a liberdade de expressão contra símbolos da religião é implacável na luta contra gestos e sinais nazis (gestos de Hitler e cruz suástica) contra a democracia. Em todos os países, a Bandeira não pode ser escarnecida
senão até há penalização… Porquê esta diferença de pesos e medidas em questão de liberdade de expressão? Não será que esta é uma arma discriminatória do estado secular?

Também é lícito perguntar-se porque é que crentes islâmicos reagem tão sentidos recorrendo às armas e crentes cristãos se retiram apenas magoados. Qual será a estratégica mais eficiente, a do crente muçulmano que usa o meio das armas ou a do crente cristão que se recorre das leis perdoando e rezando pelos inimigos porque acredita na ‘arma’ da oração?

O complexo de inferioridade não pode explicar tudo e menos ainda a nacionalidade. O ferimento dos sentimentos também não pode ser a medida para se erguer contra a liberdade.

Muitos admiram-se de, em nome de Deus, se ter praticado o massacre de Paris. O problema não está na crença em Deus, a dificuldade surge do facto da inspiração divina acontecer no Homem e este também ser definido pelo espaço geográfico e cultural.
António da Cunha Duarte Justo
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