UMA CICATRIZ EM VEZ DO CLÍTORIS E DOS LÁBIOS VAGINAIS

A mutilação genital feminina é a maior expressão machista

António Justo
Passou-se mais um dia internacional da mutilação genital de mulheres e, apesar disso, em 2016 foram cortados os clítoris e em muitos casos também os lábios vaginais a milhões de meninas. A maior expressão machista documenta-se socialmente na mutilação dos órgãos vaginais. 100% das mulheres sofrem toda a vida física e psiquicamente do trauma causado na sua infância.

Dá-se uma quebra de confiança da criança nos pais que entregam as meninas a tal tortura e, além do mais, sem anestesia; a criança passa a sentir o próprio corpo transformado em ceara alheia. As consequências da mutilação genital são: possíveis dores para toda a vida, problemas no urinar e nas relações sexuais. Fica-se com uma cicatriz em vez do clítoris e, muitas vezes, também sem os lábios vaginais.

Este rito cultural revela a barbaridade das energias da masculinidade quando, não temperadas pelas da feminilidade, se tornam repressoras e repugnantes; além do mais causam um impedimento à intimidade e à união afectiva entre homem e mulher. Nestas condições o acto sexual passa a ser uma atitude de caracter meramente funcional em proveito da satisfação imediata do homem e da procriação, afastando a possibilidade do prazer da mulher. A mulher torna-se em “terra agrícola do homem” que como charrua férrea a degrada, sem qualquer sentimento de violação (psíquica e corporal).

Na Guiné-Bissau, na altura em que os soldados portugueses lá se encontravam e se admiravam com o berreiro que surgia de alguns aldeamentos, era-lhes explicado pelos nativos que aquele hábito de mutilação das meninas era um acto ancestral preventivo para protecção dos homens; assim os homens não precisavam de ter preocupações porque as meninas, quando mulheres, não seriam tentadas a ser-lhes infiéis por terem dores nas relações sexuais.

A expressão do machismo cultural mundialmente vigente encontra a sua forma exacerbada nas acções bélicas e em algumas práticas culturais. A guerra foi domesticada e sublimada nas práticas de desporto como o futebol, onde o instinto guerreiro é satisfeito de forma agradável e sem estragos de maior. Noutros aspectos encontramo-nos ainda nos tempos da pedra lascada. (A propósito, o corte vaginal é geralmente feito com instrumentos primitivos e não esterilizados, o que provoca a morte a muitas meninas!)

Tive conhecimento do caso de um homem bom e sensível casado com uma mulher sexualmente mutilada. O homem sofria e não queria ter relações sexuais com ela, ao ver as dores que provocava nela sempre que tinham relações sexuais, devido às cicatrizes da sua mutilação vaginal; aquele homem, também indirectamente vítima da barbaridade cultural, dirigiu-se com a esposa à médica na procura de auxílio; uma vez submetida à operação, a mulher passou a ter menores dores físicas nas relações sexuais e mais tarde o casal teve a consolação de ter dois filhos.

Como informa “Terre des femmes” (https://www.frauenrechte.de/online/index.php/themen-und-aktionen/weibliche-genitalverstuemmelung2/173-weibliche-genitalverstuemmelung), só na Alemanha vivem pelo menos 48.000 mulheres afetadas pela mutilação total ou parcial do órgão sexual exterior e 9.000 raparigas de famílias imigradas encontram-se ameaçadas de o virem a ser. O corte do clítoris é efectuado, geralmente, entre os dois e os oito anos. É um rito cultural, não religioso próprio da África e levado também para a Indonésia. Pelo mundo fora são cortados os clítoris a 6 jovens em cada minuto que passa. Segundo UNICEF, mundialmente há 200 milhões de mulheres genitalmente mutiladas. Na Indonésia são mutiladas 2 milhões de mulheres por ano.

90% das mulheres genitalmente mutiladas vivem no Egipto, Eritreia, Somália e Indonésia. Muitas vezes, famílias emigradas mandam mutilar as meninas ao seu país de origem, sem que a comunidade acolhedora se dê conta do que se passa.

Urgem medidas preventivas contra esta barbaridade. Também nos países onde chegam migrantes é de muita importância, esclarecer as famílias em que isso possa vir a acontecer, bem como educadoras e enfermeiras. As mães deixam mutilar as filhas na sua boa-fé. Transmitem uma educação desumana machista sem sequer serem conscientes disso por se encontrarem submetidas ao hábito cultural.

Vivem sob o jugo de tradições machistas brutais sem se darem conta que a revolução humanitária em culturas patriarcalistas rígidas só poderá tornar-se eficiente e provocar verdadeiro desenvolvimento integral através da insurreição das mulheres. Estas têm de ser consciencializadas para através da educação dos seus filhos fazerem valer a energia do princípio da feminilidade perante o da masculinidade e assim se construir uma sociedade mais equilibrada.

Políticos intervêm militarmente em países quando vêem os seus interesses estratégicos ou comerciais em perigo; também eles dão testemunho de desumanidade ao não actuarem de forma consequente em sociedades onde a desumanidade fica presa nas fronteiras culturais.

