Homossexualidade


Uma Maneira diferente de estar na Vida

A ciência e a religião procuram perscrutar os segredos da natureza mas, como o Homem é um ser condicionado, são também condicionados os resultados das suas observações. A natureza é mais que ela mesma e ultrapassa o alcance da vista humana. Embora a igreja católica reconheça que não se pode isolar um acto humano das suas circunstâncias, no que respeita à sexualidade ela sempre manifestou uma relação perturbada com a sexualidade considerando-a como um campo pantanoso.

Paixão sexual é sinal e convite à abertura universal

Nem a Bíblia é livro de biologia nem as Ciências Naturais são dogma de fé a seguir como pretende, por vezes, criacionismo e evolucionismo. Numa sociedade concorrente e dominante, cada vez se tornam mais evidentes os interesses de minorias e de maiorias, em conflito, na luta pela discriminação positiva ou negativa, no domínio da sociedade e da natureza. O “pecado original” da humanidade não só pertence à essência humana mas ao condicionalismo de indivíduo e instituição serem mutuamente dependentes.

A homossexualidade (1) e a heterossexualidade estão mais em evidência onde a sociedade e a política se procuram apoderar das pessoas e dos seus instintos. Na antiguidade grega a homossexualidade era cultivada como forma de amizade superior. Esta porém não se deixa amarrar ao sexo nem à homofilia.

A vida seria demasiado banal se se perdesse na esotérica da fantasia de cada um ou se fosse limitada à procura da própria ração. Tal como nas forças do universo (centrípetas, centrífugas, de rotação, de translação, etc.), assim no microcosmo humano, são de se percepcionar, consciencializar e respeitar todas as forças. Toda a pessoa traz em si uma atracção física, emocional e espiritual. A pessoa é terra, sistema solar, galáxia e comos ao mesmo tempo. Na pessoa individual está o outro lado do todo. Por isso a paixão sexual é um sinal e um convite à abertura universal, à humanização. A esta segue-se a personalização numa dimensão não só horizontal mas também vertical. A perspectiva do alto possibilita a visão do passado e do futuro para uma melhor descodificação da natureza e do próprio ser e existir.

O eros não se esvazia no encontro com uma alteridade individual, não se podendo centrar apenas em si mesmo, tal como a força centrípeta não existe nem se explica por si, mas também não se deixar sorver por órbitas ideológicas. Isso tudo incapacita o amor levando a pessoa ao buraco negro do impessoal e anónimo. Amor é, como o universo, energia em expansão na procura de afinidade no mesmo sentido cósmico da convergência.

Como microcosmos, resumos do universo, que somos, o sexo não é em nós a finalidade do ser mas sim a oportunidade para a inter-relação, a criatividade, o amor, a união transcendente. O amor sustém os fragmentos, integrando-os, personalizando-os. Amor é a luz do interior do ser e a razão a luz do exterior. Só o verdadeiro amor pode cativar o ser na sua totalidade; e este acontece para lá dos “fósforos” da mera heterossexualidade e homossexualidade. Necessita-se sempre dum despertar, quer para o corpo quer para o espírito, de modo a convergirem na personalidade. A personalização realiza-se na união de um eu-tu com a consumação num nós respeitador da ipseidade de cada um, a caminho da alteridade para a síntese no Ómega.

Doutro modo, não passaremos de meteoritos sempre de passagem para a entropia. Microcosmos e macrocosmos seguem um chamamento a descobrir em comum. O caminho para o Homem superior pressupõe o cultivo de energias “intercêntricas” para se passar da individualidade à personalidade.

Na disputa pelo sexo

Homossexualidade e heterossexualidade podem conduzir à descoberta do sentido individual, social e cósmico do ser humano e dos seres em geral, ser o início duma caminhada empática e sinergética na construção duma nova consciência e duma nova esfera – a esfera espiritual. Distinguimo-nos da esfera animal irracional pelo facto de sabermos que sabemos e por termos dado o passo para lá da biosfera, criando assim uma nova perspectiva para o universo que através do espírito poderemos fazer progredir. Ao momento da subinteligência do instinto segue-se o do pensamento, a etapa da reflexão. Uma vez atingido o limiar do pensamento há que dar o salto para a etapa espiritual, a convergência do Espírito. Sem sonho a vida é erro! O ideal semeia o sentido na aventura da vida, porém não nos poderemos permitir sonhar deitados à sua sombra. Por isso toda a instituição e ideologia têm tanta gente dormindo e ressonando à sua sombra. Por isso o mundo se repete desde o início da História e instituições e pessoas repetem os mesmos erros e a ladainha dos mesmos queixumes, vivendo do equívoco dos mesmos equívocos do dia a dia.

