De cidadão para proletário

De cidadão para proletário

Um povo sem ressonância individual passa a viver em estádio de inveja, passando esta a motivar o seu agir, resultante dum povo soldado com os desertores da precariedade.

Os nossos políticos na Europa agem irresponsavelmente ao destruírem sistematicamente a camada social média em favor das multinacionais, fomentando a sua degradação em benefício dum estado dependente com um povo proletário carente. O esfomeado reduz a sua felicidade a um estômago com apetite mas sem fome. O seu nível de felicidade é limitado à oscilação entre o apetite e a fome. Os povos da Europa, porém, não se contentarão com isso.

O cidadão da sociedade moderna, integrado num regime estatal com foros de burgo, veio substituir o burguês. O Estado actual, porém, implementado por um socialismo desalmado e por um capitalismo irresponsável fazem do cidadão um proletário. O regime parece viver melhor do fomento de figuras passageiras, de novos-ricos, atados à sua trela à custa dum cidadão esvaziado de sentido, sem Deus nem tradição. É a dinâmica das leis do mercado aplicada ao estado: tudo se torna mercadoria, o resto é preço.

O sistema partidário, com uma organização de filiados mínima a nível social, apoderou-se do Estado, vivendo duma estratégia agravante que reduz a participação cívica ao voto eleitoral. Embora de diferentes opções e orientações, os partidos preparam, sem disso serem conscientes a forma de estado proletária e autoritária, um estado nomenclatura de que nos são exemplo a Rússia e a China.

Em Portugal, o problema é extremamente presente devido ao nevoeiro de Abril que, por um lado criou ilusões no povo e o desmotivou por outro. (O exemplo da política de ensino é um dos exemplos mais crassos provando que os nossos políticos ainda não desceram do mundo da ideologia, para poderem contactar com o mundo da realidade moderna, que exige, de Portugal, para poder subsistir dignamente, uma aposta total na inteligência da nação através do ensino. O arrivismo indisciplinado pode ser uma possibilidade no mundo da política, mas não no mundo real! Este exige grande competência, disciplina, maleabilidade e persistência). O sistema de formação de opinião dentro do partido não é democrático, como também o não é a sua estrutura, no seu âmago. O cidadão não tem influência nem oportunidade de se exercitar em democracia. Assim se fomenta uma sociedade ovelha com alguns cabritos, sempre esfomeados, à espreita da sua chance, como se pode ver na sua maneira de se reproduzirem na TV… Os que têm mais cio parecem conseguir os mais altos postos. Em relação à comunidade, aparecem frescos, gananciosos e libidinosos, com propensão para o autismo. Abusa-se da democracia reduzindo tudo ao banal da opinião. Verdade é a soma das opiniões, independentemente da razão. Por isso os governos não apostam no melhor nem no bom mas apenas no possível, no temporário eleitoral. Assim, cedem ao facilitismo duma vida enganadora não se preocupando em investir no saber exigente e sério para se elevar o nível da opinião dum país. Parece ser suficiente à filosofia de que no reino dos “cegos” quem tem um olho é rei! …

A mudança terá de começar pelas elites

O grande problema do 25 de Abril foi os partidos terem-se assenhoreado dele. Antes tinha-se um senhor de Portugal, depois assenhorearam-se dele os Soares e comparsas. O povo estava lá só para aplaudir; parece que para eles as eleições não passam de actos de aplauso!… Em nome dum ismo pretende instalar-se outro. Se um se agarrava à nação, o outro agarra-se à democracia. Em cada mudança o povo lá está para se alegrar com as novas cores da festa. A conta é-lhes apresentada depois.

Com o 25 de Abril passou-se dum autoritarismo pessoal para um autoritarismo de pessoas nos partidos. Revoluções parecem reduzir-se a ocupações. O tempo já traz, por si, o progresso mas as revoluções têm a vantagem de lhe conferir maior sincronia em relação aos biótopos vizinhos.

Para um Portugal mais democrático e mais moderno seria necessário que os partidos portugueses procedessem a uma revisão fundamental dos seus programas à luz da nação e dum futuro humanista. Para isso será mais que óbvio purificá-los dum espírito superficial do imediatismo e materialismo que o 25 de Abril lhes inspirou. O autoritarismo pessoal e ideológico, o jacobinismo presente de influência francesa, e outras barbaridades posteriores têm impedido Portugal da sua independência cultural e dum progresso orgânico. Portugal merece mais do que a importação de cópias desaferidas! Portugal precisa de originais, de originais com erros, mas originais, para poder aprender dos erros que faz. Portugal já deveria estar farto de repetir os erros dos de fora, nunca passando de aprendiz. Já chega de o povo andar atrás de vendedores da banha da cobra mascarados de heróis baratos para uso de casa. Já chega do encosto aos outros e de ideologias estrangeiradas que obriga o povo a admirar “lá fora” o que eles não querem descobrir nem fazer, cá dentro. Já é tempo da nação começar a reflectir a sua situação e de os intelectuais não se subjugarem à banalidade do real, que a TV reflecte na sua veiculação do valor do oportuno.