Na Alemanha, apenas a partir de 2013 foi considerada a mutilação sexual da mulher delito penal de maltrato e atentado contra a integridade física (§ 226ª) com uma pena de 6 meses até 5 anos de prisão. Antes, talvez em nome da multicultura, olhava-se para o lado certamente porque atentados à dignidade humana concorriam com os direitos culturais. A lei é paciente dado praticamente não se registar acusações. Na Alemanha a maior parte das vítimas provêem da Somália e da Eritreia. Devido à grande afluência de refugiados, desde 2014 o número das mutiladas aumentou 37% e das meninas que possivelmente ainda estão em perigo de ser vulneradas 67%.
© António da Cunha Duarte Justo
Pegadas do Espírito no Tempo

DEUS NÃO É IGUAL A DEUS

Existe um Islão não político?

António Justo

Factores impulsionadores da violência

O Islão considera a política e a religião como uma unidade inseparável (sem separação entre poder secular e poder religioso) e, ao mesmo tempo, subjuga a dignidade da pessoa aos interesses da comunidade e segue o princípio selectivo da evolução dando a razão ao mais forte. Como na ditadura do proletariado também no islão o indivíduo é meio e não fim em si; os interesses do grupo justificam a imolação do indivíduo porque o que está em causa é a justificação da superioridade da cultura (instituição) e não a relação pessoal e comunitária; tais pressupostos fomentam a violência e a guerra porque vinculam totalmente a pessoa (individual, religiosa e politicamente) ao sistema seu que se afirma contra outros sistemas.

Cultura do gueto contra cultura aberta

Uma sociedade para ser pacífica tem de ser plural, tem de partir da liberdade e da dignidade individual e não dos meros interesses da instituição que faz do crente um escravo de Deus e da religião.

Os políticos ocidentais não se importam com a dupla estratégia dos membros de países de cultura árabe: os muçulmanos, no estrangeiro, exigem abertura social-cultural da sociedade acolhedora para se afirmarem nela como gueto e a nível nacional interno perseguem ou discriminam quem não for muçulmano.

Assim se processa um método sub-reptício de invasão de uma cultura pela outra sem contrapartidas nem acordos bilaterais correspondentes. O argumento muçulmano usado, de que a nossa sociedade ocidental deve abrir-lhe totalmente as portas pelo facto de se definir como sociedade aberta, não é coerente e não legitima, por outro lado, que a sociedade muçulmana do país de origem se afirme como monolítica e fechada, quando, no estrangeiro, se afirme na sociedade aberta como gueto.

Representantes islâmicos escondem, no seu diálogo com os políticos e com os representantes de outras religiões, que na sua religião mais que de religião e ética se trata de poder e influência religiosa e política. Considerando as coisas meramente sob o pressuposto do poder, o grande forte da cultura islâmica perante outras culturas reside ainda no facto de não distinguir entre religião e política, entre poder religioso e poder secular, considerando o islão como factor de identidade nacional, cultural e individual.

Representantes do islão, para defenderem o seu satus quo, procuram, inteligentemente, confundir os parceiros de diálogo dizendo que Maomé tinha ao mesmo tempo uma função religiosa e política (falava ao mesmo tempo como profeta e como guerreiro comandante. Deste modo as mensagens de Maomé são consideradas ao mesmo tempo políticas e religiosas ou conforme dê mais vantagem; esta foi uma estratégia que o islão fez e faz na sua política imperialista. Palavra de honra e vinculativa só há em relação aos da própria religião.

Uma outra estratégia de branqueamento da violência islâmica é afirmar-se que fundamentalistas também os há nos cristãos.

Naturalmente todas as pessoas trazem consigo o bem e o mal mas há uma grande diferença quando se valem da violência e da repressão.

Neste sentido, a religião muçulmana torna-se num instrumento político que através da instrumentalização do súbdito muçulmano opera uma invasão agressiva, ao não permitir liberdade individual ao crente e ao utilizar a religião como único factor de poder e de expansionismo hegemónico (pena de morte, procriação, mulheres e escravas) e definir como muçulmano todo o filho de pai islâmico (por isso, uma muçulmana que se casasse com um não muçulmano constituiria motivo de vergonha e desonra para a família que chega a motivar assassino por motivo de honra, como acontece, por vezes, também na Alemanha). Como se verifica, o poder islâmico é de uma congruência insuperável no sentido de fazer valer a sua posição perante os de fora. O Islão não mudará enquanto não se abrir à teologia e enquanto continuar posse de associações e funcionários com um emaranhado de interesses que ligam a religião ao chauvinismo nacional. Exemplo: Ditib – confederação de associações turcas na Alemanha – tem representado interesses antidemocráticos da Turquia que com o seu ministério da religião e correspondente envio rotativo de imames vê o fascismo turco ser apoiado na Alemanha em contraposição com os princípios democráticos da sociedade alemã. Na Alemanha e noutros países as instituições conservadoras islâmicas são muito fortes e consideram-se os únicos parceiros de diálogo e a política como precisa de parceiros organizados, para o diálogo, fomenta-os; os muçulmanos mais liberais são arredados dos órgãos de co-decisão e deste modo impede-se um Islão mais humanista. Assim se vai formando uma sociedade paralela de religião totalitária. Na Alemanha nas ruas das grandes cidades, torna-se visível uma invasão islâmica no vestir das mulheres. Depois de mais de 40 anos de presença turca cada vez se nota mais o avanço do islão de lenço na cabeça.