Os interesses das instituições sociais colidem com os interesses particulares, sendo-lhe, por vezes, contrários. Dado o Estado querer regular cada vez mais a vida individual até ao sector mais íntimo, o conflito entre o carácter privado e público acentua-se. Por não haver clareza na definição de direitos e objectivos comunitários e individuais, o conflito torna-se antagónico envolvendo as melhores energias em coisas acidentais.

Permanece o problema da lei natural e da lei positiva, do que é norma e do que é desvio. Uma constante da natureza, porém, é a diferença. Temos por um lado uma sociedade intolerante desrespeitando o indivíduo que sai da norma e pelo outro os diferentes que querem provocar e ter o privilégio de privilegiados pela mentalidade ou simplesmente o direito de serem aceites como são pela sociedade. Uma luta entre norma e candidatos à normalidade. Tudo em nome do egoísmo ou em nome do altruísmo: um combate à margem da ipseidade e da alteridade. Uma batalha em que todos se reduzem a objectos e em que a humanidade perde.

Dum lado os grupos gay querendo ver a actuação do Estado na satisfação dos seus interesses individuais ou particulares, do outro os grupos defensores da família tradicional considerando-se como garantes de futuro procriador e de perpetuação da Nação contra a individualidade. Uns e outros reduzem-se a clientes precários do institucional, nas mãos de gente esperta que vive duns e doutros, à margem da natureza do indivíduo e do organismo.

A resolução do Parlamento Europeu de Janeiro de 2006 quer para homossexuais e lésbicas a igualação de direitos no que respeita à matéria de sucessão, propriedade, pensões, impostos e segurança social. Assim certas regalias que o Estado, por interesse próprio, concedia aos casais no intuito de fomentarem a procriação e formarem uma família, querem-se agora alargadas às ligações gay. A nova biologia genética parece simplificar o caminho a uns e a outros.

Sexualidade é mais que sexo

O fenómeno da homossexualidade não pode ser tirado da ordem do dia como era feito tradicionalmente apelidando-o de fenómeno decadente de sociedades permissivas ou como simples doença. A sexualidade influencia todos os sectores da vida humana e de cada um em particular. Todo o ser humano é carente com as suas manchas e brilho. Somos mais geografia e paisagem do que pensamos.

Independentemente do respeito devido a cada pessoa e à forma de vida escolhida, querer obrigar que todos acreditem que todas as formas de vida são iguais é alienante e sofre do mesmo vício da mentalidade discriminadora questionada. A diferença impõe-se como tal.

O problema fundamental porém está no assenhoreamento do tema por esta ou aquela facção. Homossexuais, lésbicas e heterossexuais acantonam-se atrás de ideias abstractas ou forças que não tomam a sério a individualidade e a dignidade de cada cidadão. É apenas assunto de guerra e de dividendos à margem da pessoa humana. O problema não está no pró ou no contra mas na fixação e ausência de reflexão duns e doutros.

Homossexualidade é geralmente apresentada como disposição para a prática de actos sexuais entre indivíduos do mesmo sexo. Para Freud na génese do fenómeno está o complexo de Édipo na infância com uma ligação forte da menina ao pai e do menino à mãe e a consequente falha na primeira experiência sexual, além do narcisismo e duma certa indecisão sexual. A ligação e identificação com a mãe leva o jovem à necessidade de amar como a mãe amou, necessidade essa acompanhada do medo da castração e da admiração pelo falos, em competição com o pai e no ciúme com o rival.

Por outro lado, o desejo de identificação com o ideal feminino leva o jovem a querer ser mulher custando-lhe, por outro lado, renunciar à “relação incestuosa” materna. Ele não vale por si mas pela pertença.