Precisamos duma democracia moderna, desideologiazada. Precisamos dum sistema móvel e flexível a nível político, social e religioso, que não viva encrostado em dogmas nem na ditadura da opinião barata, nem nos fiéis partidários com espírito de proselitismo, desconhecendo a própria cultura. Portugal inteiro terá que voltar a si e redescobrir-se, não podendo dar-se ao luxo de continuar a andar ao cão… A Suiça é um exemplo de país pequeno e pobre de recursos naturais que, não atraiçoando a própria cultura, continua europeia, dando lições ao mundo através da sua massa cinzenta, e da sua maneira específica de continuar povo e praticar a democracia.

Na discussão pública portuguesa não se encontram palestras científicas abertas, organizadas pelos partidos, no sentido, duma acção consertada, se catalizarem as melhores medidas a tomar para o bem de Portugal. Os políticos não podem limitar o seu papel a controladores de bilhetes, no comboio da história das nações.

É caricato o facto de um governo socialista estar a fomentar a praga dos gafanhotos que em revoadas de accionistas provocam o povo com os seus ganhos, enquanto que este, produzindo embora o lucro, tem de ser módico na satisfação das suas necessidades. A actuação de sociedades de acções é de tal modo brutal que se revela a maior inimiga dos trabalhadores, e sempre à espera de subvenções provindas dos impostos que o povo entrega ao Estado. O darwinismo social conduz ao capitalismo gatuno. “Uma sociedade sem moral torna-se num antro de ladroes” adverte o Papa, na sequência das encíclicas sociais da Igreja. É preciso humanizar o capitalismo no sentido de o tornar responsável pela sociedade e de colocar a pessoa antes do capital. A política económica portuguesa tem fomentado apenas as grandes empresas à custa do ignorar das pequenas e do indivíduo privado. Um exemplo disso está na política de fomento de energias alternativas, em especial da fotovoltaica.

Não há respostas prontas nem através do moralismo nem do neo-liberalismo. A economia de mercado livre parece ser dos melhores sistemas para o geral da sociedade. O problema dá-se quando ela sai duma ética de responsabilidade social, que a deveria manter dentro das marcas da estrada da sociedade. O comboio dos usurários na política e na economia, a continuar assim, aproxima mais depressa o descarrilamento.

Capitalismo e Socialismo de tipo materialista vivem no equívoco de reduzirem o bem-estar, a felicidade dum povo, ao seu progresso económico, descurando outros factores essenciais ao bem-estar da pessoa humana completa.

É preciso assentar critérios de bem-estar e de desenvolvimento noutros factores que não apenas no progresso económico. Precisa-se duma boa governação em que políticos e cidadãos andem de mãos dadas no sentido de construírem um bem-estar económico e espiritual, a nível de vida, educação, saúde, cultura e ambiente.

António da Cunha Duarte Justo

De burguês para cidadão, de cidadão para proletário

Sistema Político a Caminho da Entropia?

De burguês para cidadão, de cidadão para proletário

O Estado cada vez manifesta mais as feições duma sociedade proletária decadente. Sem confiança no cidadão, parece querer reduzi-lo a mero súbdito, a cidadão menor. Governantes não se comportam à altura da nação. Continuamente metem o pé na poça, como se andassem sozinhos a caminho.Manifestam uma autoridade ética proibitiva, sem considerar o bem-estar moral, o contentamento dos cidadãos. Aumenta na sociedade o saudosismo duma autoridade firme e exemplar movida pelos interesses do povo e da nação, não por ideologias. A discrepância entre governos e povo acentua-se numa atitude canina dum agir político sob o ditado da burocracia de Bruxelas. O povo leva uma vida dura embora os Média propaguem uma filosofia de vida sem necessidade de esforço nem de disciplina.

A camada social média, o fundamento da nação, sente-se insegura e até inquieta. Ela diminui e com ela a capacidade do povo intervir na configuração da sociedade. O novo modelo de sociedade pretende que a classe média “passe de cavalo para burro” .