A liberdade religiosa no cristianismo e nos países ocidentais favorece o avanço do Islão que não concede liberdade nem contrapartidas e por outro lado enfraquece a laicidade nos países de cunho cristão.

A proibição de interpretar o Corão de maneira histórico-crítica (ao contrário do que acontece no cristianismo) reduz a espiritualidade individual ou grupal a uma incrustação de palavras cultuais e culturais que permanecem estáticas nas mensagens éticas do século VII. Assim, a religião muçulmana é uma religião política sendo uma farsa falar-se do islão político, quando, na realidade, o que a jurisprudência muçulmana só permite o islão político porque só considera a liberdade e a dignidade individual da pessoa numa relação de subjugação e de súbditos da sua cultura árabe e esta como a única verdadeira; uma certa tolerância só é taticamente usada num período de transição até que o grupo islâmico se torne maioria. O islão é intolerante, servindo-se da ambiguidade, como meio de afirmação, e do fascismo religioso não só como factor identitário mas também como estratégia hegemónica. Na Europa há cientistas do islão que, pelo facto de defenderem uma análise histórico-crítica do Corão e de Maomé, vivem sob vigilância policial para não se tornarem vítimas de algum atentado islâmico. O Corão tem muitas revelações jurídicas que requerem localização histórica para não prolongarmos ad infinitum muitos dos seus costumes primitivos.

O islão também tem, muitas vezes, má fama por não reconhecer que o terrorismo islâmico tem a ver com o islão: por toda a parte se assiste à prática da violência islâmica no mundo mas publicamente afirma a sua vontade de paz e não se observe em nenhuma parte manifestações islâmicas contra o terrorismo.

A interpretação oficial de que o Corão é literalmente palavra de Deus dá razão e motiva os terroristas muçulmanos a fazerem o que fazem porque isso está escrito no Corão e Maomé foi o primeiro a dar o exemplo de violência e não cumprimento de acordos. Os líderes islâmicos continuam a manter longe deles a autocrítica e não se preocupam por uma auto-compreensão mais adequada aos tempos modernos.

O Deus de uma cultura espelha a realidade do Homem dessa cultura

Para se poder compreender textos antigos, a sua leitura terá de ser feita no seu contexto histórico e também serem submetidos à análise histórico-crítica. Querer interpretá-los apenas literalmente como fazem os muçulmanos e os Testemunhas de Jeová leva a confundir o seu espírito com o corpo (escrita) que lhes dá forma.

O mesmo se diga sobre a história do desenvolvimento da consciência ética e moral! Por outro lado a revelação de Deus também não se deixa reduzir a uma rima, nem ao casulo de uma cultura nem tão-pouco à imagem que esta faz dele para se poder definir e subsistir; o lugar da revelação de Deus é a pessoa que vive em comunidade e como tal só serve o Homem a cultura que o liberta e não a cultura ou religião que o subjuga com armaduras pesadas e impostas para fazer dele apenas soldado e se afirmar à custa dele. Soldado implica guerra, a não ser que se entenda como irmão da caridade e do amor que que disponibiliza a sua vida em serviço do próximo vendo em cada pessoa um filho de Deus independentemente da sua fé ou crença.

Deus revela-se à medida que o Homem é capaz de entendê-lo e a sua imagem de Deus é a melhor definição do que ele é e pretende ser. Por isso embora só haja um Deus, há contudo diferentes e quase contraditórias imagens dele (religiões). Por isso Deus não é igual a Deus e consequentemente religião não é igual a religião.

Em relação ao islão necessitam-se diferentes abordagens dos textos sagrados, como se faz na teologia ocidental; isto ajuda a evitar fundamentalismos sem a necessidade de se desfazer dos textos nem, por outro lado, de amarrar o sentido à casca das palavras ou aos interesses de uma instituição em que a dignidade humana não seja o princípio de soberania social.

A nossa percepção depende do contexto porque somos feitos também de comunidade

Em geral, o erro dos dirigentes muçulmanos vem do facto de não permitirem a análise contextual histórico-crítica, considerando o Corão como um monólogo de auto-revelação divina: um monólogo sem parceiro que o entenda.

O ser humano só se reconhece no diálogo ou no encarar um oposto (o rosto do outro leva-me a reconhecer e a perceber o meu rosto, sem necessidade de, para ser, negar o outro!). Por isso o ser humano é o resultado do diálogo em diálogo. No diálogo pessoal e cultural de Deus com o Homem revelam-se simultaneamente Deus e o Homem na continuação do diálogo criador-criatura. O entender do homem é, também ele, uma revelação de si mesmo e de Deus. Deus dá-lhe a mão para que o humano deixe de rastejar e se levante na afirmação-procura do que é mais que uma imagem projectada num ecrã material.

No princípio era a Palavra, a Informação e esta tornou-se carne, revela-nos já o evangelho de S. João. Do diálogo surge comunidade, a comunidade dialogante que não se reduz ao diálogo do eu com um tu mas que se realiza no nós (comunidade). Por isso Deus é trinitário, não se reduz ao deserto de um monólogo de um ausente consigo mesmo, nem à crusta da terra porque esta encobre vida. É comunicação do ser, expressa no estar, no sempre a tornar-se (acontecer).