A hipoteca de exigências maternas é demasiado pesada. A mãe, sem pénis e o medo perante o marido, projecta-se, por vezes, num filho assexuado que reserva para ela todo o seu ser. Segundo teorias da psicologia esta situação leva o jovem a procurar viver num mundo à margem da realidade, na busca dum mundo suave e na procura duma estrutura feminina de fraternidade, paz e amor. A sua virilidade tem um brilho feminino. Assim permanece, inconscientemente, fiel à mãe.

Tudo isto o levará à contestação da normalidade. É interessante constatar nos meninos uma fase da infância e da adolescência em quem repelem as amizades com o sexo oposto tornando-se mais interessantes as actividades desportivas da “horda”. Uma outra explicação é a disposição genética. Destas concepções surgem as posições contrárias: a dos que consideram a sexualidade como uma perturbação corrigível e a dos que vêem nela o determinismo biológico sem qualquer carácter doentio ou moral. Naturalmente que a visão freudiana é demasiadamente restritiva, materialista e determinista, não deixando lugar para uma liberdade superior.

Numa sociedade aberta ao natural multiplicar-se de identidades, torna-se cada vez mais difícil determinar uma tipologia da realidade do amor. Desde as conhecidas práticas na sociedade grega, à pornografia chinesa e à tradição dos Tsonga em Moçambique, na prática do casamento entre homens, verifica-se que, embora iguais no sexo, a sua diferença de identidade se mantém. Há que reconhecer uma homossexualidade persistente para lá dos hábitos e tradições. Na natureza a excepção confirma a regra sendo aquela natural, embora não norma. É diferente o caso da sodomia que sempre foi considerada infracção enquanto que a homossexualidade uma marca de identidade. A vida é irracional.

O que deveria estar aqui em questão era o direito à individualidade e à auto-determinação, e à realização pessoal no encontro de si e do outro na aventura da procura do bem.

A eterna luta de guerrilha entre direito pretendido e direito adquirido, entre interesse individual e interesse institucional é uma constante histórica. Facto é que as pretensões individuais, ao serem institucionalizadas, se tornam tão vulneráveis como as instituições que agora atacam. Dá-se uma objectivação do que se quereria sujeito (subjectividade). Afinal, uma guerra como todas as outras. Seria de lembrar: “Antes magro no mato do que gordo na boca do rato!”

O orgulho gay, por vezes, manifesta a soberba homossexual na provocação da homofobia à frente de igrejas, sinagogas e mesquitas, querendo intencionalmente “profanar” Jerusalém. Será que se vive depois melhor à sombra do marginal e dos excluídos? Tem-se a impressão que a necessidade de segurança e posse torna os estratagemas (de defensores e atacantes) iguais, variando apenas o vocabulário ideológico e o lado da rua. Tudo isto manifesta a tendência de reduzir o mundo a sistemas e os indivíduos, nas suas necessidades, a transição. Tudo permanece igual ao longo do tempo, permanecendo a tentativa de se instalar na grande levada da frustração social. Se bem se trata da conquista dum direito porquê tanta edificação, porquê tanto ressentimento? O mais urgente seria uma mudança interior e exterior das mentalidades, nos diversos acampamentos, no sentido da convergência e da realização integral do ser humano e da natureza sempre a caminho. Os preconceitos e a luta contra eles tornam-se, se não estivermos atentos, em factores de afirmação e materialização estática de sociedades.

Doutro modo não passamos duma sociedade de discriminados em que de época para época se mudam apenas os campos de batalha. Já se ouvem ao longe os queixumes dos que afirmam: ainda se proíbe a poligamia, a poliandria, o incesto, etc.!… É incongruente querer pretender que uma sociedade organizada, que por si vive da restrição de necessidades (direitos) individuais, se torne intrinsecamente militante e defensora duma sociedade do caos como querem mostrar os devotos do oportuno. Esta posição só seria própria de um partido que se estivesse marimbando para o indivíduo e para a instituição. Quem assim age actua como a criança que quer viver ao luar e que exige ao mesmo tempo o sol da praia.

