ALEMANHA REVOGA O §“CRIME DE LESA-MAJESTADE” (DIFAMAÇÃO DE SOBERANOS ESTRANGEIROS)

EM TEMPOS DE PAZ PREPARA A GUERRA

António Justo
A sociedade atravessa tempos de guerra ideológica, política e económica. Os diversos grupos pensam e agem convencidas de possuírem a visão global da realidade, muito embora percepcionada apenas sob uma perspectiva de gueto; como consequência temos a guerrilha civil; acabou-se com as nações para se prosseguir numa marcha de protestos e de toque a finados das civilizações; o descontentamento interno não se limita às fronteiras das nações. Já não chegava a instabilidade europeia, criada pelo fascismo turco, pelo Brexit, pela política de refugiados, pelo desemprego, para nos vermos ainda mais divididos pelas águas revoltas sopradas por Trump. Resumindo: uma sociedade ocidental dividida parece viver os tempos muçulmânicos de jihad (guerra santa) ad intra e jihad ad extra.

“Se queres paz prepara a guerra”

Política e socialmente debatem-se interesses contrários em jogo, e em ano de eleições relevantes na Europa (Alemanha e França) cada grupo procura tirar proveito da demonização do outro: de um lado, os que querem o poder a todo custo e, do outro, os que têm medo de o perder a defender-se com unhas e dentes.

Na era do pós-facto já não interessa a realidade nem o pensamento fundado sobre as coisas porque o poder da opinião chega para ir insuflando os factos e as coisas. É tempo da guerrilha calada e interiorizada na defesa de interesses construídos à custa do domínio dos outros. Nesta guerra geral de uns contra os outros, em que verdade e mentira se igualam e transformam em ameaça, já não se pode descansar no travesseiro da paz porque, na realidade concreta, “si vis pacem para bellum”!
Assistimos a uma sociedade dividida nos que vivem bem do sistema e nos que se sentem económica e culturalmente atacados interior e exteriormente.

O presidente turco perdeu o processo de crime de lesa-majestade

A 17.03.2016 um canal da cadeia de TV pública NDR difundiu um vídeo em que o humorista Jan Boehmermann criticou Recep Tayyip Erdoğan , presidente da Turquia, com uma poesia satírica. Erdogan considerou a poesia como um insulto, o que deu origem a um caso jurídico de estado entre a Alemanha e a Turquia.

A acusação levantada em tribunal alemão por Erdogan contra Böhmermann por este o ter apelidado de “Saco pateta, covarde e atolado”(“Sackdoof, feige und verklemmt”) foi considerada sem efeito pelo tribunal porque isso não é suficiente para poder ser apreciado como insulto. Segundo o Ministério Público não constitui crime dado “a caricatura de fraquezas humanas não conter difamação grave da pessoa”.

Foi curioso também o facto de o ministro dos negócios estrangeiros, futuro candidato à presidência da Alemanha, ter qualificado publicamente Trump como ”Pregador do ódio”.
Nos USA a liberdade de opinião não contempla crime de lesa-majestade baseando-se no argumento de que todas as pessoas são iguais perante a lei.

Governo alemão determinou acabar com o § 103 que defende dignatários estrangeiros

É considerado crime de lesa-majestade não respeitar a dignidade de reis ou de chefes de estado (§ 103) estrangeiros. O parágrafo 90 StGB regula a mesma matéria em relação achefes de estado alemães.
Para o § 103 ser aplicado, o governo alemão cedeu ao pedido da Turquia e emitiu autorização para os advogados de Erdogan poderem apresentar acusação nos tribunais alemães e ser aplicada a lei.

Os Média alemães discutiram de maneira controversa a questão mas na sua maioria criticaram Merkel por não se ter colocado ao lado de Böhmermann e ainda ter comunicado ao governo turco que considerava a poesia satírica “deliberadamente ofensiva”. O povo alemão não gostou nada desta posição de Merkel, acusando-a de rastejar (se ajoelhar) perante a Turquia, certamente devido ao facto de se encontrar dependente dela devido ao acordo para conseguir o estrangulamento dos refugiados para a Europa.

O Gabinete de Merkel decidiu a supressão do parágrafo 103 do Código Penal em 2018. Os insultos de chefes de Estado permanecerão puníveis mas serão tratados como os de qualquer outra pessoa.
A decisão tem um senão: porque não suprimir também o parágrafo 90 StGB que penaliza o insulto ao presidente alemão?

A dignidade humana é um bem cultural a defender universalmente. O respeito pela pessoa humana, independentemente do cargo ou ocupação não abule a crítica justa. Por vezes também se assiste a críticas baratas e ultrajantes que revelam mais sobre a dignidade ou indignidade (e a civilidade) de quem ataca ou ultraja do que sobre o ultrajado.
©António da Cunha Duarte Justo
Pegadas do Tempo,

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António da Cunha Duarte Justo

Actividades jornalísticas em foque: análise social, ética, política e religiosa

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