Deus é a relação por excelência que faz da vida relação, não podendo ser limitador da relação como quer o Islão, com muitas frases do Corão, que procura, através delas, aprisionar Deus na cultura árabe e legitimar a opressão e a perseguição dos vizinhos (dos fora do gueto: os denominados ímpios ou incrédulos). Também muitos muçulmanos terroristas justificam o seu agir violento com o Corão, interpretando-o à letra mas não notando que muitos textos do Corão se encontram em contradição e que neles Alá muda de opinião conforme os interesses da situação, por vezes muito mundanos.

Naturalmente, o conteúdo do Corão ou de uma revelação não pode ser reduzido ao contexto histórico ou a uma história edificante para o tempo. Trata-se de ver o que a casca do texto encobria para hoje melhor compreendermos a verdade profunda que ele esconde e que também hoje usamos para melhor nos definirmos, percebermos e expressarmos. Não se trata apenas de descobrir o conteúdo ético ou histórico mas a espiritualidade que dele brota como eco de Deus, na expressão que encobre o exprimido.

Em contexto apologético, representantes muçulmanos falam muito de justiça e misericórdia que são naturalmente valores que se referem ao tratamento, ao manejo exterior e que se podem encontrar também no Corão. Mais importante que a justiça e a misericórdia é o amor, o amago do que é vida, relação, o único suporte de tudo o resto.

O Islão tornar-se-á cada vez mais anacrónico se não se orientar mais no sentido da espiritualidade e não permitir a análise histórico-crítica das suas fontes.

© António da Cunha Duarte Justo
Teólogo e Pedagogo
Pegadas do Espírito no Tempo,

O ESTADO ALEMÃO NÃO HONROU AS VÍTIMAS DO ATENTADO DE BERLIM

O factor medo na política de informação pública e na atitude política

António Justo
Só um mês depois do ataque terrorista islâmico perpetrado em 2016/12/19 junto à Igreja da Memória num Mercado de Natal de Berlim, o Parlamento Federal conseguiu comemorar os mortos e outras vítimas do atentado e isto devido ao incentivo das muitas críticas na imprensa e nas redes sociais. O Estado alemão não honrou oficialmente as vítimas do atentado islâmico: um atentado cheio de simbologia contra o Estado e contra o cristianismo.

O medo encontra-se enraizado na coluna vertebral

A classe política alemã tem medo de dar demasiado espaço público a assuntos como a criminalidade porque desbeneficiariam a imagem pública dos estrangeiros e em especial a dos muçulmanos que se salientam pelas suas exigências à sociedade acolhedora e também pela organização de extremistas em torno de mesquitas e de clãs árabes em Berlim e noutras cidades. Uma censura camuflada da informação revela-se de resultados positivos a nível social; assim a Alemanha não se tem visto confrontada com o nacionalismo como acontece em França que segue uma política de informação mais liberal, neste sector.

A Ministra do Trabalho prometeu compensação às vítimas que seriam pagas pelo fundo para vítimas de acidentes rodoviários. Deste modo relega a questão para “acidente de trânsito”.

O presidente do Bundestag, Lamert, no discurso proferido no parlamento, referiu que um Estado, que garante a liberdade religiosa como um direito humano, “pode e deve exigir dos muçulmanos uma discussão com a sua religião e a conexão fatal entre fé e violência fanática, de forma vigorosa“, disse ele.

Com o atentado terrorista de Berlim a classe política revelou uma atitude cobarde para com as vítimas. A Alemanha é o único país que depois de um atentado terrorista evitou celebrações públicas.
A gravidade desta omissão assenta no facto de um atentado terrorista com fundamentação política ser politicamente ignorado pela classe política. Estamos em ano de eleições na Alemanha e a classe política quer evitar tudo o que faça lembrar os seus erros. O medo do medo chegou à política legitimando o ataque de certos grupos que dizem que ela apenas reage e não age. Há razões objectivas para se ter medo de se viver em cidades que habitamos que levam muitos cidadãos a sentirem-se estrangeiros no próprio país. Não se trata de tomar opções drásticas como faz talvez levianamente Trump mas de convencer os muçulmanos a serem mais moderados e contidos na sociedade que lhes permite elaborar um futuro mais digno do que teriam na própria sociedade.

Hoje a opinião do mainstream autocensura-se evitando ou banindo perguntas críticas com o argumento de poderem fomentar a xenofobia e o populismo. Falta a coragem de argumentar em público com sinceridade e parte-se da consideração de uma sociedade imatura em que não se pode confiar a verdade em vez de a preparar para a multiplicidade e para o dever da interculturalidade.

O medo tem as suas origens sobretudo numa desigualdade social que cresce. A sociedade média encontra-se cada vez mais instável; poucos sobem na sociedade isolando-se em elites e outros vêem que seus filhos, embora nas mesmas condições de formação, estão condenados à depravação.

Muita da camada social decadente sente-se injustiçada e desfavorecida em relação aos refugiados que, por vezes, recebem maior apoio do Estado do que os necessitados nacionais.
Os terroristas combatem o modelo de sociedade ocidental e esta limita-se a construir fossos de combate entre si ou a meter a cabeça na areia. Estabilidade interna e liberalidade encontram-se em tensão alta.

O luto recusado

As vítimas de Berlim encontram carinho e empatia cordial por parte dos cidadãos mas não na sociedade política donde seria de esperar um gesto público de respeito do Estado pelas suas vítimas.