É natural que o comportamento institucional, ao desrespeitar e ignorar a pessoa humana e as suas necessidades, legitima a anarquia. A anarquia que desconhece também ela a verdadeira natureza da pessoa humana e da subsidiariedade de indivíduo e instituição, encontra-se prisioneira do mesmo sistema de pensamento. Deslegitima-se a si mesma usando os mesmos instrumentos de opressão e a mesma filosofia da agressão, vivendo também ela do parasitismo entre lei positiva e lei natural numa táctica de penetração imperceptível mas também ela meramente orgásmica. Os defensores dos direitos individuais comprometem-se a si mesmos ao colocarem-se sob a penetração neo-marxista, uma visão parcial da vida.

Os grupos gay são por um lado levados e por outro instrumentalizados em função da penetração socialista. O socialismo ortodoxo é estruturalista, contra a liberdade individual; esta pode interessar-lhe mas apenas como momento da dialéctica ao serviço dum Estado todo poderoso. Por seu lado os conservadores agarram-se a um passado estático com medo do novo. Uns e outros são movidos pelo medo e pelo poder. Uma sociedade nova pressuporia um discurso aberto e não de trincheira para trincheira. Uma nova maneira de lidar entre as pessoas e com os problemas poderia dar oportunidade a um novo discurso, uma forma de estar não dualista, uma maneira de ser superior, com melhor qualidade de vida para heterossexuais, homossexuais e lésbicas.

O Deus de Jesus Cristo é pessoal, é bondade e amor. Ele conhece cada um pelo seu nome, não sendo relevante os abstractos nem as essências do saber. Não se deixa prender em sistemas homossexuais ou heterossexuais. Quer o máximo de humanidade e o mínimo de instituição. O poder, a instituição, os sistemas e as ideologias é que pregaram a pessoa na cruz. Uma preocupação útil seria canalizarmos todas as nossas forças humanas para o bem da humanidade e respeito por cada pessoa, independentemente das tendências sexuais.

António da Cunha Duarte Justo

Teólogo e Pedagogo

(1) Mais adequado que o termo homossexualidade seria o emprego da palavra homofilia. Aquela tem uma conotação muito restritiva reduzindo a relação pessoal à sexualidade genital caindo assim no equívoco de Freud.

KOSOVO – UMA PAZ CARA

O exemplo duma política europeia falhada

Na província do sul da Sérvia, no Kosvo, realizam-se hoje eleições para o parlamento desta província. Entretanto decorrem as conversações, a nível internacional, no sentido desta província sérvia, administrada desde 1999 pela UNO, alcançar um novo estatuto, a nível de direito internacional.

Desde a guerra civil da Sérvia a população islâmica do Kosovo (Amselfeld) quer-se tornar independente. A paz, entre as populações ortodoxas mais a norte e as muçulmanas a sul, só tem sido mantida em parte devido à administração do Kosovo pelos representantes da ONU e à forte presença militar internacional. A população islâmica (90%) quer criar factos históricos, o reconhecimento da independência, porque, doutro modo nunca daria provas de aceitar o multiculturalismo, condição que, a ser realizada de facto, iria impossibilitar a independência.

Querem uma independência controlada pela União Europeia; uma exigência fácil para uma região sem condições de facto para a independência. Depois a Europa que pague a factura. Interesses da ortodoxia nacionalista colidem com interesses do Islão hegemónico.

A América alargou a sua zona de influência ao Cáucaso podendo vir a estacionar foguetões na Europa do Leste. A Rússia sabe que, mantendo a sua influência sobre o Kosovo, pode estacionar foguetões naquela província, sem ameaçar a própria segurança interna.

O Kosovo é o berço da nacionalidade Sérvia, a que a minoria sérvia não quer renunciar. O assunto não é fácil para a Europa, duma maneira ou doutra, a região continuará a ser fonte de conflitos e preocupações para toda a Europa.

Os muçulmanos, só aguentam o jugo do infiel, enquanto se acham em minoria, depois determinam eles o caminho.

A Europa, porém, confia poder levar a maioria muçulmana a um processo democrático europeu comprando a paz com dinheiro. Desconhece a força da religião e a vontade exemplar do povo árabe que vê a sua melhor maneira de ganhar força no mundo espalhando o Islão. Na consciência de que os sistemas económicos e políticos passam, esta é a verdadeira estratégia. Ao fim e ao cabo só repetem, por outros meios, o que os portugueses (no tempo em que ainda tinham convicções e vontade) fizeram no século XV e XVI: espalhar o império através da fé.