Enquanto na sociedade tradicional, as famílias burguesas financiavam o ensino dos próprios filhos, registando-se um exagero elitista, exclusivista e disciplinador, a sociedade nova segue o extremo oposto abandalhando o estilo de vida social enganando mesmo o povo com a promessa duma vida fácil. A antiga sociedade privilegiava as famílias burguesas, a nova privilegia o desejo individualista catalizado em partidos. A sociedade democrática aberta, socializa o acesso directo aos bens, ao bem-comum, para depois se apoderar dele através de instituições como partidos, lojas e outros elitismos que ocupam os postos na administração pública, na rádio, TV, conselhos fiscais de bancos, empresas, etc. A diferença dos sistemas está no baralhar das cartas. Em democracia apenas se baralham as cartas de maneira diferente, mantendo-se contudo os mesmos ases, reis, valetes, damas e setes. O povo continua palha para assistir.

A filosofia económica neo-liberal, de que a protecção da riqueza adquirida só é possível através do crescimento, leva o Estado a uma maior dependência dos caprichos da economia internacional, que, indirectamente, beneficia a ideologia socialista de administração dum povo reduzido a objecto económico. Também por isso, parecem colaborar tão bem turbo-capitalismo, socialistas e sociais-democratas. (Não se põe em causa a sociedade do mercado livre, o que se questiona é a perca do seu rosto humano.)

Terrorismo islâmico – Um modelo?

O problema do futuro, a aumentar o descontentamento social e a degradação de partes da sociedade, estará na capacidade do Estado para poder continuar a manter o monopólio do poder. O estado, na sua forma, cada vez se aproxima mais da prática do estado islâmico . Falta-lhe porém a coesão da sua crença.

O terrorismo internacional, as insurreições nas grandes cidades, a crescente violência no dia a dia, a desilusão individual, o medo, ocupam cada vez mais espaço da vida individual e social. Também a polícia já começa a ter medo de estar presente em certas zonas das cidades. A falta de futuro e de confiança crescente poderá conduzir muita gente a uma reacção extremista que para impor os seus interesses se organizará em grupos tipo guerrilha nos arrabaldes das grandes cidades apoiados pelos marginais do sistema. Bin Laden, e os “assassinos” imanentes ao seu sistema são uma amostra duma panorâmica possível; prepara-se a vinda dos Viriatos e dos Sertórios. Uma sociedade com grande parte da população a alimentar-se das migalhas que caem das mesas de alguns poucos ou das gotas do estado, degrada a pessoa. A desonra fomenta heroísmos imprevistos. O Deus dos fortes já não os defenderá porque entretanto o desmentiram no seu agir. A Democracia, que se afirmou contra a tirania de sistemas brutais, ao apadrinhá-la, perde a sua legitimidade.

O negócio da necessidade de segurança individual a troco da cedência da liberdade pessoal a favor do Estado está a atingir um nível que começa a ser ameaçador. A prepotência estatal no ataque à privacidade individual, aliada à prática duma política de mercenários a viver do Estado e da filosofia da multa, é despersonalizante. Sem lugar para ele, o súbdito procura alternativas que proporcionem uma perspectiva à sua identidade. A vida da nação parece reduzida a ideologia, sexo e pão. De facto as ideologias são passageiras, a devoção sexual só satisfaz o momento e não deixa projecção, e o homem não vive só de pão… Uma economia e uma política que não se preocupe com o contentamento geral dos cidadãos torna-se questionável.

O terrorismo islâmico tornou-se num pretexto para o Estado controlar o cidadão por razões de estratégia política, fiscal e social. A necessidade de poder da nova potência a surgir, a União Europeia, não pode legitimar a instauração do estado polícia de Orwell. Não estamos nas Arábias nem na China! O Estado parece compreender-se como um espaço cibernético onde reina a unanimidade na abdicação do cidadão e a possibilidade de quem tiver acesso ao banco de dados pessoais, neste caso, o Estado, controlar a esfera privada e se limitar a fazer leis em serviço da estatística contra o navegador número, longe de qualquer humanismo.

Tal como outrora os Romanos defendiam a sua estratégia de luta nas legiões contra a estratégia de guerrilha lusa, também hoje os estados parecem legitimar a sua luta contra o terrorismo, vendo em cada cidadão um potencial terrorista. Por isso, o cidadão encontra-se, neste momento, na fuga da sociedade para o seu foro privado, a caminho dum estádio tribal, que o iludirá na visão duma sociedade em estado de guerrilha, tal como os terroristas já nos exercitam como modelo de auto-afirmação.

António da Cunha Duarte Justo (Continua)