Familiares das vítimas queixaram-se do “luto excluído” e da falta de cultura do luto. De facto não houve imagens das vítimas.
Tal é o medo dos partidos e de um Estado perante um povo que, em parte, os responsabiliza pelo acontecido e por um Estado que perdeu o controlo sobre os refugiados que albergou em 2015 (cerca de um milhão). O culto da culpa praticado na Alemanha não parece conveniente nem oportuno para vítimas alemãs. “Vítimas alemãs não se enquadram no conceito do culto da culpa – em que só pode haver delinquentes alemães e não há vítimas alemãs”, relata um desiludido. Uma certa benevolência de tratar pública e politicamente os muçulmanos na Alemanha fomenta em muitos a inveja de serem desfavorecidos.

A república mudou a partir dos acontecimentos de Colónia

Os cidadãos das potências europeias e, por empatia, também os dos países pequenos encontram-se movidos por uma onda dos sentimentos que em certos meios toma a expressão de uma guerra civil de moral contra moral.

O poder da emoção pública aumenta e mete medo também aos políticos que, em tempos de eleições, se deixam determinar mais pelo medo. Em vez dos factos surge o poder das emoções e das ideologias que determinam um espírito irritado e irritadiço na sociedade.
Nas conversas domina a preocupação e a falta de orientação. O eu individual e o eu social não se encontram em harmonia.

Na passagem do ano de 2015 Colónia e outras cidades alemãs congregaram grupos de refugiados principalmente do norte de áfrica com a finalidade de apalpar, roubar e abusar de centenas de mulheres alemãs reunidas em torno da Catedral para saudar 2016. Este fenómeno repetiu-se na mesma noite noutras cidades. A informação sobre o assunto foi, em parte, manipulada e adiada para não causar aversão contra os muçulmanos. A partir daí a sociedade deixou de ser a mesma; a desconfiança tem vindo ocupando os espaços da confiança. Diminuiu imenso a confiança na imprensa e nos políticos. A ideia que a sociedade tinha em surdina, já desde há muitos anos, de que as informações relativas a abusos e criminalidade de pessoas de cultura árabe eram branqueadas, viu-se confirmada na manipuladora política de informação dessa noite e nas hesitações dos dias seguintes. Depois de Colónia essa preocupação encontra-se mais velada na prática de se procurar justificar a maior criminalidade árabe com problemas de meio social e de precaridade económica como se nas mesmas cidades não vivessem outros tantos ou mais alemães nas mesmas condições sociais. Às vezes a explicação de um fenómeno ainda o agrava mais por substituir a tomada de apoios para os grupos sociais concorrentes.

O medo na Alemanha tem uma certa legitimação, dado o povo estar atento e reagir aos acontecimentos. Era tabu ter medo de expressar o medo ou crítica a uma sociedade hóspede que se comporta, por vezes como se fosse senhora da casa. A sociedade aberta não é consequente ao evitar uma cultura de conversação aberta.

A sociedade ocidental, de uma maneira geral, tem uma atitude complacente para com o delinquente (mesmo a nível de tribunal) e uma atitude indiferente para com a vítima, independentemente de ela ser nacional ou estrangeira. Talvez esta atitude corresponda a uma projecção da própria sombra recalcada no sentimento inconsciente de que o próprio bom viver se deve à exploração.
© António da Cunha Duarte Justo

Pegadas do Tempo,

ALEMANHA REVOGA O §“CRIME DE LESA-MAJESTADE” (DIFAMAÇÃO DE SOBERANOS ESTRANGEIROS)

EM TEMPOS DE PAZ PREPARA A GUERRA

António Justo
A sociedade atravessa tempos de guerra ideológica, política e económica. Os diversos grupos pensam e agem convencidas de possuírem a visão global da realidade, muito embora percepcionada apenas sob uma perspectiva de gueto; como consequência temos a guerrilha civil; acabou-se com as nações para se prosseguir numa marcha de protestos e de toque a finados das civilizações; o descontentamento interno não se limita às fronteiras das nações. Já não chegava a instabilidade europeia, criada pelo fascismo turco, pelo Brexit, pela política de refugiados, pelo desemprego, para nos vermos ainda mais divididos pelas águas revoltas sopradas por Trump. Resumindo: uma sociedade ocidental dividida parece viver os tempos muçulmânicos de jihad (guerra santa) ad intra e jihad ad extra.

“Se queres paz prepara a guerra”

Política e socialmente debatem-se interesses contrários em jogo, e em ano de eleições relevantes na Europa (Alemanha e França) cada grupo procura tirar proveito da demonização do outro: de um lado, os que querem o poder a todo custo e, do outro, os que têm medo de o perder a defender-se com unhas e dentes.

Na era do pós-facto já não interessa a realidade nem o pensamento fundado sobre as coisas porque o poder da opinião chega para ir insuflando os factos e as coisas. É tempo da guerrilha calada e interiorizada na defesa de interesses construídos à custa do domínio dos outros. Nesta guerra geral de uns contra os outros, em que verdade e mentira se igualam e transformam em ameaça, já não se pode descansar no travesseiro da paz porque, na realidade concreta, “si vis pacem para bellum”!
Assistimos a uma sociedade dividida nos que vivem bem do sistema e nos que se sentem económica e culturalmente atacados interior e exteriormente.