Contra as pessoas e a pobre população falam os interesses políticos e estratégicos da USA-EU e da Rússia, e os interesses da Ortodoxia e do Islão. Este tem aqui a melhor porta para a Europa. Também poderia ser uma maneira de aplanar os caminhos para a marcha da Turquia para a Europa.

A população sérvia concentra-se no norte do Kosovo. Por outro lado na Sérvia também há grupos minoritários de muçulmanos. Uma constelação propícia à discriminação e à desforra dum e doutro lado. E uma Europa que aumenta a herança do seu futuro dentro das suas nações não se preocupa em resolvê-los a nível de base na Sérvia e sua província do kosovo.

Os políticos europeus mantêm-se calados sobre os verdadeiros problemas de fundo porque querem levar à frente, sem que a população europeia acorde, um projecto que irá custar muito dinheiro a pagar no futuro, também pelos países da periferia europeia. Para desviar as atenções vão mostrando imagens conciliadoras e belas da cidade de Prestina para impressionar um Ocidente populacional desinformado e incauto. Esquecem de mostrar as muitas casas abandonadas pelos sérvios na fuga ao medo da população muçulmana. Antes tinham os muçulmanos medo dos sérvios, hoje têm os sérvios medo dos muçulmanos.

A antiga Jugoslávia, uma sociedade multicultural, encontra-se sob o flagelo das tendências nacionalistas, racistas e hegemónicas. Uma Europa que apregoa e defende por todo o lado no seu seio as sociedades abertas e a multicultura tem duas palavras e duas medidas. Na política que tem feito em relação à antiga Jugoslávia não só defende o contrário como tenta criar factos consumados. Dão-nos já a cheirar os problemas europeus do futuro que tem assentado mais em ideologias do que na realidade dos povos. Os sérvios viam os muçulmanos com maus olhos e discriminavam-nos considerando-os como primitivos. A virilidade muçulmana sempre meteu medo à Sérvia.

A política parece só entender e dar razão à fala das armas e da intolerância. Interessante que também há ressentimentos e discriminações, dum lado e doutro, contra os ciganos. Como não exigem uma forma de estado territorial não são tomados a sério. Quem com ferros mata com ferros morre.

Não é com uma independência leviana que se resolvem os problemas. Esta leviandade já foi cometida pela Europa quando interveio, contra o direito internacional, na Jugoslávia em defesa de interesses alemães e americanos. As mesmas forças procuram convencer povos incautos a efectuar a independência do Kosovo. A Europa, se quer ser credível, deverá treinar na antiga Jugoslávia o multiculturalismo e a tolerância que apregoa para a Europa. É preciso desmontar o ressentimento aninhado em ortodoxos e muçulmanos mas de maneira realista.

Doutro modo, o mesmo direito que têm os muçulmanos do Kosovo, porque o não devem ter os bascos, os curdos e tantos outros grupos que, por esse mundo fora, não se sentem em casa? Com o reconhecimento da independência a um grupo étnico cria-se um precedente com consequências catastróficas em muitas regiões do mundo.

A Europa apoia o desmantelamento e indirectamente dá razão a uma cultura do ódio. A convivência entre muçulmanos e ortodoxos numa relação inter-cultural baseada no respeito pela pessoa humana e não tanto em estruturas culturais seria um bom exemplo e uma boa oportunidade para a aproximação do Islão e do Cristianismo. O problema é que a política só liga a grupos e estruturas trabalhando à margem e à custa duma população sérvia e muçulmana sacrificada

António da Cunha Duarte Justo

Pena de Morte

Barbaridade e primitivismo legal não legítimo

A Comissão dos Direitos Humanos da ONU exige a suspensão de excussões. A pena de morte encontra-se abolida em 130 países do mundo, dentre os quais os países da União Europeia.

A barbaridade da execução da pena de morte ainda continua a ser prática em 66 Estados do mundo, através de envenenamento, cadeira eléctrica, enforcamento, decapitação, apedrejamento, etc.

Segundo informações da Amnistia Internacional, em 2006 foram executados 1591 prisioneiros, em 25 países.

A Comissão dos Direitos Humanos da ONU acaba de votar uma resolução contra a pena de morte. A favor da resolução votaram 99 países, 52 votaram negativamente e 33 abstiveram-se.

Em Dezembro o plenário da ONU votará a resolução, contando-se já com a aprovação. Embora o voto não seja vinculativo, será um sinal para alguns dos renitentes.

Países defensores da pena de morte acusam a Europa de querer impor as suas concepções morais a outros países.

Razões contra a Pena de Morte

Razões de ordem natural que contrariam a pena de morte. Mesmo o tribunal mais independente e elucidado não está imune do erro. A justiça erra e encontra-se muitas vezes sob pressão governamental ou popular. A sentença de morte não se pode fazer voltar atrás no caso de posteriormente se provar a inocência.

O maquiavelismo político leva ditadores a eliminar os adversários políticos. As ideologias e os regimes políticos e sucedem-se uns aos outros, permanecendo uma arma comum do uso da injustiça como direito. O espírito vil, o cálculo político leva políticos a não respeitar o santo direito das pessoas à vida. A pena de morte torna-se num instrumento fácil para a exterminação dos opositores a longo prazo. Quem defende a pena capital também defende a guerra, a intolerância e a violência privada. É uma questão de consciência e de desenvolvimento humano. O Estado, ao usar dum direito ilegítimo, legitima indirectamente o uso da agressividade entre privados e entre grupos. A pena de morte, geralmente é aplicada em sistemas que reduzem a pessoa a indivíduo à disposição, a uma peça da engrenagem social. Aqui se situa a incompatibilidade do Cristianismo com o Socialismo materialista ortodoxo e o fascismo.

Há também razões de ordem cristã que vinculam a negação da pena de morte. Execuções são incompatíveis com a dignidade humana. O ser humano é a imagem e semelhança de Deus participando da Sua divindade. Mesmo a acção dum acto infame ninguém não legitima ninguém a colocar-se sobre outro homem, a armar-se em juiz, nem sequer um Estado.

Para os cristãos a pena de morte corresponderia ao regresso ao paganismo, e o repúdio da norma fundamental cristã de amor ao próximo e ao inimigo. O Sermão da Montanha é a carta magna do cristianismo. “Amai os vossos inimigos, fazei bem aos que vos odeiam, abençoai os que vos amaldiçoam… Se amais só os que vos amam, que mérito tendes? Também os pecadores amam os que os amam… Os pecadores emprestam aos pecadores, a fim de receberem outro tanto. Vós, porém, amai os vossos inimigos, fazei o bem e emprestai, sem nada esperar em troca.“ (Lc 6, 27…)

A pena de morte não impede o crime. Por outro lado a vingança não pode substituir o luto. Com a pena de morte o Estado coloca-se ao mesmo nível do criminoso, saldando crime com crime.

António da Cunha Duarte Justo

Fundamentalismo religioso versus fundamentalismo científico

Tensão entre Razão e Fé

Hoje há muita gente que não aguenta a tensão entre razão e fé. Partem do princípio de que um autor ou é razoável, isto é, científico ou, quando muito, autor de literatura edificante. Na religião cristã porém, fé e razão encontram-se juntas. A fé é conforme à razão e possibilita em colaboração com os métodos científicos verificáveis uma forma própria do conhecimento e do reconhecimento. Há vários caminhos e instrumentos para abordar a mesma realidade.

Cada vez se observa mais, em sectores mais esclarecidos, na tensão fé-razão, uma forma de colaboração interdisciplinar a nível das universidades e doutras instituições. Cada pessoa parte duma perspectiva preconcebida ou pré-formada.

Da variedade das perspectivas, na consciência de que a realidade nos transcende e transcende a própria percepção, surge a pluralidade e a possibilidade de desenvolvimento.

Com respeito à realidade, a Jesus e a Deus a perspectivas são inúmeras atendendo a que não há uma imagem da realidade, de Deus, uma imagem de Jesus. Por isso seria um pressuposto elementar da discussão a tolerância das imagens. Umas ao lado das outras na interdisciplinaridade podem possibilitar aumentar o ângulo de visão da realidade.