O presidente turco perdeu o processo de crime de lesa-majestade

A 17.03.2016 um canal da cadeia de TV pública NDR difundiu um vídeo em que o humorista Jan Boehmermann criticou Recep Tayyip Erdoğan , presidente da Turquia, com uma poesia satírica. Erdogan considerou a poesia como um insulto, o que deu origem a um caso jurídico de estado entre a Alemanha e a Turquia.

A acusação levantada em tribunal alemão por Erdogan contra Böhmermann por este o ter apelidado de “Saco pateta, covarde e atolado”(“Sackdoof, feige und verklemmt”) foi considerada sem efeito pelo tribunal porque isso não é suficiente para poder ser apreciado como insulto. Segundo o Ministério Público não constitui crime dado “a caricatura de fraquezas humanas não conter difamação grave da pessoa”.

Foi curioso também o facto de o ministro dos negócios estrangeiros, futuro candidato à presidência da Alemanha, ter qualificado publicamente Trump como ”Pregador do ódio”.
Nos USA a liberdade de opinião não contempla crime de lesa-majestade baseando-se no argumento de que todas as pessoas são iguais perante a lei.

Governo alemão determinou acabar com o § 103 que defende dignatários estrangeiros

É considerado crime de lesa-majestade não respeitar a dignidade de reis ou de chefes de estado (§ 103) estrangeiros. O parágrafo 90 StGB regula a mesma matéria em relação achefes de estado alemães.
Para o § 103 ser aplicado, o governo alemão cedeu ao pedido da Turquia e emitiu autorização para os advogados de Erdogan poderem apresentar acusação nos tribunais alemães e ser aplicada a lei.

Os Média alemães discutiram de maneira controversa a questão mas na sua maioria criticaram Merkel por não se ter colocado ao lado de Böhmermann e ainda ter comunicado ao governo turco que considerava a poesia satírica “deliberadamente ofensiva”. O povo alemão não gostou nada desta posição de Merkel, acusando-a de rastejar (se ajoelhar) perante a Turquia, certamente devido ao facto de se encontrar dependente dela devido ao acordo para conseguir o estrangulamento dos refugiados para a Europa.

O Gabinete de Merkel decidiu a supressão do parágrafo 103 do Código Penal em 2018. Os insultos de chefes de Estado permanecerão puníveis mas serão tratados como os de qualquer outra pessoa.
A decisão tem um senão: porque não suprimir também o parágrafo 90 StGB que penaliza o insulto ao presidente alemão?

A dignidade humana é um bem cultural a defender universalmente. O respeito pela pessoa humana, independentemente do cargo ou ocupação não abule a crítica justa. Por vezes também se assiste a críticas baratas e ultrajantes que revelam mais sobre a dignidade ou indignidade (e a civilidade) de quem ataca ou ultraja do que sobre o ultrajado.
©António da Cunha Duarte Justo
Pegadas do Tempo,

TRUMP UM INCÓMODO PARA A ESQUERDA E UMA INSEGURANÇA PARA A DIREITA

Trump mete medo às elites do poder favorecidas pela unidade de opinião

António Justo
São mais as vozes que as nozes! O discurso de Trump abriu-nos uma panorâmica a preto e branco! Assistimos ao irromper de uma era histórica da privatização e emocionalização da política e ao bulevardismo do poder mediático.

O que está em jogo?

Trump manifestou-se contra as elites que vivem encostadas ao Estado, quer iniciar o proteccionismo económico e assim opor-se principalmente à concorrência chinesa, não pretende a guerra fria com a Rússia,quer responsabilizar mais os membros da Nato, quer destruir as bases do “Estado Islâmico „na Síria e no Iraque, põe em questão a causa das alterações climáticas, é contra a imigração ilegal, considera o islão como “potencial de risco” querendo proibir a imigração de muçulmanos, é também contra o aborto e contra o casamento homossexual que hoje são legais nos EUA.

De momento encontram-se dois poderes em luta na opinião pública: a dos que defendem os interesses do estabelecimento político e a dos que alegam a defesa do povo mais precário ou em derrocada: num extremo os que vivem melhor da ideologia e no outro os que vivem pior do trabalho.

Contra uma cultura da abertura que favorece as culturas fechadas

Os EUA são de todos: de republicanos e de democratas; a Europa é de todos: de conservadores e de progressistas, de religiosos e ateus; neste contexto é óbvia a moderação e o equilíbrio e o reconhecimento da intercultura provocada pela imigração que vai mudando o rosto americano.

O trunfo Trump assusta principalmente as elites que vivem em torno do poder estabelecido habituado à unidade de opinião pública de timbre vermelho e numa política do continue-se assim! Uma grande parte da população na América e na Europa não têm nada a perder, pelo que, qualquer experimentação no palco da política não a levará a pior.

Os apoiantes de Trump, tal como parte do povo europeu, contesta a prática política de uma cultura aberta desenfreada que tem beneficiado a afirmação das culturas fechadas (privilegiando mesmo a formação de guetos com mais força de organização e afirmação do que o povo precário nativo) e consequentemente o ressurgir do proteccionismo e do nacionalismo. A Europa tem fomentado a abertura da própria cultura e a formação de guetos cerrados no seu meio: uma contradição!