Muitos ideólogos e opiniosos encontram-se ainda prisioneiros duma concepção estática de ciência ultrapassada do século XIX, o mesmo se dando com os prisioneiros duma visão de fé como se pode verificar no Islão ou nalguns biótopos cristãos.

É do conhecimento de muitos que Religião, arte, poesia não podem ser julgadas ou criticadas apenas com métodos e critérios racionais nem tão-pouco a razão chega para explicar a realidade. Assim como há um fundamentalismo religioso também há um fundamentalismo científico. Estruturalmente não há diferença entre os fundamentalismos, as crenças políticas religiosas e científicas atendendo ao adiantamento do conhecimento de hoje. Há vários mundos e várias verdades: a factual, a política, a religiosa, a científica, a da arte, etc. O importante é que elas se não definam pela contradição mas no discurso e na consciência da própria relatividade contribuam para a Verdade no acontecer. De resto, na verdade, o contrário também é verdadeiro. Ela é processo. A obstrução está quando vive à sombra da política, da economia, da religião…

A dificuldade é que muitos, também na política e na ciência ainda não realizaram a mudança copérnica e muito menos ainda a mudança provocada pelas teorias da nova física, as teorias da relatividade quântica. As pessoas continuam a comportar-se como espectadores de diferentes palcos cada um pensando que só o seu teatro é que existe.

A discussão pública é conduzida por sentenças dogmáticas bipolares medíocres propagadas por multiplicadores simplistas com uma mentalidade própria de acampamento militar (trincheira). A ciência só pode explicar sectores parciais da nossa realidade. Naturalmente que para se alcançar a maturidade científica, o conhecimento científico ou experiência religiosa não se torna fácil mesmo para doutores da ciência e da religião.
A necessidade humana é que determina o uso e o usufruto. Seria miopia querer reduzir a necessidade humana e as potencialidades humanas a um ou outra coutada, a uma ou outra interpretação.

António Justo

António da Cunha Duarte Justo

Festival da Canção

Europa de Leste contra a Europa Ocidental

Sérvia venceu o festival da Eurovisão em Helsínquia. Na satisfação e expressão da vencedora passava o acto remissor dum país demasiado humilhado pela Europa vizinha… De notar que todas as antigas repúblicas jugoslavas deram à Sérvia a pontuação máxima que eram 12 pontos.

Independentemente da qualidade das músicas e textos do Festival, uma coisa se tornou evidente: a solidariedade da votação entre os estados do antigo bloco de leste. Nele se tornou manifesta a existência de duas Europas. Na hora da música do Pacto de Varsóvia, os sequiosos vencem sobre os de estômago cheio.

Atendendo à grande quantidade de países pequenos do antigo bloco de Leste, os países da Europa ocidental não terão grande oportunidade de alcançar boa qualificação quer na pré-selecção dos países quer na classificação final dos festivais.

É agradável notar nos países da periferia o empenho e campanhas televisivas para que os seus conterrâneos, que vivem emigrados no estrangeiro votem no representante da sua nação. Devido ao facto da presença migrante nos países de imigração, aqueles podem, através da sua participação telefónica influenciar os pontos a distribuir pelos países onde vivem. É a lei da competição.

Portugal sem oportunidade
Em alguns meios questionam-se todos os critérios de votação. A continuar assim os países da Europa Ocidental perderão sempre. Alguns falam já da necessidade da divisão dos países participantes em dois grupos para as meias-finais e no fim só deixarem votar os participantes.

A nível de cálculo de justiça distributiva terão razão mas a nível duma política europeia de integradora dos povos isto só acentuaria ainda mais as diferenças. Haverá porém meios de diminuir as injustiças. De resto, estas são o nosso fiel companheiro até ao fim dos tempos, se “outros maiores valores” se não levantam!

O maior problema põe-se para países ocidentais da periferia como é o caso de Portugal. Este, no vigente sistema de votação, nunca chegará a alcançar os pontos suficientes para poder passar para lá das meias-finais. A Alemanha, a Espanha, a Franca e a Inglaterra participam automaticamente nas finais pelo facto de serem os principais financiadores do Festival.

O critério definidor da qualidade da música e das letras das canções é muito subjectivo dependendo principalmente dos gostos de públicos e de familiaridades culturais.

António Justo

António da Cunha Duarte Justo