Esta onda irrita de sobremaneira uma certa elite do poder europeu que tinha apostado na desestabilização económica da classe média e da própria cultura em favor da globalização e do rejuvenescimento social através da imigração e da afirmação do islão, mais adequado à execução da sua ideologia e interesses.

Compromisso: Primeiro América e os americanos

O aparecimento súbito de um homem representante de valores machistas a dizer “Primeiro América e os americanos” desperta esperanças naquela parte da população que se sente há muito como alma penada da nação e como tal a sapata de um regime político que a leva a julgar-se estrangeira no próprio país. Segundo a revista Forbes nos últimos quarenta anos os salários dos gestores cresceu mil por cento e o dos trabalhadores onze por cento.

A vitalidade das nações pode medir-se pelo crescimento sustentável do seu pib (produto interno bruto). O crescimento do pib previsto para este ano nos USA é de 1,5% e na China é de 6,6 %. Isto mete medo a Trum que quer manter de maneira sustentável a economia norte-americana à frente do mundo sem pensar que os outros países também trabalham no seu sentido. Em 2016 o pib americano foi de 17,9 biliões de dólares e o pib da China foi de 10,9 biliões.

Nesta perspectiva a América não é Europa e a Nato também não; esta mensagem de Trump, aliada à intenção de proteccionismo económico, mete medo a uma UE habituada a viver encostada aos EUA e que se abriu tanto em nome do capitalismo e do socialismo liberal que se encontra mergulhada em problemas sem fim.

O proteccionismo da economia nacional e a introdução de direitos comerciais aduaneiros significaria o fim da globalização e prejudicaria sobretudo nações exportadoras como a Alemanha que são beneficiadas pela globalização.

Trump quer poupar na Nato para investir nas infraestruturas

Trump quer restringir a política externa e o planeamento militar e para isso reduzir os lugares de inserção e operações militares. Os EUA gastam com a defesa 600 mil milhões de dólares por ano (tanto como a China, a Rússia, o Reino Unido e a França juntos) e têm um exército com 1,5 milhões de empregados. A tesoura entre ricos e pobres é maior que noutros países industriais. O topo da população americana (0,1%) ganha em média seis milhões de euros por ano, enquanto 90% da população ganha em média apenas 33.000 dólares por ano. A expectativa de vida dos norte-americanos desceu há dois anos de 78,9 anos para 78,8. Vinte e nove milhões de norte-americanos não têm seguro de saúde; as infraestruturas do estado, estradas e electricidade, são piores que as europeias.

Enquanto os gastos com a Nato em 2016 corresponeram a 3,61% do pib dos EUA, na Alemanha corresponderam a 1,19%, na França a 1,78% e no Reino Unido a 2,21%. O objectivo da NATO combinado em 2002 para os seus membros tinha sido 2%.

Só a aragem de Trump talvez obrigue a Europa a unir-se e a estender a mão à Rússia, seu natural e vocacionado vizinho, se não quiser perder-se em gastos imensos de armamento.

Uma elite do poder renitente

O medo do terror dependurado no pescoço americano (desde11.11.2001) legitima o governo a tornar-se mais autoritário. Na Turquia que, se encontra perto e dentro da Europa, o fascismo e a ditadura afirmam-se sem manifestações públicas nem medidas da EU que considerem isso perigoso embora 60% dos turcos na Alemanha apoiem Erdogan.

O poder estabelecido treme já só em ouvir o soar da trompeta de Trump. Há muito a perder de um lado e talvez algo a ganhar do outro. Em democracia os interesses revezam-se no poder e, como a sociedade está dividida, reveza-se também na dor. Muitos cidadãos não se se dão bem com a bipolaridade da realidade colocando a verdade num só polo esquecendo que partido é parte e, como tal, representa apenas uma parte da verdade e dos interesses populacionais.

Independentemente dos Erros de Trump, é triste o facto de uma Europa com uma consciência política semelhante à das elites do partido democrático americano não se aproveitar da lição da eleição de Trump para se virar para o povo e analisar o que realmente faz de mal.

Do nosso lado temos a soberana dívida, o Brexit que questiona a EU e a que se soma uma taxa de desmprego nos paíse europeus horrenda de desemprego (de 23,1% a 7,6%: média europeia 9,8%), um capitalismo feroz que tomou conta da política e a crise dos refugiados.

Uma Europa aberta mas de patriotismo envergonhado e pródiga em relação ao esbanjamento de interesses económicos arma-se em tribunal da sociedade americana dividida que agora vê ganhar a parte instável em Trump. Em vez de análise da situação ouve-se por todo o lado uma indignação arrogante de uma opinião pública massificada que se arroga o direito do monopólio da interpretação, como se em democracia só tivesse uma facção razão e a verdade fosse determinada pelo barulho da rua ou dos Média. Trump não gosta dos jornalistas e os jornalistas não gostam dele. O poeta e dramaturgo Bertold Brecht (1898-1956) alertava para a cegueira do quotidiano e da opinião pública publicada dizendo: ”Não aceitem o habitual como coisa natural, pois em tempos de confusao organizada, de arbitrariedade consciente, de humanidade desumanizada, nada deve parecer natural. Nada deve parecer impossível de mudar”.

Talvez o exagero de Trump ajude a Europa a mais realismo e, com o tempo, a menos ideologia política de modo a poder voltar à Europa a política económica social de mercado e o respeito pelos interesses da sua população desprotegida ou mantida à mão da esmola do Estado. Esta, estruturalmente desdignificada e desonrada, cada vez se sente mais como peso morto num Estado sem sol para ela e que lhe não oferece perspectivas.

Islão como factor de risco

A eleição de Trump alerta também para o facto do preço da abertura da Europa ter sido proveitoso para as elites que participam do poder e prejudicial para a camada social desprotegida, com mais concorrência e mais negação da própria cultura em favor da árabe: esta dá-nos petróleo e imigrantes em troca da expansão da sua religião. Trump tocou também este ponto sensível ao considerar o islão como “potencial de risco” sem diferenciar entre islão como ordem social e muitos muçulmanos que a nível individual distinguem entre poder religioso e poder secular.

Temos uma classe política europeia cúmplice, crítica em relação ao cristianismo, fraudulenta no que toca ao futuro da juventude e implementadora do islão por razões económicas e estratégicas. Enigmático na política da EU, que se preocupa tanto com a defesa dos valores ocidentais permanece o facto de nunca um governo ocidental ter defendido os perseguidos cristãos nos países islâmicos e por outro lado os políticos virem para a praça pública dizer que o islão pertence à nação e que o sistema dos países islâmicos e o terrorismo islâmico não têm nada a ver com o islão. Em vez de se procurarem medidas para resolver os problemas de maneira equilibrada e bilateral, assiste-se também aqui a uma política semelhante à seguida nas dívidas soberanas que apenas se juntam e aumentam à custa da insegurança das gerações futuras. Nos USA há 5 milhões de muçulmanos, na Alemanha vivem 4,02 milhões.

Na hora dos malcomportados

Trump, tal como Costa em Portugal, conseguiu assumir ao governo embora o partido adversário tenha reunido mais votos (Clinton 61 milhões e Trump 60).

Nestas eleições reúnem-se os malcomportados: Trump que não respeita a classe dominante nem as minorias; Obama que vai contra a tradição fazendo um discurso de despedida contra o da tomada de posse de Trump e dirigido ao eleitorado dos democratas; na rua, vencidos revoltam-se contra vencedores como se não tivesse havido eleições; tudo isto parece dar vida à democracia que não quer ver todos os cidadãos reunidos debaixo das suas saias: ela vive da disputa de valores e interesses. Trump poder-se-ia vingar em parte do “estabelecimento político” que, há cinco anos, através de Obama, o humilhou publicamente. Tal atitude prejudicaria o restabelecimento da unidade nacional. Naturalmente Trump não governa sozinho; ele tem a seu lado instituições democráticas que o não deixam isolar-se.

Penso que o que está aqui em jogo é a volta dos nacionalismos e correspondentes proteccionismos dado também a política europeia das portas abertas ter falhado e ser um perigo para um continente dividido que não tem os mesmos pressupostos históricos nem a independência política que podem ter os EUA. Penso que a situação da esquerda e da direita é tão novelada em torno de um polo e do outro que, de momento, domina demasiadamente o medo e um espírito político carnavalesco.

Trump quer governar o mundo como se este pudesse ser governado tal como se gere uma empresa; neste sentido parece equacionar o mundo em termos de cálculo de custo e de utilidade (lucro). Por outro lado personaliza e privatiza a política conotando-a mais de povo. A um extremo seguido até agora segue-se talvez um outro, num movimento pendular de épocas, ideologias e tempos.

No reino das projecções e das sombras

A indignação exagerada ou uma fixação na crítica contra Trump ou contra outra personalidade pode ser indício de caracter fraco e correr o perigo de procurar e combater inconscientemente fora de si os defeitos que traz dentro de si e consequentemente vê-os (projecta-os) como sombras em Trump ou em alguém que odeia. Muitas das pessoas que odeiam deixam-se reduzir a meras portadoras de sombras. Exigem que os outros sejam exemplos de luz, portadores da luz que corresponde à sombra que não reconhecem em si mesmos. A América sempre serviu de espaço da sombra para a esquerda europeia e para os nacionalistas.

Este é um conceito de C.G. Jung que tudo o que não aceitamos (vícios) em nós, o oprimimos e banimos para as sombras que são o nosso inconsciente. Então inquieta-nos o que não queremos admitir em nós para o combatermos nos outros. Quando nos irritamos muito com algum defeito nos outros isso é um sinal de que esse defeito é algo que faz parte da nossa sombra invisível (combatemos fora os próprios defeitos oprimidos!).

No sentido do pensar positivo americano

Uma vantagem da América e da Rússia sobre a Europa na qualidade de povo e nação vem do facto de darem importância à religião cristã como factor de substrato nacional e de identificação. Trump é um aviso à esquerda materialista dominante na sociedade para que se torne mais humilde e não tão determinante e poder-se-ia tornar também num apelo aos americanos de cima para que se comportem de modo responsável para com os de baixo.

Concedamos-lhe 100 dias para governar e então saberemos mais! De resto, até agora, pelo que pude observar, Trump tem a vantagem de ser um homem igual a si mesmo! Quanto ao resto, os factos o dirão.
© António da Cunha Duarte Justo
Pegadas do Tempo,